Igreja – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Fri, 26 Apr 2024 18:16:17 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Igreja – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 Uma Igreja sinodal em missão https://observatoriodaevangelizacao.com/uma-igreja-sinodal-em-missao/ Fri, 26 Apr 2024 18:16:17 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.com/?p=49834 [Leia mais...]]]>

Uma Igreja Sinodal em Missão – Cartilha

Conheça a Cartilha “Igreja Sinodal em Missão” organizada pelo CNLB, Caritas Brasileira e CCB Jesuítas – Uma reflexão sobre a sinodalidade!

O Conselho Nacional do Laicato do Brasil (CNLB), a Caritas Brasileira e o Centro Cultural de Brasília (Jesuítas – Companhia de Jesus) lançaram a cartilha “UMA IGREJA SINODAL EM MISSÃO”. É possível fazer o download na versão digital bem como na versão para impressão, no site do CNLB.

A presidente do CNLB lembrou que a ideia de fazer uma cartilha para rezar e estudar o documento síntese da 1ª Sessão do Sínodo sobre a Sinodalidade surgiu em uma reunião do CNLB. “O Colegiado Deliberativo do Conselho fez a indicação de procurarmos a Caritas Brasileira e os Jesuíta para construção desse instrumento de oração, estudo e reflexão”, enfatizou Sônia Gomes.

Padre Miguel Martins, jesuíta, tem a expectativa de que, de modo especial, os cristãos leigos e leigas, possam se utilizar dessa cartilha se apropriar dos conteúdos do relatório síntese da 1ª Sessão do Sínodo da Sinodalidade. “O processo sinodal não é um evento. É um modo de ser Igreja que inclusive nós aqui no Brasil já vivemos. Mas precisamos reavivar isso, esse modo de ser igreja, que é um modo de participação de todos, para que todos tenham voz e vez”, destacou o jesuíta.

Marilza Schuina da Comissão de Assessoria Permanente (CAP) do CNLB lembra que a cartilha quer ajudar a aprofundar as questões que o Sínodo sobre Sinodalidade aponta a partir da realidade em que vivemos. “Nossa expectativa é que esta cartilha favoreça que os cristãos leigos e leigas, nas comunidades, movimentos e pastorais possam refletir sobre os temas apresentados no relatório síntese da primeira sessão sinodal”, finalizou Schuina.

 

O porquê da Cartilha “Uma Igreja Sinodal em Missão” …

Este subsídio deve ajudar as pessoas por meio da leitura orante, dos círculos bíblicos, textos, cantos e outros instrumento para uma reflexão orante do relatório síntese da 1ª Sessão do Sínodo sobre a Sinodalidade. “Aproximar aqueles e aquelas dos mais distantes lugares para refletir e ler o relatório síntese, entender o que é uma Igreja sinodal e assim ajudar a viver esse jeito de ser Igreja na prática”, destacou Sônia Gomes.

Já Marilza Schuina reforça que o objetivo da Cartilha não é apenas responder as questões do relatório, mas refletir e debater como podemos ser uma Igreja verdadeiramente Sinodal na sua essência, uma Igreja povo de Deus, de comunhão, participação e missão.

Como utilizar a Cartilha?

A Cartilha tem linguagem de fácil entendimento e muito simples de utilizar. Assim sendo, o jesuíta Miguel Martins, nos lembra que esse instrumento pode ser usado nos encontros dos grupos de jovens, das pastorais, dos movimentos, das CEBs. São 20 capítulos com temas ligados ao relatório síntese da 1ª Sessão do Sínodo da Sinodalidade. “Os animadores de comunidades, lideranças das pastorais, organismos, serviços, movimentos e demais forças vivas da Igreja são sujeitos eclesiais que podem liderar essa reflexão em seus espaços e assim ajudar na espiritualidade sinodal, nosso jeito de viver a fé”, reforçou padre Miguel.

Sônia Gomes nos lembra que a Cartilha pode ser usada em todos os espaços que participamos inclusive nos novos areópagos como a internet. “A cartilha pode inclusive ser usada em nossas reuniões virtuais para reflexão da Igreja Sinodal em comunhão com o Sínodo da Sinodalidade”, finalizou a presidente do CNLB.

Fonte: Conselho Nacional do Laicato do Brasil

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Dom Luis Marín: Sinodalidade, um processo espiritual e eclesial onde ninguém é excluído. https://observatoriodaevangelizacao.com/dom-luis-marin-sinodalidade-um-processo-espiritual-e-eclesial-onde-ninguem-e-excluido/ Thu, 03 Nov 2022 22:19:24 +0000 https://atomic-temporary-74025290.wpcomstaging.com/?p=46375 [Leia mais...]]]> No Angelus de 16 de outubro, o Papa Francisco anunciou que a Assembleia Sinodal para os Bispos do Sínodo sobre a Sinodalidade acontecerá em duas etapas, a já marcada para outubro de 2023, de 4 a 29, e uma segunda em outubro de 2024. Não é o Sínodo da Igreja como tal que foi  estendido, mas a Assembleia Ordinária do Sínodo dos Bispos, de acordo com Dom Luis Marín de San Martín.

O Sínodo já está em andamento

O bispo agostiniano sublinha que “o Papa não ampliou o Sínodo, porque não precisa ampliá-lo, pois é a Igreja, a Igreja inteira, que é sinodal. Para perceber isso, basta ler os Padres e estudar a história, desde os primeiros tempos do cristianismo até o Concílio Vaticano II”. Portanto, se a Igreja é sempre e toda sinodal, “não é possível identificar o sínodo ou a sinodalidade somente com os bispos”. O processo em andamento está orientado “para fortalecer a realidade sinodal da Igreja e o que ela implica para todos os batizados. Já estamos no Sínodo, não em sua preparação”.

Neste sentido, Dom Marín de San Martín sublinha que “o que o Papa ampliou de fato foi o tempo da Assembleia do Sínodo dos Bispos”, mais um elemento, “muito importante, mas mais um elemento, em uma Igreja que é constitutivamente sinodal”. E especifica que “não haverá duas assembleias diferentes, como foi o caso do Sínodo da Família (uma extraordinária e outra ordinária), mas uma única Assembleia, a mesma Assembleia, em duas sessões”.

As razões para uma extensão

Esta iniciativa foi tomada pelo Papa Francisco, diz o subsecretário do Sínodo, “considerando a importância do desenvolvimento da sinodalidade e o quanto é essencial realizar um discernimento calmo, profundo e sereno, ouvindo o Espírito”. O objetivo é tornar o lema do Sínodo uma realidade: “Por uma Igreja sinodal: comunhão, participação e missão”.

