Luis Miguel Modino – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Wed, 01 Jun 2022 00:00:00 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.3 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Luis Miguel Modino – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 “A Amazônia não ficou esquecida do Papa”, afirma Dom Leonardo após nomeação cardinalícia https://observatoriodaevangelizacao.com/a-amazonia-nao-ficou-esquecida-do-papa-afirma-dom-leonardo-apos-nomeacao-cardinalicia/ Wed, 01 Jun 2022 00:00:00 +0000 https://atomic-temporary-74025290.wpcomstaging.com/?p=45114 [Leia mais...]]]> Luis Miguel Modino traz o relato de uma entrevista com Dom Leonardo Steiner, indicado para o Colégio de Cardeais. No domingo 29 de maio, a Igreja foi surpreendida com a convocação de um novo consistório, onde o Papa Francisco nomeou mais 21 cardeais, 16 deles eleitores, menores de 80 anos. Também foi uma surpresa para os próprios eleitos, dentre eles Dom Leonardo Ulrich Steiner, Arcebispo Metropolitano de Manaus.

O Papa está olhando para as periferias

Em encontro com a imprensa local, o novo purpurado afirmou que na manhã do domingo foi surpreendido, dado que o Papa Francisco não acostuma comunicar nada antes. Dom Leonardo afirmou ter ficado meio incrédulo num primeiro momento, dado a falta de um comunicado oficial.

Segundo o Arcebispo de Manaus, “é uma alegria para todos nós da Amazônia”, insistindo em que “a nomeação minha não diz apenas ao respeito da minha pessoa”. Ele ressaltou como “o Papa Francisco tem um carinho especial pela Amazônia e pelas igrejas que estão na Amazônia”, lembrando o fato dele ter tido a delicadeza de ligar no tempo da pandemia. Agora com essa nomeação, “mostra mais uma vez o quanto ele está próximo das nossas igrejas, está próximo da nossa região”, destacou Dom Leonardo Steiner, insistindo em que “é por isso que nós nos alegramos”.

O fato de ser cardeal, é visto pelo novo purpurado como “uma responsabilidade que se assume na Igreja”, destacando que “o mais importante que eu vejo na reação dos bispos e de tantas pessoas que entraram em contato, é a alegria de ter um cardeal na Amazônia, que a Amazônia não ficou esquecida do Papa”. Se referindo à nomeação do novo cardeal na Mongólia, uma Igreja onde não chega a dois mil católicos, Dom Leonardo afirmou que “o Papa está olhando para as periferias, o Papa está olhando para onde a Igreja pode ser muito viva, uma Igreja que pode ir construindo a sua história, como a nossa Igreja da Amazônia tem construído a sua história”.

Que nossas Igrejas que realmente assumam o Sínodo

O Arcebispo de Manaus diz se alegrar “de poder participar agora mais intensamente da construção dessa Igreja que deseja ser uma Igreja cada vez mais missionária, cada vez mais presente e uma Igreja cada vez mais viva”. Dom Leonardo também agradeceu as manifestações de carinho, de proximidade, de alegria, pedindo que rezem por ele, “para que eu possa exercer esse verdadeiro ministério junto do Papa com boa disposição e ajudando assim a Igreja a se tornar cada vez mais presente e tornar visível o Reino de Deus, Jesus Ressuscitado”.

Diante das perguntas dos jornalistas, o novo cardeal foi explicando o que representa a missão dos cardeais na Igreja, também os detalhes do consistório que acontecerá em Roma no dia 27 de agosto. Dom Leonardo afirmou que no seu trabalho cotidiano, “o título não muda nada, só um pouquinho mais de trabalho”, lembrando também da visita ad limina dos bispos do Regional Norte1, junto com o Regional Noroeste, que acontecerá no mês de junho.

Dom Leonardo Steiner afirmou que duas pessoas tinham lhe falado que sua nomeação é um fruto do Sínodo, lembrando o processo do Sínodo para a Amazônia e do atual Sínodo da Sinodalidade. Diante disso, ele disse que “talvez o Papa esteja pedindo das nossas Igrejas que realmente assumam o Sínodo, especialmente Querida Amazônia e o Documento Final”. Nesse sentido insistiu em que “os bispos da Amazônia estão muito dispostos a isso”, destacando mais uma vez que “as manifestações de afeto colegial e de alegria foram muitas da parte dos bispos. Eu penso que nós todos estamos muito dispostos a ajudar o Santo Padre a sermos uma Igreja muito missionária, especialmente uma Igreja Sinodal”.

Uma Igreja profundamente encarnada e inculturada

Em relação com seu papel e nova responsabilidade dentro da Igreja da Amazônia, Dom Leonardo afirmou que “talvez a responsabilidade seja de animação”, ressaltando que “as igrejas nossas, católicas, na Amazônia são muito ativas”. Em referência ao Documento de Santarém, que está completando 50 anos, um fato que será comemorado de 6 a 9 de junho com um encontro dos Bispos, no mesmo local do acontecido 50 anos atrás, Dom Leonardo disse ver esse Documento como algo decisivo, vendo o Sínodo para a Amazônia como um dos frutos do Documento de Santarém.

Em relação com esse Documento, “que parte de duas premissas, que é a encarnação e a libertação, são duas premissas fundamentais para que a Igreja seja realmente a Igreja que é na Amazônia”. Segundo o Arcebispo de Manaus, “é claro que com o Sínodo teremos que dar muitos outros passos, levar ainda uma participação maior dos leigos, que já é muito expressiva, mas também uma Igreja que sabe escutar mais e fazer os leigos participarem dos momentos de decisão”.

Celebrar 50 anos de Santarém representa um compromisso dos bispos com Santarém, com o Vaticano II e com o Sínodo, esperando dar sua contribuição para que “se torne uma Igreja muito viva, uma Igreja das pequenas comunidades, uma Igreja das comunidades eclesiais de base, uma Igreja profundamente encarnada, uma Igreja profundamente inculturada, uma Igreja que possa realmente ouvir os povos indígenas e achar as suas expressões também celebrativas, as suas expressões teológicas, de reflexão e de oração”, algo que exige um esforço, um cuidado, um bom ânimo de continuarmos a nossa caminhada.

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Pe. Luis Miguel Modino
Natural da Espanha, é missionário Fidei Donum na Diocese de São Miguel da Cachoeira, Amazonas. É parceiro do Observatório da Evangelização e articulista em diversos periódicos e revistas virtuais católicas.

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Encontros Eclesiais Regionais: “Identificar como os desafios estão chegando ao coração do continente” https://observatoriodaevangelizacao.com/encontros-eclesiais-regionais-identificar-como-os-desafios-estao-chegando-ao-coracao-do-continente/ Sat, 21 May 2022 21:30:00 +0000 https://atomic-temporary-74025290.wpcomstaging.com/?p=45041 [Leia mais...]]]> A Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe é algo que continua, e como mais um passo nessa caminhada, durante esta semana estão acontecendo os encontros virtuais eclesiais por regiões, um para cada uma das quatro grandes regiões nas quais o CELAM está dividido. Acompanhe o relato deste evento por Luis Miguel Modino.

O primeiro encontro reuniu aqueles que vivem sua fé na Região CAMEX, que inclui o México e a América Central. O objetivo era ser uma oportunidade para continuar aprofundando todos os desafios que a Assembleia Eclesial nos deixou. Mais um passo após a Assembleia Eclesial de novembro de 2021 e o Encontro Eclesial de março passado, como destacou Paola Calderón, do Centro para a Comunicação do CELAM, e o Secretário Geral Adjunto da entidade, Padre David Jasso, que vê neste momento uma oportunidade “de poder identificar como os desafios estão chegando ao coração do continente”.

Compartilhando experiências, trocando conceitos, levantando preocupações, e fazendo isso no contexto da celebração do 15º aniversário de Aparecida, comemorado na semana passada na casa da Padroeira do Brasil, onde o CELAM esteve presente, mas também no caminho para o Sínodo sobre a Sinodalidade.

“Reviver essa experiência de caminho em comum”

É assim que vê Dom Jorge Eduardo Lozano esses encontros, onde “estão presentes diferentes vocações do povo de Deus, também de diferentes realidades eclesiais, culturais e sociais”, destacou o Secretário Geral do CELAM. Ele também recordou a presença daqueles que “se dedicam à catequese, aqueles que se dedicam à missão, ao cuidado dos doentes, à pregação da Palavra, a cada um dos ministérios e serviços de nossa Igreja”.

Dom Jorge Lozano lembrou a Assembleia Eclesial realizada em novembro, que “nos levou a um discernimento sobre os novos desafios que temos como Igreja no continente”, vendo o encontro deste dia como um momento para “retomarmos juntos o caminho, para compartilharmos juntos também a alegria da fé”.

Após um momento de oração, inspirado em Aparecida, quando nos fala da vida, a nova vida da Páscoa, foi retomado o que foi vivido há 15 anos em Aparecida, que fez um chamado a assumir o fato de sermos discípulos missionários, e foram apresentados alguns dos objetos utilizados na V Conferência, assim como imagens daquele importante evento eclesial. Entre estas imagens, algumas em que o Cardeal Bergoglio disse que “Aparecida termina com um grande empurrão que nos envia em missão”.

Para renascer e fazer crescer a esperança

Susana Nuin, que fez parte da equipe de comunicação da V Conferência CELAM, destacou a importância dos diferentes pontos de vista presentes nesta equipe, afirmando que “um bom processo, bem vivido, é capaz de superar as fissuras”. A comunicação em Aparecida possibilitou que os bispos participantes obtivessem feedback do que a imprensa publicou. Ela também destacou o impacto positivo que Aparecida teve sobre a mídia, tanto secular quanto eclesial, com muitas repercussões de comunicação no retorno dos bispos às suas respectivas dioceses.

Um dos bispos participantes de Aparecida foi Dom Ángel Garachana, que começou seu testemunho dizendo que “fui a Aparecida preparado, participei com empenho e voltei entusiasmado”. O bispo de São Pedro Sula (Honduras) destacou três aspectos da V Conferência CELAM: um evento eclesial intensamente vivido; um documento que nos convida a superar rotinas, o desencanto, faz renascer e crescer a esperança; uma realização, uma colocação em prática, que continua a dar ímpeto à ação evangelizadora da Igreja. Por esta razão, ele insistiu que “Aparecida continua a nos inspirar, motivar e orientar”.

A partir do Centro de Pesquisa do Conhecimento, seu diretor Guillermo Sandoval refletiu sobre o que Aparecida, passando pela experiência da Assembleia Eclesial, nos mostra hoje. Depois de explicar o trabalho que este centro realiza, ele insistiu que “Aparecida tem sido uma contribuição da Igreja latino-americana para a Igreja universal”.

“Pelo batismo somos todos discípulos missionários”

Do ponto de vista teológico pastoral, o teólogo brasileiro Agenor Brighenti lembrou elementos de Aparecida que poderiam ajudar na reflexão dos grupos de diálogo. Ele começou lembrando a importância da Assembleia Eclesial, que “a pedido do Papa Francisco propôs reviver Aparecida”. É por isso que ele chamou 15 anos depois para ver até que ponto sua proposta desafiadora está encarnada nos processos pastorais e “se Aparecida pode continuar sendo um caminho e uma bússola para nossa Igreja”.

O Padre Brighenti destacou sete aspectos de Aparecida, convidando os participantes do encontro a questionar até que ponto eles estão presentes na vida das Igrejas locais do continente e quais ainda estão pendentes. Em primeiro lugar, ele falou do fundo e do espírito, destacando como uma grande contribuição de Aparecida “ter resgatado a contribuição do Concílio Vaticano II e a recepção criativa em nosso continente”, algo que é retomado no Documento, fazendo referência a algumas situações que o tornaram difícil, como o clericalismo.

Um segundo elemento a destacar é que “pelo batismo somos todos discípulos missionários”, vendo o discipulado como um chamado a seguir Jesus Cristo em sua Igreja, algo importante diante do crescimento dos cristãos sem inserção nas comunidades eclesiais. Em terceiro lugar, ele refletiu sobre o estado permanente de missão da Igreja, insistindo na missão como algo próprio de ser cristão e de comunidades eclesiais. Para realizar esta missão é necessária a conversão pastoral, em atitudes e estruturas eclesiais, algo que ele considera o quarto elemento a ser destacado, resgatando uma proposta de Santo Domingo, que é central para o pontificado do Papa Francisco.

“Um centro poderoso de irradiação do Reino da Vida”

O quinto aspecto a destacar é que “cada comunidade eclesial precisa ser um centro poderoso de irradiação do Reino da Vida”, segundo o membro da Equipe Teológica do CELAM, que vê essa irradiação como algo que aponta para uma Igreja em saída, superando uma Igreja autorreferencial, buscando a encarnação como base da evangelização, que leva à humanização. Junto com isto, uma Igreja samaritana e profética, defensora dos pobres, sexto ponto a destacar, uma Igreja que deve sempre defender os pobres, porque “a opção pelos pobres está implícita na fé cristológica”, como disse o Papa Bento XVI.

Finalmente, o sétimo aspecto é a promoção de um itinerário de discipulado missionário, que é realizado em quatro etapas: experiência pessoal de fé, vida comunitária, formação teológico-bíblica, compromisso missionário da comunidade como um todo. Estes são aspectos que em grande parte já estão presentes 15 anos depois, mas ainda há muito a ser feito, de acordo com o Padre Brighenti.

