Robson Sávio – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Fri, 17 Nov 2017 18:17:58 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Robson Sávio – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 Superação da violência? Um desafio que precisa ser assumido por todos nós. https://observatoriodaevangelizacao.com/superacao-da-violencia-um-desafio-que-precisa-ser-assumido-por-todos-nos/ Fri, 17 Nov 2017 18:17:58 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=26927 [Leia mais...]]]> Entrevista com o prof. Robson Sávio, da PUC Minas, especializado em segurança pública, na qual aborda sobre o complexo e desafiante tema da CF 2018

A CNBB divulgou entrevista com o professor da PUC Minas e coordenador do Núcleo de Estudos Sociopolíticos (Nesp), Robson Sávio Reis Souza. O professor é um dos colaboradores na redação do texto base da Campanha da Fraternidade 2018, cujo tema é violência. Doutor em Ciências Sociais e especialista em Segurança Pública, além de membro associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o professor falou à Revista Bote Fé, das Edições da CNBB, sobre o tema da violência.

Para o autor do livro “Quem comanda a segurança pública no Brasil: atores, crenças e coalizões que dominam a política nacional de segurança pública”, da Editora Letramento, a violência vem se tornando o fio condutor da forma como se realiza a sociabilidade no Brasil.

Acompanhe, abaixo, a íntegra da entrevista concedida para a CNBB:

cartaz-da-CF2018

1. A ideia de que o povo brasileiro é ordeiro e de que há uma sociabilidade pacífica é um mito nacional? 

A experiência do viver em paz fundamenta a autoimagem de um povo que se concebe como pacífico, ordeiro e inimigo da violência. Contudo, essa ideia não apaga as contradições. Ao mesmo tempo em que se ostenta a vida pacífica, produz-se e promove-se a violência, tanto no espaço público como no ambiente privado de casas e empresas; nas interações pessoais diretas ou mediadas pela tecnologia. Constata-se que, até mesmo nas relações sociais cotidianas, o equilíbrio necessário à existência pacífica tem aparecido frágil e suscetível a abalos, inflamados frequentemente por razões banais.

Nesse movimento de transformação social, tem emergido uma sociabilidade que vai se concretizando em ações cotidianas violentas. A cordialidade parece ceder lugar à intolerância. O compartilhamento negociado de espaços e recursos parece, então, correr o risco de ser substituído pela imposição autoritária de pontos de vista e a subjugação do outro pelo uso da força, seja ela simbólica ou, em certos casos, até mesmo física. Em razão de fenômenos como esses, é possível suspeitar que a sociedade brasileira possa estar consolidando modos de vida referenciados no uso da força e da violência.

A violência se torna o fio condutor da forma como se realiza a sociabilidade, isto é, a forma como uma pessoa interage com as demais em um certo grupo social. Por vezes, para combater a violência, escolhem-se condutas violentas. A concepção punitiva da justiça feita pelas próprias mãos, o incremento dos equipamentos de segurança pela população em busca de autoproteção, a exigência do maior rigor nas leis e do aumento dos presídios são exemplos de como o discurso contra a violência às vezes se converte em práticas que podem vir a aumentar ainda mais a sociabilidade violenta. Isso ocorre quando se pretender fazer o combate da violência pelo recurso a instrumentos potencialmente geradores de mais violência.

A concepção punitiva da justiça feita pelas próprias mãos, o incremento dos equipamentos de segurança pela população, a exigência do maior rigor nas leis e do aumento dos presídios são exemplos de como o discurso contra a violência às vezes se converte em práticas que podem vir a aumentar ainda mais a sociabilidade violenta

 

2. No texto base da CF 2018 vocês falam de uma violência multifacetada e epidêmica que faz parte da história do país. Multifacetada e epidêmica? O que estas expressões dizem sobre a natureza da violência em nosso país?

O Brasil é uma sociedade injusta, excludente e extremamente desigual que exibe uma democracia sem cidadania. Injustiça, exclusão e desigualdade são fatores que geram múltiplas formas de violência. A fome, o desemprego, a falta de moradia, de políticas públicas de proteção e promoção de direitos são tipos de violência que afetam a dignidade humana.

Apesar de ser a oitava maior economia mundial, é o décimo país mais desigual do mundo, segundo o Relatório de Desenvolvimento Humano, de 2016, elaborado pela Organização das Nações Unidas. Em relação à violência letal, por exemplo, os números apontados pelo Mapa da Violência 2016, mostram que, no Brasil, cinco pessoas são mortas por arma de fogo a cada hora. A cada único dia são 123 pessoas assassinadas dessa forma.

