Marcos Sassatelli – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Wed, 04 Sep 2019 12:59:50 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Marcos Sassatelli – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 Nesses tempos de recepção criativa das DGAE 2019-2023, às vésperas do Sínodo da Amazônia, a crítica profética de Frei Marcos Sassatelli: https://observatoriodaevangelizacao.com/nesses-tempos-de-recepcao-criativa-das-dgae-2019-2013-as-vesperas-do-sinodo-da-amazonia-a-critica-profetica-de-frei-marcos-sassatelli/ Wed, 04 Sep 2019 12:59:50 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=31389 [Leia mais...]]]> Ainda em tempo de corrigir os rumos, preencher lacunas e, sobretudo, incluir no horizonte aberto ao Espírito Santo, que fecunda com seus dons a nossa criatividade pastoral, e levar em conta na concretização da ação evangelizadora que procura responder aos desafios e urgências de nosso tempo, Frei Marcos Sassatelli, verdadeiro guardião da memória profética da práxis libertadora de Jesus e da caminhada da Igreja dos pobres, nos alerta:

“Mesmo fazendo – em linguagem atualizada – valiosas reflexões teóricas (como orientações gerais) sobre os desafios do mundo e do Brasil de hoje (a questão da cultura urbana, do meio ambiente, da missionariedade das Comunidades Eclesiais e outras), as Diretrizes revelam de maneira muito clara que, na caminhada pastoral da Igreja no Brasil, está em andamento – embora com muitas resistências – um processo de volta ao modelo de Igreja pré-conciliar. Um retrocesso lamentável!

Confira o texto publicado pelo IHU:

Omissões que falam por si

Numa leitura atenta das “Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil” (DGAE 2019-2023) da CNBB – aprovadas em 6 de maio passado na 57ª Assembleia Geral (Aparecida – SP, 1-10/05/19) – notam-se imediatamente algumas “omissões” graves que falam por si.

Mesmo fazendo – em linguagem atualizada – valiosas reflexões teóricas (como orientações gerais) sobre os desafios do mundo e do Brasil de hoje (a questão da cultura urbana, do meio ambiente, da missionariedade das Comunidades Eclesiais e outras), as Diretrizes revelam de maneira muito clara que, na caminhada pastoral da Igreja no Brasil, está em andamento – embora com muitas resistências – um processo de volta ao modelo de Igreja pré-conciliar. Um retrocesso lamentável!

1ª omissão grave nas DGAE: o “esquecimento” do de Medellín

A primeira omissão é o “esquecimento” do Documento (composto por 16 Mini – Documentos) da II Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e Caribenho de Medellín – 1968 (A Igreja na atual transformação da América Latina e do Caribe, à luz do Concílio Vaticano II). Nas Diretrizes não há uma referência sequer a esse Documento. Consequentemente, nem é citado na “Lista das Siglas” dos Documentos da Igreja universal e latino-americana utilizados na elaboração das Diretrizes.

Em 2018 comemoramos os 50 anos do Documento de Medellín. Infelizmente, notou-se na Igreja – com raras exceções – uma indiferença muito grande em relação a essa data jubilar. Em maio deste ano (2019), a “homenagem” que a CNBB – na elaboração das Diretrizes – prestou ao Documento de Medellín foi o seu “esquecimento”. A Assembleia Geral da CNBB poderia ter sido uma oportunidade para – oficialmente – fazer a memória do jubileu desse Documento e retomar seus principais ensinamentos, destacando sua atualidade.

O Documento de Medellín é a aplicação do Concílio Vaticano II, ou melhor, é o próprio Concílio Vaticano II para a América Latina e o Caribe. Como muito bem disse Clodovis Boff, é o Documento fundante da Igreja Latino-Americana e Caribenha enquanto tal. Até então, a Igreja Latino-Americana e Caribenha era a Igreja Europeiatransplantada na América Latina e no Caribe. Os participantes da Conferência de Medellín podem ser considerados os Padres da Igreja Latino-Americana e Caribenha.