No diálogo em grupo, os participantes compartilharam como os frutos da Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe foram recebidos em cada um dos países. Para isso, discutiram se os desafios pastorais eram conhecidos, se houve encontros ou análises aprofundadas, se os desafios correspondiam às realidades nacionais vividas em cada país e os testemunhos ou histórias a serem contadas a respeito da experiência da Assembleia Eclesial. Também as dificuldades em relação à recepção ou assimilação dos frutos e como eles têm sido capazes de enfrentá-los.

Caminhar juntos, em sinodalidade

Depois de trabalhar em grupos, os participantes compartilharam o que haviam experimentado nesta reunião, destacando alguns dos aspectos sobre os quais haviam refletido e a importância disso para caminharem juntos em sinodalidade. Um processo vivido em comunidade a partir das diferentes realidades, que gera otimismo para continuar contribuindo para a missão evangelizadora, vivido como um processo, que ajudou a refletir sobre questões importantes para a vida da Igreja continental e universal, o que é de grande importância na fase de consulta do processo sinodal.

A Assembleia Eclesial tem sido um processo que tem dado força e esperança, mas é necessário avançar na concretização dos desafios da Assembleia, na articulação dos diversos processos que a Igreja está vivendo, na criação de pontes entre a Assembleia Eclesial e o Sínodo, insistindo na importância da comunicação nesta caminhada. É uma caminhada do povo de Deus, que está gerando algo que levará tempo para ser digerido, pois necessita de uma mudança de atitudes que possibilite uma maior participação dos jovens, mulheres e leigos.

Para este fim, foram solicitadas ações concretas em nível pastoral para ajudar a avançar o processo de sinodalidade, assumindo os desafios da Assembleia a partir desta forma de ser sinodal. É nisso que o CELAM está tentando avançar com um plano de ação a ser realizado nos próximos meses, para o qual estão sendo criados recursos para ajudar a avançar neste caminho, como prova de que o trabalho continua, de que não se pode permitir que a chama se apague, algo que depende de cada um e de todos.

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Pe. Luis Miguel Modino
Natural da Espanha, é missionário Fidei Donum na Diocese de São Miguel da Cachoeira, Amazonas. É parceiro do Observatório da Evangelização e articulista em diversos periódicos e revistas virtuais católicas.

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“Concretizar a sinodalidade do processo como metodologia eclesial” – Dom Cláudio Hummes https://observatoriodaevangelizacao.com/concretizar-a-sinodalidade-do-processo-como-metodologia-eclesial-dom-claudio-hummes/ Tue, 18 Jan 2022 00:30:58 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=43305 [Leia mais...]]]> “Procuremos desenvolver o espírito e a prática sinodais” nas comunidades. O presidente da CEAMA enfatiza a urgência de treinar futuros pastores indígenas ordenados e incentiva os bispos a avançar no caminho da inculturação da fé. O cardeal Hummes também assinalou outras necessidades, tais como a criação de uma Universidade Católica Pan-Amazônica, insistindo no apoio do CELAM e da REPAM.”

Retomar e implementar as tarefas da CEAMA para 2022, “em favor da missão da Igreja na nossa querida Panamazônia”. Este foi o objetivo da mensagem em vídeo lançada pelo Cardeal Claudio Hummes, presidente da entidade.

Em um caminho legitimado e iluminado pelo Sínodo para a Amazônia e seus documentos norteadores, assim como pela criação e reconhecimento canônico da CEAMA, o cardeal brasileiro chama a “caminhar juntos, respeitando as nossas legítimas diferenças, e mantendo-nos em rede entre nós e em comunhão jubilosa e real com nosso querido Papa Francisco”.

Para o presidente da CEAMA, a sinodalidade deve ser a metodologia eclesial, na qual todos participam, procurando ser uma “Igreja em saída”, que “derruba os muros e constrói pontes para chegar e escutar a todos, com prioridade aos pobres”, insistindo em alcançar os povos indígenas e com eles buscar os avanços necessários.

O Cardeal Hummes chamou a ” socializar o que cada comunidade está fazendo e inspirar as demais em seu próprio trabalho”, lembrando a necessidade de “elaborar e pôr em prática um Plano de Pastoral de Conjunto”, algo que já está sendo feito e que “quer tornar real uma pastoral missionária de uma Igreja que visa não somente as comunidades e pessoas humanas, mas toda a criação, a natureza, numa ecologia integral”.

Dom Cláudio também fez um chamado a assumir a preservação do meio ambiente e que “procuremos desenvolver o espírito e a prática sinodais” nas comunidades. O presidente da CEAMA enfatiza a urgência de treinar futuros pastores indígenas ordenados e incentiva os bispos a avançar no caminho da inculturação da fé. O cardeal Hummes também assinalou outras necessidades, tais como a criação de uma Universidade Católica Pan-Amazônica, insistindo no apoio do CELAM e da REPAM.

Finalmente, Dom Cláudio enfatizou a importância do trabalho diário nas comunidades locais, insistindo que “é ali que se deve escutar as bases e com elas elaborar e realizar concretamente o básico do que nos pede todo este processo sinodal”.

Por Luis Miguel Modino – Regional Norte 1

MENSAGEM DO PRESIDENTE DA CEAMA PARA INÍCIO DE 2022

Caros amigos e amigas, irmãos e irmãs, quem lhes fala aqui é Dom Cláudio Hummes, atual presidente da Conferência Eclesial da Amazônia, a CEAMA. Permitam-me dirigir-lhes a seguinte mensagem neste início de ano. Terminadas as comemorações natalinas e da passagem do ano, importa retomar e implementar, na luz do Espírito Santo, as nossas tarefas de CEAMA para o transcurso do ano de 2022 em favor da missão da Igreja na nossa querida Panamazônia.

O Sínodo para a Amazônia e seus documentos orientadores, bem como a criação e o reconhecimento canônico da CEAMA, legitimam e iluminam o nosso caminho. Este caminho deverá ser um “caminhar juntos”, respeitando as nossas legítimas diferenças, e mantendo-nos em rede entre nós e em comunhão jubilosa e real com nosso querido Papa Francisco.
No “caminhar juntos” importa concretizar a sinodalidade do processo, como metodologia “eclesial”, isto é, em que participam na qualidade de sujeitos não apenas os pastores, mas também as demais categorias do Povo de Deus, ou seja, consagrados e leigos, com suas múltiplas formas de se organizarem.

Já disse numa mensagem anterior que, neste sentido de realizar o sínodo, já se está fazendo muita coisa nas comunidades locais, sejam da população sejam da Igreja. A presente mensagem quer animar a todos a continuar este trabalho e pedir que seus relatórios sejam levados a nossa rede de comunicação, através da secretaria executiva da CEAMA, que tem sua sede no CELAM, em Bogotá. Isso tornará possível socializar o que cada comunidade está fazendo e inspirar as demais em seu próprio trabalho.

Como eu disse acima, é preciso continuar corajosamente este nosso trabalho na Panamazônia, com alegria e muita oração. A bênção de Deus não nos faltará. Só para lembrar algumas dessas tarefas, cito especialmente aquela que Aparecida e depois o sínodo sublinharam, isto é, elaborar e pôr em prática um Plano de Pastoral de Conjunto. Estamos já fazendo isto, mas ainda não terminamos.

Dentro deste horizonte, recordemos que este plano de pastoral envolve e quer tornar real uma pastoral missionária de uma Igreja que visa não somente as comunidades e pessoas humanas, mas toda a criação, a natureza, numa ecologia integral, segundo as orientações do Papa Francisco, em que é importante, nessa ecologia integral, nessa pastoral, lutar também pela preservação do território, do Planeta, porque é obra de Deus e porque de sua saúde, da saúde do Planeta, depende nosso futuro.

Por isso, continuemos firmes na luta em favor da preservação das florestas, a luta contra a contaminação do ar, do solo e das águas dos rios, lagos e nascentes. A proteção das nascentes é fundamental. Vamos promover o reflorestamento, onde for o caso, e a descontaminação das águas, do solo e do ar. Sejamos também força de resistência, quando nossos governos devastam a natureza. Na população de nossas cidades situadas junto às florestas, vamos desenvolver a consciência de que a floresta não é obstáculo ao progresso; ao contrário, a floresta em pé pode produzir mais riquezas do que quando a abatemos.

Em todas as nossas comunidades procuremos desenvolver o espírito e a prática sinodais. Isso poderá ser até mesmo uma contribuição concreta e já em andamento para o próximo Sínodo Ordinário dos Bispos, de 2023, que o Papa convocou para refletir sobre a sinodalidade de toda a Igreja.

Outra tarefa urgente e fundamental é a formação de futuros pastores ordenados indígenas (bispos, padres, diáconos), bem como de ministros indígenas instituídos e catequistas. Os bispos de cada país panamazônico poderiam reunir-se para planejar sobre como realizar isto em seu país. Seria um passo decisivo para o processo de uma verdadeira inculturação da fé. Por que, quem melhor do que os próprios indígenas para inculturar a fé em suas culturas? Que serão processos de médio e longo prazo.

Outra tarefa ampla, complexa e que demandará seu devido tempo, é a criação de uma universidade católica panamazônica. Ela demandará da parte de Roma a criação de uma Fundação Pontifícia. Também pressupõe a formulação, a médio prazo, de um projeto inovador, elaborado com a ajuda de especialistas do setor, criativos e interessados. Este projeto de universidade está em andamento, sim, sendo levado avante por um comitê de promoção, mas precisa muito de nosso apoio e principalmente do apoio de nossas universidades católicas.

Contamos também com a colaboração das Agências Católicas Internacionais de Ajuda e com os setores universitários internacionais contatados pela REPAM quando a CEAMA ainda não existia.

Dentro de todo este processo precisamos do apoio e da colaboração do CELAM, que acaba de realizar uma bem sucedida Assembleia Eclesial da Igreja na América Latina e Caribe. A REPAM, por sua vez, certamente estará sempre conosco, lado a lado.

Contudo, volto a dizer que no dia a dia importa o trabalho nas comunidades locais. É ali que se deve escutar as bases e com elas elaborar e realizar concretamente o básico do que nos pede todo este processo sinodal.

Termino, agradecendo a Deus a sua bênção inspiradora e a todos os colaboradores a sua participação. E vamos em frente!

Cardeal Dom Cláudio Hummes, O.F.M.

Presidente da CEAMA

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Dom Edson Damian: Nas comunidades da Amazônia “o povo tem direito à Eucaristia” https://observatoriodaevangelizacao.com/dom-edson-damian-nas-comunidades-da-amazonia-o-povo-tem-direito-a-eucaristia/ Tue, 28 Sep 2021 11:12:40 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=41633 [Leia mais...]]]> Se faz necessário começar a colocar em prática as atividades muito concretas que surgem dos sonhos de Querida Amazônia, segundo dom Edson Damian. O presidente do Regional Norte 1 insiste em “levar em conta a interculturalidade”.

Dom Edson Damian, presidente do Regional Norte 1 da CNBB.

O Sínodo para a Amazônia pode ser considerado como um divisor de águas na vida da Igreja da Amazônia, inclusive na vida da Igreja universal. O grande desafio é levar para as igrejas particulares as propostas elaboradas, algo que foi dificultado pela pandemia, mas que aos poucos vai se tornando realidade. Estamos falando de uma Igreja sinodal, onde todos e todas são escutados, onde as pessoas se encantam pelo fato de que “a palavra de uma mulher indígena é escutada com o mesmo respeito e atenção do que a palavra de um bispo”, segundo ressaltou uma das participantes, no final da 48ª Assembleia do Regional Norte 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, que se realizou em Manaus de 20 a 22 de setembro de 2021.

Na tentativa de construir novos caminhos, os bispos e representantes das dioceses, prelazias e pastorais elaboraram as novas Diretrizes à luz das Diretrizes da CNBB Nacional e dos sonhos da Querida Amazônia. Tudo isso num processo sinodal, uma dinâmica do Regional, segundo o padre Zenildo Lima, membro da equipe de articulação da Assembleia.

48ª Assembleia do Regional Norte 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
48ª Assembleia do Regional Norte 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

Após recolher o material apresentado pelas bases, isso foi transformado num texto de proposta, para depois acolher as contribuições dos delegados presentes nessa Assembleia, segundo o reitor do Seminário São José, de Manaus. Ele ressalta que foram repercussões bastante profundas que foram refletidas em grupos de trabalho, trazendo de novo o chão das realidades locais.

O padre Zenildo Lima, auditor no Sínodo para a Amazônia, acha interessante “essa consciência desse sujeito que é a comunidade eclesial missionária, seja como sujeito, mas também como destinatário”. Ele destaca o fato de “ousar a inversão de uma metodologia missionária, que é aquela que o Sínodo trouxe para nós, de trazer a periferia para o centro”. “As comunidades periféricas no centro da ação missionária, da ação evangelizadora já é um grande sinal de presença, e uma presença sempre marcada por esse compromisso com a vida”, ressaltou.

Se faz necessário começar a colocar em prática as atividades muito concretas que surgem dos sonhos de Querida Amazônia, segundo dom Edson Damian. O presidente do Regional Norte 1 insiste em “levar em conta a interculturalidade”. Diante das muitas culturas na região, “a Igreja deve construir a unidade na diversidade, e para isso nós devemos criar espaços de diálogo, para respeitar as pessoas que são diferentes, para que se manifestem na sua espiritualidade, nos seus valores culturais”, segundo o bispo de São Gabriel da Cachoeira.  