Por ano, quase 60 mil brasileiros são assassinados. A maioria pobres, negros, jovens e moradores da periferia. É uma violência seletiva. Não atinge a todos. No Brasil, há locais mais seguros que a Europa e mais violentos que a Síria.  Talvez, por isso, a violência letal não apareça como um escândalo que clama aos céus, para muitos segmentos da sociedade e dos governos.

Essas cifras revelam que, no Brasil, ocorrem mais mortes por arma de fogo do que nas chacinas e atentados que acontecem em todo o mundo. Contam-se mais homicídios aqui do que em diversas das guerras recentes.

A violência se torna o fio condutor da forma como se realiza a sociabilidade, isto é, a forma como uma pessoa interage com as demais em um certo grupo social

 

3. Os episódios de violência intensificaram-se e, ao que parece, tornaram-se comuns também em médios e pequenos centros urbanos, deixando de ser um fenômeno típico das grandes metrópoles. O que explica esta realidade?

Se antes a violência era um problema relativo às grandes cidades, em tempos recentes, numerosos fatores fizeram com que a violência chegasse também aos médios e pequenos municípios. Além disso, ela se disseminou por todo o território nacional, de modo que – apesar das variações regional ou local em sua intensidade – a violência é hoje um problema em todo o país. O incremento da violência pelo interior do país é determinado por múltiplos fatores, dificilmente redutíveis a uma causalidade única. Entretanto, não há como ignorar a influência do contexto socioeconômico na geração da violência.

dados disponíveis permitem afirmar que o sistema de segurança pública e de justiça criminal é ineficaz. Com o aumento da criminalidade a partir da década de 1980 foi-se consolidando um contexto em que a impunidade, a maior procura por drogas ilícitas e a maior disponibilidade de armas de fogo formaram o ambiente no qual se deu o crescimento dos homicídios e de outros crimes contra a pessoa e contra o patrimônio.

Ao invés de se rediscutirem o funcionamento e os objetivos do aparato estatal de segurança e justiça criminal para lidarem com a prevenção e o combate à violência urbana, assistiu-se ao incremento da indústria de armas de fogo, a medidas paliativas oi pontuais na gestão da segurança pública e à ascensão da indústria da segurança privada. É nesse contexto que se espraiou para todo o país a criminalidade violenta.

Se antes a violência era um problema relativo às grandes cidades, em tempos recentes, numerosos fatores fizeram com que a violência chegasse também aos médios e pequenos municípios.

 

4. Numa mesma cidade, encontramos oásis de paz e tranquilidade e territórios marcados por extrema violência. Que fatores definem estes espaços de paz e de guerra?

Pelo menos três fatores são fundamentais para definir esses espaços de paz e de guerra. O primeiro deles é a ação (ou omissão) do poder público. Nos locais onde o Estado deveria estar mais presente, como nas periferias das grandes cidades, observa-se uma quase ausência das políticas de proteção, promoção e defesa de direitos deixando tais territórios e seus moradores, muitas vezes, entregues a grupos armados e a toda a sorte de violência e desordem social.

Por outro lado, em áreas nobres, a presença do poder público se faz de múltiplas formas, garantindo direitos dos cidadãos e protegendo o patrimônio das elites. O segundo ponto que demarca a ocorrência da paz ou da guerra está relacionado ao poder do dinheiro. Quem pode pagar por segurança privada tem uma série de privilégios dentro do espaço urbano negados à maioria dos cidadãos que não possuem recursos financeiros. É dessa forma que a segurança deixa de ser direito e torna-se privilégio.

Um terceiro ponto diz respeito ao tratamento seletivo dado pelos órgãos públicos, dos três poderes, em relação à garantia de direitos, como o acesso à Justiça. Quem tem condições de pagar “bons” advogados, por exemplo, tem tratamento diferenciado. Nesse sentido, o viés étnico-racial e socioeconômico é fator preponderante para proteção ou exposição à violência.

Também as interações sociais que acontecem no espaço público da política e do aparato de Estado, por vezes, tornam-se violentas. Isso ocorre quando, ao invés de se pautarem pela equidade e a observância universal das leis consensualmente estabelecidas, as relações se pautam pela dissimetria de poder. Determinadas pessoas tiram benefício privado a partir de recursos que deveriam ser, por definição, públicos. Esse modo de funcionamento privatista das instituições da sociedade torna-se um forte gerador de diversas formas de violência.