O Documento de Puebla – 1979 (Evangelização no presente e no futuro da América Latina e Caribe), o Documento de Santo Domingo – 1992 (Nova Evangelização, Promoção Humana e Cultura Cristã) e o Documento de Aparecida – 2007 (Discípulos missionários de Jesus Cristo para que nossos povos Nele tenham vida) só podem ser lidos (analisados e interpretados) à luz do Documento de Medellín e em “continuidade criativa” com ele.

2ª omissão grave nas DGAE: o “desaparecimento” das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs)

A segunda omissão é o “desaparecimento” das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) do texto das Diretrizes (não da vida, graças a Deus). A palavra CEBs encontra-se somente duas vezes, de passagem e sem nenhuma relevância: uma, quando as Diretrizes afirmam que, “recordando o 14º Intereclesial das CEBs, somos convidados a olhar com alegria e esperança todas as iniciativas que se voltam para as cidades, buscando compreender seu jeito de pensar, sentir e agir” (68); outra, quando dizem que “o empenho por constituir Comunidades Cristãs maduras na fé, deve ser a meta das dioceses, paróquias, CEBs, comunidades novas, movimentos, associações, serviços e famílias” (128).

Que diferença entre as Diretrizes e o Documento de Medellín! No Documento de Medellín, a CEB é “o primeiro e fundamental núcleo eclesial” ou “a célula inicial da estrutura eclesial” (Medellín, XV, 10) e a Paróquia, “um conjunto pastoral unificador das Comunidades de Base” (Ib. 13). As CEBs – na diversidade e beleza de seus “rostos” – são o jeito de ser Igreja que Jesus de Nazaré sonhou, quis e quer. A expressão “de Base” foi acrescentada para nos lembrar que as Comunidades Eclesiais devem (como Jesus de Nazaré) ser “encarnadas” na vida do povo.

As Diretrizes – como é dito na Introdução – “estão estruturadas a partir da Comunidade Eclesial Missionária, apresentada com a imagem da ‘casa’, ‘construção de Deus’ (1Cor 3,9)” (4). Elas, porém, esquecem de dizer que a primeira “casa” de Jesus foi a “manjedoura” de um estábulo. “Não havia lugar para eles na hospedaria (dentro de casa)” (Lc 2,6). Esquecem também de dizer que a Comunidade Eclesial – como Comunidade de seguidores e seguidoras de Jesus – tem lado: o lado dos Pobres, oprimidos, excluídos e descartados. “Quem diz que permanece em Deus, deve caminhar como Jesus caminhou” (1Jo 2,6).

Por ter lado, a Comunidade Eclesial – embora esteja aberta à participação de todos e de todas que praticam a partilha – se constrói a partir dos Pobres (“desde a manjedoura”). É por isso que ela é “de Base”. Se não for “de Base”, não é Comunidade Eclesial e – menos ainda – Comunidade Eclesial Missionária (“em saída”). Existe algo que seja mais “de Base” que a “manjedoura” de um estábulo? Essa é a verdade que, com todas al letras, precisa ser dita e, infelizmente, as Diretrizes não dizem.

3ª omissão grave das DGAE: a falta de escuta dos sinais dos tempos na ótica dos pobres

A terceira omissão (que é a causa principal das outras duas omissões) é a “falta” da escuta dos sinais dos tempos desde os pobres, ou seja, a partir (na ótica) dos empobrecidos, oprimidos, excluídos e descartados da sociedade e do mundo. Essa escuta deveria ser (mas, infelizmente, não é) a espinha dorsal das Diretrizes.

Para escutar os sinais dos tempos não basta apontar ou fazer breves referências à realidade – conjuntural e estrutural – atual (como fazem as Diretrizes), mas é necessário analisar profundamente essa realidade (com a mediação das ciências humanas e sociais), interpretá-la criticamente (discernir) à luz da razão iluminada pela fé na Palavra de Deus (com a mediação da filosofia e teologia) e libertá-la de tudo aquilo que impede a vida do ser humano e do mundo (da Mãe Terra).