48ª Assembleia do Regional Norte 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
48ª Assembleia do Regional Norte 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

Na sua diocese, o princípio que norteia a espiritualidade e a pastoral é: “a Boa Nova das culturas indígenas acolhe a Boa Nova de Jesus”. Segundo o bispo, “as sementes do Verbo chegaram antes dos missionários, e nós devemos ter a sensibilidade para descobrir esses valores que são humanos, profundamente cristãos, que os povos indígenas vivem até hoje: a vida comunitária, a partilha dos alimentos, o trabalho feito em comum”.

Dom Edson Damian fala também dos casamentos interétnicos, algo que aproxima uma cultura da outra, e facilita que os povos indígenas aprendem várias línguas na convivência uns com os outros. O presidente do Regional Norte 1 insiste na necessidade de “começar a traduzir, pelo menos os Evangelhos nas línguas dos povos indígenas”. Também em “colocar elementos da espiritualidade dos povos indígenas na nossa liturgia, na liturgia da Palavra, na liturgia Eucarística com muita mais liberdade”.

Outro elemento é “a valorização dos catequistas que estão nas comunidades indígenas e ribeirinhas, que devem ser acompanhados com uma formação bíblica e pastoral”, afirma o bispo. Segundo ele, “muitos deles devem ser ordenados diáconos casados, permanentes”. Na Assembleia se acentuou muito “que a Eucaristia é um elemento fundamental da nossa espiritualidade cristã”, insistindo em que mesmo valorizando a celebração da Palavra, “o povo tem direito à Eucaristia, que é elemento fundamental da nossa espiritualidade cristã”.

48ª Assembleia do Regional Norte 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
48ª Assembleia do Regional Norte 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

Falando do sonho ecológico vê fundamental “levar a Laudato si´ aos povos das nossas comunidades ribeirinhas”. Mesmo vivendo a ecologia e sendo os guardiões da natureza, é importante “descobrir o valor que tem a ecologia integral”. Junto com isso, no sonho social, falou da cidadania, da fé e política, de levar adiante escolas de formação, algo necessário “nesse momento de retrocesso que vive nosso país, de desmonte dos direitos que os povos indígenas e os pobres adquiriram com muita luta”.

Sobre o autor:

Luis Miguel Modino

Luis Miguel Modino – Padre diocesano de Madri, missionário fidei donum na Amazônia, residindo atualmente em Manaus – AM. Faz parte da Equipe de Comunicação da REPAM. Correspondente no Brasil de Religión Digital e colaborador do Observatório da Evangelização e em diferentes sites e revistas.

Fonte:

www.vaticannews.va

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Dom Leonardo abençoa o Barco Hospital São João XXIII: “Que seja presença misericordiosa de Deus no meio de nós” https://observatoriodaevangelizacao.com/dom-leonardo-abencoa-o-barco-hospital-sao-joao-xxiii-que-seja-presenca-misericordiosa-de-deus-no-meio-de-nos/ Thu, 01 Jul 2021 18:27:10 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=39906 [Leia mais...]]]>

Dom Leonardo Steiner, arcebispo de Manaus, abençoou nesta quinta-feira, 1º de julho de 2021, o Barco Hospital São João XXIII. Trata-se do terceiro barco hospital que vai percorrer os rios da Amazônia, após o Barco Hospital Papa Francisco, que desde 2019 atende à população do Estado do Pará e o Barco Hospital São João Paulo II, comprado em outubro de 2020 e que vai acompanhar as comunidades da Região do Baixo Amazonas.

O novo barco, um navio de 4 pisos, vai atender as comunidades do Rio Negro e do Rio Solimões, e, segundo dom Leonardo, “haverá de curar também os enfermos, mas não apenas os enfermos do corpo, mas também os enfermos no espírito, na alma”. O arcebispo de Manaus lembrou que “Jesus sempre que cura alguém diz os teus pecados são perdoados, ele quer curar a pessoa por inteira”.

O arcebispo insistiu que esse barco hospital seja essa presença misericordiosa de Deus no meio de nós, em Jesus, e que cada enfermo, cada enferma que entrar nesse barco hospital seja recebido como se recebêssemos Jesus, e cuidemos de Jesus nesses nossos irmãos e irmãs”.

A celebração de benção contou com a presença de dom Edmilson Tadeu Canavarros dos Santos, bispo auxiliar de Manaus e vice-presidente do Regional Norte 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e dom Bernardo Johannes Bahlmann, bispo de Óbidos e presidente do Regional Norte 2 da CNBB, onde trabalham os outros dois barcos hospitais.

Junto com eles se fez presente Jorsinei Dourado do Nascimento, procurador do Ministério Público do Trabalho do Estado do Amazonas, uma das entidades parceiras. Segundo ele, “o projeto do Barco Hospital São João XXIII faz parte de um trabalho também do Ministério Público do Trabalho, na medida em que foram investidos valores de processos judiciais em que o Ministério Público atuou e que empresas foram condenadas. Esses recursos devem ser investidos obrigatoriamente em projetos que beneficiam à sociedade amazonense”.

Segundo o procurador, os recursos “estão sendo canalizados para esse projeto do barco, que tem uma finalidade social clara e evidente, na medida em que entregará, quando ele estiver completamente pronto para operar nas comunidades ribeirinhas, um serviço de saúde pública, e que vai atingir as pessoas que mais necessitam, que são as comunidades ribeirinhas e as comunidades indígenas”.

Jorsenei Dourado do Nascimento, insiste nessa dificuldade da população dessas comunidades “seja por questão logística, seja por questão de costume, até mesmo da precariedade do serviço de saúde no interior, as pessoas não conseguem ter acesso, e passarão a ter com o barco hospital”.

Também participaram do evento os frades da Associação Lar de São Francisco da Providência de Deus, que administram os barcos hospitais Papa Francisco e São João Paulo II. O novo barco hospital, que depois de um trabalho de reabilitação e adaptação tem previsto começar os trabalhos médicos no início de 2022, vai atender a população, desde o serviço mais básico até serviços mais complexos, como cirurgias. Com o novo barco, essas pessoas irão ser atendidas em suas comunidades por profissionais de saúde.

Sobre o autor:

Luis Miguel Modino

Luis Miguel Modino – Padre diocesano de Madri, missionário fidei donum na Amazônia, residindo atualmente em Manaus – AM. Faz parte da Equipe de Comunicação da REPAM. Correspondente no Brasil de Religión Digital e colaborador do Observatório da Evangelização e em diferentes sites e revistas.

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Sinodalidade: um processo construído aos poucos na América Latina https://observatoriodaevangelizacao.com/sinodalidade-um-processo-construido-aos-poucos-na-america-latina/ Thu, 10 Jun 2021 18:27:41 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=39727 [Leia mais...]]]> Todos sabíamos que o próximo Sínodo dos Bispos abordaria o tema da sinodalidade, o que muitos não imaginavam é a forma como o papa Francisco decidiu realizá-la, com uma metodologia sem precedentes, pelo menos em instâncias do Vaticano, mas isso não surpreende aqueles que vivem a sua fé na América Latina.

A sinodalidade não é uma invenção de Francisco, um homem de processos, é algo intrínseco à vida da Igreja, que nasceu naquela primeira comunidade de seguidores e seguidoras de Jesus onde houve a coragem de se sentar, ouvir uns aos outros, discernir e encontrar o caminho a seguir, algo nem sempre fácil para uma Igreja perseguida, onde ser cristão era muitas vezes pago com martírio e sempre com perseguição e exclusão social.

Esta Igreja que escuta, que está interessada no que está acontecendo no mundo, na vida de homens e mulheres de cada momento histórico, foi retomada no Concílio Vaticano II. Assim, uma das Constituições que pode ser considerada fundamental no último Concílio, a que trata da Igreja no mundo de hoje, começa por dizer:

“As alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo”.

Gaudium et spes, n. 01

As palavras de Gaudium et spes, como todas as contidas nos documentos do Concílio, não ficaram por ouvir na América Latina, que pouco depois se reuniu em Medellín para encontrar uma forma de concretizar no continente as decisões do Concílio. O método de ver (ouvir), julgar (iluminar) e agir foi assumido como o caminho a seguir, estabelecendo assim elementos de uma sinodalidade que, sem ser explicitada em terminologia, foi vivida na prática, na vida das comunidades que fizeram da caminhada sinodal uma realidade, onde, sem a presença constante do clero, as decisões eram tomadas em conjunto, também pelas mulheres, porque as mulheres tiveram sempre um papel decisivo na vida destas comunidades, elas eram ouvidas no processo de tomada de decisões.

Não podemos negar que esta forma de ser Igreja, sinodal, pouco a pouco se desvaneceu e permaneceu em segundo plano. A retomada pode ser datada em Aparecida, um documento construído sobre o batismo, onde é feito um apelo para ser discípulos missionários, uma condição própria de todos os batizados. As ideias de Aparecida foram inundando a vida da Igreja latino-americana, para mais tarde inundar a vida da Igreja universal.

Em 2012, teve lugar o Sínodo sobre a Nova Evangelização para a Transmissão da Fé Cristã, no qual muitos dos bispos latino-americanos levaram as ideias de Aparecida, o que pouco a pouco despertou questões nos outros padres sinodais. Destas reflexões surgirá a exortação pós-sinodal Evangelii Gaudium, já escrita pelo papa Francisco, o relator geral de Aparecida, na qual muitos veem refletidas as reflexões da V Conferência Geral do Episcopado Latino-americano, incluindo as que foram postas de lado no Documento final aprovado pelo Vaticano.

Estamos em 2013, e agora, com a chegada do Papa latino-americano, o Papa do fim do mundo, como ele próprio disse nas suas primeiras palavras na sede papal, a dinâmica eclesial está tomado novos rumos. É um Papa que insiste em escutar e que mostra que tem o interesse e o tempo para ouvir, para estar no meio do povo. Nunca esquecerei a procissão no início do Sínodo para a Amazônia, desde o interior da Basílica de São Pedro até à Sala do Sínodo. Ali Francisco estava, no meio do povo, sorrindo, feliz. Se um estranho chegasse, só saberia que era o Papa porque estava vestido de branco, mas ele era apenas mais um.

Esse sínodo pode ser visto como um ensaio geral para o processo de renovação eclesial que começou há mais de 50 anos. A maioria dos que entraram na sala sinodal sabia o que estava a ser construído, pois muitos tinham participado de um amplo processo de escuta que tinha escrutinado cada canto da Amazônia, descobrindo assim “as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje”, como nos disse Gaudium et spes e Aparecida retoma. E não só isso, ali estavam, no meio dos bispos e cardeais, os indígenas e as mulheres, a quem o Papa ouvia com especial atenção sempre que falavam na sala sinodal e nos encontros informais durante os intervalos, nas quais ele continuava ouvindo, como sempre faz.

Esta dinâmica de sinodalidade, de escuta como elemento indispensável para um bom discernimento, tem vindo a enraizar-se na vida da Igreja. Mais uma vez, foi no continente latino-americano onde foi dado mais um passo. Tem sido com a Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe, como anteriormente com a Conferência Eclesial da Amazônia, experiências sem precedentes, decorrentes do discernimento do primeiro Papa jesuíta, filho do mestre do discernimento.

Francisco não quer elites nem ideologias na Igreja, ele quer ouvir e dialogar com parrésia para encontrar juntos o caminho a seguir. Estamos perante uma Igreja em que todos falam e ouvem, com base na categoria teológica do Povo de Deus. Ouvir as pessoas, mesmo aquelas que sempre estiveram em baixo ou nas margens, já não é algo opcional ou feito para o bem da galeria. É interessante ver como os povos indígenas dizem que no Documento Final do Sínodo e na Querida Amazônia veem o que disseram ao longo do processo de escuta do Sínodo para a Amazônia.

A Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe adoptou uma metodologia semelhante à do Sínodo para a Amazônia, algo que foi transferido para a Igreja universal. A Secretaria do Sínodo dos Bispos assumiu esta dinâmica para o próximo Sínodo, que tem como tema “Por uma Igreja Sinodal: comunhão, participação e missão”. Quer partir das igrejas particulares, da base, da escuta de todos, sem quaisquer escrúpulos ou restrições. “Um na escuta dos outros, e todos na escuta do Espírito Santo”, a fim de superar qualquer “tentação de uniformidade”, procurando “a unidade na pluralidade”.

A grande reforma está em curso, uma reforma que durará no tempo, porque não é algo que vem da mente iluminada de alguém, é a voz do Povo de Deus, e isso é algo sagrado. Todos serão ouvidos e todos terão de ouvir. Estamos perante um novo tempo, não o tempo da democracia, mas o tempo da sinodalidade, onde a totalidade dos batizados são protagonistas, têm uma palavra a dizer.

Sobre o autor:

Luis Miguel Modino

Luis Miguel Modino – Padre diocesano de Madri, missionário fidei donum na Amazônia, residindo atualmente em Manaus – AM. Faz parte da Equipe de Comunicação da REPAM. Correspondente no Brasil de Religión Digital e colaborador do Observatório da Evangelização e em diferentes sites e revistas.

Confira, a seguir, a versão em espanhol:

Sinodalidad: un proceso cocido a fuego lento en el Sur

Todos sabíamos que el próximo Sínodo de los Obispos iría a abordar el tema de la sinodalidad, lo que muchos no imaginaban es la forma en que el Papa Francisco ha decidido llevarlo a cabo, con una metodología inédita, al menos en instancias vaticanas, pero que no sorprende a quienes viven su fe en el Sur.