Não é uma questão de “manter o dossiê”, diz ele. “O Papa quer cuidar da qualidade deste processo”, porque “a pressa é sempre um mau conselheiro.  Algo importante precisa de tempo. Não podemos ir a um ritmo rápido, com etapas de queima às vezes em períodos muito curtos”. Neste sentido, é fundamental “ter paz e tranquilidade e tempo para discernir juntos, ouvir a voz do Espírito, escutar uns aos outros, ver quais realidades precisam ser fortalecidas, quais outras precisam ser mudadas, quais precisam ser vividas de uma maneira diferente. E, desta forma, tomar decisões”.

Buscamos “coerência, sempre em unidade com Cristo e com nossos irmãos e irmãs. A partir disto deve fluir um claro impulso evangelizador”. O prelado agostiniano considera muito importante “não nos fecharmos em nossos títulos, mas, ao contrário, sairmos para evangelizar, como fizeram os primeiros cristãos: com palavra, testemunho e vida. Envolvendo a todos, respeitando os diferentes carismas e vocações, curando as feridas. Passando de uma perspectiva estática e defensiva para uma perspectiva dinâmica e integradora”.

Dom Luis Marín de San Martín é claro em dizer que “A verdade não é uma ideia, mas uma pessoa, um amor encarnado, que triunfa sobre a morte, sobre tudo o que é morte na sociedade, na cultura, nas relações internacionais e econômicas, no mundo”.  A resposta urgente que nos compromete é a sinodalidade, “que implica estarmos unidos no Cristo Ressuscitado, inseparáveis de seu corpo, que é a Igreja, de nossos irmãos e irmãs. Significa caminhar ao lado deles e com eles. O cristianismo não é uma religião de elites”.

Um desafio de extraordinária beleza

O subsecretário do Sínodo acolhe com alegria esta decisão do Papa, “o que nos faz perceber a importância deste processo e, acima de tudo, a oportunidade que temos. É uma possibilidade que nos é oferecida pelo Espírito Santo, um kairos, um tempo de graça, um verdadeiro presente de Deus”. Isto o leva a assinalar que “é o Senhor quem bate à porta e nos encoraja a viver nossa fé com coerência, a ser uma Igreja santa e evangelizadora”. Ele insiste que estamos em um momento crucial na história da Igreja.

É por isso que o subsecretário do Sínodo lamenta que alguns cristãos, especialmente alguns padres, tenham medo ou desconfiem deste processo e assumam uma postura passiva, se não mesmo obstrutiva. “Por que pensamos que o Sínodo pode subverter a moralidade ou destruir a Igreja? Será porque não confiamos no Espírito Santo e perdemos a dimensão orante e espiritual; a experiência de Cristo, em quem vivemos, nos movemos e existimos? Ou talvez seja irritante que nos tire de nossa zona de conforto e nos obrigue a mudar atitudes e caminhos profundamente enraizados? Nossa única segurança é o Senhor e nosso ministério é o serviço. Sem anulá-lo ou traí-lo, mas inserindo-o na Igreja”. É por isso que ele insiste que “cada um de nós deve responder a Deus: eu tenho sido um canal de graça ou tenho bloqueado a ação do Espírito? É uma grande responsabilidade”.

A “civilização do amor” não cumprida

Na linha de São Paulo VI, quando ele falou da “civilização do amor”, para Dom Marín de San Martín é necessário passar da cultura do confronto para a cultura da fraternidade, na qual a unidade pluriforme da Igreja é assumida e expressa. “O outro, mesmo que pense diferente, é meu irmão, não meu inimigo. Se houver diferenças de qualquer tipo, oremos, procuremos juntos a luz do Espírito. Mas como irmãos. Só assim poderemos celebrar a Eucaristia de forma coerente e rezar sinceramente o Pai Nosso”. O subsecretário do Sínodo pede a participação como forma de fortalecer o sentido de comunidade. “Não deixemos o processo sinodal para grupos de pressão, ou limitado a setores fortemente ideologizados de uma forma ou de outra. É um processo espiritual e eclesial, no qual ninguém (e eu sublinho “ninguém”) é excluído”. É um convite “a toda a Igreja, a todos os cristãos: em Cristo e com Cristo. A toda a Família de Deus, porque a Igreja é uma família, um lar e não uma trincheira”.

Dom Luis Marín de San Martín vê isso claramente como um processo de autenticidade, “de renovação radical”, e considera necessário que “assumamos com confiança e coragem o risco da reforma à qual ela nos conduz. O Espírito Santo não é nosso funcionário. Ele lidera, ele guia”.

Depois da fase diocesana, o que segue?

O subsecretário do Sínodo teve a oportunidade de explicar aos bispos e aos referentes do Sínodo que “a síntese elaborada pela respectiva Conferência Episcopal nunca deve ser um ponto de chegada, um documento a ser colocado na prateleira ou guardado no armário. É um ponto de partida, um instrumento para continuar a caminhar com ele”.

Em uma primeira linha de ação, o prelado agostiniano incentiva as dioceses e as conferências episcopais a desenvolver estes documentos, estas sínteses, que ele considera “verdadeiramente preciosas, de grande riqueza, onde as luzes e as sombras de nosso tempo se refletem”. Por esta razão, ele os chama a aceitar “como a voz do Povo de Deus, com suas deficiências e limitações, com sua grandeza e suas possibilidades”. Estas sínteses “podem ajudar a estabelecer planos pastorais”. A fase diocesana “concluiu, mas não o processo que gerou, ou seja, o processo de escuta e participação em uma Igreja viva”. Por esta razão, ele insiste que “as decisões devem agora ser tomadas em nível local, diocesano e de conferência episcopal”.

Os desafios da etapa continental

A segunda e muito importante linha de ação é aquela que corresponde à etapa continental, que agora está começando. O subsecretário do Sínodo nos lembra que “estas não são fases fechadas em si mesmas que seguem uma após a outra como eventos; é um processo que está se desdobrando, progredindo, se desenvolvendo”. Para levar adiante esta etapa, no dia 27 de outubro será apresentado um Documento de Trabalho, que “não é um texto teológico, nem um documento magisterial, mas foi elaborado com base nas sínteses que nos foram enviadas pelas Conferências Episcopais, a Cúria Romana, a vida consagrada, os movimentos leigos, o continente digital”.

Com tudo isso, a Secretaria do Sínodo oferece agora “um documento que nos ajuda a continuar ouvindo, dialogando e discernindo, permitindo que o Povo de Deus fale”. Ele considera que, “de certa forma, é uma restituição em um processo circular. Recebemos a voz do Povo de Deus e agora a estamos enviando de volta às dioceses através deste documento que terá que ser aprofundado em todos os níveis”.

