Entrevista com Ir. Maria Freire da Silva – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Tue, 24 Nov 2020 19:07:43 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Entrevista com Ir. Maria Freire da Silva – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 “A mulher precisa, e as religiosas sobretudo, sair daquele papel de que ela é inferior”. Entrevista com a Ir. Maria Freire. https://observatoriodaevangelizacao.com/a-mulher-precisa-e-as-religiosas-sobretudo-sair-daquele-papel-de-que-ela-e-inferior-entrevista-com-a-ir-maria-freire/ Tue, 24 Nov 2020 19:07:43 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=36721 [Leia mais...]]]> A Congregação das Irmãs do Imaculado Coração de Maria está começando uma nova etapa. Após doze anos em que a irmã Marlise Hendges foi sua Superiora Geral, recentemente foi eleita a irmã Maria Freire da Silva como nova superiora para os próximos seis anos.

Ir. Maria Freire da Silva

A nova superiora vê sua nova missão como um desafio muito grande, mas ela entende que “existe uma perspectiva muito grande, que é dar continuidade e visibilizar o espírito carismático da congregação, do carisma, da espiritualidade e missão, no seguimento radical a Jesus Cristo”, fazendo realidade uma Igreja em saída, sendo uma congregação que possa viver a sinodalidade, no sonho “de viver uma opção preferencial e solidária pelos pobres, com um ardor missionário novo”.

Diante da difícil situação em que a pandemia tem colocado o Brasil e o mundo, a congregação quer se implicar no acompanhamento aos mais vulneráveis. À luz de Fratelli Tutti, a irmã Maria Freire, que tem dedicado boa parte de sua vida ao estudo e ensino teológico, principalmente no âmbito da Trindade, ela pretende fazer realidade “uma congregação samaritana”, em comunhão com outras realidades eclesiais e outras igrejas e religiões.

Ela reconhece a necessidade do diálogo como caminho de mudança, de aproveitar os diferentes espaços como mulheres, como religiosas, pois “a mulher precisa, e as religiosas sobretudo, sair daquele papel de que ela é inferior”. Nesse caminho é importante o papel que a vida religiosa pode ter no processo formativo dos seminaristas, afirmando a necessidade de “uma maior presença de mulheres nas faculdades de teologia”, um trabalho que não é muito valorizado na vida religiosa.

Junto com isso, destaca a importância do laicato e de uma consciência laical na vida da congregação. Seu sonho é resgatar “as raízes fundacionais, o carisma, a espiritualidade e missão da congregação”, e ao mesmo tempo “que a congregação seja uma congregação comprometida com os pobres na sua totalidade”.

Confira a entrevista:

1. A senhora acaba de ser eleita superiora geral da Congregação das Irmãs do Imaculado Coração de Maria. Como enfrenta essa nova missão que a congregação acaba de lhe confiar?

R.: Foi um processo bastante quenótico, difícil porque no momento de assumir essa missão, acredito que foi uma graça do Espírito, que está me envolvendo, continuando a me abrir sempre para sair de mim mesma e assumir essa nova missão. É um desafio muito grande assumir a congregação nesse momento, com a diversidade que ela é de idades, culturas, e com a situação do país e do mundo, com a pandemia e tantas desigualdades sociais, políticas, eclesiais, que nos assolam.

Mas existe uma perspectiva muito grande, que é dar continuidade e visibilizar o espírito carismático da congregação, do carisma, de espiritualidade e missão, no seguimento radical a Jesus Cristo, e numa Igreja, como fala o papa Francisco, numa Igreja em saída. A gente tem essa conexão com tudo e também num momento no qual toda a Terra geme em dores de parto, como fala São Paulo. É um processo que temos que viver, e ao mesmo tempo, nessa perspectiva de que nós podemos testemunhar a esperança e a alegria, través de nosso compromisso como sujeitos da nossa missão. Sobretudo aquilo que o capítulo nos levou, que é nosso foco, mulheres e juventudes.