La sinodalidad no es un invento de Francisco, un hombre de procesos, es algo intrínseco a la vida de la Iglesia, que nace en aquella primera comunidad de seguidores y seguidoras de Jesús donde había la valentía de sentarse, escuchar unos a los otros, discernir y encontrar el camino a seguir, algo no siempre fácil para una Iglesia perseguida, donde ser cristiano se pagaba muchas veces con el martirio y siempre con la persecución y la exclusión social.

Esa Iglesia que escucha, que se interesa por lo que pasa en el mundo, en la vida de los hombres y mujeres de cada momento histórico, se quiso retomar en el Concilio Vaticano II. Así, una de las Constituciones que puede ser considerada como fundamento del último concilio, aquella que trata sobre la Iglesia en el mundo actual, empieza diciendo: “los gozos y las esperanzas, las tristezas y las angustias de los hombres de nuestro tiempo, sobre todo de los pobres y de cuantos sufren, son a la vez gozos y esperanzas, tristezas y angustias de los discípulos de Cristo”.

Las palabras de Gaudium et Spes, como todas las recogidas en los documentos conciliares, no quedaron en saco roto en América Latina, que poco después se reúne en Medellín para encontrar el modo de concretizar en el continente las decisiones conciliares. El método ver (escuchar), juzgar (iluminar) y actuar se va imponiendo como camino a seguir, instaurando así elementos de una sinodalidad que, sin explicitarse en una terminología, se vivía en la práctica, en la vida de las comunidades, que hacían realidad el caminar sinodal, donde, sin la presencia constate del clero, se decidía juntos, también juntas, pues las mujeres siempre tuvieron un papel decisivo en la vida de esas comunidades, eran escuchadas en la toma de decisiones.

No podemos negar que ese modo de ser Iglesia, sinodal, poco a poco se fue apagando, quedando en un segundo plano. La retomada se puede fechar en Aparecida, un documento construido a partir del bautismo, donde se hace un llamamiento a ser discípulos misioneros, una condición propia de todos los bautizados. Las ideas de Aparecida van inundando la vida de la Iglesia latinoamericana, para después inundar la vida de la Iglesia universal.

En 2012 tiene lugar el Sínodo sobre la Nueva Evangelización para la Transmisión de la Fe Cristiana, donde muchos de los obispos latinoamericanos llevan las ideas de Aparecida, lo que poco a poco va despertando cuestionamientos en los otros padres sinodales. De esas reflexiones surgirá la exhortación postsinodal Evangelii Gaudium, ya escrita por el Papa Francisco, el relator general de Aparecida, donde muchos ven reflejadas las reflexiones de la V Conferencia General del episcopado latinoamericano, inclusive aquellas que fueron aparcadas en el Documento final aprobado por el Vaticano.

Estamos en 2013, y ahora, con la llegada del Papa del Sur, del fin del mundo como él mismo dijo en sus primeras palabras en la sede pontificia, la dinámica eclesial va tomando nuevos rumbos. Es un Papa que se empeña en escuchar y que hace ver que tiene interés y tiempo para escuchar, para estar en medio de la gente. Nunca olvidaré la procesión de inicio del Sínodo para la Amazonía, desde el interior de la Basílica de San Pedro hasta el Aula Sinodal. Allí estaba Francisco, en medio de la gente, sonriente, feliz. Si llegase un extraño, solo iría a saber que era el Papa porque vestía de blanco, pero él era uno más.

Ese sínodo puede ser considerado como un ensayo general del proceso de renovación eclesial iniciado hace más de 50 años. La mayoría de quienes entraron a la sala sinodal sabían lo que se estaba cociendo, muchos habían sido partícipes de un proceso de escucha que había escudriñado todos los rincones de la Amazonía, descubriendo así “los gozos y las esperanzas, las tristezas y las angustias de los hombres de nuestro tiempo”, que nos decía Gaudium et Spes y retoma Aparecida. Y no solo eso, allí estaban, en medio de obispos y cardenales, los indígenas y las mujeres, a quienes el Papa escucharía con especial atención siempre que hablaban en el aula sinodal y en los encuentros informales de los descansos, en los que seguía escuchando, como siempre hace.

Esa dinámica de la sinodalidad, de la escucha como elemento imprescindible para un buen discernimiento, se ha ido instalando en la vida de la Iglesia. De nuevo ha sido en el continente latinoamericano donde se ha dado un paso más. Ha sido con la Asamblea Eclesial de América Latina y el Caribe, como antes había sido con la Conferencia Eclesial de la Amazonía, experiencias inéditas, surgidas del discernimiento del primer Papa jesuita, hijo del maestro del discernimiento.

Francisco no quiere ni élites, ni ideologías en la Iglesia, quiere escucha y diálogo con parresía para encontrar juntos el camino a seguir. Estamos ante una Iglesia en la que todos hablan y escuchan, fundamentada en la categoría teológica de Pueblo de Dios. Escuchar a la gente, también a los que siempre estuvieron abajo o al margen, ya no es algo opcional o que se hace de cara a la galería. Es interesante ver cómo los pueblos indígenas manifiestan que en el Documento Final del Sínodo y en Querida Amazonía ven recogido aquello que dijeron a lo largo del proceso de escucha del Sínodo para la Amazonía.

La Asamblea Eclesial de América Latina y el Caribe ha adoptado una metodología similar a la del Sínodo para la Amazonía, algo que ha transbordado a la Iglesia universal. La Secretaría del Sínodo de los Obispos ha asumido esa dinámica para el próximo Sínodo, que tiene por tema “Por una Iglesia Sinodal: comunión, participación y misión”. Se quiere comenzar desde las iglesias particulares, desde la base, desde la escucha a todos, sin remilgos y sin cortapisas. “Uno en escucha de los otros, y todos en escucha del Espíritu Santo”, para así poder superar toda “tentación de uniformidad”, buscando “unidad en la pluralidad”.

La gran reforma está en marcha, una reforma que perdurará en el tiempo, porque no es algo que surge de la mente iluminada de alguien, es la voz del Pueblo de Dios, y eso es algo sagrado. Todo mundo va a ser escuchado y todo mundo va a tener que escuchar. Estamos ante un nuevo tiempo, no el tiempo de la democracia y sí el tiempo de la sinodalidad, donde la totalidad de los bautizados son protagonistas, tienen voz y vez.

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“Que o CELAM seja um centro de promoção do discipulado e da consciência missionária”, com a palavra dom Miguel Cabrejos https://observatoriodaevangelizacao.com/que-o-celam-seja-um-centro-de-promocao-do-discipulado-e-da-consciencia-missionaria-com-a-palavra-dom-miguel-cabrejos/ Thu, 10 Jun 2021 17:49:23 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=39708 [Leia mais...]]]> A 38ª Assembleia do Conselho Episcopal Latino-Americano (CELAM) aconteceu do dia 18 a 21 de maio de 2021. Planejada para se realizar em Porto Rico, mas a situação que se vive em consequência da pandemia de Covid-19 fez com que se realizasse toda virtualmente.

Quatro elementos podem ser destacados para esta assembleia: a modalidade, o tema, os participantes e os frutos esperados. Um pequeno grupo participará de Trujillo, Peru, a sede arquiepiscopal do presidente do CELAM, Dom Miguel Cabrejos.

O ponto central da 38ª Assembleia Geral será o processo de renovação e reestruturação do CELAM, uma tarefa confiada à atual Presidência desde a sua eleição em Tegucigalpa em maio de 2019, para a qual já foi preparada uma proposta. Paralelamente, a realidade do Continente e as Conferências episcopais serão analisadas face à crise e à situação que os países da região estão atravessando, bem como a Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe, a se realizar em novembro deste ano, e a Conferência Eclesial da Amazônia – CEAMA.

Dom Miguel Cabrejos

Espera-se que 85 pessoas participem na Assembleia, a qual terá um carácter deliberativo. Está previsto que a Assembleia envie uma Mensagem ao Povo de Deus, uma Mensagem às Conferências Episcopais e uma Carta ao papa Francisco, no final das suas sessões.

Dom Miguel Cabrejos espera que a assembleia seja “muito reflexiva e participativa, dada a situação atual da América Latina e do Caribe e do mundo, que tem sido extremamente afetados pela pandemia da Covid-19 que assola a nossa região”. Durante a Assembleia, a presidência apresentará a proposta de reestruturação e renovação do CELAM, que, nas palavras do seu presidente, deverá ser realizada num “espírito de comunhão, colegialidade e sinodalidade“.

Este processo, inspirado “pelos quatro sonhos da Exortação ‘Querida Amazônia’: social, cultural, ecológico e eclesial”, partiu “dos próprios pedidos, sugestões e propostas dos bispos”, diz dom Miguel Cabrejos, que sublinha que também foi consultado com o papa Francisco. Tem sido um esforço de equipe, “podemos dizer que seguimos um caminho sinodal para a elaboração da proposta“, insiste o Arcebispo de Trujillo, para quem “o processo tem sido muito participativo e enriquecedor“.

Na consulta realizada, segundo o Arcebispo, conseguiram reunir “informações chave sobre as dinâmicas eclesiais de cada uma das Regiões, num espírito de fraternidade e solidariedade, sinceridade e apoio mútuo“. Ele assinala que “cada região tem a sua peculiaridade, que é importante perceber e encorajar”, bem como os desafios que surgem de novas realidades presentes na dinâmica do CELAM, como a Conferência Eclesial da Amazônia – CEAMA, ou a Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe.

Apesar da grave situação que os países e a Igreja na América Latina e no Caribe estão vivendo, o presidente do CELAM insiste que estão tentando “acompanhar e apoiar as Conferências episcopais nas suas situações, experiências e propostas”. O prelado relata algumas das ações realizadas, tais como os cursos virtuais do CEBITEPAL, com mais de 4.000 estudantes em 2020, relatórios sobre as consequências da Covid-19, o trabalho do Centro de Comunicação, o apoio do Centro de Redes e Ação Pastoral na animação das redes existentes, entre outras ações.

O seu presidente deseja que “o CELAM seja um centro de promoção do discipulado e da consciência missionária, como uma referência vital para a compreensão e aprofundamento da catolicidade latino-americana e caribenha“. Para o levar a cabo, ele quer que seja realizado “num espírito de comunhão, colegialidade, sinodalidade em plena harmonia com o papa Francisco. Tudo isto nos dá muito entusiasmo para procurarmos verdadeiramente ser uma Igreja em saída missionária“.

Sobre o autor:

Luis Miguel Modino

Luis Miguel Modino – Padre diocesano de Madri, missionário fidei donum na Amazônia, residindo atualmente em Manaus – AM. Faz parte da Equipe de Comunicação da REPAM. Correspondente no Brasil de Religión Digital e colaborador do Observatório da Evangelização e em diferentes sites e revistas.

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“A comunicação não pode ser neutra, ela precisa ser comprometida com a possibilidade de uma nova sociedade”. Entrevista com dom Joaquim Mol https://observatoriodaevangelizacao.com/a-comunicacao-nao-pode-ser-neutra-ela-precisa-ser-comprometida-com-a-possibilidade-de-uma-nova-sociedade-entrevista-com-dom-joaquim-mol/ Thu, 03 Jun 2021 04:18:51 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=39669 [Leia mais...]]]> Dom Mol: “Na Igreja do Brasil, a comunicação, ela não deve ser neutra”

No marco celebrativo do 55º Dia Mundial das Comunicações Sociais, entrevistamos dom Joaquim Giovani Mol Guimarães, presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Comunicação da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB.

O bispo auxiliar de Belo Horizonte – MG e reitor da PUC Minas, analisa a mensagem do papa Francisco para este dia, afirmando que “não dá para fazer comunicação, e ainda mais comunicação da Igreja, do gabinete, do escritório, porque a comunicação não é ajuntamento de informações pura e simplesmente”. A comunicação “não deve ser neutra”, segundo dom Mol, destacando a coragem de muitos jornalistas “para fazer uma reportagem que vai gerar consciência nova”.

O bispo, colocando como exemplo o papa Francisco, insiste na necessidade de ser “destemidos naquilo que falamos, nos valores que pregamos, que nascem do Evangelho, da pessoa de Jesus”. Ele defende a necessidade de a Igreja investir mais em comunicação e adverte “que não podem ser chamados de católicos aqueles que praticam” as insídias na comunicação, inclusive contra o papa Francisco. Se faz necessário na comunicação da Igreja, segundo dom Mol, cuidar das linguagens, estar em comunhão com a Igreja, estar comprometida, libertar e não ser passiva.

Eis a entrevista:

Dom Joaquim Giovanni Mol Guimarães

1. Diante do 55º Dia Mundial das Comunicações Sociais, o papa Francisco faz um chamado a comunicar encontrando as pessoas onde estão e como são. O que isso significa para a comunicação da Igreja?

R.: Eu acho uma intuição do papa Francisco muito interessante e muito contemporânea, ou seja, é uma exigência do tempo de hoje. Não dá para fazer comunicação, e ainda mais comunicação da Igreja, do gabinete, do escritório, porque a comunicação não é ajuntamento de informações pura e simplesmente. A comunicação, ela tem a exigência do estabelecimento de uma relação com o outro. Por isso que o papa Francisco, acho que de uma maneira muito perspicaz, ele diz que a gente precisa ir. Vem e verás, tem que ir, e ir ao encontro das pessoas.

Neste encontro é que a gente retira a informação, os dados. Precisamos entender que é uma intuição muito bonita, de um encontro que acontece quando a gente vai para ver, encontro de pessoa com pessoa, é que a gente então faz comunicação, e a partir da comunicação a gente também informa a toda a sociedade.