A particularidade desta etapa é que “a reflexão e o discernimento levarão em conta as particularidades, os desafios e a realidade de cada continente”. São sete: América do Norte, América Latina e Caribe, Europa, África, Ásia, Oceania e as Igrejas do Oriente Médio. Talvez o chamado “continente digital” deva ser incluído. Segundo Dom Marín, “cada um tem suas próprias características”, e a proposta agora é “escutar e refletir para discernir que desenvolvimentos são necessários em cada um desses continentes para conseguir um testemunho vivo e alegre da fé, levando em conta a diversidade de cultura, tradição e história”. E o que pode ser contribuído para a Igreja universal de cada continente”.

O subsecretário do Sínodo sugere “uma leitura orante do documento e a escuta do Espírito. Em seguida, podemos nos perguntar: Que insights ou inovações ajudam a realidade eclesial em meu continente? Que desafios eles nos colocam? Que propostas concretas devemos fazer ao Sínodo dos Bispos para o bem de toda a Igreja?”

Os passos de um caminho

A etapa continental se estende do final de outubro de 2022 até 31 de março de 2023. A responsabilidade de organizá-la, em ligação com a Secretaria Geral do Sínodo, cabe à respectiva Conferência Episcopal continental. Em cada um dos continentes “será convocada uma assembleia no final (fevereiro ou março) na qual participarão representantes do Povo de Deus, em suas diferentes vocações e realidades”. A isto se seguirá uma reunião continental de bispos, “que são os pastores e que devem fazer seu próprio discernimento depois de escutar o resto do Povo de Deus”.

Cada Conferência Episcopal continental elaborará um documento, de cerca de vinte páginas, a ser enviado à Secretaria do Sínodo até 31 de março. Dom Marín comenta que “a partir dos 7 documentos recebidos, a Secretaria redigirá o Instrumentum laboris, que será apresentado em junho de 2023, para trabalhar na primeira etapa da Assembleia do Sínodo dos Bispos, de 4 a 29 de outubro”. A Secretaria do Sínodo montou uma equipe de coordenação de 3 pessoas. As Conferências Episcopais Continentais também foram convidadas a nomear sua própria equipe para que possam se inter-relacionar e ajudar “este horizonte de esperança a dar muitos frutos na Igreja, com a colaboração de todos”.

Dom Luis Marín de San Martín conclui expressando sua disponibilidade e a da Secretaria do Sínodo para resolver dúvidas e ajudar no que for necessário. “Queremos realmente ser companheiros ao longo do caminho”.

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Assembleia Eclesial: oportunidade para “escutar a polissemia do Povo de Deus” https://observatoriodaevangelizacao.com/assembleia-eclesial-oportunidade-para-escutar-a-polissemia-do-povo-de-deus/ Sun, 27 Feb 2022 12:00:00 +0000 https://atomic-temporary-74025290.wpcomstaging.com/?p=44028 [Leia mais...]]]> Reflexionar sobre os desafios e perspectivas da Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe foi o propósito da Aula inaugural do Instituto São Paulo de Estudos Superiores (ITESP), que está completando 50 anos de caminhada. O palestrante foi Dom Vicente de Paula Ferreira, bispo auxiliar de Belo Horizonte que vê na Assembleia Eclesial uma oportunidade de escutar o povo de Deus na sua totalidade e variedade. Acompanhe a matéria de Luis Miguel Modino:

Não se instalar na comodidade

O bispo partiu do contexto da Assembleia Eclesial, convocada pelo Papa Francisco em 24 de janeiro de 2021, com o tema “Somos todos discípulos missionários em saída”, inspirada na eclesiologia do Concílio Vaticano II e na Conferência de Aparecida.

A assembleia aconteceu em formato híbrido, virtual e presencial, com um pequeno grupo na sede da Conferência Episcopal Mexicana, de 21 a 28 de novembro de 2021, com uma presença aproximada de mil pessoas, a maioria homens, membros da hierarquia. Dom Vicente vê a Assembleia Eclesial como uma oportunidade para “escutar a polissemia do Povo de Deus em nosso Continente, em suas alegrias e preocupações”, que antecedeu o Sínodo sobre a Sinodalidade que acontecerá em 2023.

O tema nos leva a refletir sobre o número 383 do Documento de Aparecida, que afirma que “a Igreja necessita de forte comoção que a impeça de se instalar na comodidade, no estancamento e na indiferença, à margem do sofrimento dos pobres do Continente”. Daí que o bispo auxiliar de Belo Horizonte considere a Assembleia Eclesial como “o desejo de transbordar a caminhada já feita, avançando em pontos importantes”.

Após apresentar a metodologia da Assembleia, com palestras, testemunhos, celebrações e reuniões em grupos, e os 12 desafios ou perspectivas surgidos da Assembleia, o bispo refletiu sobre questões emergentes para a Evangelização em nosso continente, uma abordagem feita desde duas perspectivas, a conjuntura socioambiental e eclesial.

Subserviência ou soberania?

Na análise socioambiental Dom Vicente de Paula Ferreira refletia sobre aquilo que considera uma clara expressão do capitalismo neoliberal: um por cento da população domina a terra, até o ponto que uma dezena de pessoas controlam riquezas equivalentes ao que possuem outros 50%. O modo de dominar é pela violência em relação aos povos e territórios, “um cenário reforçado por emergências de grupos radicais de extrema direita que estão a serviço desse discurso autoritário capitalista”, segundo o bispo.

Diante dessa realidade, o continente Latino-americano e Caribenho busca, segundo o bispo auxiliar de Belo Horizonte, “sua sobrevivência na grande tensão: ou continuar subserviente ao Norte mundial ou assumir caminhos de soberania”. Diante da destruição dos direitos humanos e ambientais no Brasil, o bispo advertiu do perigo da barbárie fascista. Frente a isso disse sonhar com uma contra hegemonia, nascida dos movimentos sociais e de reações democráticas.

Cisma latente

Em relação à Igreja, Dom Vicente de Paula falou das três conversões profetizadas pelo Papa Francisco: Eclesiológica (Evangelii Gaudium), Ecológica (Laudato Sì) e Cultural (Fratelli Tutti), afirmando existir pessoas, grupos, redes que se empenham nessa direção, citando exemplos disso. Mas também relatava a existência de grupos fechados, centrados no culto, alienados da vida, com uma fé sem a dimensão política, uma espiritualidade da prosperidade, reprodutora do sistema de consumo, o que tem como resultado um cristianismo de consumo.

O bispo chegou a falar de uma perseguição aos que buscam uma Espiritualidade socio-ambiental-transformadora, imagem do Reino de Deus. Isso se manifesta em um “cisma latente entre nós”. Existem, segundo Dom Vicente de Paula, “tribunais da fé representados por grupos ou influencers do ‘verdadeiro sagrado’, que se julgam legítimos defensores de Deus, da Pátria e da família”.