Por fim – para renovar a nossa esperança e nos fortalecer como cristãos e cristãs – é necessário celebrar a realidade (analisada e interpretada) no Mistério Pascal de Cristo e o Mistério Pascal de Cristo na realidade.

Sigamos com alegria o caminho que Jesus fez: desde a manjedoura até sua morte na cruz e sua ressurreição! Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida!

Sobre o autor:

Frei Marcos Sassatelli é frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção – SP) e professor aposentado de Filosofia da UFG

Fonte:

IHU

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“A fraternidade humana em prol da paz mundial e da convivência comum” – 4ª parte https://observatoriodaevangelizacao.com/a-fraternidade-humana-em-prol-da-paz-mundial-e-da-convivencia-comum-4a-parte/ Mon, 20 May 2019 19:31:26 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=30561 [Leia mais...]]]> O Documento do Grão Imame e do Papa sublinha a importância do papel das religiões na construção da paz mundial, escreve Marcos Sassatelli, frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção – SP) e professor aposentado de Filosofia da UFG.

Pedimos a todos que cessem de instrumentalizar as religiões para incitar ao ódio, à violência, ao extremismo e ao fanatismo cego e deixem de usar o nome de Deus para justificar atos de homicídio, de exílio, de terrorismo e de opressão. Pedimo-lo pela nossa fé comum em Deus, que não criou os seres humanos para serem assassinados ou lutarem uns com os outros, nem para serem torturados ou humilhados na sua vida e na sua existência Deus, o Todo-Poderoso, não precisa de ser defendido por ninguém e não quer que o Seu nome seja usado para aterrorizar as pessoas“.

Eis a quarta parte do artigo: 

No Documento “A fraternidade humana em prol da paz mundial e da convivência comum”, o Grão Imame e o Papa destacam também o papel da família no mundo de hoje. “É evidente quão essencial seja a família, como núcleo fundamental da sociedade e da humanidade, para dar à luz filhos, criá-los, educá-los, proporcionar-lhes uma moral sólida e a proteção familiar. Atacar a instituição familiar, desprezando-a ou duvidando da importância de seu papel, constitui um dos males mais perigosos do nosso tempo”.

Destacam ainda, como fator positivo, o despertar do sentido religioso: “Atestamos a importância do despertar do sentido religioso e da necessidade de o reanimar nos corações das novas gerações, através duma educação sadia e da adesão aos valores morais e aos justos ensinamentos religiosos, para enfrentarem as tendências individualistas, egoístas, conflituosas, o sectarismo e o extremismo cego em todas as suas formas e manifestações”.

Lembram o objetivo das religiões: “O primeiro e mais importante objetivo das religiões é o de crer em Deus, honrá-Lo e chamar todos os seres humanos a acreditarem que este universo depende de um Deus que o governa: é o Criador que nos moldou com a Sua Sabedoria divina e nos concedeu o dom da vida para o guardarmos. Um dom que ninguém tem o direito de tirar, ameaçar ou manipular a seu bel-prazer; pelo contrário, todos devem preservar este dom da vida desde o seu início até à sua morte natural”.

Por isso, declaram: “Condenamos todas as práticas que ameaçam a vida, como os genocídios, os atos terroristas, os deslocamentos forçados, o tráfico de órgãos humanos, o aborto e a eutanásia e as políticas que apoiam tudo isto”.

E continuam: “De igual modo declaramos – firmemente – que as religiões nunca incitam à guerra e não solicitam sentimentos de ódio, hostilidade, extremismo nem convidam à violência ou ao derramamento de sangue. Estas calamidades são fruto de desvio dos ensinamentos religiosos, do uso político das religiões e também das interpretações de grupos de pessoas de religião que abusaram – em algumas fases da história – da influência do sentimento religioso sobre os corações dos seres humanos para os levar à realização daquilo que não tem nada a ver com a verdade da religião, para alcançar fins políticos e econômicos mundanos e míopes”.