“O modo de funcionamento privatista das instituições da sociedade torna-se um forte gerador de diversas formas de violência”

 

5. Como se manifesta a violência institucional no Brasil?

Diferentemente das formas de violência direta, existem outras que não se configuram como um fato ou evento remissíveis a um ou mais agressores que causem um dano claramente definido a outra pessoa ou a outras pessoas. Nesse caso, embora não se possa isolar e identificar claramente o agressor, persiste a agressão ainda que perceptível somente de forma indireta. Não se trata de um evento isolado, mas de um processo que acaba gerando dano a um segmento social, mesmo que, eventualmente, não se possa discernir explicitamente a intenção de produzir tal dano.

Apesar de ser mais difícil caracterizá-la, a violência no Brasil está relacionada a modelos de organização e a práticas sociais que alcançam um nível institucional e sistemático de produção e perpetuação de modos de vida violentos. Não é, portanto, apenas nas interações cotidianas que a violência transparece. Ela permeia também as instituições sociais. De fato, historicamente, o próprio Estado brasileiro age, através dos séculos, de modo a reiterar situações geradoras de violência, sobretudo no que tange à desigualdade e à exclusão.

Exemplificando a correlação entre violência e contexto social, econômico e político, vários estudos associam o aumento da violência letal – ou seja, a violência que gera morte – ocorrido na década de 1980, com a crise socioeconômica vivida naquele período. O processo inflacionário e a consequente corrosão dos salários implicaram perda de rendimentos principalmente para os mais pobres. Como resultado, aumentou expressivamente a desigualdade social.

Não se trata de uma relação linear de causa e efeito. O incremento da violência é determinado por múltiplos fatores, dificilmente redutíveis a uma causalidade única. Entretanto, não há como ignorar a influência do contexto socioeconômico na geração da violência.

“A violência no Brasil está relacionada a modelos de organização e a práticas sociais que alcançam um nível institucional e sistemático”

 

6. Como a questão da violência vem sendo enfrentada no âmbito das políticas públicas e práticas governamentais e da legislação brasileiras? Há alguma luz no fim do túnel?

A sociabilidade violenta é uma construção. Faz-se de escolhas políticas que a cada dia se renovam. Cada escolha ou decisão política em favor da manutenção da atual (des)ordem das relações contribui para a perpetuação do modelo. Em razão disso, parece coerente afirmar que o possível enfrentamento da violência depende intrinsecamente das relações políticas.

Entendem-se, com o termo “política”, as negociações que se estabelecem para que pessoas – com interesses tão numerosos e, por vezes, antagônicos – possam dividir pacificamente um mesmo espaço. Nesse sentido, pode-se dizer que não há solução para a violência fora das discussões que ocorrem no âmbito da política. Por outro lado, esse raciocínio conduz a reconhecer que cabe às decisões políticas uma parcela na responsabilidade pela perpetuação de estruturas geradoras de violência no Brasil.

Existem hoje, no Congresso Nacional, parlamentares identificados com segmentos econômicos e sociais fortemente interessados em propostas potencialmente geradoras de violência. Defendem o uso de armas de fogo pela população civil, sustentando tratar-se de um direito natural o da autopreservação. Tramitam propostas de alteração do “Estatuto do desarmamento”, não obstante o fato de este haver representado um importante passo na redução do número de mortes por arma de fogo. Há várias propostas de recrudescimento da legislação penal e de ampliação da ação discricionária das polícias, do Ministério Público e do Judiciário.

No entanto, para além deste aspecto mais visivelmente ligado à questão da segurança pública, existem inúmeras outras questões, estreitamente ligadas a interesses econômicos, que são hoje debatidas no Legislativo, não obstante o potencial motivador de mais violência de tais medidas. Destacam-se as propostas que dificultam ou impedem a reforma agrária, a demarcação de terras indígenas e outros povos tradicionais; as que restringem a legislação ambiental; e as que facilitam a liberação do uso de agrotóxicos. Nessas e em diversas outras medidas prevalece o interesse do ganho econômico para pequenos grupos, em detrimento do benefício de toda a população.

Quando praticada de modo a transformar o acúmulo de riquezas num fim em si mesmo ao invés de assegurar a dignidade das vidas humanas, a política gera violência. Produzindo exclusão e desigualdade social, tal forma de se fazer política faz da lei do mais forte a regra e pessoas tornam-se descartáveis.

O Papa Francisco tem se colocado firmemente contra essa cultura do descartável, “criada pelas potências que controlam as políticas econômicas e financeiras do mundo globalizado”. Em um discurso para a Associação de Movimentos Cooperativos Italianos, em fevereiro de 2015, ele ressaltou o “crescimento vertiginoso do desemprego” e os problemas que os sistemas de assistência social existentes tiveram para atender às necessidades da saúde pública. Para aqueles que vivem “nas margens existenciais” o sistema atual político e social “parece estar fatalmente destinado a sufocar a esperança e aumentar os riscos e ameaças”, afirmou o Pontífice.