Igreja com rosto Latino Americano e Caribenho

Finalmente apontou o que ele considera algumas questões cruciais para a eclesiologia do futuro. Dentre outros colocou o protagonismo de todo batizado como ruptura do clericalismo; o fortalecimento de uma Igreja com rosto Latino Americano e Caribenho decolonial, que ele definiu como indígena, preta e feminina; uma Comunicação Popular Libertadora, com cidadania eclesial de todos, como confronto à manipulação das narrativas espiritualistas de muitos meios de comunicação, verdadeiros promotores de influencers digitais sagrados; investimento nas comunidades eclesiais de base como superação do cristianismo de massa.

Junto com isso, uma Teologia da Libertação Renovada como promoção de uma Igreja socioambiental transformadora, com a ecologia integral como elemento transversal; a ministerialidade das mulheres como urgente superação do machismo; a inclusão das reivindicações LGBTQIA+ como forma de superação da homofobia eclesial; a recepção da Amoris Laetitia, que leve a refletir sobre a segunda união matrimonial e a ordenação de homens casados.   

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pe. Luis Miguel Modino
Natural da Espanha, é missionário Fidei Donum na Diocese de São Miguel da Cachoeira, Amazonas. É parceiro do Observatório da Evangelização e articulista em diversos periódicos e revistas virtuais católicas.

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“Templos, Igrejas e protestos”, com a palavra Ir. Marcelo Barros https://observatoriodaevangelizacao.com/templos-igrejas-e-protestos-com-a-palavra-ir-marcelo-barros/ https://observatoriodaevangelizacao.com/templos-igrejas-e-protestos-com-a-palavra-ir-marcelo-barros/#comments Fri, 11 Feb 2022 12:46:15 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=43396 [Leia mais...]]]> Diante das discussões sem profundidade do fato ocorrido na Igreja do Rosário em Curitiba, um protesto contra a banalização da violência e das manifestações crescentes de racismo em nosso país, protesto pela dignidade da vida e do povo negro, convidamos você a ler o artigo do monge beneditino Marcelo Barros: “Em Roma, o papa Francisco pode considerar prioritário dialogar com movimentos populares e defender a vida de migrantes africanos, mas essa não é ainda a sensibilidade de muitos ministros e fieis católicos no Brasil. As pastorais sociais da CNBB e muitos padres e agentes de pastoral participaram dos atos de protesto e de denúncia contra o racismo. Muitos religiosos gritaram com as organizações populares que “vidas negras importam”, mas para muitos cristãos, católicos e evangélicos, esse assunto parece não fazer parte do anúncio da fé e da missão da Igreja... Originalmente, o Cristianismo não tinha templos e sim Igrejas. Enquanto os santuários se colocam como locais sagrados, Igrejas significam espaços de assembleia. Quando o apóstolo Paulo chamou as comunidades às quais escrevia de Igrejas, estava afirmando que eram assembleias de pessoas não reconhecidas como cidadãs pelo império, mas que nas comunidades cristãs, podiam se reunir e se manifestar como assembleias de cidadãos e cidadãs do reinado divino no mundo. Ainda hoje, quando manifestantes ocupam uma Igreja, de alguma forma, interpelam aos senhores do templo: Qual é o sentido e a missão da Igreja?

Confira na íntegra a reflexão de Marcelo Barros:

Manifestação Justiça por Moise, em Curitiba — Foto: Victor Hugo/RPC

Templos, Igrejas e protestos

Ir. Marcelo Barros

Nesses dias, a imprensa ávida por qualquer notícia sensacionalista que legitime denúncias contra movimentos populares e partidos considerados de esquerda, se deleitou com imagens e narrativas do que chamaram de invasão de uma Igreja em Curitiba. Autoridades eclesiásticas e civis protestaram contra o desrespeito ao lugar sagrado e o assunto está sendo debatido na própria câmara de vereadores da cidade.

O debate se dá sobre o fato dos manifestantes terem entrado na Igreja depois da Missa e terem expressado dentro do templo a denúncia contra o assassinato truculento e cruel de Moise, jovem congolês, barbaramente torturado e assassinado, em um quiosque na Barra da Tijuca. Nestes mesmos dias, ocorreu também, no Rio de Janeiro, a morte de outro negro, baleado por vizinho policial, que o confundiu com um ladrão. Naquele final de semana, em diversas regiões do Brasil, ocorreram manifestações de protestos contra esses atos extremos de racismo contra negros. Em Curitiba, no centro histórico da cidade, o ato se reuniu em frente a uma Igreja, que, historicamente, pertenceu a uma confraria negra. Depois do horário da missa, no final da tarde, os manifestantes entraram na Igreja e encerraram ali o seu protesto pacífico.

Sobre o fato, podem se fazer várias considerações. Antes de tudo, em termos metodológicos e estratégicos, organizações populares e partidos progressistas tomaram posições críticas em relação ao ocorrido. De fato, o grupo que fazia a manifestação não sofreu nenhuma perseguição, não fugia de nenhuma repressão e não precisava ter ocupado a Igreja, sem permissão dos responsáveis pelo templo.

Do ponto de vista institucional, todos sabem que a maioria dos eclesiásticos católicos concorda que Igrejas sejam usadas para missas de posse de governadores ou prefeitos de direita. No entanto, considera desrespeito ao lugar sagrado qualquer manifestação de categorias populares que possa ser vista como sendo de esquerda.

Em Roma, o papa Francisco pode considerar prioritário dialogar com movimentos populares e defender a vida de migrantes africanos, mas essa não é ainda a sensibilidade de muitos ministros e fieis católicos no Brasil. As pastorais sociais da CNBB e muitos padres e agentes de pastoral participaram dos atos de protesto e de denúncia contra o racismo. Muitos religiosos gritaram com as organizações populares que “vidas negras importam”, mas para muitos cristãos, católicos e evangélicos, esse assunto parece não fazer parte do anúncio da fé e da missão da Igreja.

Sonhamos com tempos nos quais padres e bispos não somente não se oponham, como fiquem felizes quando suas Igrejas forem ocupadas pacificamente por grupos populares que defendem a justiça e a vida para todas as pessoas humanas e na comunhão com todos os seres vivos.
Ir. Marcelo Barros

Na época da ditadura militar brasileira, em Recife, estudantes que protestavam contra a repressão ocuparam uma Igreja no centro da cidade. Assim que soube, o próprio arcebispo Dom Helder Camara foi para a Igreja e se colocou lá ao lado dos estudantes até conseguir que eles pudessem sair do templo em segurança. O mesmo ocorreu em Salvador, BA, onde a Igreja ocupada pelos rapazes e moças foi a basílica do Mosteiro de São Bento. O abade Dom Timóteo Amoroso Anastácio não somente abriu as portas da Igreja, como declarou o Mosteiro como espaço de abrigo e santuário de proteção da juventude. Do mesmo modo, em São Bernardo do Campo, em 1980, a Igreja Matriz foi abrigo para assembleias dos metalúrgicos em greve perseguidos pela ditadura.