Esse é o nosso foco, por onde nós vamos perpassar toda a ação missionária, com esses sujeitos. Depois nós também temos o marco de canonização de Bárbara Maix, que é assumir a população em situação de rua. Nós escolhemos São Paulo para começar com um grupo, junto com iniciativas já existentes. Do ponto de vista missionário, nós temos, a gente chamou de sonho, o sonho que de que a congregação possa se colocar como uma congregação em saída, com o lema que nós escolhemos, que é: “Irmãs do Imaculado Coração de Maria, em fidelidade à raiz fundacional, no compromisso místico, profético, com a vida”.

Viver esse tema, nesse momento, nos fazer sonhar com uma congregação que possa sempre mais, viver a sinodalidade, viver o compartilhamento de tudo o que ela é, e isso sem esquecer a responsabilidade socioambiental no cuidado da casa comum e na vivência da ecologia integral. É necessário unir tudo isso para direcionar a congregação, que ela seja aquilo que Bárbara Maix sonhou, que é uma congregação que está comprometida com os pobres, com os mais vulneráveis, e uma congregação sempre em saída, para visibilizar sempre o carisma, expressando o projeto de Deus no contexto histórico.

Nós temos esse sonho de viver uma opção preferencial e solidária pelos pobres, com um ardor missionário novo, que a gente possa situar-se dentro desse contexto que nós estamos vivendo no Brasil, nos outros países, Bolívia, Haiti, Moçambique, Angola, Paraguai, Argentina, Roma, que nós possamos viver aquilo que foi o sonho, que foi também o sonho da nossa fundadora. Nós temos a perspectiva de que a congregação possa viver um momento novo a partir de agora, sem claro, não estar rompendo com o passado, mas estar dando passos para esse compromisso solidário, místico, profético, com os pobres.

2. A senhora fala sobre a pandemia, pessoalmente, quais as reflexões que a pandemia tem provocado na senhora, e como congregação, quais os desafios que esta pandemia coloca na frente da sua vida e missão?

R.: Eu pessoalmente, morando em São Paulo, que eu estava como provincial, eu via a cada dia o escancaramento do empobrecimento do povo ali em São Paulo, e isso era resultado também que reflete a situação de outros estados que se fazem presente na população de São Paulo. A gente percebeu nos viadutos, nas ruas, no centro de São Paulo, mas também em alguns bairros mais ricos, como ficou escancarada essa questão da pobreza por causa da pandemia, mas também por causa do desgoverno que o país está vivendo. A questão do desrespeito ao meio ambiente, nas ruas vemos crianças, jovens, famílias inteiras em baixo dos viadutos. Isso gerou para mim uma certa indignação, e por isso, justamente, partiu essa esperança e essa perspectiva que eu tenho na rua em São Paulo. É resultado de ter visto esse escancaramento ali.

Como congregação, eu quero ver o sonho que ela assume esse trabalho, que não seja só a Província Nossa Senhora de Guadalupe, mas um sonho que seja concretizado enquanto congregação. E para isso, nós vamos criar um grupo em que esteja tanto pessoas de Guadalupe, como pessoas daqui do Rio Grande do Sul, da Província Mãe de Deus. É um desafio muito grande para as pessoas que estão numa ação pastoral de inserção, porque são os desafios de solidariedades imediatas que a pandemia gerou, como as irmãs em Manaus, no Norte e Nordeste, e aqui também, no Rio Grande do Sul, com a questão das cestas básicas, as máscaras, outros atendimentos. Isso agora é emergencial, porem nós queremos também que esse compromisso vai se concretizar em outras iniciativas nossas diante da realidade que vivemos.

3. A senhora fala sobre realidades que o Papa Francisco aborda na última encíclica que ele escreveu, na Fratelli Tutti, sobretudo quando ele faz uma reflexão a partir da figura do Bom Samaritano. Numa sociedade cada vez mais empobrecida, num país como o Brasil, onde a pobreza está aparecendo de forma cada vez mais clara, se dando um abandono das pessoas, nem só por parte do poder público, como também do povo, como trazer isso para a vida da congregação e para essa perspectiva de missão que a senhora está querendo instaurar na congregação?

