O Natal como sacramento da regeneração – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Mon, 16 Dec 2019 10:00:00 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 O Natal como sacramento da regeneração – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 O Natal como sacramento da regeneração (2ª parte) https://observatoriodaevangelizacao.com/o-natal-como-sacramento-da-regeneracao-2a-parte/ Mon, 16 Dec 2019 10:00:00 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=33818 [Leia mais...]]]> Se Santo Agostinho chama o Natal de “aniversário” – conforme vimos no primeiro artigo desta série, ainda que com um sentido mais profundo e um significado mais abrangente do que o habitual, São Leão Magno vai muito além. Não são poucos os sermões de sua autoria que trazem consigo elementos-fonte para os textos eucológicos do tempo do Natal, sobretudo pela marcante teologia presente nos libbeli do Sacramentário Veronense, também chamado de Leonino.

Para este Papa, cujo pontificado se deu entre 440 e 461, a celebração da Natividade do Senhor passa muito distante da lembrança de uma data. É verdadeiro sacramento, pelo qual “o círculo do ano faz-nos outra vez presente (reparatur, isto é re+apresentação) o mistério (sacramentum) da nossa salvação.” Ou seja, Leão Magno compreende que, pelas vias da ritualidade litúrgica, os fiéis podem participar do nascimento de Cristo, uma vez que foram “admitidos” neste evento. A alegria e o prazer de celebrar o Natal se funda no fato de, pelo “nascimento de nosso Senhor Jesus Cristo, pelo qual Ele Se vestiu da carne da nossa natureza” se explica em razão de “nos tornarmos consortes da natureza divina”.

A Liturgia, portanto, dá acesso ao acontecimento. É porta de ingresso no mistério. Não é apenas um ensino sobre ele, mas a condição de nossa participação nele, afinal “o que era visível em nosso Salvador passou para seus mistérios”, segundo o mesmo Papa Leão (CIC 115). Por esta razão terá muita importância para Ele o advérbio “hoje”.

“Hoje o Verbo de Deus apareceu vestido de carne… Hoje, os pastores souberam pelas palavras dos Anjos que o Salvador tinha nascido… Hoje, aos que estão à frente dos rebanhos do Senhor foi entregue nova forma de mensagem (…) A festa de hoje renova para nós o sagrado início da vida de Jesus, nascido da Virgem Maria. E enquanto adoramos o nascimento do nosso Salvador, celebramos também o nosso nascimento. Efetivamente, a geração de Cristo é a origem do povo cristão: o Natal da cabeça é também o Natal do Corpo.”

Deste modo, continua noutro lugar, “o Natal do Senhor, em que o “Verbo se fez carne”, não tanto o havemos de lembrar como acontecimento do passado, mas antes imaginá-lo como se o vissem agora nossos olhos.” E como o veem senão pela condicionalidade da mesma carne assumida pelo Verbo, cujos ritos litúrgicos são verdadeira extensão? Aliás é exatamente isto que afirma o Catecismo da Igreja Católica ao tratar da Economia Sacramental presente na Igreja: que pelos gestos (ritualidade) e palavras (Sagrada Escritura e eucologia) o mesmo Cristo age no hoje dos fiéis (cf. CIC 1088). A lógica é simples: se Deus nos alcançou na carne, abrançando e assumindo nossa humanidade para comunicar o Deus, é pela mesma carne que este mistério pascal “permanece  e atrai tudo para a vida”.

A eucologia das missas do Natal do Senhor nos apresentam com nitidez esta compreensão:

“Concedei, ó Deus, que sejamos renovados, ao celebrarmos o Natal de vosso Filho, que se faz alimento e bebida neste divino mistério.” (Oração depois da comunhão na Missa da Vigília)

“Acolhei, ó Deus, a oferenda da festa de hoje, na qual o céu e a terra trocam seus dons, e dai-nos participar da divindade daquele que uniu a vós a nossa humanidade.” (Oração sobre as oferendas, Missa da Noite)

“Nós vos pedimos, ó Deus, que estas oferendas realizem em nós o mistério do Natal.” (Oração sobre as oferendas da Missa da Aurora)

“Ó Deus que, admiravelmente criastes o ser humano e mais admiravelmente restabelecestes a sua dignidade, dai-nos participara da divindade do vosso Filho, que se dignou assumir a nossa humanidade.” (Oração do Dia da Missa do Dia)

Conclui-se, pois, que a celebração do Natal do Senhor deve nos orientar na participação de um acontecimento e não, simplesmente, nos referir a uma data perdida no passado e que o caminho para isso passa por assumir os ritos como porta de acesso ao mundo do Deus-Conosco.