O Papa tem frequentemente criticado a economia de mercado ortodoxa por estimular a injustiça e a desigualdade. Tem denunciado o fato de as pessoas serem forçadas a trabalhar longas horas, às vezes na economia paralela, em troca de um salário mensal ínfimo, porque elas são vistas como facilmente substituíveis. Segundo Francisco, quando o dinheiro se torna um ídolo, ele comanda as escolhas.

“Existem hoje, no Congresso Nacional, parlamentares identificados com segmentos fortemente interessados em propostas potencialmente geradoras de violência”

 

7. Há experiências de práticas sociais que apontam para o caminho da superação da violência?

Na busca pela paz, muito frequentemente, há uma ênfase ao combate à violência direta que, se eliminada, promoveria a paz. Disso resulta uma concepção entendida por alguns estudiosos como uma paz negativa (que, per si, pode inclusive ocultar injustiças que, muitas vezes, geram novos conflitos). Destaca-se aqui, portanto, a importância do enfrentamento não somente da violência direta, mas das violências estruturais e culturais, em busca de uma paz positiva e sustentável.

Por certo, a paz não será alcançada pela mera obediência e submissão a normas, pelo medo das sanções a determinados comportamentos coletivamente rechaçados, ou pela segregação de pessoas e grupos.  Há que construir uma sociedade que, pautada na justiça, deseje a paz.

Assim, reconhecendo que a paz não se caracteriza apenas pela ausência de conflito — condição inerente à vida humana em sociedade — a concepção de “cultura de paz” está aqui entendida no sentido do “cultivo da paz”, portanto, não como algo dado, mas resultado de ações e processos multidimensionais, individuais e coletivos, claramente intencionados a produzir modos de ser e de viver que tenham a paz como valor coletivo e horizonte a ser alcançado. Em outras palavras, trata-se de construir estilos de vida voltados para a promoção da paz.

O enfrentamento de diferentes formas de violência requer o agenciamento de estratégias distintas, porém concertadas. E o entendimento de que a paz é possível e desejada deve andar pari passu com a disseminação e concretização de ações que resultem na abolição de todas as situações que a impedem.

Assim sendo, a construção da paz submete-se a diversos condicionantes, somente se podendo realizar na ação de muitos atores sociais — individuais e coletivos—, via micro e macro práticas democráticas que promovam o fortalecimento do Estado de Direito, a promoção dos direitos humanos, a participação e o controle sociais.

Portanto, o desenvolvimento de uma cultura de paz implica a ampla ação institucional, sobretudo no que tange ao Estado — e tem-se aí o papel importantíssimo dos governos e o envolvimento das instituições jurídicas — e, paralela e igualmente importante, a ação da sociedade civil, dos grupos e dos indivíduos, de modo a que instaure uma radical mudança nas relações sociais e políticas.

Em outras palavras, a construção de uma Cultura de Paz está intimamente relacionada à promoção da democracia e ao fortalecimento das instituições democráticas; ao desenvolvimento econômico e social sustentável, com garantia da participação de todos; à erradicação da pobreza e das desigualdades; à eliminação de toda forma de discriminação; ao respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais; à promoção da tolerância, da diversidade e da solidariedade.

 

Fonte:

www.arquidiocesebh.org.br

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A voz profética da Igreja levanta-se contra as anti-reformas em curso https://observatoriodaevangelizacao.com/a-voz-profetica-da-igreja-levanta-se-contra-as-reformas/ Fri, 05 May 2017 10:00:07 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=17321 [Leia mais...]]]> A voz profética da Igreja levanta-se contra as reformas

A estratégia de mobilização que articulou os movimentos sindicais, sociais e eclesiais para a greve geral realizada no último dia 28 de abril foi exitosa. Mais de 35 milhões de trabalhadores cruzaram os braços e as ruas de centenas de cidades foram tomadas pelos trabalhadores.

Destaque especial seja dado à participação de lideranças da Igreja Católica – instituição que tem um dos maiores índices de credibilidade entre a população brasileira. Mais de 100 bispos, cerca de 1/3 do episcopado na ativa, apoiaram publicamente a greve. Desde a ditadura não acontecia uma mobilização dessas proporções pelo alto clero da Igreja do Brasil.

Se as manifestações havidas até então foram marcadas pela articulação e participação de movimentos sindicais e sociais, o salto qualitativo e quantitativo da greve geral certamente deve ser atribuído a participação contundente de movimentos eclesiais, conclamados pelas lideranças cristãs, especialmente os bispos católicos, como também de outras igrejas cristãs, religiões ou organizações de religiosos/as.