R.: O nosso capítulo esteve perpassado pela dimensão trinitária, e essa Trindade, que vem na história através de Jesus Cristo, que se encarna, e a parábola do Bom Samaritano. Nós refletimos muito aquilo que o papa Francisco pede, de uma Igreja samaritana, e ao mesmo tempo que a Trindade, ela é samaritana, já diziam os Padres da Igreja no segundo século do cristianismo. Então, a Trindade samaritana, que nos leva a ser samaritanos, samaritanas. E como congregação, também nós queremos também ser uma congregação samaritana, refletimos bastante esse atendimento para além de nossos espaços eclesiais ou eclesiásticos, da vida da Igreja, mas atendendo não importa quem é.

Se é vulnerável, nós vamos estar também ao serviço dessas pessoas, e nos unir também com outras igrejas, porque a congregação, de certa forma, ela já tem alguns espaços, um relacionamento bom. Eu mesma já tive muita experiência com igrejas ortodoxas, com judeus, com outras religiões, tive também com o islamismo, na faculdade onde eu lecionava. Eu tive muita, digamos, inter-relação com outras igrejas, e isso vai também nos ajudar a sermos samaritanos, a estar a caminho e a atender a quem está no caminho. Isso significa dar rosto, é resgatar a identidade das pessoas, sem importar a quem estamos fazendo isso. Mas o sujeito histórico pobre, empobrecido, isso nos importa. O meio ambiente, que está sofrendo tanto com a questão da Amazônia, isso nos importa.

4. Na vida religiosa, a presença da mulher nas instâncias de decisão, cada vez é mais evidente. A gente vê que aqui no Brasil, na Conferência dos Religiosos do Brasil, a presidenta é uma mulher, na Conferência Latino-americana de Religiosos, a presidenta também é uma mulher. Como levar isso para a vida da Igreja como um todo, que na verdade estão se dando passos, como valorizar esses passos que estão sendo dados e quais os desafios que isso coloca para a Igreja, fazendo com a que a mulher esteja cada vez mais presente nas instâncias de decisão da Igreja?

R.: Nós como congregação, nós temos que provocar também uma relação com a CNBB, aqui no Brasil, com os bispos onde nós estamos, com os padres, e dialogar. Em vez da gente se distanciar, porque não gostou da ideia, a gente vai dialogando e provocando um pouco mais o relacionamento de proximidade mesmo. Em sentido eclesiástico, isso vai precisar muito diálogo e reflexão, nós vamos aproveitando também os espaços que a gente vê que é possível ocupar dentro das iniciativas do papa Francisco. A irmã Marlise Hendges, que era nossa Geral, ela está convidada para a Congregação dos Religiosos, onde ela vai trabalhar, em Roma, ser uma representação das congregações femininas no Brasil. Esse já um espaço muito bom que a gente vai ocupando.

Na CRB, também a gente viu que a irmã Maria Inês, ela fez e faz um bom trabalho, a presidente da CLAR é uma pessoa muito bem situada, na ação missionária latino-americana e caribenha, e isso vai provocando e empoderando outras mulheres. Eu acredito que isso vai estar sempre presente agora na nossa congregação, eu sou uma pessoa que gosto de ocupar o espaço que eu vejo que ele está ali para ser ocupado. A mulher deve provocar isso, porque ninguém vai chegar a algum lugar sem fazer a caminhada para desafiar-se, sem colocar-se em saída.

A mulher precisa, e as religiosas sobretudo, sair daquele papel de que ela é inferior. Por aí não vai caminhar a vida religiosa, se ela caminha por ali não dá para chegar a instâncias maiores na vida da Igreja. O Papa Francisco tem dado uma abertura para nós dialogarmos sobre isso, e provocarmos essa possibilidade.

5. Um âmbito importante, nesse sentido, é a formação. A senhora trabalhou durante muitos anos como professora de teologia, onde a maioria dos alunos eram seminaristas do clero diocesano e religiosos, que depois se tornavam padres. Como essa presença feminina no campo da formação dos futuros padres, ajuda ou poderia ajudar, e como incentivar para que cada vez mais mulheres, no campo da formação filosófica e teológica, possam estar presentes e influenciar nessa futura formação, e assim fomentar o diálogo entre as religiosas e os padres?