2. Na mensagem do papa Francisco, ele agradece a coragem de muitos jornalistas que assumindo essa coragem de ir ao encontro, eles ajudam a dar a conhecer os abusos e injustiças contra os pobres e contra a criação. Como isso deveria ser plasmado, se é que ainda não está sendo, na comunicação da Igreja, sobretudo no Brasil?

R.: Isso deve ser plasmado na Igreja do Brasil, principalmente, por um esforço que precisa ser feito, um esforço de compreensão de que a comunicação, ela não deve ser, e isso pode provocar estranhamento, não deve ser neutra. A comunicação neutra, que muitas pessoas buscam fazer, é uma comunicação que, pretensiosamente sem lado algum, acaba se posicionando em favor do lado de quem tem mais poder, poder político, poder econômico e tudo e qualquer tipo de poder, inclusive religioso.

Para plasmar isso dentro da prática eclesial brasileira, é preciso entender que a comunicação tem que ser comprometida, um compromisso com a outra pessoa, um compromisso com a possibilidade – que precisa inclusive ser alimentada pela própria comunicação -, de uma nova sociedade. Não uma sociedade com remendos, em que fica tudo mais ou menos como está, mas é uma outra sociedade possível.

Eu gosto muito de um pensador dos Camarões, negro, historiador, filósofo, Achille Mbembe. Ele diz que a era do humanismo acabou, e por que que acabou, porque nada indica que o poder, por exemplo, dos Estados Unidos sobre outros muitos países, vai arrefecer, que em muitos países, a perseguição e a morte dos negros vão cessar. O humanismo acabou porque a faixa de Gaza é a maior prisão a céu aberto que existe no mundo. O humanismo acabou porque a fome aumenta, porque a desigualdade vai se tornando cada vez pior, ou seja, mais gente pobre, sem recursos para poder se defender e viver dignamente, enquanto uma minoria, cada vez menor no mundo, cada vez tem mais. Aí vai uma indicação muito interessante do Thomas Piketty, que escreveu “O Capital do Século XXI”, onde fez uma análise do imposto de renda em vários países, onde diz que a desigualdade alcançou um patamar que dificilmente se consegue agora resolver.

A comunicação não pode existir neutra, ela precisa ser comprometida com a possibilidade de uma nova sociedade. Por isso, o Papa elegia muitos jornalistas, na mensagem ele usa a palavra “muitos jornalistas”. Mas não são todos, pois tem jornalistas que estão aí para manter o status quo. E são famosos, ganham muito dinheiro com o jornalismo, mas não estão ao serviço disso que o Papa diz. Acho interessante que ele cita outros profissionais da comunicação, operadores de câmera, editores, cineastas, que trabalham, sofrem grandes riscos inclusive, e que estão ali para melhorar a sociedade, defender a condição humana, mostrar as desigualdades, defender o direito dos pobres, os direitos humanos, e assim por diante.

Há muitos jornalistas que fazem isso, e fazem com competência, e fazem com muito amor e coragem, porque inclusive, de fato, se arriscam muitas vezes, para fazer uma reportagem que vai gerar consciência nova. Também nós precisamos, junto com o Papa, agradecer a coragem de muitos jornalistas. 

3. O senhor fala que não dá para fazer uma comunicação sem compromisso. Poderíamos dizer que o papa Francisco é alguém que nas suas palavras sempre mostra o caminho a seguir, e geralmente não deixa ninguém indiferente, recebendo elogios e ataques, muitas vezes impiedosos. Como o exemplo do papa Francisco deveria se fazer presente na vida dos jornalistas, dos comunicadores, mas também na vida de todos os batizados, da hierarquia, dos bispos, que muitas vezes são os mais escutados dentro da Igreja?

R.: A gente precisa rever nossa maneira de seguir a Jesus. A questão de sermos, a exemplo do papa Francisco, destemidos naquilo que falamos, nos valores que pregamos e que nascem do Evangelho, do encontro com a pessoa de Jesus, tais como a paz, a justiça do Reino, o perdão… Eu tenho a impressão de que há um excesso de formalidade na vivência da fé cristã, o que significa procurar excessivamente ser politicamente correto sobre todos os aspectos. E aí, é claro, a comunicação que a gente faz nunca será a exemplo do papa Francisco, que não teme ser caluniado, impiedosamente maltratado, desrespeitosamente, deseducadamente agredido de todas as formas.

Se a gente como Igreja, os ministros ordenados, nós bispos, padres, diáconos, seminaristas, os que estão em processo de formação, não incorporarmos na nossa vivência da fé esse destemor, porque nós somos seguidores de Jesus Cristo Crucificado, Ressuscitado, inclusive depois de ter anunciado e testemunhado o Reino de Deus, nós não vamos avançar. O papa Francisco diz que a Igreja precisa ser como hospital de campanha, e como tal a Igreja não pode se preocupar com estar toda engomadinha. A gente passa essa imagem, e não de alguém que tem as mãos no outro, as mãos na carne do outro, na ferida do outro, na dor outro, do outro individual e do outro coletivo.

Pelo que tenho lido, escutado, este é um dos piores momentos para as comunidades indígenas no Brasil, porque os indígenas, eles foram escolhidos como inimigos do Governo Federal do Brasil, e todo mundo que está do lado deles. Se a Igreja não se aproxima e coloca a mão na carne indígena, na dor indígena, no sofrimento de cada um deles, e assim tantos outros povos, tantos outros segmentos da sociedade, ela vai fazer sim, uma comunicação linear, não tem alto, nem baixo, ela não tem nada a ver com a vida, que é cheia de altos e baixos.

Resumindo, nós precisamos nos converter a Jesus Cristo. A verdadeira comunicação na Igreja, ela brotará, certamente, viçosa, exuberante, de pessoas convertidas a Jesus Cristo. Isso serve para leigos, leigas, e serve muito bem para nós, ministros ordenados. Essa conversão a Ele, à centralidade da mensagem dele em nossa vida, é fundamental.

4. A gente percebe que muitas vezes os ministros ordenados têm certo medo, receio dos jornalistas. Realmente a Igreja do Brasil, a hierarquia brasileira, tem consciência do poder da comunicação para poder anunciar e testemunhar a Boa Notícia do Evangelho?

R.: Não, não tem a consciência plena do poder da comunicação. Posso dizer isso sob o aspecto do investimento, muitos não investem nisso. Muitas coisas no campo da comunicação são precárias, inclusive equipamentos importantes da comunicação. Não que sejam caros, mas é questão de escolha, como se fosse investir em algo que não vale a pena. E isso dá um efeito colateral terrível, há segmentos da Igreja que descobrem que a comunicação é importante e usam a comunicação e ferramentas da comunicação para fazer um anúncio estranho do Evangelho. Nós temos uma boa parte de cristãos católicos fundamentalistas, cristãos que se tornaram influenciadores digitais, que estão inclusive nas rádios, nas TVs, nas redes digitais etc., eles são formados, são preparados, são católicos, que usam a comunicação, mas usam para isso, para formar fundamentalistas. Nós sabemos que no Brasil há muitas pessoas assim, padres, instituições, que usam a comunicação nesse sentido.

Há muitas coisas a descobrir, às vezes é difícil encontrar uma pessoa da Igreja para conceder uma entrevista, muitos parecem que têm medo de jornalista. Eu acho que tem mesmo algumas pessoas, outras não, claro, que são muito bem preparadas. Muitos tem medo porque não se prepararam, inclusive para saber ouvir o jornalista e responder às perguntas que ele faz. Há irmãos no episcopado que, inclusive eu já presenciei, maltratam pessoas da imprensa, porque estas fazem perguntas que são às vezes difíceis de serem respondidas, e em vez de responderem, agridem o jornalista.

Há uma outra razão, não é porque não se prepararam, mas é porque há, digamos assim, um excessivo recolhimento da mensagem de Jesus. A Igreja consegue falar muito mais para dentro de si mesma, do que para fora. E isso é muito ruim para toda e qualquer instituição, ainda mais para a Igreja. Quando ela se especializa em falar para dentro, só para os iniciados, só para os seus, ela está se recusando, na realidade, de fato, a estabelecer diálogo com o mundo, com as lideranças. Ela está se negando a interagir com forças que são humanizadoras e que estão dentro da sociedade. Uma postura realmente muito ruim, que revela que a pessoa se habituou e escolheu falar só para dentro e fechar o microfone para fora.

5. A mensagem do papa Francisco fala sobre uma realidade muito presente no mundo, inclusive no Brasil. Trata-se daquilo que ele chama insídias na web, presente na grande mídia, mas também na mídia da Igreja, onde a gente vê certos grupos cristãos, católicos, que muitas vezes se colocam, inclusive, como exemplo, não procuram o debate e insistem no insulto contra o papa Francisco, contra a CNBB, contra a própria Igreja. O que deveria ser feito para superar essas atitudes e para descobrir aquilo que o papa Francisco chama de oportunidades, incentivando o diálogo e gerando debates positivos nos meios de comunicação católicos?

R.: Com toda liberdade, e eu preciso dizer isso, e digo muito consciente, de maneira muito sóbria, que não podem ser chamados de católicos aqueles que praticam aquilo que você acaba de dizer. Inclusive, cheios de si mesmos, ensimesmados, se apresentam como melhores do que os outros, sabedores de tudo. Eu vejo algumas pessoas falando em veículos de comunicação, até de inspiração católica, como se fossem os doutores, sabedores de todas as leis e normas, quando eles tomam a palavra, em primeiro lugar, ficam atrás do cumprimento da lei, da norma, pessoas que direta ou diretamente agridem ou recusam o Magistério do papa Francisco, que aliás já colaborou com todo o corpo da Doutrina Social da Igreja, com Querida Amazônia, com Laudato Si’, com Fratelli tutti, que estão contra e fazem questão até de ridicularizar o Magistério do Papa, essas pessoas não podem ser chamadas de católicos. Na realidade elas não são.

Embora se apresentem assim, precisamos entender claramente que a Igreja deveria tomar, eu acho que está começando a fazer isso, tomar medidas muito claras, não tanto para fazer uma disputa de informação, de comunicação, não é debate de ideias, de projeto, do Evangelho, da forma de viver a vida cristã. A Igreja precisa tomar medidas no seu interno, até mesmo canônicas, algumas no campo da justiça civil, por causa de calúnia, de difamação.

O Papa não se abate com essas questões, é um homem iluminado pelo Espírito, mesmo sofrendo essas calúnias, difamações, até mesmo por gente da hierarquia da Igreja. Ele consegue dormir em paz. Ele está propondo exatamente aproveitar as oportunidades para expandir, pela web, por outros veículos de comunicação, expandir o Reino de Deus. A tecnologia digital, ela não pode ser demonizada. O Papa faz críticas sérias, porque frequentemente, os veículos de comunicação, as redes sociais, que alguém já chamou de terra de ninguém, terra sem lei, ou como já falou outro grande pensador, com o advento da internet, mesmo que a expressão possa ser feia ou agressiva, os idiotas ganharam um espaço, um palco muito grande.

O Papa faz críticas sérias a isso, mas ele reconhece o valor que as redes sociais tem, e por isso que ele diz, vamos aproveitar as oportunidades. O Papa diz que é um instrumento formidável, fora do normal, e a gente pode crescer e desfrutar dessa tecnologia, desses veículos de comunicação, para fazer verdadeira comunicação.

6. A comunicação, como tudo aquilo que é feito na Igreja, tem como missão fundamental testemunhar o Evangelho. O que os veículos de comunicação da Igreja no Brasil deveriam fazer para chegar naqueles que estão fora da Igreja, naqueles que estão afastados, pensando sobretudo nos mais jovens?

R.: São várias coisas e uma remete à outra. Uma delas é melhorar a linguagem, a Igreja tem preferido falar para dentro, e isso é perigoso, porque a gente corre o risco de estagnar a caminhada da Igreja, ela só fala para se mesma. E a Igreja tem um anúncio a ser feito, por obrigação, que é o anúncio do Evangelho do Reino, essa é a sus missão, é a mesma missão de Jesus, que ela não pode abrir mão dele. Se ela fala só para dentro, ela se sente incapaz de encontrar as linguagens adequadas, e a linguagem para os que estão fora, deve ser outra, a linguagem para os mais jovens, outra, a linguagem para os que são parte de comunidades muito específicas, que compõe vários segmentos da sociedade, outras linguagens.

A gente precisa exercitar linguagens diferentes, são aprendizados. Exercitar significa fazer o exercício várias vezes, ir repetindo, aprimorando, reelaborando, até conseguir um entendimento entre a mensagem que nós temos a anunciar, que é o Reino, e aqueles que estão abertos a acolher este anuncio.

Segunda coisa a ser feita, que é muito importante, entender que quem pratica a comunicação pelos meios católicos, precisa comungar com a Igreja, estar em comunhão com a Igreja. Quando um veículo de comunicação, uma TV, por exemplo, está muito distante daquilo que a Igreja está orientando, que a Conferencia Nacional dos Bispos do Brasil está orientando, quando está distante na comunicação, está distante na vida. Quando aquele grupo, no fundo, não aceita a orientação da Igreja, faz a comunicação com seu projeto pessoal e não com o projeto da Igreja.