Atualmente, embora em outro contexto político, a sociedade tem direito de cobrar dos responsáveis das Igrejas a coerência profética com o evangelho de libertação. Originalmente, o Cristianismo não tinha templos e sim Igrejas. Enquanto os santuários se colocam como locais sagrados, Igrejas significam espaços de assembleia. Quando o apóstolo Paulo chamou as comunidades às quais escrevia de Igrejas, estava afirmando que eram assembleias de pessoas não reconhecidas como cidadãs pelo império, mas que nas comunidades cristãs, podiam se reunir e se manifestar como assembleias de cidadãos e cidadãs do reinado divino no mundo. Ainda hoje, quando manifestantes ocupam uma Igreja, de alguma forma, interpelam aos senhores do templo: Qual é o sentido e a missão da Igreja?

Ao mesmo tempo que desejamos que os movimentos populares sempre se esmerem por respeitar educadamente a todos os ambientes e deem exemplo de diálogo com todas as pessoas com as quais se encontram, pedimos a Deus que os discípulos de Jesus aceitem retomar o caráter profético da fé cristã.

Mesmo se a postura do arcebispo e da arquidiocese de Curitiba tem sido, em geral, mais aberta e solidária, sonhamos com tempos nos quais padres e bispos não somente não se oponham, como fiquem felizes quando suas Igrejas forem ocupadas pacificamente por grupos populares que defendem a justiça e a vida para todas as pessoas humanas e na comunhão com todos os seres vivos.

Sobre o autor:

Marcelo Barros

Ir. Marcelo Barros é monge beneditino, escritor e teólogo biblista brasileiro. Em 1969 foi ordenado padre por dom Helder Camara e, durante quase dez anos, de 1967 a 1976, trabalhou como secretário e assessor de dom Helder para assuntos ecumênicos. É membro da Comissão Teológica da Associação Ecumênica dos Teólogos do Terceiro Mundo (ASETT), que reúne teólogos da América Latina, África, Ásia e ainda minorias negras e indígenas da América do Norte. Assim, em seu blog, ele se define: “Sou monge beneditino, chamado a trabalhar pela unidade das Igrejas e das tradições religiosas. Adoro os movimentos populares e especialmente o MST. Gosto de escrever e de me comunicar”. Marcelo recebeu, em 2021, o título de doutor Honoris Causa pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB. Dentre seus mais de 50 livros publicados, artigos e assessorias, destacamos aqui: Teologias da Libertação para os nossos dias (Vozes, 2019); com Emerson Sbardelotti e Edward Guimarães, organizou com mais de 40 autores, 50 anos de Teologias da Libertação. Memórias, revisão, perspectivas e desafios (Recriar, 2022).

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“O papa Francisco, a Igreja e alguns desafios da evangelização hoje”, com a palavra Reginaldo Martins da Silva https://observatoriodaevangelizacao.com/o-papa-francisco-a-igreja-e-alguns-desafios-da-evangelizacao-hoje-com-a-palavra-reginaldo-martins-da-silva/ Thu, 16 Sep 2021 14:10:06 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=40957 [Leia mais...]]]> O texto a seguir foi elaborado pelo aluno Reginaldo Martins da Silva para o seminário promovido pela disciplina Pedagogia Dialógica Participativa, Corresponsabilidade e Ação Pastoral, ministrada pelo prof. dr. Edward Guimarães no curso de pós-gradução em Teologia Pastoral da PUC Minas.

Confira:

O papa Francisco, a Igreja e alguns desafios da evangelização hoje

INTRODUÇÃO

A experiência sinodal, o desafio de caminharmos juntos, faz parte da autocompreensão da Igreja de Cristo. Enquanto prática pode-se dizer que ela esteve presente na caminhada da Igreja, de modo especial, em seus primórdios. Podemos dizer também que a sinodalidade continuou e continua a acontecer em muitas dinâmicas eclesiais, na caminhadas de muitas comunidades, paróquias, dioceses, congregações religiosas, pastorais, grupos e movimentos… Embora não de maneira hegemônica, mas minoritária. Desde do século IV, o que predominou na história do Cristianismo foi uma compreensão hierárquica e, quase sempre, clerical. Foi no Concílio Vaticano II, com seu impulso de volta às fontes, que se afirmou uma eclesiologia Povo de Deus que caminha junto. A sinodalidade, o caminhar juntos, é o que nos faz celebrar a capacidade de avaliar, ponderar e atualizar o mandato de Jesus: Ide e fazei discípulos meus em todos os povos (Mt 28,19a) com um discernimento espiritual, comunitário e apostólico.

A sinodalidade no contexto eclesial atual vem ganhando muita força com o pontificado do papa Francisco. Segundo Dianich, “o papa argentino desenvolve um magistério em movimento centrado no Evangelho e na evangelização, com forte acento querigmático. A sinodalidade na vida da Igreja vai sendo percebida como decisiva para a realização de sua missão e designa um jeito de caminhar participativo e corresponsável em todos os níveis.

Segundo a afirmação do papa Francisco, na comemoração pelos 50 anos da instituição do Sínodo dos bispos, “o caminho da sinodalidade é o caminho que Deus espera da Igreja do terceiro milênio”. Ele nos aponta que a sinodalidade não é somente um modo de operar a vida da Igreja, trata-se de uma dimensão constitutiva da Igreja, por isso se apresenta como caminho da Igreja para o terceiro milênio.

Diante de um tema tão caro, como a sinodalidade pode contribuir com a Igreja para que ela seja mais próxima a vida cotidiana das pessoas? E como estabelecer um diálogo cheio de sentido para um possível viver e caminhar juntos? E como integrar na evangelização a realidade digital que cada vez mais entra na dinâmica da vida da gente?

DESENVOLVIMENTO

Não existe um resposta definitiva para essas questões, mas o papa Francisco vem nos convidando em seu pontificado a fazermos a experiência de um Deus amoroso e misericordioso e que provoca em nós alegria e um espírito missionário para irradiar a boa notícia do amor de Deus por nós. Jesus, sendo a plenitude de toda a revelação de Deus, demonstra em sua pessoa o máximo do amor divino. Sua morte expressa seu ato de compaixão por toda a humanidade, uma entrega de si em amor ao outro. Deste modo, provoca em nós essa saída de nós mesmos, porque Deus é saída de si.

A eclesiologia criativa do papa Francisco

O papa Francisco fala, então, do desafio de concretizarmos uma “Igreja em saída”. Com essa metáfora “Igreja em saída”, o Papa convida toda Igreja a viver um despojamento, sobretudo no que toca à questão da autorreferencialidade, revestindo-nos do serviço, assumindo a Cruz de Cristo por meio daqueles que mais sofrem e se encontram nas diversas situações de periferias. Uma Igreja pobre e para os pobres, essa é a Igreja que o papa quer apresentar para o mundo, uma Igreja transbordante de misericórdia.

