Francisco de Assis Gomes – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Thu, 02 Sep 2021 13:47:30 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Francisco de Assis Gomes – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 “A relação da Igreja com a comunidade LGBTQIA+”, com a palavra Francisco de Assis Gomes https://observatoriodaevangelizacao.com/a-relacao-da-igreja-com-a-comunidade-lgbtqia-com-a-palavra-francisco-de-assis-gomes/ Thu, 02 Sep 2021 13:47:30 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=40491 [Leia mais...]]]> O texto a seguir foi elaborado pelo aluno Francisco de Assis Gomes para o seminário promovido pela disciplina Pedagogia Dialógica Participativa, Corresponsabilidade e Ação Pastoral, ministrada pelo prof. dr. Edward Guimarães.

Confira:

A relação da Igreja com a Comunidade LGBTQIA+

Se estivéssemos convencidos de que eles são filhos de Deus, as coisas mudariam muito.

Papa Francisco


PREÂMBULO

“Os católicos precisam ouvir a comunidade LGBTQIA+”. Está é a frase que me motivou a escolher o tema “A relação da Igreja com a comunidade LGBTQIA+” e adveio das aulas de Pedagogia dialógica e Pastoral Urbana. Em ambas as aulas pude entender que tratar-se de uma comunidade excluída, deixada à beira do caminho, sem amparo pastoral, sem direito ao amor de Deus e expulsos pelos cristãos do Reino de Deus.

Diante de tal realidade, nos propusemos a pesquisar sobre o tema e, devido a pandemia, tudo foi feito com a ajuda da internet. Na primeira busca deparamos com o livro “Building a bridge – Construindo uma ponte[1]” do padre jesuíta James Martin, SJ, consultor do Secretariado de Comunicações do Vaticano. O nosso olhar foi imediatamente fisgado pela obra e artigos relativos a ela. Salientamos que a leitura da obra não foi possível devido à exiguidade de tempo para produção do trabalho.

A pesquisa nos levou a constatar que o assunto possui um bom material escrito e cujo tema já chegou no Vaticano, dado o posicionamento explicito de SS. Papa Francisco em diversas oportunidades em que foi questionado. Entretanto, a discussão pública do tema ainda está bem acanhada.  

INTRODUÇÃO

Ao abrir este trabalho, proponho algumas questões[2] para a nossa reflexão, lembrando que elas nortearão, de forma diluída no texto, a abordagem da relação entre a Igreja e a comunidade LGBTQIA+:

  1. O que significa ser LGBTQIA+ diante do ser católico?
  2. A Igreja precisa ouvir e acolher a comunidade LGBTQIA+?
  3. É possível “construir uma ponte” entre as pessoas LGBTQIA+ e a Igreja?

O texto do Evangelho de João que apresenta Jesus como o Bom Pastor nos dá uma ideia clara do papel daqueles que ouvem o chamado ao pastoreio das ovelhas de Deus. Precisamente em Jo 10, 10c-11, temos o nível de engajamento que o pastor deve apresentar para ser uma mimese real do bom pastor: “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância. Eu sou o bom pastor: o bom pastor dá a vida pelas suas ovelhas”.

A vida pós-moderna nos revela uma realidade diferente do que o Evangelho nos propõe, pois a comunidade LGBTQIA+ não é acolhida pelo cristianismo em geral e foi colocada à margem, sofrendo todo tipo de discriminação e profunda carência de acolhimento. O diálogo foi simplesmente interrompido com a ovelha perdida, ou melhor: a ovelha foi descartada.

É muito estranho a falta de diálogo entre os cristãos e a comunidade LGBTQIA+. Aliás, ao longo da história, percebe-se uma tensão muito grande entre ambas. O aparecimento de grupos radicais neopentecostais acirrou ainda mais o clima, elevando a temperatura ao ponto de que em nome de Deus e de um purismo absurdo, partirem para a agressão física e psicológica de pessoas LGBTQIA+ de uma maneira irracional e selvagem, aumentando sobremaneira o distanciamento e dificultando as poucas e isoladas tentativas de aproximação.