R.: Eu tive uma experiência muito boa trabalhando com a juventude, nos seminários, tanto religiosos como arquidiocesanos, no sentido de que ocupei um espaço, meu espaço era valorizado. E eu dialogava com os alunos, embora a gente sabe que a gente dialoga enquanto professor, eu tinha um certo espaço um pouco destacado, no sentido de que a minha voz era ouvida. Porém, quando eles vão para as paroquias, muitos deles esquecem aquilo que a gente trabalhou na faculdade, mas muitos deles, hoje eu tenho uma alegria muito grande, que eles tentam até a gente ter um contato, e eles lembram e dizem que às vezes trabalham nas comunidades aquilo que a gente havia trabalhado.

Eu penso que exige uma maior presença de mulheres nas faculdades de teologia, o que quase não tem mais. E por parte da vida religiosa, esse trabalho não é muito valorizado. Quando eu trabalhei na faculdade de teologia, não era visto isso como uma missão. E se as congregações não veem como uma missão esse trabalho, não dão o valor devido e acham que não é lugar. Isso dificulta, às vezes a mulher tem um lugar na faculdade, e não assume porque a congregação não prioriza esses espaços, e não priorizando esses espaços, não há como se atingir um diálogo maior.

Porque a filosofia, a teologia, é fundamental na formação da mulher consagrada, para ela interagir com os formandos, sejam seminaristas, sejam leigos e leigas que também estão junto, para fomentar nas comunidades uma visão diferente do que seja a vivência eclesial. Como é que a Igreja vive suas dimensões carismáticas, ministeriais, no diálogo, no respeito ao distinto, ao homem e à mulher. Eu penso que a mulher consagrada, ela teria um grande papel nisso, mas ela não sabe ainda utilizar.

6. As congregações estão tomando cada vez mais consciência da importância do laicato na vida da congregação. Na sua congregação, aos poucos, isso vai sendo mais evidente. Qual pensa que deveria ser o papel do laicato, daqueles que assumem o carisma da sua congregação, no futuro da sua congregação e da vida religiosa e a vida da Igreja?

R.: Dentro dessa consciência que a gente tem trabalhado, que é a consciência de que nós somos uma categoria laical, digamos, com as suas distinções, no sentido da instituição. Porém nós, na nossa ação missionária, nós temos tudo para vivermos essa dimensão na vida da congregação. Eu acredito que com a juventude que está vindo, a congregação terá uma possibilidade maior de se abrir a isso, de conscientizar-se da diversidade dos espaços, que às vezes são até nos oferecidos, e às vezes nós não priorizamos, e que é necessário priorizar.

A participação na CNBB, na CRB, a participação na Rede um Grito pela Vida, no trabalho contra o tráfico de seres humanos, o trabalho feito no Sínodo, como está sendo feito na comunidade de Manaus, a participação da irmã Roselei no Sínodo, tudo isso vai ajudando essa consciência laical na congregação, porque isso é partilhado também. Do meu ponto de vista, isso precisa partilhar mais, isso precisa ser compreendido melhor no todo da congregação. E outros trabalhos que as irmãs têm, como lá no Haiti, na África. Então há grandes possibilidades de sermos uma Igreja em saída, uma congregação em saída. A perspectiva de viver na consciência de que somos uma categoria laical, isso há uma maior possibilidade com a juventude que está vindo.

7. A senhora foi eleita para os próximos seis anos. Daqui a seis anos, quando acabar seu serviço na congregação, que poderiam ser mais seis se fosse reeleita, o que a senhora gostaria de dizer que fez, e o que gostaria que a congregação falasse sobre seu trabalho?

R.: Eu tenho um sonho muito grande de que quando eu terminar esses seis anos, eu tenha resgatado as raízes fundacionais, o carisma, a espiritualidade e missão da congregação, que tenha ajudado a congregação a perceber o dinamismo trinitário nela. E a partir disso, que a congregação seja uma congregação comprometida com os pobres na sua totalidade, é um grande sonho meu. Então, ao chegar aos seis anos e eu olhar para trás, e alguém dizer, olha, você conseguiu resgatar as raízes da congregação e estão firmes aqui com os mais vulneráveis. Isso é o que eu quero no futuro, e ver uma congregação unida, com uma espiritualidade forte e uma ação missionária bem sólida.