Em seu pontificado, traz para o centro a questão dos pobres que são os destinatários preferenciais da vida de Jesus.

Saiamos, saiamos para oferecer a todos a vida de Jesus Cristo! – Prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças. Não quero uma Igreja preocupada com ser o centro, e que acaba presa no emaranhado de obsessões e procedimentos. Se alguma coisa nos deve santamente inquietar e preocupar a nossa consciência é que haja tantos irmãos nossos que vivem sem força, sem luz e a consolação da amizade com Jesus Cristo, sem uma comunidade de fé que os acolha, sem horizonte e sentido de vida.[1]

Papa Francisco, Evangelii Gaudium, n. 49

Francisco quer dar um enfoque para uma Igreja aberta ao novo, capaz de transformar as realidades e resgatar a esperança por meio do encontro com o outro. Diante disso, urge a Igreja para que faça do ser humano o seu caminho, devolvendo-lhe sua dignidade. Uma Igreja samaritana, companheira de caminho de toda a humanidade, especialmente dos que mais sofrem. Uma igreja cuidadora, que promove e defende a vida em todas as suas fases e o planeta como sua casa comum.

Deste modo, nossa missão enquanto Igreja é exercer um serviço pastoral onde teremos a possibilidade de mediar este processo de conversão de mentalidade nas pessoas e nos grupos eclesiais e instaurar um processo metodológico de acompanhar-discernir-integrar. Ou seja, ser capaz de gerar no outro, um Outro, uma nova vida. Não podemos esquecer que a obra é de Deus. Ele “primereia” (toma a iniciativa). A nós compete favorecer a dinâmica pascal revelada na Eucaristia. Gerar outro é se dar, partindo-se. Isso forma uma nova comunhão. Ele espera que sejamos capazes de nos doar gratuitamente como Ele. Afinal, Deus não pede nada mais do que Ele já tenha dado.

O teólogo Cesar Kusma, ao falar sobre as Provocações eclesiológicas do papa Francisco a partir da Evangelli Gaudium, diz:

A Igreja “em saída” também será uma Igreja mãe de portas abertas (EG 46). Uma casa paterna/materna, ao modo da casa do filho pródigo (cf. Lc 15, 11-32), que está aberta para acolher a todos e, na abertura, coloca-se em sinal de espera, de atenção a tudo o que circunda o seu existir. Não se trata de uma espera passiva, mas ativa, inquieta, que se antecipa ao encontro e vai em direção dos que mais precisam e estão fadigados pelo cansaço da vida (cf. Mt 11,28). É a igreja mãe que sai e se dispõe a enxugar as lágrimas, a curar as feridas, a dar consolo e abrigo, fazendo de sua casa a casa de todos. A Igreja entendida como mãe não ajudará aqueles que dela se aproximam, pois não é a este fim que ela foi enviada, mas para acolher no mesmo amor que a impulsiona, que regenera e que faz novas todas as coisas (cf. Ap 21,5). A Igreja não é uma alfândega, mas a casa paterna, onde há lugar para todos com a sua vida fatigosa (EG47).[2] 

KUSMA, 2014, p. 199.

O ambiente digital como espaço da evangelização

Falar do ambiente digital diante da realidade apresentada refere-se de modo concreto à ação da Igreja em continuidade com a missão de Jesus. A cultura digital se apresenta como parte integrante e imprescindível a ser considerada e refletida como contexto e nova ambiência, na transmissão da fé, na sociedade pós-moderna.

Assim, falar de cultura digital implica acompanhar a evolução não somente das teorias de comunicação, o aspecto tecnológico, mas dos paradigmas pelos quais passa o processo de comunicação até chegar o momento atual, este que se vive hoje, chamado de cultura digital. Isso significa não somente conhecer e compreender o momento atual, mas a exigência de um olhar que percebe a necessidade de uma mudança de mentalidade nos processos comunicativos, isto é, que toca profundamente o desenvolver, o atuar do binômio comunicação/evangelização.

Uma das características deste ambiente digital é a ideia de síntese, como processo de um único elemento; as tecnologias e linguagens convergindo para o ambiente digital. A ideia da digitalização de tudo, processos práticos que têm ganhado espaço em nosso meio. Informação disponível por toda parte, difícil de proteger e impossível de controlar.

Segundo aspecto é a ideia da conectividade. A forma de contato se torna cada vez mais simples e mais rápida. Aqui há uma mudança na relação com o conhecimento e com o outro. Nos processos de comunicação atuais não há mais controle; quem define são as redes, ou seja, todos aqueles que acessam essa rede. Com muitas pessoas conectadas, o processo do conhecimento se torna cada vez mais fortalecido. Veja, por exemplo, a Wikipédia.

Outro conceito, o de ubiquidade, é aquele em que se está em toda parte ao mesmo tempo, ou seja, um novo conceito de mobilidade. Nós nos tornamos seres que estão em toda parte e em qualquer momento. Os processos de comunicação são móveis. A dicotomia online e off-line cai em desuso, pois estamos numa vida conectada, sobretudo as nossas relações eclesiais, diante da instantaneidade, simultaneidade e efemeridade. As informações que nos cercam não são suficientes, precisamos estar logado para sermos renovados a todo instante.

A ideia de autonomia para as pessoas torna a pessoa empoderada em produzir conteúdo. A isso chamamos de autocomunicação de massa. Os processos de participação são revistos, pois o sujeito é ativo, quer colocar a mão na massa. Uma geração que exige o fazer, sobretudo na linguagem digital.

No contexto religioso, ao falarmos dessa cultura digital, o conceito de enculturação digital também se faz presente neste ambiente. Papa Francisco cita, na Evangelli Gaudium, que

[…] pela inculturação, a Igreja introduz os povos com suas culturas na própria comunidade, porque cada cultura oferece formas de valores que podem enriquecer o modo como o Evangelho é empregado, compreendido e vivido”. 

Essa nova leitura introduzida ao contexto do evangelho nos ajuda bastante a pensar a realidade juvenil, fazendo-nos aprender muitas coisas com essa nova forma de cultura que, ao invés de empobrecer, acaba enriquecendo cada vez mais no campo da evangelização. Aqui evidenciamos os jovens, pois eles são os nativos digitais, eles já estão imersos nesta cultura e nesta mentalidade e muito contribuem com a Igreja para sua ação no mundo. É preciso aprender as formas, os valores, os métodos e as dinâmicas que estão para além das tecnologias, que já estão presentes no modo de ser pessoa, de se relacionar e de construir relação.

O papa Francisco, utilizando esta metáfora – Igreja em saída –, escreveu uma mensagem para o Dia Mundial das Comunicações em 2014, dizendo o seguinte:

Entre uma Igreja acidentada que sai pela estrada e uma Igreja doente de autorreferencialidade, não hesito em preferir a primeira […]. Entre estas estradas estão também as digitais, congestionadas de humanidade, muitas vezes feridas.