Fazem, pois, um apelo para que as religiões não sejam instrumentalizadas para justificar e legitimar atos violentos: “Pedimos a todos que cessem de instrumentalizar as religiões para incitar ao ódio, à violência, ao extremismo e ao fanatismo cego e deixem de usar o nome de Deus para justificar atos de homicídio, de exílio, de terrorismo e de opressão. Pedimo-lo pela nossa fé comum em Deus, que não criou os seres humanos para serem assassinados ou lutarem uns com os outros, nem para serem torturados ou humilhados na sua vida e na sua existência”.

Com efeito, “Deus, o Todo-Poderoso, não precisa de ser defendido por ninguém e não quer que o Seu nome seja usado para aterrorizar as pessoas”.

Por fim, o Documento do Grão Imame e do Papa – de acordo com o ensinamento dos Documentos Internacionais anteriores – sublinha “importância do papel das religiões na construção da paz mundial” e atesta: “A forte convicção de que os verdadeiros ensinamentos das religiões convidam a permanecer ancorados aos valores da paz; apoiar os valores do conhecimento mútuo, da fraternidade humana e da convivência comum; restabelecer a sabedoria, a justiça e a caridade e despertar o sentido da religiosidade entre os jovens, para defender as novas gerações a partir do domínio do pensamento materialista, do perigo das políticas da avidez do lucro desmesurado e da indiferença baseadas na lei da força e não na força da lei”. Diante dessas colocações, não dá para ficar indiferentes! Lutemos!

Sobre o autor

Sobre o autor:

Marcos Sassatelli, frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção – SP) e professor aposentado de Filosofia da UFG

Fonte:

IHU

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“A fraternidade humana em prol da paz mundial e da convivência comum” – 2ª Parte https://observatoriodaevangelizacao.com/a-fraternidade-humana-em-prol-da-paz-mundial-e-da-convivencia-comum-2a-parte/ Thu, 16 May 2019 19:40:27 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=30525 [Leia mais...]]]> No Documento “A Fraternidade Humana em prol da Paz Mundial e da convivência comum”, o Grão Imame de Al-AzharAhmad Al-Tayyeb (com os muçulmanos do Oriente e do Ocidente) e o Papa Francisco (com os católicos do Oriente e do Ocidente) afirmam: “Declaramos adotar a cultura do diálogo como caminho; a colaboração comum como conduta; o conhecimento mútuo como método e critério”. Reparem: cultura do diálogo, colaboração comum e conhecimento mútuo.

Tudo isso, em nome:

“- de Deus, que criou todos os seres humanos iguais nos direitos, nos deveres e na dignidade e os chamou a conviver entre si como irmãos, a povoar a terra e a espalhar sobre ela os valores do bem, da caridade e da paz;

– da vida humana inocente que Deus proibiu de matar, afirmando que qualquer um que mate uma pessoa é como se tivesse matado toda a humanidade e quem quer que salve uma pessoa é como se tivesse salvo toda a humanidade;

– dos pobres, dos miseráveis, dos necessitados e dos marginalizados, a quem Deus ordenou socorrer como um dever exigido a todos os seres humanos e de modo particular às pessoas que dispõem de mais recursos;

– dos órfãos, das viúvas, dos refugiados e dos exilados das suas casas e dos seus países; de todas as vítimas das guerras, das perseguições e das injustiças; dos fracos, de quantos vivem no medo, dos prisioneiros de guerra e dos torturados em qualquer parte do mundo, sem distinção alguma;

– dos povos que perderam a segurança, a paz e a convivência comum, tornando-se vítimas das destruições, das ruínas e das guerras;

– da ‘fraternidade humana’, que abraça todos os seres humanos, une-os e torna-os iguais;

– desta fraternidade dilacerada pelas políticas de integralismo e divisão e pelos sistemas de lucro desmesurado e pelas tendências ideológicas odiosas, que manipulam as ações e os destinos dos seres humanos;

– da liberdade, que Deus deu a todos os seres humanos, criando-os livres e enobrecendo-os com ela;

– da justiça e da misericórdia, fundamentos do progresso e pilares da fé;

– de todas as pessoas de boa vontade, presentes em todos os cantos da terra”.