Sobre o autor:

Luis Miguel Modino

Luis Miguel Modino – Padre diocesano de Madri, missionário fidei donum na Amazônia, residindo atualmente em Manaus – AM. Faz parte da Equipe de Comunicação da REPAM. Correspondente no Brasil de Religión Digital e colaborador do Observatório da Evangelização e em diferentes sites e revistas.

A seguir, a versão do texto em espanhol, confira:

María Freire: “La mujer necesita, sobre todo las religiosas, salir de ese pensamiento de que es inferior”

La Congregación de las Hermanas del Inmaculado Corazón de María comienza una nueva etapa. Después de doce años en los que la Hermana Marlise Hendges fue su Superiora General, la Hermana María Freire da Silva fue elegida recientemente como nueva Superiora para los próximos seis años.

La nueva superiora ve su nueva misión como un gran desafío, pero entiende que “hay una perspectiva muy grande, que es dar continuidad y visibilidad al espíritu carismático de la congregación, al carisma, a la espiritualidad y a la misión, en el seguimiento radical de Jesucristo”, haciendo realidad una Iglesia en salida, siendo una congregación que pueda vivir la sinodalidad, en el sueño “de vivir una opción preferencial y solidaria por los pobres, con un nuevo ardor misionero”.

Ante la difícil situación en la que la pandemia ha colocado a Brasil y al mundo, la congregación quiere acompañar a los más vulnerables. A la luz de Fratelli Tutti, la hermana María Freire, que ha dedicado buena parte de su vida al estudio y a la enseñanza teológica, especialmente en el ámbito de la Trinidad, quiere hacer realidad “una Congregación samaritana”, en comunión con otras realidades eclesiales y con otras iglesias y religiones.

Reconoce la necesidad del diálogo como camino de cambio, de aprovechar los diferentes espacios como mujeres, como religiosas, porque “la mujer necesita, sobre todo las religiosas, salir de ese pensamiento de que es inferior”. En este recorrido es importante el papel que la vida religiosa puede desempeñar en el proceso de formación de los seminaristas, afirmando la necesidad de “una mayor presencia de la mujer en las facultades de teología”, un trabajo poco valorado en la vida religiosa.

Junto con esto, destaca la importancia del laicado y la conciencia laica en la vida de la congregación. Su sueño es rescatar “las raíces fundacionales, el carisma, la espiritualidad y la misión de la congregación”, y al mismo tiempo “que la congregación sea una congregación comprometida con los pobres en su totalidad”.

Acaba de ser elegida Superiora General de la Congregación de las Hermanas del Inmaculado Corazón de María. ¿Cómo afronta esta nueva misión que la Congregación acaba de confiarle?

Fue un proceso bastante kenótico, difícil porque en el momento de asumir esta misión, creo que fue una gracia del Espíritu, que me está involucrando, continuando a abrirme siempre para salir de mí misma y asumir esta nueva misión. Es un gran desafío asumir la congregación en este momento, con la diversidad de edades, de culturas, y con la situación de nuestro país y del mundo, con la pandemia y tantas desigualdades sociales, políticas y eclesiales que nos asolan.

Pero hay una perspectiva muy grande, que es dar continuidad y visibilidad al espíritu carismático de la congregación, al carisma, a la espiritualidad y la misión, en un seguimiento radical de Jesucristo, y en una Iglesia, como dice el Papa Francisco, en una Iglesia en salida. Tenemos esta conexión con todo y también en un momento en el que toda la Tierra gime en dolores de parto, como dice San Pablo. Es un proceso que tenemos que vivir, y al mismo tiempo, en la perspectiva de que podamos dar testimonio de esperanza y alegría a través de nuestro compromiso como sujetos de nuestra misión. Sobre todo, aquello a lo que el capítulo nos ha llevado, que es nuestro foco en las mujeres y las juventudes.