CONSTRUINDO UMA PONTE  

A propósito do lançamento da edição ampliada e revisada de seu quase polêmico livro “Building a bridge” o padre James Martin concedeu uma entrevista à REVISTA IHU ON-LINE, com o título: “A Igreja precisa ouvir as pessoas homossexuais”. Nessa oportunidade, explicou que expandiu a obra para dar mais voz às pessoas LGBTQIA+ e deixá-las contar suas próprias histórias, uma vez que se aprende melhor ouvindo histórias. Aliás, um recurso pedagógico muito bem utilizado por Jesus Cristo. Além disso, Martin insiste que o “ouvir” o outro está na base do acolhimento. E é esse “ouvir” que abre as portas para uma aproximação e um acompanhamento, do qual não pode subestimar o valor da amizade que pode surgir entre as partes. Entretanto, aponta que o medo de ambos os grupos pode ser um entrave muito sério na relação entre estes dois mundos tão distintos. O diálogo só encontra espaço num ambiente de amor perfeito que afaste o medo. O autor da obra continua insistindo que o ambiente de amor também favorece à reconciliação entre a comunidade LGBTQIA+ e a Igreja, uma vez que foi esta que marginalizou o cristão LGBTQIA+.

Para Martin, não há dúvidas de que o diálogo respeitoso entre Igreja e cristãos LGBTQIA+ é o caminho mais eficaz para se construir pontes. Por outro lado, a comunidade LGBTQIA+ queixa da falta de acesso aos bispos, arcebispos e cardeais. Essa dificuldade apontada por Martin é tão grave que ele buscou apoio nas palavras do teólogo gay Jason Steidl para apresentar o protesto como a única maneira das minorias se fazerem ouvir e poder se expressar.  Ademais, o catecismo da Igreja trata o assunto com uma linguagem que afeta as pessoas LGBTQIA+ e isso não favorece ao diálogo. Pois, como aponta uma paroquiana de Martin, é uma linguagem que pode destruir os jovens. Como nos explica Javier e Martha – pais de jovem gay – “palavras vindas de padre e bispos têm verdadeira autoridade”.

Por tudo isso, o autor sugere um retorno reflexivo sobre algumas passagens do evangelho para meditar melhor sobre a pedagogia empregada por Jesus Cristo no encontro com pessoas marginalizadas e aponta o encontro do Mestre com a mulher samaritana. Para Martin, é um dos diálogos mais longo de todo Evangelho, não havendo nenhuma razão para Jesus Cristo fazer tal coisa, pois falar com mulher e samaritana não era algo esperado para um judeu. Na verdade, nos evangelhos, Jesus Cristo está acolhendo, ouvindo e dialogando com pessoas marginalizadas, coisa que todos nós cristãos podemos e devemos fazer, conclui o autor, abrindo a possibilidade para o acolhimento fraterno das pessoas LGBTQIA+.  

CONCLUSÃO

Apoio-me em  LIMA (2009) para responder as questões apresentadas no início deste texto, pois homossexualidade é apenas uma das tantas questões que interpelam a humanidade, exigindo desta uma abordagem séria e comprometida. Por conseguinte, a Igreja tem um papel fundamental. Nesse sentido, ele concorda com a reflexão de Martin (2019). Para o autor, pluralidade é a riqueza do mundo acadêmico e natural, uma vez que o próprio termo católico nos remete para o universal, de onde só se pode esperar uma multiplicidade de entes convivendo naturalmente e em harmonia. Portanto, a aspecto da natureza humana e pode “ajudar as pessoas a amarem a si mesmas como criação divina e a darem um sentido amoroso e transcendente às suas vidas”.   

LIMA (2009) aduz que “na verdade, nós estamos vivendo uma mudança de paradigma antropológico”, ou seja, no início do terceiro milênio de vida cristã, uma nova realidade humana desponta no horizonte e balança as frágeis estruturas de uma moral que já não se sustenta mais. Há muitos gays que se sentem felizes como são, pois acham que Deus os ama, os fez assim e não sentem vergonha ou culpa do que são.

O papa Francisco muito tem contribuído nesse sentido. Ao receber o padre James Martin no Vaticano para falar de sua missão de amparo e acolhimento das pessoas LGBTQIA+ e das diversas vezes que manifestou publicamente seu desejo de receber esta comunidade no seio da Igreja ao se expressar humildemente a respeito: “Quem sou eu para julgar”? Atitude assim nos dá a impressão de que há uma urgência em reparar essa lacuna que por muito tempo foi omitida, evitada e desconsiderada.