Essas palavras nos questionam, nos obrigam a refletir e nos levam a fazer novas opções de vida, com atitudes e ações concretas. (Continua na 3ª parte)

Em tempo: Uma memória que não podemos deixar de fazer. No dia 16 de fevereiro de 2005, 14 mil pessoas foram brutalmente despejadas (em 1 hora e 45 minutos) da Ocupação Sonho Real, em Goiânia (GO), através da Operação Criminosa “Triunfo”(precedida – por 10 noites – da Operação Criminosa “Inquietação”) da Polícia Militar, que – entre outras barbáries – provocou o assassinato de Pedro e Vagner. No dia 16 deste mês completaram 14 anos de impunidade! A data – por lembrar uma história de crueldade e iniquidade diabólicas, e para que não se repitam fatos como esse – é comemorada mundialmente e encontra-se registrada todo ano no “Livro-Agenda Latino-americana Mundial”.

O Papa Francisco lembra que o “direito ao teto” (moradia) – e os “direitos à terra e ao trabalho” – são direitos fundamentais de toda pessoa humana. “Direitos Humanos não se pede de joelhos, exige-se de pé” (Dom Tomás Balduino). Queremos justiça!

Sobre o autor:

Marcos Sassatelli, frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção – SP) e professor aposentado de Filosofia da UFG

Fonte:

IHU

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“A fraternidade humana em prol da paz mundial e da convivência comum” – 1ª Parte https://observatoriodaevangelizacao.com/a-fraternidade-humana-em-prol-da-paz-mundial-e-da-convivencia-comum-1a-parte/ Tue, 14 May 2019 10:00:38 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=30513 [Leia mais...]]]> Para Marcos Sassatelli, frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção – SP) e professor aposentado de Filosofia da UFG, o Documento “é um passo de grande importância no diálogo entre cristãos e muçulmanos e um poderoso sinal de paz e esperança para o futuro da humanidade”.

Francisco e Al-Tayyib “indicaram juntos um caminho de paz e reconciliação no qual todos os homens de boa vontade podem caminhar, não apenas cristãos e muçulmanos”.

No dia 4 de fevereiro de 2019, o Papa Francisco (em viagem apostólica aos Emirados Árabes Unidos: 3-5/02/19) e o Grão-Imame de Al-Azhar Ahmed Al-Tayyeb assinaram conjuntamente – no final do Encontro Inter-religioso em Abu Dhabi – o Documento sobre “A Fraternidade Humana em prol da Paz Mundial e da convivência comum”.

É um Documento “corajoso e profético, porque enfrenta, chamando-os pelo nome, os temas mais urgentes do nosso tempo. Temas sobre os quais quem acredita em Deus é exortado a questionar a própria consciência e a assumir com confiança e decisão sua responsabilidade de dar vida a um mundo mais justo e solidário”.

É também “um apelo vibrante a responder o mal com o bem, a fortalecer o diálogo inter-religioso e a promover o respeito mútuo para bloquear o caminho daqueles que sopram no fogo do conflito de civilizações”.

O Papa e o Grão-Imame, “com palavras inequívocas, advertem que ninguém está autorizado a instrumentalizar o nome de Deus para justificar a guerra, o terrorismo e qualquer outra forma de violência. Reafirmam que a vida deve sempre ser preservada (reparem: sempre ser preservada) como devem ser plenamente reconhecidos os direitos das mulheres, rejeitando qualquer prática discriminatória contra elas”.

E ainda: “Diante de uma humanidade ferida por tantas divisões e fanatismos ideológicos, mostram que promover a cultura do encontro não é uma utopia, mas a condição necessária para viver em paz e deixar às gerações futuras um mundo melhor do que aquele em que vivemos”. 