Este es nuestro foco, a través del cual pasaremos toda nuestra acción misionera con esos sujetos. También tenemos el hito de la canonización de Bárbara Maix, que es hacerse cargo de la gente de la calle. Hemos elegido São Paulo para empezar con un grupo, junto con las iniciativas ya existentes. Desde el punto de vista misionero, tenemos, lo llamamos un sueño, el sueño de que la congregación pueda situarse como una congregación en salida, con el lema que hemos elegido, que es: “Hermanas del Inmaculado Corazón de María, en fidelidad a la raíz fundacional, en el compromiso místico, profético, con la vida”.

Vivir este tema, en este momento, nos hace soñar con una congregación que pueda siempre más, vivir la sinodalidad, vivir el compartir de todo lo que es, y esto sin olvidar la responsabilidad socio-ambiental en el cuidado de la casa común y en vivir la ecología integral. Es necesario unir todo esto para direccionar la congregación, para que sea lo que Bárbara Maix soñó, una congregación comprometida con los pobres, con los más vulnerables, y una congregación que esté siempre en salida, para hacer siempre visible el carisma, expresando el plan de Dios en el contexto histórico.

Tenemos este sueño de vivir una opción preferencial y solidaria por los pobres, con un nuevo ardor misionero, que podamos situarnos en este contexto que estamos viviendo en Brasil, en otros países, Bolivia, Haití, Mozambique, Angola, Paraguay, Argentina, Roma, que podamos vivir lo que fue el sueño de nuestra fundadora. Tenemos la perspectiva de que la congregación pueda vivir un nuevo momento a partir de ahora, sin romper con el pasado, pero dando pasos hacia este compromiso solidario, místico, profético, con los pobres.

Usted habla de la pandemia, personalmente, ¿cuáles las reflexiones que la pandemia ha provocado en usted y, como congregación, cuáles son los retos que esta pandemia plantea para su vida y su misión?

Yo personalmente, viviendo en São Paulo, como provincial, veía todos los días el aumento del empobrecimiento de la gente allí en São Paulo, y este fue también un resultado que refleja la situación de otros estados que están presentes en la población de São Paulo. Vimos en los viaductos, en las calles, en el centro de São Paulo, pero también en algunos barrios más ricos, cómo se abrió este tema de la pobreza a causa de la pandemia, pero también por el desgobierno que vive el país. El tema de la falta de respeto por el medio ambiente, en las calles vemos niños, jóvenes, familias enteras bajo los viaductos. Esto me ha generado cierta indignación, y es precisamente por eso que nació esta esperanza y esta perspectiva que tengo en la calle en São Paulo se ha roto. Es el resultado de haber visto esta abertura allí.

Como congregación, quiero ver el sueño de que asuma este trabajo, que no sea sólo la Provincia de Nuestra Señora de Guadalupe, sino un sueño que se haga realidad como congregación. Y para ello, vamos a crear un grupo en el que estén tanto personas de Guadalupe como de aquí, de Rio Grande do Sul, de la Provincia de la Madre de Dios. Es un desafío muy grande para quien está en una acción pastoral de inserción, porque son los desafíos de solidaridad inmediata que la pandemia ha generado, como las hermanas de Manaos, del Norte y Nordeste, y aquí también, en Rio Grande do Sul, con la cuestión de las canastas básicas de alimentos, las mascarillas, otros cuidados. Esto es ahora una emergencia, pero también queremos que este compromiso se materialice en otras iniciativas nuestras ante la realidad que vivimos.

Usted habla de las realidades que el Papa Francisco trató en su última encíclica, en Fratelli Tutti, especialmente cuando hace una reflexión sobre la figura del Buen Samaritano. En una sociedad cada vez más empobrecida, en un país como Brasil, donde la pobreza aparece cada vez más claramente, donde aparece el abandono de la gente, no sólo por el poder público, sino también por la propia gente, ¿cómo llevar esto a la vida de la congregación y a esta perspectiva de misión que están tratando de establecer en la congregación?