Aqui ele nos faz refletir, enquanto prática pastoral, pois os ambientes digitais são reais e lá existem pessoas. Isso é interessante para revermos os nossos investimentos neste ambiente digital e os desafios que isso também traz para a Igreja. A Igreja também nestes ambientes é chamada a ser presença e traduzir sua Tradição e sua doutrina numa linguagem digital.

Na perspectiva eclesial, o papa Francisco trouxe um apelo renovado à santidade como proposta radical de vida na Exortação Apostólica Gaudete et Exultate, sobre o chamado à santidade no mundo atual. Aparentemente talvez não façamos relação alguma, mas está estritamente relacionado com a temática da comunicação. Ele vai dizer: “Mesmo nos media católicos, é possível ultrapassar os limites, tolerando-se a difamação e a calúnia e parecendo excluir qualquer ética e respeito pela fama alheia”. Nos documentos dos jovens ele vai apresentar a mesma preocupação: “[…] formas de controles que são tão evasivas criando mecanismos de manipulação das consciências e do processo democrático […]” .

O Pontífice ainda enfatiza na sua última encíclica Fratelli Tutti que “[…] há interesses econômicos gigantescos que operam no mundo digital, capazes de realizar formas de controle que são tão sutis quanto invasivas, criando mecanismos de manipulação das consciências e do processo democrático”.  Deste modo, ao analisarmos a inserção e a nossa participação neste ambiente virtual que a Internet apresenta, algumas implicações são necessárias levar em consideração para um maior entendimento desta realidade: primeiro existe uma capacidade em se constituir como espaço efetivo de diversas participações; segundo, entender que as redes sociais se constituem atualmente um campo aberto de divulgação de informação e organizações civis, políticas e religiosas.

O desafio é criar um estilo digital cristão. O papa Bento XVI traduziu isso dizendo que “[…] existe um estilo cristão de presença também no mundo digital: traduz-se numa forma de comunicação honesta e aberta, responsável e respeitadora do outro.”  O papa Francisco vai insistir na ideia de testemunho quando, em 2014, no twitter, ele vai dizer: “[…] que quer dizer evangelizar? Testemunhar com alegria e simplicidade o que somos e aquilo que acreditamos” , e ressalta ainda que “[…] o testemunho cristão não se faz com o bombardeio de mensagens religiosas, mas com a vontade de se doar ao outros através da disponibilidade para se deixar envolver, pacientemente e com respeito, nas suas questões e nas suas dúvidas.” 

Com isso, a escuta ativa nos desafia como Igreja, e é um ambiente riquíssimo para conhecer as pessoas, as realidades e o mundo em que estamos dispostos a evangelizar. É preciso entender que o mundo digital tem muito a contribuir no processo evangelizador de nossos grupos e comunidades. Deste modo, “[…] o pregador (comunicador) deve também pôr-se à escuta do povo para descobrir aquilo que os fiéis precisam ouvir. Um pregador é um contemplativo da Palavra e também um contemplativo do povo […]. Nunca se deve responder a pergunta que ninguém se põe.” (EG 154-155).

CONCLUSÃO

Falar de uma Igreja em saída é colocar-se em direção do outro, para que nós, saindo da autorreferencialidade, possamos ir nas diversas periferias, para que o verdadeiro encontro aconteça. Se o coração não arde ao falar da missão, alguma coisa está errada. A ação pastoral deveria ser uma prioridade em nossas Igrejas particulares, na qual o discernimento se torne um estilo de “Igreja em saída”. Trata-se de uma Igreja que não se acomoda com suas estruturas, mas que se faz peregrina no seguimento de Jesus e que vai ao encontro dos que mais necessitam de sua solidariedade.

O que se evidencia, para mim, é a necessidade de fazermos uma evangelização às avessas. Aquela que primeiro escuta e sente a cultura, os processos sociais, que olha a realidade em seus vários aspectos e procura discernir os sinais dos tempos. E ao perceber que, estamos mergulhados neste ambiente digital e que nossas respostas aos questionamentos podem ser mais criativas e fecundas, não teme envolver e aprender com os jovens para melhor utilizamos a ferramenta das mídias digitais e renovar o campo da evangelização.

A grande novidade do pontificado do papa Francisco, segundo José Maria Castillo, “[…] é ser um papa mais humano, aquele que resgata o sentido dos primeiros seguidores de Cristo, na medida que ele é mais humano, esta mesma medida nos revela a Deus mais claramente”.[3] Ao olharmos a pessoa de Jesus como Deus encarnado ou um Deus humano, percebemos a sua compaixão por aqueles que são oprimidos, excluídos, empobrecidos, sem vez e sem voz. Por inúmeras vezes, Jesus nos Evangelhos assume a postura de estar junto. Deste modo, o papa Francisco também se compadece, sentindo com os mais necessitados as suas dores. Isso é o que revela o humanismo de nosso papa, essa capacidade de reproduzir em sua vida os mesmos sentimentos de Cristo pela humanidade.

Notas

[1]   Francisco, 2013, n. 49.

[2]   Kuzma, Cezar. Cantar com Francisco! Provocações eclesiológicas a partir da Evangelli Gaudium. In: Amado, Joel Portela; Fernandes, Leonardo Agostini (org.). Evangelii Gaudium em questão: aspectos bíblicos, teológicos e pastorais. São Paulo: Paulinas: PUC-Rio, 2014. p. 199.

[3]  SÁNCHEZ, José Maria Castillo. O humanismo de Francisco revela a essência do ser cristão. 2018. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/159-noticias/entrevistas/579130-o-humanismo-de-francisco-revela-a-essencia-do-ser-cristao-entrevista-especial-com-jose-maria-castillo. Acesso em: 7 out. 2020.

Referências

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium – A alegria do evangelho: Sobre o anúncio do Evangelho no mundo atual. São Paulo: Paulus; Loyola, 2013.

KUZMA, Cesar. Cantar com Francisco! Provocações eclesiológicas a partir da Evangelii Gaudium. In: AMADO, Joel Portela; FERNANDES, Leonardo Agostini. Evangelii Gaudium em questão: Aspectos bíblicos, teológicos e pastorais. São Paulo: Paulinas/PUC-Rio, 2014, p. 195-208.

SÁNCHEZ, José Maria Castillo. O humanismo de Francisco revela a essência do ser cristão. 2018. Disponível em: <http://www.ihu.unisinos.br/159-noticias/entrevistas/579130-o-humanismo-de-francisco-revela-a-essencia-do-ser-cristao-entrevista-especial-com-jose-maria-castillo>. Acesso em: 7 out. 2020.