Sobre o autor:

Pe. Márcio Pimentel

Padre Márcio Pimentel é especialista em Liturgia pela PUC-SP e mestrando
em Teologia na Faculdade Jesuíta de Teologia e Filosofia (Faje / Capes)
Pároco da paróquia São Sebastião e São Vicente

Fonte:

www.arquidiocesebh.org.br/opiniao-e-noticias/

]]>
33818
O Natal como sacramento da regeneração (1ª parte) https://observatoriodaevangelizacao.com/o-natal-como-sacramento-da-regeneracao/ Sun, 08 Dec 2019 23:27:42 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=33731 [Leia mais...]]]> Seria necessário aqui relembrar que o Natal do Senhor não é mera comemoração de seu aniversário? É verdade que Santo Agostinho fala, ao menos por duas vezes, do “aniversário do Natal de nosso Salvador.” Entretanto, o tom de seu discurso a respeito dessa solenidade exige pensarmos sobre as consequências do acontecimento rememorado. Ele afirma que o dia do Natal é santificado pelo evento celebrado. Em um sermão, ainda sobre o Natal, ele afirma:

O Evangelho não diz: ‘a carne se fez Palavra’, mas: ‘a Palavra se fez carne’. (…) Aquele que era Filho de Deus, para nascer da Virgem Maria fez-Se filho do homem, assumindo a forma de servo. Continuou a ser o que era e assumiu o que não era. Nasceu do Pai, sem dia temporal, nasceu da mãe no dia de hoje (…). O Dia que marca o início do crescimento dos dias é símbolo da obra de Cristo, pelo qual o nosso homem interior se renova dia após dia…

Nota-se, com clareza, que a questão é posta em relação ao significado desse acontecimento que, embora datável no passado, ao ser lembrado no presente da comunidade celebrante, lhe concede lugar de honra diante de Deus e do mundo. O Natal do Senhor é ocasião para Agostinho afirmar que esse dia é santificado pelo evento comemorado:

santificador do dia de hoje, desde o seio da mãe…; inefavelmente sábio e sabiamente mudo; enche o mundo e jaz num presépio; governa os astros e toma o peito materno; tão grande na forma de Deus como pequeno na forma de servo…

Para o bispo de Hipona, portanto, o “dia de hoje leva-nos ao dia eterno”. Este dia é o próprio Jesus Cristo, pois Ele “ao nascer da Virgem, tornou sagrado o dia de hoje.” Cristo é celebrado no Natal como o amanhecer de Deus para o mundo, segundo a teopoética, diríamos, de Agostinho. A Natividade do Senhor faz-se, então, festa da Luz, porque o Sol nascente vence a noite e assim, a humanidade inteira pode alegrar-se pelo raiar do Dia Eterno.

Como a liturgia realiza o mistério do Natal?

Seguindo essa compreensão de sabor agostiniano, vale a pena verificar como a Liturgia realiza, no corpo dos fiéis em festa, essa teologia. 

Pensemos no tempo do Advento, durante o qual se agregou, à pratica celebrativa de inúmeras comunidades do mundo inteiro, o costume de acendermos a Coroa do Advento. A progressão da luz, pedagogicamente inculcada no acender gradual da primeira à quarta vela, alude a este processo longe do raiar do Sol desde o tempo da promessa até a ocasião do cumprimento.

A Coroa do Advento sinaliza simbolicamente para os fiéis aquilo que o Primeiro e o Segundo Testamentos testemunham: que a única Luz, o Filho, raiz e razão do tempo, irrompeu na história humana desde época remotas até o momento crucial de sua manifestação plena na encarnação.

Antônio Alcade cita em seu “Canto e Música Liturgica” (Paulinas: 1998, p.107) uma breve poesia para o acendimento da Coroa que diz:

“Vigilantes acendemos /

a coroa do Advento. /

Nos círios oferecemos /

quatro etapas de um encontro.”

Sim, trata-se de um único encontro: Deus com a humanidade, o Dia Eterno com o Tempo, o Céu com a Terra, o Espírito desposando a carne. É isto que celebramos no Natal, cujo Advento nos orienta os sentidos.

Sobre o autor:

Pe. Márcio Pimentel

Padre Márcio Pimentel é especialista em Liturgia pela PUC-SP e mestrando
em Teologia na Faculdade Jesuíta de Teologia e Filosofia (Faje / Capes)
Pároco da paróquia São Sebastião e São Vicente

Fonte:

www.arquidiocesebh.org.br/opiniao-e-noticias/

]]>
33731