Nuestro capítulo ha estado impregnado de la dimensión trinitaria, de esta Trinidad, que se hace presente en la historia a través de Jesucristo, que se encarna, y de la parábola del Buen Samaritano. Reflexionamos mucho sobre lo que el Papa Francisco pide, una Iglesia Samaritana, y al mismo tiempo que la Trinidad, es samaritana, lo que ya dijeron los Padres de la Iglesia en el segundo siglo del cristianismo. La Trinidad samaritana nos lleva a ser samaritanos, samaritanas. Y como congregación, también queremos ser una congregación samaritana, reflejamos mucho este servicio más allá de nuestros espacios eclesiales o eclesiásticos, desde la vida de la Iglesia, pero asistiendo sin importar quién sea.

Si es vulnerable, también estaremos al servicio de estas personas, y nos uniremos a otras iglesias, porque la congregación, en cierto modo, ya tiene algunos espacios, una buena relación. Yo mismo he tenido mucha experiencia con las iglesias ortodoxas, con los judíos, con otras religiones, también con el islam, en la facultad donde enseñaba. He tenido mucha, digamos, interrelación con otras iglesias, y esto también nos ayudará a ser samaritanos, a estar en camino y a servir a los que están en el camino. Significa dar la cara, significa rescatar la identidad de la gente, no importa a quién se lo hagamos. El sujeto histórico pobre y empobrecido es quien nos importa. El medio ambiente, que está sufriendo tanto con el tema de la Amazonía, eso nos importa.

En la vida religiosa, la presencia de las mujeres en la toma de decisiones es cada vez más evidente. Vemos que aquí en Brasil, en la Conferencia de Religiosos de Brasil, la presidenta es una mujer, en la Conferencia Latinoamericana de Religiosos, la presidenta también es una mujer. ¿Cómo llevar esto a la vida de la Iglesia en su conjunto, que de hecho se están dando pasos, cómo valorar estos pasos que se están dando y qué retos plantea esto para la Iglesia, haciendo que la mujer esté cada vez más presente en las instancias de decisión de la Iglesia?

Nosotras, como congregación, también tenemos que provocar una relación con la CNBB (Conferencia Nacional de los Obispos de Brasil), aquí en Brasil, con los obispos donde estamos, con los sacerdotes, y dialogar. En lugar de distanciarnos, porque no nos ha gustado la idea, ir dialogando y provocando un poco más la relación de cercanía. En un sentido eclesiástico, esto requerirá mucho diálogo y reflexión, también aprovecharemos los espacios que vemos que pueden ser ocupados dentro de las iniciativas del Papa Francisco. La hermana Marlise Hendges, que fue nuestra General, ha sido invitada a la Congregación de Religiosos donde trabajará en Roma para ser una representación de las congregaciones femeninas en Brasil. Este ya es un muy buen espacio que estamos ocupando.

En la CRB, también vemos que la hermana María Inés, hizo y hace un buen trabajo, la presidenta de la CLAR es una persona muy bien situada en la acción misionera de América Latina y el Caribe, y esto está provocando y empoderando a otras mujeres. Creo que esto estará siempre presente ahora en nuestra congregación, soy una persona a la que le gusta ocupar el espacio que veo que está ahí para ser ocupado. La mujer debe provocar esto, porque nadie va a llegar a ninguna parte sin dar el paso a desafiarse a sí misma, sin ponerse en salida.

La mujer necesita, sobre todo las religiosas, salir de ese pensamiento de que es inferior. La vida religiosa no va a caminar así, si camina así no podrá alcanzar niveles más altos en la vida de la Iglesia. El Papa Francisco nos ha dado una apertura al diálogo sobre esto, y para provocar esta posibilidad.

Un área importante, en este sentido, es la formación. Trabajó durante muchos años como profesora de teología, donde la mayoría de los estudiantes eran seminaristas del clero diocesano y religiosos, que más tarde se convirtieron en sacerdotes. ¿Cómo ayuda o podría ayudar esta presencia femenina en el campo de la formación de los futuros sacerdotes, y cómo puede animar a más y más mujeres, en el campo de la formación filosófica y teológica, a estar presentes e influir en esta futura formación, y así fomentar el diálogo entre las religiosas y los sacerdotes?