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Alberto Antoniazzi: vida em missão https://observatoriodaevangelizacao.com/alberto-antoniazzi-vida-em-missao/ Fri, 22 Dec 2017 02:42:59 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=27154 [Leia mais...]]]>  

Padre Alberto desempenhou um papel fundamental na formação e atualização sacerdotal, tanto na Igreja de Belo Horizonte quanto em nível nacional. Era presença constante nos Encontros Nacionais de Presbíteros. Sempre morou no seminário arquidiocesano e foi braço direito dos reitores. Desde 1990 esteve inteiramente dedicado ao Projeto Pastoral Construir a Esperança. Eu diria, na verdade, que padre Alberto foi a mente e o coração do PPCE.

                                                           Cardeal Dom Serafim Fernandes de Araújo  Arcebispo Emérito de Belo Horizonte

 

Se o próprio Dom Serafim afirma que Alberto Antoniazzi “foi a mente e o coração do PPCE”, monsenhor Éder Amantéa, na segunda parte da entrevista a nós concedida, irá narrar a gênese da I Assembleia do Povo de Deus (I APD), que emerge justamente como consequência do Projeto Pastoral Construir a Esperança (PPCE). Ao ouvir sua narrativa compreende-se porque tantos declaram que padre Alberto Antoniazzi era um homem de Igreja e para a Igreja.

Antoniazzi foi um sacerdote atento aos apelos de renovação eclesial do Concílio Ecumênico Vaticano II. Por isso mesmo, percebia que a presença da Igreja na sociedade precisava se dar a partir de sua missão enquanto Povo de Deus. Isso mudava completamente a eclesiologia piramidal anterior, pois todo o Povo de Deus – não só o clero – experimenta-se, então, com uma mesma missão e dignidade pelo Batismo. Refletia assim sobre o ministério ordenado e sobre o laicado tanto na perspectiva intra-eclesial quanto na importância da atuação cristã para a transformação social.

O PPCE foi a forma encontrada por padre Alberto para dinamizar a vida da Igreja na arquidiocese de Belo Horizonte. Incentivar e fortalecer o protagonismo laical; criar equipes para fazer da pastoral catequética de BH uma referência nacional; apoiar a reforma litúrgica… “o que aconteceu de pastoral no episcopado de Dom Serafim, foi iniciativa do padre Alberto”, segundo o depoimento de seu grande amigo, monsenhor Éder.

Além desse testemunho entusiasmado, Éder Amantéa contextualiza os fatos narrados e assevera: “O Concílio chegou com toda a força. Toda a Igreja estava esperando a reforma, mas depois de 50 anos de Concílio, muitas reformas não foram implementadas ainda. Há muita coisa pra mudar…” Vale a pena conferir!

Professora Tânia Jordão.

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O sentido cristão de evangelizar https://observatoriodaevangelizacao.com/o-sentido-cristao-de-evangelizar/ Tue, 30 Sep 2014 20:21:48 +0000 http://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=185 [Leia mais...]]]> Comecemos pela via negativa, ou seja, pelo que confunde e não define a “ação de evangelizar”. Equivoca quem a compreende como um mero “anúncio”, “pregação” ou “propagação” de algo que se julga precioso e fundamental para a vida. Erra, igualmente, quem a entende como “discurso de defesa” de uma doutrina, igreja ou religião, dentre outras, como a melhor, a única verdadeira e digna de existir ou de ser seguida. Também se engana quem a concebe como um “conjunto de esforços” para que uma pessoa, divindade ou caminho espiritual seja aceito como o “único mediador capaz de salvar” ou encontrar luz, força e felicidade.

No primeiro caso, há a necessidade de discussão sobre os critérios de julgamento, a autoridade de quem julga e as disposições de abertura de quem recebe o conteúdo anunciado. No segundo, a ação evangelizadora suscitaria inúmeros conflitos entre igrejas, religiões e doutrinas cada qual com a pretensão de evangelizar o diferente de si. No terceiro, ainda que o mediador seja Jesus Cristo e que a religião seja o Cristianismo, a ação evangelizadora não evitaria, mas provocaria enormes dificuldades de convivência fraterna entre as pessoas, diálogo aberto entre as religiões e paz entre os povos e as culturas.

Se evangelização não é sinônimo de apologética religiosa, então, o que vem a ser “evangelizar”? O substantivo “evangelho” vem do grego ευαγγέλιον, euangelion, eu = bom + angelion = mensagem, significa, portanto, boa mensagem, boa notícia, boa nova. Trata-se, concretamente, da ação de compartilhar com outros, no cotidiano da vida, o ser humano que foi convertido, transformado e iluminado pelo conteúdo que ele anuncia cuja pretensão é ser recebido como boa nova. Deste modo, a autoridade da ação evangelizadora nasce nos olhos, e não apenas nos ouvidos, de quem recebe a ação evangelizadora. Significa que o evangelizador necessariamente concretiza alguém que foi evangelizado, ou seja, transformado pelo conteúdo do evangelho que anuncia. A vida do evangelizador apresenta-se como uma espécie de amostra grátis para quem é convidado a abrir o coração e acolher a boa nova anunciada.

No caso da tradição cristã, Jesus anunciou uma boa nova específica para os pobres e necessitados, pecadores, doentes, estrangeiros e marginalizados. Revelou que Deus é presença amorosa, misericordiosa e salvífica no meio do povo. Além disso, mostrou que Deus tem um projeto salvífico universal. Jesus encarnou, em sua vida, o que proclamava sobre Deus e o projeto do Reino. Após a morte brutal na cruz, a experiência da Ressurreição e de Pentecostes, os discípulos e as discípulas de Jesus, transformados pelo evangelho, passam a anunciar como boa nova a vida de Jesus e a compartilhar, em comunidades fraternas, a vida nova que brotava entre aqueles e aquelas que acolhiam o evangelho.

O cristão crê que Jesus experimentou e anunciou o amor universal de Deus. Cada pessoa é amada por Deus, de forma gratuita e incondicional, como filho ou filha. E porque somos amados por Deus, Jesus percebeu e testemunhou a possibilidade de rompermos muros e construirmos pontes de fraternidade, justiça e misericórdia entre nós. Anunciou a alegria desta boa nova e indicou-nos um caminho a seguir. Não há, nesse sentido, autêntica evangelização cristã sem a acolhida, de todo coração, do amor universal de Deus, como Pai de todos, e dos outros, como irmão e irmã.

Evangelizar, nesse horizonte de sentido, passou a significar ações, gestos e palavras, da Igreja de Jesus Cristo. A Igreja é formada por aqueles que concretizam entre si a vida nova e que descobriram a alegria de colocar-se a serviço, em espírito de diálogo fraterno, da convivência pacífica e justa entre os seres humanos, juntamente com as suas culturas e religiões. A ação evangelizadora adquire credibilidade na busca diária de promover e cuidar da dignidade da vida, sobretudo, de quem está à margem do caminho.

Edward Neves M. de B. Guimarães

P/ equipe executiva do Observatório

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