Dois dias antes da megaparalisação, o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Leonardo Steiner, disse hoje:

“O Brasil vive um momento particular de sua história, uma crise ética. Há situações de enorme complexidade nos quais estão envolvidos personagens do cenário político, sem falar da crise econômica que atinge a todos. Como encaminhar mudanças sem o respaldo da sociedade? Propostas de reformas que tocam na Constituição Federal, no sistema previdenciário, na CLT merecem estudo, pesquisa e aprofundamento. Sem diálogo não é possível criar um clima favorável que vise o bem do povo brasileiro.”

No dia da greve, em entrevista ao vivo à Rede Aparecida (uma das maiores emissoras católicas do país, transmitindo com exclusividade a 55ª Assembleia Geral da CNBB, que ocorre no Santuário Nacional), o bispo-auxiliar de Belo Horizonte e reitor da PUC Minas conclamava:

“Vivemos um tempo de democracia participativa. Que aqueles que foram eleitos para concretizar a democracia representativa sejam sábios para escutar o clamor dos cidadãos. Nunca tivemos um momento como este com tanta convergência para um pensamento totalmente contrário ao que está sendo proposto pelo governo. Só há um caminho para o povo brasileiro: sair para as ruas e dizer que não está satisfeito, que não quer este caminho que está sendo imposto pelo governo.”

A greve geral é um instrumento a ser praticado em momentos específicos da conjuntura sociopolítica, quando há condições objetivas de adesão massiva dos trabalhadores e, simultaneamente, a possibilidade de se gerar um poderoso movimento de transformação; no caso, visando à superação de um golpe que levou ao poder uma coalizão que atenta contra os direitos dos trabalhadores, aposentados, grupos vulneráveis.

Mesmo com o desdém, a mentira, a manipulação e o terrorismo implantado pela mídia e seus comentaristas na véspera e durante todo o dia 28, a paralisação foi o maior movimento reivindicatório do operariado brasileiro e ganhou destaque na imprensa internacional.

Há momentos na história de um povo e de uma Nação que os cidadãos e as instituições democráticas, populares e eclesiais são colocados à prova. Nesses momentos há que se dar um salto qualitativo.

Como escreveu o filósofo Vladimir Safatle, para os que tentam se legitimar contra o povo

“a greve geral foi criada. Ela é a mais legítima de todas as manifestações políticas, pois, no seu cerne, está a recusa em se deixar desaparecer. Ela é a maneira profunda que o povo tem de dizer: ‘Nós existimos’. Nós existimos como sujeitos, como os verdadeiros soberanos.”

Numa democracia não é possível um governo sem povo; sem o mínimo de respeito aos verdadeiros soberanos.

É insustentável que um grupo político atolado na corrupção e sem compromisso com o povo e Nação – refém do capitalismo rentista e subjugado pelos chantagistas do sistema judicial-midiático – continue usurpando o poder para se locupletar e agradar seus financiadores do setor econômico.

É absurdo, que clama aos céus por justiça, um governo que, com 4% de aprovação popular, rasga a Constituição Cidadã e a substitui por uma constituição anticidadã.

É insuportável que a pauta política seja dominada e imposta não pelos interesses populares, mas por uma mídia apodrecida no desvario da desinformação e da manipulação; serviçal dos rentistas e algoz do povo.

Não se pode aceitar mais que empresas de comunicação que operam como concessão pública – com obrigação constitucional de informar e não manipular -, continuem a impor sua agenda nefasta em detrimento dos interesses de uma Nação.

A violência operada pelos projetos políticos do governo golpista e seus sócios, concretizada nas medidas antipopulares e antinacionais em curso, nos desafiam à construção de novos caminhos, de forma ousada e revolucionária.

Que o clamor que vem do episcopado brasileiro (reunido em Aparecida na 55ª Assembleia anual da CNBB), através da mensagem de 1º de maio para os trabalhadores, consolide, com clareza, a postura profética da Igreja Católica em defesa da vida humana, da dignidade do trabalhador e do direito de todos sentarem à mesa da cidadania. Em profunda sintonia ética sociopolítica, outras igrejas e religiões, instituições e ONGs igualmente defendam critérios fundamentais e irrenunciáveis que sejam expressam da dignidade de cada pessoa humana e promovam coletivamente  uma autêntica revolução cidadã em nosso país. Aquela mesma revolução expressa pela boca de Jesus de Nazaré: “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10, 10).

Prof. Robson Sávio Reis Souza

Membro da Equipe Executiva do Observatório da Evangelização

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