No Prefácio do Documento, Francisco e Al-Tayyib nos transmitem uma mensagem tão bonita, que – se vivida – revoluciona todos os critérios da convivência humano-ambiental.

Afirmam: “A fé leva o crente a ver no outro um irmão que se deve apoiar e amar. Da fé em Deus, que criou o universo, as criaturas e todos os seres humanos – iguais pela Sua Misericórdia -, o crente é chamado a expressar esta fraternidade humana, salvaguardando a criação e todo o universo e apoiando todas as pessoas, especialmente as mais necessitadas e pobres”.

O Papa e o Grão-Imame continuam fazendo memória da realidade na qual vivemos: “Partindo deste valor transcendente, em vários encontros dominados por uma atmosfera de fraternidade e amizade, compartilhamos as alegrias, as tristezas e os problemas do mundo contemporâneo, a nível do progresso científico e técnico, das conquistas terapêuticas, da era digital, dos mass-media, das comunicações; a nível da pobreza, das guerras e das aflições de tantos irmãos e irmãs em diferentes partes do mundo, por causa da corrida às armas, das injustiças sociais, da corrupção, das desigualdades, da degradação moral, do terrorismo, da discriminação, do extremismo e de muitos outros motivos”.

Com otimismo, concluem: “De tais fraternas e sinceras acareações que tivemos e do encontro cheio de esperança num futuro luminoso para todos os seres humanos, nasceu a ideia deste ‘Documento sobre a Fraternidade Humana’. Um Documento pensado com sinceridade e seriedade para ser uma declaração conjunta de boas e leais vontades, capaz de convidar todas as pessoas, que trazem no coração a fé em Deus e a fé na fraternidade humana, a unir-se e trabalhar em conjunto, de modo que tal Documento se torne para as novas gerações um guia rumo à cultura do respeito mútuo, na compreensão da grande graça divina que torna irmãos todos os seres humanos”. (Fonte: Santa Sé).

Ouçamos agora o conselho do Papa Francisco:

“Em Abu Dhabi foi dado um passo a mais: eu e o Grão-Imame de Al-Azhar Ahmedassinamos o ‘Documento sobre a Fraternidade Humana’, no qual afirmamos juntos a comum vocação de todos os homens e mulheres de ser irmãos enquanto filhos e filhas de Deus; condenamos toda forma de violência (reparem mais uma vez: toda forma de violência), especialmente a violência revestida de motivações religiosas, e nos comprometemos na difusão dos valores autênticos e da paz no mundo. Este Documento – acrescentou – será estudado nas escolas e nas universidades de muitos países, mas eu também aconselho que vocês o leiam, o conheçam, porque traz muitos impulsos para avançar no diálogo sobre a fraternidade humana”.

Ao invés de pensarmos nas civilizações cristã e islâmica e nas religiões como fontes de conflitos, “quisemos dar – esclarece o Papa – um sinal a mais, claro e decidido, de que, ao contrário, é possível se encontrar, é possível se respeitar e dialogar, e de que, inclusive na diversidade das culturas e das tradições, o mundo cristão e o mundo islâmico apreciam e guardam valores comuns: a vida, a família, o sentimento religioso, a honra aos anciãos, a educação dos jovens, e outros mais” (Audiência Geral, 6 de fevereiro: um dia após retornar dos Emirados Árabes Unidos).

Enfim, o Documento é hoje a estrela que guiou os Reis Magos até Belém. Ah, se os que têm um serviço público no Legislativo (políticos), no Judiciário (juízes) e no Executivo (governantes) – e todos e todas nós – seguíssemos o caminho que o Documento aponta! O Brasil e o mundo mudariam completamente. Lutemos, com fé e esperança, para que isso aconteça!

Sobre o autor:

Marcos Sassatelli, frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção – SP) e professor aposentado de Filosofia da UFG

Fonte:

IHU

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