Terceira coisa é fazer com que as pessoas da comunicação entendam que se a comunicação não estiver de fato comprometida, ela não liberta, ela não revela a verdade, os valores do Evangelho, da justiça e da paz, ela se torna passiva e aliena. Alienar é cuidar do seu mundinho, até ajuntando pessoas ao redor do seu mundinho, mas desocupar-se dos outros, aquela pessoa individualmente com o qual eu preciso relacionar-me, aquele grupo ao qual pertenço, que eu preciso estabelecer relações com ele. Os outros são também a coletividade, a comunidade, a sociedade, a humanidade.

7. Se os comunicadores católicos não entenderem que a comunicação precisa sempre libertar, seguramente, ela estará alienando as pessoas. A questão da linguagem, a questão do posicionamento, assim como eu penso que a comunicação não deve ser neutra, mas ela tem que se comprometer, ela tem um lado, a comunicação, ela também não deve ser genericamente verdadeira, mas ela deve revelar a verdade dos pequenos e dos pobres. Diante da chacina do Jacarezinho no Rio de Janeiro, escuta a polícia, ela vai dizer uma verdade, entre aspas. Escuta a população, a família que estava lá, eles vão dizer uma outra verdade. Que verdade você vai colocar no ar, que verdade você vai publicar, que verdade você vai transmitir pelo rádio, que verdade o comunicador católico dirá?

R.: Se você pergunta para um grande fazendeiro a visão que ele tem da Amazônia, e pergunta para uma comunidade local, autóctone, que vive dentro da Amazônia, são coisas completamente distintas. A comunicação, assim como ela não é neutra, ela também não pode ser genericamente verdadeira, ela precisa preocupar-se da verdade dos pobres, da verdade dos oprimidos, da verdade dos despojados, da verdade dos excluídos, como parte dessa verdade. Porque é essa verdade aí, que acolhe a verdade que Jesus anuncia sobre a pessoa humana, homens e mulheres, é essa verdade que acolhe.

Mas também não pode ser passiva, aí alguém vai dizer, olha está estimulando o ódio. A comunicação, ela deve ser terminantemente defensora, lutadora pela vida, ela não espera as coisas acontecerem. O processo de comunicação que é feito, praticado pela Igreja, cada assessoria de comunicação de cada diocese, da CNBB, do Celam, da Igreja no mundo inteiro, essas pessoas todas precisam entender que a comunicação não é passiva, a comunicação é pacífica, ela pacifica, ela constrói a paz, mas ela não é passiva. Ela ajuda a construir a paz sendo lutadora pela vida e lutadora pela paz. Precisa arregaçar as mandar, uma comunicação que é aguerrida na construção, na implantação dos valores do Reino.

Há muito que fazer, temos que crescer muito, nas nossas TVs, rádios, que são cerca de 1.400 no Brasil, rádios católicas, sobretudo nas redes sociais, que é o que hoje é mais utilizado, está acessível para muitas pessoas. Eu acredito muito na comunicação, agora, eu tenho a consciência de que tudo o que a gente faz de comunicação como Igreja no presente momento, é apenas, apenas, o grãozinho de areia na praia. Temos muitas coisas ainda a praticarmos na comunicação para que ela esteja ao serviço da vida.

Sobre o autor:

Luis Miguel Modino

Luis Miguel Modino – Padre diocesano de Madri, missionário fidei donum na Amazônia, residindo atualmente em Manaus – AM. Faz parte da Equipe de Comunicação da REPAM. Correspondente no Brasil de Religión Digital e colaborador do Observatório da Evangelização e em diferentes sites e revistas.

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Sofrimento com a doença e a fome e Sinodalidade marcam Análise de Conjuntura da 58ª Assembleia Geral da CNBB https://observatoriodaevangelizacao.com/sofrimento-com-a-doenca-e-a-fome-e-sinodalidade-marcam-analise-de-conjuntura-da-58a-assembleia-geral-da-cnbb/ Tue, 13 Apr 2021 03:12:41 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=39199 [Leia mais...]]]>

Um momento importante do primeiro dia da 58ª Assembleia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB tem sido a Análise de Conjuntura social e eclesial, elaboradas por uma equipe de assessores e assessoras, que destacam que não representa a opinião da Conferência.

Análise de conjuntura social

Com o título “O Povo de Deus sofre com a doença e a fome”, a análise de conjuntura social apresentada aos bispos do Brasil aponta para a realidade de um país profundamente atingido pela pandemia da Covid-19, que oficialmente está próximo de 13,5 milhões de casos e já superou os 353 mil mortos.

Estamos diante de uma crise com muitas faces, consequência da primazia do dinheiro e das finanças, que tem provocado “uma gravíssima pandemia” que coloca a prova a sobrevivência da humanidade, e que ameaça com um repetir de modo ainda mais grave. A crise sanitária tem impactado nas diversas dimensões da sociedade, provocado um mundo em mudança.

A análise relata como vem se desenvolvendo o maior colapso sanitário e hospitalar da história do Brasil, com longas filas de espera e trabalhadores com uma carga excessiva de trabalho. Diante dessa realidade o texto destaca “a importância da vacina e do distanciamento social para a superação da pandemia”, junto com o uso de máscaras. A vacinação está “muito aquém do necessário”, o distanciamento social “nunca foi feito de forma plena e organizada em todo o país”.

No Brasil, a crise econômica e sanitária estão profundamente relacionadas. Se faz necessário investimentos públicos e fomento à economia, para se evitar um colapso econômico cada vez mais próximo, que vai se traduzir em fome, miséria e desesperança, uma realidade presente nas periferias das grandes cidades. No campo da economia também tem se dado uma grave desvalorização do real, consequência do fato de que nos últimos meses o Brasil se tornou o epicentro da pandemia. Isso favorece as exportações, principalmente do agronegócio, mas tem elevado o preço dos produtos importados, dos itens mais presentes na vida dos mais pobres, a inflação e os juros.

A pergunta que surge na análise é o efeito das medidas que estão sendo tomadas no campo econômico, mas também os efeitos no meio ambiente. Junto com isso o desemprego bateu recordes ao final de 2020 na maioria dos estados brasileiros. Esse “terrível quadro econômico do ano passado não foi pior, em parte, por conta da política fiscal adotada para mitigar os efeitos da pandemia”, mas o PIB e a dívida externa estão numa situação muito complicada. Uma das mais graves consequências disso é a fome, que atinge a 19,1 milhões de brasileiros, com mais da metade da população sem segurança alimentar. As perspectivas, após “a catastrófica gestão da pandemia e da economia”, são pouco alentadoras, com “ausência de crescimento econômico (exceto para alguns setores), junto com considerável inflação ao consumidor”.

O texto entregue aos bispos afirma que o Brasil mudou, algo que se faz visível na conjuntura política, no aumento das possibilidades de comunicação, surgindo o fenômeno da psicopolítica, que “o fluxo contínuo da comunicação, a instabilidade da emoção, não permitindo a reflexão, o racionalismo”. Isso se traduz numa difícil relação entre política e cultura e as dificuldades enfrentadas pelo sistema democrático, cimentado em “relações de mando e subserviência”, se fazendo cada vez mais evidente o que texto chama de “uma paixão pela ignorância”, também chamado de “ódio à inteligência, ao conhecimento, à ciência, ao esclarecimento, ao discernimento”, se fazendo um “uso elitista do conhecimento”.

A educação, junto com a cultura, também se tornou uma dificuldade no Brasil. Tem aparecido distintos universos culturais, que tem motivado “uma perda do respeito pelo mundo da cultura e da educação, o maior alicerce da esfera pública”. Essa realidade, que já estava em crise, piorou muito com a pandemia. O texto analisa a figura do atual presidente, Bolsonaro, que denomina como “um entrave para a superação da crise”, com postura de hostilidade à ciência e a volta de um messianismo anticomunista. Frente a isso surge o fator Lula, que retornou ao cenário político e à corrida eleitoral, provocando “notória mudança política do governo federal”.  Junto com isso, a análise destaca a grande presença militar no atual governo.

O texto conclui relatando a postura do governo federal e do presidente diante da pandemia, que desde o início procurou minimizar a doença e desrespeitar as vítimas; descumprir o isolamento social e o uso de máscaras; incentivar o uso de medicamentos sem eficácia científica comprovada; realizar uma má gestão da área da saúde; criar desavenças com governadores, prefeitos e instituições da sociedade civil. A análise afirma que “muitas mortes e sofrimento de famílias poderiam ter sido evitados”. Diante disso, as propostas são: vacinação com a maior velocidade possível, distanciamento social e auxílio emergencial. Diante de um quadro “de fome, doença e de desgoverno” a proposta é de “maior unidade com uma profunda e resistente união do coro dos lúcidos”, construindo pontes e diálogos, “tarefa dos cristãos e de todas as pessoas de boa-fé”.

Veja abaixo o texto completo:

Análise de conjuntura eclesial

A análise de conjuntura eclesial teve como ponto central a sinodalidade, que promove uma experiência de comunhão e participação. De fato, pode ser considerada como uma reflexão teológica sobre essa dimensão. O ponto de partida foi o Magistério do papa Francisco, para quem esse é “o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milênio”, uma proposta de “caminhar juntos”, em chave missionária, que tem como fundamento teológico a infalibilidade in credendo de todo o povo de Deus, o sensus fidei e o consensus fidelium, o que faz de cada batizado um “sujeito ativo da evangelização”.

O Santo Padre vê a sinodalidade como “dimensão constitutiva da Igreja”, da qual surge o “dinamismo de comunhão que inspira todas as decisões eclesiais”, que tem como base a escuta e a decisão de entrar num processo. A realização da sinodalidade começa nas igrejas particulares e continua nas regiões eclesiásticas e conferências episcopais, chegando finalmente ao âmbito da Igreja universal.

A teologia da sinodalidade do papa Francisco tem como base a inspiração do Espírito Santo, algo que no Sínodo para a Amazônia quis fazer visível nos “momentos de silêncio que Francisco introduziu na Aula do Sínodo, durante as Assembleias, após cada cinco Intervenções”. Essa sinodalidade não pode fugir do discernimento e da escuta, e tem que ter um forte caráter missionário, com consequências ecumênicas e para o serviço cristão à sociedade. O Papa adverte, enfatiza o texto, sobre os equívocos e riscos nos processos sinodais, o primeiro e fundamental, é vê-lo “como um Parlamento”.

Partindo da doutrina do Concilio Vaticano II, o texto faz uma análise da realidade brasileira, onde as Assembleias Diocesanas de Pastoral tornaram-se mais comuns que os Sínodos Diocesanos. São relatados alguns eventos e realidades sinodais, como as Comunidades eclesiais de base – CEBs e os encontros intereclesiais, e as assembleias da CNBB em diferentes níveis. Junto com isso, faz uma análise da produção teológica sobre a sinodalidade, cada vez mais abundante.

Sobre o autor:

Luiz Miguel Modino

Luis Miguel Modino – Padre diocesano de Madri, missionário fidei donum na Amazônia, residindo atualmente em Manaus – AM. Faz parte da Equipe de Comunicação da REPAM. Correspondente no Brasil de Religión Digital e colaborador do Observatório da Evangelização e em diferentes sites e revistas.

Confira, a seguir, a versão em espanhol:

Sufrimiento con la enfermedad y el hambre y Sinodalidad marcan Análisis de coyuntura en la 58ª Asamblea de la CNBB

Un momento importante de la primera jornada de la 58ª Asamblea General de la Conferencia Nacional de los Obispos de Brasil – CNBB ha sido el análisis de coyuntura social y eclesial, elaborado por un equipo de asesores, que destacan que no representa la opinión de la Conferencia.

“El Pueblo de Dios sufre con la enfermedad y el hambre”. Ese es el título del análisis de la situación social presentado a los obispos de Brasil que nos muestra la realidad de un país profundamente golpeado por la pandemia del Covid-19 que oficialmente se acerca a los 13,5 millones de casos y ya ha superado las 353.000 muertes.

Estamos ante una crisis con muchas caras, consecuencia de la primacía del dinero y las finanzas, que ha provocado “una gravísima pandemia” que pone a prueba la supervivencia de la humanidad, y que amenaza con repetirse de forma aún más grave. La crisis sanitaria ha impactado en las diferentes dimensiones de la sociedad, provocando un mundo en cambio.

El análisis informa de cómo se ha desarrollado el mayor colapso sanitario y hospitalario de la historia de Brasil, con largas filas de espera, trabajadores de la sanidad con una carga de trabajo excesiva. Frente a esta realidad, el texto destaca “la importancia de la vacuna y el distanciamiento social para superar la pandemia”, junto con el uso de mascarillas. La vacunación está “lejos de ser la necesaria”, el distanciamiento social “nunca se ha hecho de forma completa y organizada en todo el país”.

En Brasil, la crisis económica y la crisis sanitaria están profundamente correlacionadas. Son necesarias las inversiones públicas y el fomento de la economía para evitar un colapso económico cada vez más cercano, que se traducirá en hambre, miseria y desesperanza, una realidad presente en las periferias de las grandes ciudades. En el ámbito de la economía también se ha producido una grave devaluación del real, consecuencia de que en los últimos meses Brasil se ha convertido en el epicentro de la pandemia. Esto favorece las exportaciones, especialmente de la agroindustria, pero ha elevado el precio de los productos importados y de los artículos más presentes en la vida de los más pobres, la inflación y los tipos de interés.