Tuve una muy buena experiencia trabajando con jóvenes en seminarios, tanto religiosos como diocesanos, en el sentido de que ocupaba un espacio, mi espacio era valorado. Y yo dialogaba con los alumnos, aunque sé que dialogaba como profesora, tenía un cierto espacio un poco destacado, en el sentido de que mi voz era escuchada. Pero cuando van a las parroquias, muchos de ellos olvidan lo que trabajamos en la facultad, pero muchos de ellos, hoy tengo una gran alegría, se acuerdan y hasta tenemos un contacto, y dicen que a veces trabajan en las comunidades lo que nosotros habíamos trabajado.

Creo que se requiere una mayor presencia de mujeres en las facultades de teología, que ya casi no hay. Y por parte de la vida religiosa, este trabajo no es muy valorado. Cuando trabajé en la facultad de teología, no se veía eso como una misión. Y si las congregaciones no ven este trabajo como una misión, no lo aprecian y piensan que no es el lugar. Esto lo hace difícil, a veces la mujer tiene un lugar en la facultad, y no lo asume porque la congregación no prioriza estos espacios, y al no priorizar estos espacios, no hay forma de lograr un mayor diálogo.

Porque la filosofía, la teología, es fundamental en la formación de las mujeres consagradas, para que interactúen con los formandos, ya sean seminaristas o laicos que también están allí, para fomentar en las comunidades una visión diferente de la experiencia eclesial. Cómo si no vive la Iglesia sus dimensiones carismáticas, ministeriales, en diálogo, respetando lo distinto, al hombre y a la mujer. Creo que la mujer consagrada, tendría un gran papel en esto, pero aún no sabe cómo usarlo.

Las congregaciones son cada vez más conscientes de la importancia de los laicos en la vida de la congregación. En su congregación, esto se está haciendo gradualmente más evidente. ¿Cuál cree usted que debe ser el papel de los laicos, los que asumen el carisma de su congregación, en el futuro de su congregación y de la vida religiosa y la vida de la Iglesia?

Dentro de esta conciencia que hemos estado trabajando, que es la conciencia de que somos una categoría laica, digamos, con sus distinciones, en el sentido de la institución. Pero nosotras, en nuestra acción misionera, tenemos todo para vivir esta dimensión en la vida de la congregación. Creo que con la juventud que viene, la congregación tendrá una mayor posibilidad de estar abierta a esto, de ser consciente de la diversidad de espacios, que a veces incluso se nos ofrecen, y a veces no priorizamos.

La participación en la CNBB, en la CRB, la participación en la Red un Grito por la Vida, en el trabajo contra el tráfico de personas, el trabajo hecho en el Sínodo, como lo está haciendo la comunidad de Manaos, la participación de la Hermana Roselei en el Sínodo, todo esto está ayudando a esta conciencia laica en la congregación, porque esto también se comparte. Desde mi punto de vista, esto necesita ser compartido más, esto necesita ser mejor entendido en toda la congregación. Y otras obras que las hermanas tienen, en Haití, en África. Así que hay grandes posibilidades de que seamos una iglesia en salida, una congregación en salida. La perspectiva de vivir con la conciencia de que somos una categoría laica, que hay una mayor posibilidad con la juventud que viene.

Has sido elegida para los próximos seis años. Dentro de seis años, cuando termine su servicio en la congregación, que podrían ser seis más si fuera reelegida, ¿qué le gustaría decir que ha hecho, y qué le gustaría que la congregación dijera de su trabajo?

Tengo un sueño muy grande de que cuando termine estos seis años, haya rescatado las raíces fundacionales, el carisma, la espiritualidad y la misión de la congregación, que haya ayudado a la congregación a realizar el dinamismo trinitario en ella. Y desde ahí, que la congregación sea una congregación comprometida con los pobres en su totalidad, es un gran sueño mío. Así que, cuando llegue a los seis años y mire hacia atrás, que alguien diga, mira, has logrado rescatar las raíces de la congregación y están firmes con los más vulnerables. Eso es lo que quiero en el futuro, y ver una congregación unida, con una fuerte espiritualidad y una acción misionera muy sólida.  

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