No entanto, não se pode ser inocente e achar que tudo está resolvido ao abrir as igrejas e colocar as pessoas LGBTQIA+ para dentro. Não é só isso. Há um longo caminho a ser percorrido. Podemos dizer que a acolhida no seio da Igreja é passo importante que está sendo dado. É preciso colocar o assunto em pauta de conversa, estudo e reflexão. Além disso devemos nos conscientizar de que as mudanças necessárias são enormes. O processo de mudança de mentalidade e práxis é lento e pode causar escândalos em muitos. É preciso cuidar para que as gerações que se sucedam cresçam em um ambiente acolhedor que favoreça aproximação e mudança de mentalidade. Com a graça de Deus, tenho certeza de que um dia chegaremos a um bom termo.

O texto levou-me a pensar que há um grande número de pessoas LGBTQIA+ que são motivados à fé cristã católica, que querem aderir ao projeto divino, experimentando o amor de Deus e seguir o caminho de Jesus Cristo do jeito que elas são. Entretanto, parte da Igreja ainda insiste em fechar-lhes as portas do Reino. Além dos problemas institucionais, a oposição ao acolhimento dos Gays é forte e vem da sociedade leiga também. Há um crescente número de grupos extremistas radicais de direita e de esquerda que lutam contra. Contudo, o trabalho do Padre James Martin e de outros pode e deve servir de inspiração para muitos que querem contribuir nessa tarefa de inclusão: “Construindo um complexo de Pontes” de mão dupla, ligando a comunidade LGBTQIA+, Igreja, Sociedade e Deus.

Respondendo diretamente às questões propostas:

a) O que significa ser LGBTQIA+ diante do ser católico?

Significa ser excluído, por ser considerado indigno de pertencer à comunidade cristã e poder ouvir a Palavra de Deus.

b) A Igreja precisa ouvir e acolher a comunidade LGBTQIA+?

Já passou da hora de se debruçar sobre o assunto e buscar uma solução. Todos têm direito à voz e fala. Portanto, não há justificativa para tanta exclusão.

c) É possível “construir uma ponte” entre as pessoas LGBTQIA+ e a Igreja?

É o que penso e que me motiva a trabalhar nesse espinhoso assunto. Aliás, já disse anteriormente, uma ponte só é pouco, precisamos de um complexo de pontes e com duas vias.

Finalmente, “OUVIR” foi o verbo que mais me chamou a atenção e que apareceu muitas vezes nos textos que li. Portanto, encerramos o trabalho com a mesma frase que abrimos: “Os católicos precisam ouvir a comunidade LGBTQIA+”.

REFERÊNCIAS

ANDERSON, John. Em ‘Construindo uma Ponte’, o Padre James Martin dá as boas-vindas aos católicos LGBTQ. AMERICA – THE JESUIT REVIEW. Disponível em: https://www.americamagazine.org/arts-culture/2021/06/16/anderson-building-bridge-movie-martin-240881. Acesso em: 04/07/21.

LEFEBVRE, Elizabeth. A conversa LGBT é um sinal de nova vida na igreja. U.S.Catholic – FAITH IN REAL LIFE, 03/04/18. Disponível em: https://uscatholic.org/articles/201804/the-lgbt-conversation-is-a-sign-of-new-life-in-the-church/. Acesso em: 04/07/21.   

LIMA, Luís Corrêa. A igreja e os homossexuais. REVISTA IHU ON-LINE, 24/08/19. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/entrevistas/24408-a-igreja-e-os-homossexuais-entrevista-comluis-correa-lima. Acesso em: 04/07/21.

MARTIN, James. A Igreja precisa ouvir as pessoas homossexuais. REVISTA IHU ON-LINE, 22/02/18. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/78-noticias/576294-a-igreja-precisa-ouvir-as-pessoashomossexuais-entrevista-com-james-martin. Acesso em: 04/07/21.

MARTIN, James. Os católicos precisam ouvir os LGBT. DW Brasil, 04/10/19. Disponível em: https://www.terra.com.br/noticias/os-catolicos-precisam-ouvir-os-lgbt,c826ac7ec9b0d0f0b996a8672731f3ee10v6rf4g.html. Acesso em: 04/07/21.

SHINE, Robert. Teólogos católicos ficaram quietos demais sobre o livro “Building a Bridge”, do padre James Martin? REVISTA IHU ON-LINE, 07/03/18. Disponível em: http://www.ihu.unisinos.br/188-noticias/noticias-2018/576706-teologos-catolicos-ficaram-quietos-demais-sobre-o-livro-building-a-bridge-do-padre-james-martin. Acesso em: 04/07/21.


[1] Livro escrito originalmente em inglês e sem tradução no Brasil. “Construindo uma ponte” é uma tradução livre, sem maiores pretensões.

[2] Estas questões foram tiradas ou parafraseadas a partir dos textos lidos.

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