La cuestión que se plantea en el análisis es el efecto de las medidas económicas que se están adoptando en el ámbito económico, pero también los efectos sobre el medio ambiente. Junto a esto, el desempleo batió récords a finales de 2020 en la mayoría de los estados brasileños. Este “terrible panorama económico del año pasado no fue peor, en parte, por la política fiscal adoptada para mitigar los efectos de la pandemia”, pero el PIB y la deuda externa están en una situación muy complicada. Una de las consecuencias más graves es el hambre, que afecta a 19,1 millones de brasileños, con más de la mitad de la población sin seguridad alimentaria. Las perspectivas, tras “la catastrófica gestión de la pandemia y de la economía”, no son muy alentadoras, con “ausencia de crecimiento económico (salvo en algunos sectores), junto con una considerable inflación para los consumidores”.

El texto entregado a los obispos afirma que Brasil ha cambiado, algo que es visible en la coyuntura política, en el aumento de las posibilidades de comunicación, surgiendo el fenómeno de la psicopolítica, afirmando que “el flujo continuo de la comunicación, la inestabilidad emocional, no permitiendo la reflexión, el racionalismo”. Esto se traduce en una difícil relación entre la política y la cultura y en las dificultades a las que se enfrenta el sistema democrático, cimentado en “relaciones de mando y sumisión”, haciéndose cada vez más evidente lo que el texto llama “una pasión por la ignorancia”, también llamada “odio a la inteligencia, al conocimiento, a la ciencia, a la ilustración, al discernimiento”, haciendo un “uso elitista del conocimiento”.

La educación, junto con la cultura, también se ha convertido en una dificultad en Brasil. Han aparecido diferentes universos culturales, lo que ha motivado “una pérdida de respeto por el mundo de la cultura y la educación, el mayor fundamento de la esfera pública”. Esta realidad, que ya estaba en crisis, empeoró mucho con la pandemia. El texto analiza la figura del actual presidente, Bolsonaro, al que califica de “obstáculo para la superación de la crisis”, que ha hecho realidad una política marcada por la militarización, por querer hacer la voluntad del pueblo, el mesianismo, la hostilidad a la ciencia y el anticomunismo. Enfrente está el factor Lula, que ha vuelto a la carrera electoral, y ha provocado “el notorio cambio político del gobierno federal”.  Junto a esto, el análisis destaca la gran presencia militar en el actual gobierno.

El texto concluye relatando la postura del gobierno federal y del presidente frente a la pandemia, que lo ha llevado a minimizar la enfermedad y a no respetar a las víctimas; a no cumplir el aislamiento social, el uso de mascarillas, y ha fomentado el uso de medicamentos sin eficacia científica comprobada; a realizar una mala gestión del área de salud; a crear desencuentros con gobernadores, alcaldes e instituciones de la sociedad civil. El análisis afirma que “se podrían haber evitado muchas muertes y el sufrimiento de las familias”. Ante esto, las propuestas son: vacunas y vacunación con la mayor rapidez posible; distanciamiento social; ayuda de emergencia. Ante una situación “de hambre, enfermedad y desgobierno” se propone “más unidad y una unión profunda y resistente del coro de los lúcidos”, tendiendo puentes y dialogando, “tarea de los cristianos y de todas las personas de buena fe”.

El análisis de la situación eclesial tuvo como punto central la sinodalidad, que promueve una experiencia de comunión y participación. De hecho, puede considerarse una reflexión teológica sobre esta dimensión. El punto de partida ha sido el Magisterio del Papa Francisco, para quien este es “el camino que Dios espera de la Iglesia del tercer milenio”, una propuesta para “caminar juntos” en clave misionera, que tiene como fundamento teológico la infalibilidade in credendo de todo el pueblo de Dios, el sensus fidei y el consensus fidelium, que hace de todo bautizado un “sujeto activo de la evangelización”.

El Santo Padre ve la sinodalidad como “una dimensión constitutiva de la Iglesia”, de la que surge el “dinamismo de comunión que inspira todas las decisiones eclesiales”. La realización de la sinodalidad comienza en las iglesias particulares y continúa en las regiones eclesiásticas y en las conferencias episcopales, llegando finalmente al nivel de la Iglesia universal.

La teología de la sinodalidad del Papa Francisco se basa en la inspiración del Espíritu Santo, algo que en el Sínodo para la Amazonía quiso hacer visible en los “momentos de silencio que Francisco introdujo en el Aula Sinodal, durante las Asambleas, después de cada cinco intervenciones”. Esta sinodalidad no puede dejar de lado el discernimiento y la escucha, y debe tener un fuerte carácter misionero, con consecuencias ecuménicas y de servicio cristiano a la sociedad. El Papa advierte, subraya el texto, sobre los errores y riesgos en los procesos sinodales, el primero y fundamental, el verlo “como un Parlamento”. Partiendo de la doctrina del Concilio Vaticano II, el texto hace un análisis de la realidad brasileña, donde las Asambleas Pastorales Diocesanas han sido más comunes que los Sínodos Diocesanos. Se informa de algunos eventos y realidades sinodales, como las comunidades eclesiales de base – CEBs y los encuentros intereclesiales, y las asambleas de la CNBB a diferentes niveles. Junto a ello, se analiza la producción teológica sobre la sinodalidad, que es cada vez más abundante.

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Mulheres que ajudam a construir o Reino de Deus na Igreja e nas periferias do mundo https://observatoriodaevangelizacao.com/mulheres-que-ajudam-a-construir-o-reino-de-deus-na-igreja-e-nas-periferias-do-mundo/ Tue, 09 Mar 2021 10:18:06 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=38702 [Leia mais...]]]>

No dia em que é comemorado o Dia Internacional da Mulher, somos chamados a refletir sobre o papel das mulheres na sociedade e na Igreja. Olhar para o passado para poder analisar o presente e poder construir o futuro, um futuro melhor, sustentado em princípios que mostram aquilo que Deus quer.

Falar de mulheres nos leva a pensar em rostos concretos, que simbolizam lutas comuns, que ajudam a construir o Reino de Deus. A Igreja brasileira, a Igreja da Amazônia tem dado passos ao longo dos últimos anos, nem sempre para frente, mas mesmo aqueles que pontualmente representaram um retrocesso, a longo prazo, ajudaram a construir o futuro evitando cair nos erros do passado.

Laura, Joelma, Rosita, Rose… são nomes atrás dos quais aparecem representadas as lutas de muitas mulheres para que a Igreja e a sociedade sejam cada vez mais imagem do Deus da Vida, sinal de Boa Notícia, de Evangelho, sinal do Reino de Deus. Elas são presença feminina no meio dos povos indígenas, no mundo da comunicação, entre os migrantes e refugiados, ao lado das vítimas do abuso e exploração sexual.

Ir. Laura Vicuña Pereira Manso

Fruto do seu trabalho como agente do Conselho Indigenista Missionário, a Ir. Laura Vicuña Pereira Manso, tem dedicado os últimos anos a acompanhar a vida do povo Karipuna, no estado de Rondônia. Ela, que também é indígena, foi escolhida como representante dos povos originários na Conferência Eclesial da Amazônia – CEAMA, onde “nós mulheres, temos muito a contribuir”, pois segundo a religiosa:

nós somos chamadas a ser essa presença e essa voz de mulher na Conferência Eclesial da Amazônia”.

Ir. Laura Vicuña Pereira Manso

A religiosa Catequista Franciscana vê essa presença como “uma grande responsabilidade, pois estar presente numa instituição como esta, é uma responsabilidade no sentido de que a gente está levando a presença e a voz de muitas outras mulheres que habitam o território amazônico. São avós, mães, filhas e da Vida Consagrada, que estão presentes vivendo nesse imenso bioma, nessa imensa região amazônica”. Trata-se de “mulheres que lideram famílias e comunidades inteiras, que promovem a defesa da vida e que aspiram a um espaço também maior nos espaços da Igreja”.

A Ir. Laura insiste em que “nós mulheres merecemos isso, precisamos agir, falar, e não devemos permanecer invisibilizadas nesses espaços”. Daí, ela espera “que isso nos ajude a abrir nossa mente, nosso coração, e estejamos abertas e abertos às transformações que estão ocorrendo no mundo e na Igreja”. Como indígena, destaca a importância da presença dos povos originários na CEAMA, como algo que pode “ajudar a oferecer uma visão de vida, de luta, das cosmovisões, a partir de dentro dos povos originários e das comunidades amazônicas”.

Estar na CEAMA é oportunidade para “trazer presente tudo aquilo que nos faz sofrer e que ameaça a vida das pessoas e desse bioma”, para “defender os seus territórios, defender a Amazônia, o ecossistema e os povos que aqui habitam, defender a nossa casa comum para que as gerações futuras possam ter vida”. Por isso insiste em que “a Igreja seja amiga e aliada dos povos da Amazônia e da Amazônia como um todo, para que dessa forma nos comprometamos com o cuidado da casa comum”.

Joelma Viana

Fazer comunicação na Amazônia é “um desafio muito grande, porque quando a gente pensa essa região, ela é enorme, as distâncias são uma dificuldade que nós encontramos para poder chegar onde as coisas acontecem”. As palavras de Joelma Viana nos ajudam a descobrir que na comunicação amazônica, “a gente consegue estar mais próxima das pessoas, ouvindo, pisando o chão que eles pisam, compartilhando as suas vivências”, sempre na busca de uma comunicação diferenciada. A radialista insiste em que :

quando a gente faz a comunicação a partir da Igreja, nessa região amazônica, a gente não está só para ouvir, só para recolher os depoimentos. É necessário estar próximo, compartilhando esses momentos, vivenciando esses momentos, partilhando cada um desses momentos e aprendendo juntos”.

Joelma Viana

Na Amazônia, “essa comunicação acaba tendo um sentido muito maior, um sentido de comungar da vida do outro”, comungar com a vida dos povos da região. Esses desafios próprios da comunicação amazônica, aumentam quando ela é feita pelas mulheres, segundo Joelma Viana. Ela insiste em que o trabalho que é feito por mulheres, ele é diferente, pois as mulheres, “elas são sensíveis e conseguem fazer um acolhimento. E nós tentamos fazer isso, um acolhimento das pessoas que estão próximas da gente”.

Na Igreja da Amazônia, as mulheres que fazem comunicação ainda se deparam com posturas patriarcais, pois “muita gente não acredita no trabalho que é feito por mulheres” afirma Joelma. Ela que tem um papel destacado na Rede de Notícias da Amazônia, que desde Santarém, no Estado do Pará, engloba várias rádios católicas da região, afirma que “quando a gente olha o cenário da própria região e do próprio Brasil, a gente vai ter poucas mulheres à frente desse ramo dentro da Igreja. A gente vê mais homens no processo do que mulheres”. Diante disso, ela insiste na necessidade de ter maior presença das mulheres.

Nesse avanço, Joelma destaca a importância do papa Francisco, que “a partir do Sínodo da Amazônia, e agora também do próximo sínodo, que tem mulheres sendo representadas, acaba fortalecendo ainda mais esse trabalho que a gente vem desenvolvendo nessa região, que é tão desafiadora, mas ao mesmo tempo é tão instigante”. Isso faz com que as mulheres, insiste a radialista, “nós nos sentimos o tempo todo motivadas a estar presente, a estar compartilhando aquilo que aprendemos no nosso dia a dia”.

Ir. Rosita Milesi

As mulheres refugiadas, as mulheres migrantes, as mulheres apátridas, “elas são mulheres persistentes, são resilientes, são de uma devoção à sua vocação de mulher e mãe, que impressiona”. Quem assim fala é a Ir. Rosita Milesi, alguém que dedica sua vida a cuidar daquelas e daqueles que a sociedade despreza e explora. Nessas mulheres, a religiosa scalabriniana vê a presença de alguém que supera “com esforço, com dedicação, com carinho, com amor imensurável, todas as dificuldades e todos os percalços para poder atender, com um mínimo de dignidade, em primeiro lugar a seus filhos, depois a si mesmas, buscando a sua reintegração, a sua retomada na construção dos caminhos que a migração lhes impõe”.

Esse trabalho, tem ajudado a diretora do Instituto Migrações e Direitos Humanos – IMDH, a vivenciar fatos concretos que ajudam a “expressar a minha convicção de quanto essas mulheres atuam, buscam e superam”. Ela conta o caso de uma mãe que está em cadeira de rodas, está temporariamente impossibilitada de locomover-se. “No entanto, ela passa a maior parte do dia buscando alternativas, buscando comida, movendo amigos e amigas para socorrer outras pessoas que estão em maior necessidade do que ela”, relata a religiosa.

São exemplos que nos impressionam e que servem:

“para que nós, agentes humanitárias, busquemos cada vez com mais convicção esta possibilidade, ou este recurso que temos em nossas mãos, de estarmos ao serviço,  de fortalecermos a nossa missão e de atuarmos conforme o apelo do papa Francisco, e de tantos líderes que nos inspiram neste momento, buscando acolher com carinho, promover, e dar chance, dar oportunidades, envolver estas mulheres para que elas possam colocar todas suas capacidades e talentos ao serviço dos demais, como elas sabem generosamente fazer”.

Ir. Rosita Milesi

Aprender a valorizar e começar a entender o processo de luta pelas mulheres, é algo que a Ir. Rose Bertoldo aprendeu desde muito pequena, no berço de casa, vendo sua mãe, que trabalhava com o movimento de mulheres campesinas, no Rio Grande do Sul. Ela lembra muito “de minha mãe quando ia para a rua, nas mobilizações em Porto Alegre, para reivindicar o salário maternidade e aposentadoria”. A religiosa insiste em que “as mulheres nunca ganharam nada de graça, mas sim a partir da luta organizada”. Ela diz que “sempre trabalhei, toda missão como mulher consagrada, a partir da vida das mulheres mais sofridas, mais empobrecidas, principalmente as meninas e as mulheres”, destacando sua história de “identificar esse trabalho de enfrentamento ao abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes e tráfico de pessoas”, que hoje assume como missão principal.

Ir. Rose Bertoldo

Como religiosa do Imaculado Coração de Maria, sua missão tem sido no “cuidado da vida, voltada mais a questão das violações de direito”. Ela afirma que, aos poucos, “como uma mulher consagrada, também fui me inserindo nesse movimento de construção de uma Igreja mais voltada para os mais empobrecidos, os mais vulneráveis. Aí está também a categoria das mulheres”. Seu trabalho na Rede um Grito pela Vida, “tem sido por essa sensibilidade de sentir a dor de tantas meninas mulheres”, vivenciando essa opção de trabalho de enfrentamento ao tráfico de pessoas, como “uma presença profética, enquanto Igreja, enquanto Vida Consagrada, enquanto missionária, nesse chão da Amazônia”.

Na Amazônia, onde mora há nove anos, ela vê, sobretudo a partir do processo de preparação sinodal, que está sendo construída “uma Igreja que caminha com a gente e também é parte da gente”, onde se fez possível “poder perceber mais essa presença das mulheres na vida da Igreja, na sociedade, e também perceber, a partir das vozes das mulheres, o tanto de dor, de sofrimento, que as mulheres da Pan-Amazônia têm sofrido”. A religiosa enfatiza que “a questão do abuso, da exploração sexual, do tráfico de pessoas, do feminicídio, são gritos imensos que a gente tem ouvido”. No seu trabalho na Rede um Grito pela Vida, ela diz perceber e encontrar

o rosto de Jesus, a presença de Deus, no rosto sofrido na presença das mulheres que estão em situação de tráfico, em situação de abuso, em situação de exploração sexual”.

Ir. Rose Bertoldo

Rose Bertoldo afirma que sua missão é:

poder ser essa presença, poder ajudar, contribuir para que essas mulheres saiam dessa situação de violência, reconstruam suas vidas, possam retomar também, porque cada mulher é única, cada menina é única, e cada mulher revela a imagem desse Deus cheio de ternura, cheio de amorosidade”.

Ir. Rose Bertoldo

Por isso, “celebrar esse 8 de março é revigorar, rememorar toda essa história de luta das mulheres e aí continuar acreditando”, insiste a religiosa. Junto com isso, destaca a necessidade da formação de outras mulheres, “que possam contribuir nas mudanças, principalmente com relação à inclusão, de sermos uma presença ativa, efetiva, afetiva, nos espaços eclesiais, mas também em tantos outros espaços de luta, de construção da dignidade, não só das mulheres, mas de todas as pessoas”.

Sobre o autor:

Luiz Miguel Modino

Luis Miguel Modino – Padre diocesano de Madri, missionário fidei donum na Amazônia, residindo atualmente em Manaus – AM. Faz parte da Equipe de Comunicação da REPAM. Correspondente no Brasil de Religión Digital e colaborador do Observatório da Evangelização e em diferentes sites e revistas.

Confira, a seguir, a versão em espanhol:

Mujeres que ayudan a construir el Reino de Dios en la Iglesia y en las periferias del mundo

En el día en que se celebra el Día Internacional de la Mujer, estamos llamados a reflexionar sobre el papel de la mujer en la sociedad y en la Iglesia. Mirar el pasado para analizar el presente y poder construir el futuro, un futuro mejor, sustentado en principios que muestran lo que Dios quiere.

Hablar de mujeres nos lleva a pensar en rostros concretos, que simbolizan luchas comunes, que ayudan a construir el Reino de Dios. La Iglesia brasileña, la Iglesia en la Amazonía, ha dado pasos en los últimos años, no siempre hacia adelante, pero incluso aquellos que ocasionalmente representaron un retroceso, a la larga, ayudaron a construir el futuro evitando caer en los errores del pasado.

Laura, Joelma, Rosita, Roselei, son nombres detrás de los cuales están representadas las luchas de muchas mujeres para que la Iglesia y la sociedad sean cada vez más una imagen del Dios de la Vida, un signo de la Buena Noticia, del Evangelio, un signo del Reino de Dios. Son una presencia femenina entre los pueblos indígenas, en el mundo de la comunicación, entre los emigrantes y refugiados, junto a las víctimas de abusos y explotación sexual.

Laura Vicuña Pereira Manso, ha dedicado los últimos años a acompañar la vida del pueblo Karipuna en el estado de Rondônia, Amazonía brasileña. Ella, que también es indígena, fue elegida como representante de los pueblos originarios en la Conferencia Eclesial de la Amazonía – CEAMA, donde “las mujeres tenemos mucho que aportar”, porque, según la religiosa “estamos llamadas a ser esa presencia y esa voz de la mujer en la Conferencia Eclesial de la Amazonía”.

La religiosa Catequista Franciscana ve esta presencia como “una gran responsabilidad, porque estar presente en una institución como ésta es una responsabilidad en el sentido de que estamos llevando la presencia y la voz de muchas otras mujeres que viven en el territorio amazónico. Son abuelas, madres, hijas y de la Vida Consagrada que están presentes viviendo en este inmenso bioma, en esta inmensa región amazónica”. Se trata de “mujeres que lideran familias y comunidades enteras, que promueven la defensa de la vida y que aspiran a un lugar mayor en los espacios de la Iglesia”.

La Hna. Laura insiste en que “las mujeres nos lo merecemos, necesitamos actuar, hablar, y no debemos permanecer invisibles en estos espacios”. Desde aquí espera “que esto nos ayude a abrir nuestras mentes, nuestros corazones, y a estar abiertos y receptivos a las transformaciones que están teniendo lugar en el mundo y en la Iglesia”. Como indígena, destaca la importancia de la presencia de los pueblos originarios en la CEAMA, como algo que puede “ayudar a ofrecer una visión de la vida, de la lucha, de las cosmovisiones, desde los pueblos originarios y las comunidades amazónicas”.

Estar en la CEAMA es una oportunidad para “traer a la memoria todo lo que nos hace sufrir y amenaza la vida de los pueblos y de este bioma”, para “defender sus territorios, defender la Amazonía, el ecosistema y los pueblos que viven aquí, defender nuestra casa común para que las generaciones futuras tengan vida”. Por ello, insiste en que “la Iglesia debe ser amiga y aliada de los pueblos de la Amazonía y de la Amazonía en su conjunto, para que así nos comprometamos a cuidar nuestra casa común”.

Comunicar en la Amazonía es “un gran desafío, porque cuando pensamos en esta región, es enorme, las distancias son una dificultad que encontramos para poder llegar donde suceden las cosas”. Las palabras de Joelma Viana nos ayudan a descubrir que en la comunicación amazónica “somos capaces de estar más cerca de la gente, escuchándola, pisando su terreno, compartiendo sus experiencias”, siempre en busca de una comunicación diferenciada. La locutora de radio insiste en que “cuando comunicamos desde la Iglesia en esta región amazónica, no estamos sólo para escuchar, para recoger testimonios. Es necesario estar cerca, compartir estos momentos, vivir estos momentos, compartir cada uno de estos momentos y aprender juntos”.

En la Amazonía, “esta comunicación acaba teniendo un significado mucho mayor, un sentido de compartir la vida de los demás”, de compartir la vida de los pueblos de la región. Según Joelma Viana, estos retos de la comunicación amazónica aumentan cuando la llevan a cabo las mujeres. Insiste en que el trabajo que realizan las mujeres es diferente porque las mujeres “son sensibles y consiguen acoger a los demás. Y tratamos de hacer esto, una acogida de las personas que están cerca de nosotros”.

En la Iglesia de la Amazonía, las mujeres que trabajan en la comunicación todavía se enfrentan al hecho de que “mucha gente no cree en el trabajo que realizan las mujeres”, dice Joelma. Con un papel destacado en la Red de Noticias de la Amazonía, que desde Santarem, en el estado de Pará, engloba a varias radios católicas de la región, afirma que “cuando miramos el escenario de la región y del propio Brasil, encontraremos pocas mujeres al frente de esta rama dentro de la Iglesia. Vemos más hombres en el proceso que mujeres. Ante esto, insiste en la necesidad de tener una mayor presencia de mujeres”.

En este avance, Joelma destaca la importancia del Papa Francisco, que “a partir del Sínodo de la Amazonía, y ahora también del próximo sínodo, que tiene a las mujeres representadas, termina fortaleciendo aún más este trabajo que venimos desarrollando en esta región, que es tan desafiante, pero al mismo tiempo es tan instigador”. Esto hace que las mujeres, insiste la locutora, “nos sintamos todo el tiempo motivadas a estar presentes, a estar compartiendo lo que aprendemos en nuestra vida diaria”.

Las mujeres refugiadas, las mujeres migrantes, las mujeres apátridas, “son mujeres persistentes, son resistentes, tienen una impresionante devoción por su vocación de mujeres y madres”. De ello habla la hermana Rosita Milesi, que dedica su vida a atender a quienes la sociedad desprecia y explota. En estas mujeres, la religiosa scalabriniana ve la presencia de alguien que supera “con esfuerzo, con dedicación, con cariño, con amor inconmensurable, todas las dificultades y penurias para poder atender, con un mínimo de dignidad, primero a sus hijos, luego a ellas mismas, buscando su reinserción, su reinício en la construcción de los caminos que la migración les impone”.

Este trabajo ha servido a la directora del Instituto de Migraciones y Derechos Humanos (IMDH) para experimentar hechos concretos que ayudan a “expresar mi convicción de lo mucho que actúan, buscan y superan estas mujeres”. Cuenta el caso de una madre que está en silla de ruedas y no puede desplazarse temporalmente. “Sin embargo, pasa la mayor parte del día buscando alternativas, buscando comida, trasladando a los amigos para ayudar a otros que están más necesitados que ella”, nos cuenta.

Son ejemplos que nos impresionan según la Hna. Rosita Milesi, pero que nos deben servir “como trabajadores humanitarios, para buscar cada vez con más convicción esta posibilidad, o este recurso que tenemos en nuestras manos, para ser servicio, para fortalecer nuestra misión y actuar según el llamado del Papa Francisco, y de tantos líderes que nos inspiran en este momento, buscando acoger con afecto, promover, y dar oportunidades, involucrar a estas mujeres para que pongan todas sus capacidades y talentos al servicio de los demás, como ellas generosamente saben hacer”.

Aprender a valorar y empezar a entender el proceso de lucha de las mujeres es algo que la Hna. Rose Bertoldo aprendió desde muy joven, en la cuna del hogar, observando a su madre que trabajaba con el Movimiento de Mujeres Campesinas en Rio Grande do Sul. Se acuerda mucho de “mi madre cuando salía a la calle en las movilizaciones en Porto Alegre para exigir la paga de maternidad y la jubilación”. Insiste en que “las mujeres nunca han ganado nada gratis, sino desde la lucha organizada”. Dice que “siempre he trabajado, en cada misión como mujer consagrada, a partir de la vida de las mujeres más sufridas, más empobrecidas, especialmente las niñas y las mujeres”, destacando su historia de “identificación de este trabajo de enfrentamiento con el abuso y la explotación sexual de niños y adolescentes y la trata de personas”, que hoy asume como su principal misión.

Como religiosa del Inmaculado Corazón de María, su misión ha sido en el “cuidado de la vida, centrada más en la cuestión de las violaciones de los derechos”. Dice que, poco a poco, “como mujer consagrada, me he insertado también en este movimiento de construcción de una Iglesia más centrada en los más empobrecidos, en los más vulnerables. Aquí se engloban también las mujeres”. Su trabajo en la Red Um Grito pela Vida, “ha sido desde esta sensibilidad de sentir el dolor de tantas niñas y mujeres”, viviendo esta opción de trabajo contra el tráfico de personas, como “una presencia profética, como Iglesia, como vida consagrada, como misionera, en esta Amazonía”.  

En la Amazonía, donde vive desde hace nueve años, ve que, sobre todo a partir del proceso de preparación del Sínodo, “se está construyendo una Iglesia que camina con la gente y que también forma parte de la gente”, donde se ha hecho posible “percibir más esta presencia de la mujer en la vida de la Iglesia, en la sociedad, y también percibir, a partir de las voces de las mujeres, cuánto dolor y sufrimiento han padecido las mujeres de la Pan-Amazonía”. La religiosa destaca que “el tema del abuso, la explotación sexual, la trata de personas, el feminicidio, son gritos inmensos que hemos escuchado”. En su trabajo en la Red Um Grito pela Vida, percibe “el rostro de Jesús, la presencia de Dios, el rostro sufriente en la presencia de las mujeres que están en situaciones de trata, en situaciones de abuso, en situaciones de explotación sexual”.

Rose Bertoldo dice que su misión es “ser esta presencia, ayudar, contribuir para que estas mujeres salgan de esta situación de violencia, reconstruyan sus vidas, que puedan también retomar, porque cada mujer es única, cada niña es única, y cada mujer revela la imagen de este Dios lleno de ternura, lleno de amor”. Por eso, “celebrar el 8 de marzo es revigorar, recordar toda la historia de la lucha de las mujeres y seguir creyendo”, insiste. Junto a ello, subraya la necesidad de la formación de otras mujeres “que puedan contribuir a los cambios, especialmente en lo que se refiere a la inclusión, de ser una presencia activa, efectiva y afectiva en los espacios eclesiales, pero también en muchos otros espacios de lucha, de construcción de la dignidad, no sólo de las mujeres, sino de todas las personas”.

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