Eliseu Wisniewski – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Fri, 15 Oct 2021 21:44:57 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Eliseu Wisniewski – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 O novo rosto do clero: perfil dos “padres novos” no Brasil, com a palavra Eliseu Wisniewski https://observatoriodaevangelizacao.com/o-novo-rosto-do-clero-perfil-dos-padres-novos-no-brasil-com-a-palavra-eliseu-wisniewski/ Fri, 15 Oct 2021 21:44:57 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=42045 [Leia mais...]]]> Diante da complexidade do perfil dos “padres novos” na Igreja do Brasil – esta obra é um convite para pensar o ministério presbiteral e seu exercício na Igreja e no mundo de hoje“, escreve Eliseu Wisniewski, presbítero da Congregação da Missão (padres vicentinos) Província do Sul e mestre em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), ao comentar o livro O novo rosto do clero: perfil dos padres novos no Brasil (Vozes, 2021, 304 p.).

Capa do livro “O novo rosto do clero:
perfil dos padres novos no Brasil“, de
Agenor Brighenti (Foto: Editora Vozes)

Confira o artigo publicado no IHU:

Os resultados de uma pesquisa de campo em âmbito nacional com as análises apresentadas por especialistas do campo das ciências religiosas e social, em particular da teologia e da pastoral, focaram o perfil dos “padres novos”. Este é o escopo do livro O novo rosto do clero: perfil dos padres novos no Brasil (Vozes, 2021, 304 p.), de autoria de Dr. Agenor Brighenti e coautoria de Alzirinha Rocha de Souza, Andrea Damacena Martins, Antônio José de Almeida, Antônio Manzatto, Brenda Carranza, Fernando Altemeyer Junior, João Décio Passos e Manoel José de Godoy.

Temos vivido tempos de crise, de mudanças e de desafios. As “sombras de um mundo fechado” e “os sonhos desfeitos em pedaços” desafiam também o ministério presbiteral. Frente a isso é fundamental pensar o papel do presbítero na contemporaneidade. Sabedores que o perfil do clero brasileiro vem mudando significativamente nas últimas décadas, Brighenti destaca ser essa a razão principal que

“motivou uma pesquisa em busca do perfil dos “padres novos” no Brasil foi o fato de, nas últimas décadas, ter emergido um novo perfil de presbíteros no Brasil, assim como praticamente em todo o continente. Este contingente de presbíteros da Igreja Católica conforma sua visão de mundo, de Igreja e do exercício do ministério. De um modo geral, em sua vida pessoal e no desempenho de sua missão, eles têm demonstrado sensibilidade e interesse por outras realidades e questões, que aquelas típicas dos “padres das décadas de 1970/1980”, afinados com a renovação do Concílio Vaticano II e sua reconciliação com o mundo moderno, a tradição libertadora da Igreja na América Latina e comportamentos pessoais, ao se vincularem ao recente deslocamento do profético para o terapêutico e do ético para o estético na esfera da experiência religiosa, tem provocado tensões e entraves nos processos pastorais em curso, tanto nas dioceses entre presbíteros como nas paróquias onde atuam frente a religiosas, leigos e leigas” (p. 17).

O novo rosto do clero: perfil dos padres novos no Brasil, p. 17

Como dito acima a obra é o resultado de uma pesquisa de campo, que buscou identificar o perfil dos “padres novos” no Brasil, em relação à sua visão de mundo de hoje, da Igreja e do exercício do próprio ministério. Os dados levantados são oriundos de uma consulta aos presbíteros, leigos (as), jovens, seminaristas e religiosas de três dioceses, em cada uma das cinco regiões do país.

A análise preliminar dos resultados que hora se apresenta, se “restringiu a apresentar um breve relatório dos dados levantados, relativos a cada uma das trinta perguntas que compunham, o questionário aplicado, seguido de uma análise preliminar“ (p. 272), está estruturada em três partes, precedidas de dois capítulos com informações sobre o objeto, o teor e as características da pesquisa.

No primeiro capítulo (p. 17-31), Agenor Brighenti “aborda a emergência dos ‘padres’ novos no catolicismo brasileiro, um sujeito incômodo e objeto particular desta pesquisa” (p. 14). Incômodo, esclarece o autor “no sentido de fazer pensar, provocar instabilidade, levantar questionamentos, exigindo distanciamento analítico, sob pena de desqualificações ligeiras e injustas” (p. 14).

No segundo capítulo  (p. 32-50), Andréa Damacena Martins e Agenor Brighenti “explicitam o teor e as características da pesquisa, referenciais importantes a se levar em conta no acesso aos dados levantados e em suas interpretações “ (p. 14), isso porque “respostas a questões como ‘o que’ se perguntou na busca do perfil dos ‘padres novos’ no catolicismo brasileiro; ‘a quem’ se perguntou para obter os dados almejados; e ‘como’ se perguntou, ou seja, que meios se utilizou para a coleta de dados etc., precisam ser levadas em conta na abordagem dos resultados” (p. 14).

Parte I

Parte I (p. 55-122) apresenta e faz uma análise preliminar de dados coletados pelo primeiro bloco de perguntas do instrumento aplicado na pesquisa de campo, relativo à visão dos entrevistados sobre o mundo de hoje. Brighenti destaca que

o mundo é constitutivo da Igreja. Não é o mundo que está na Igreja, mas é a Igreja que está no mundo. Ela faz parte dele e existe para ser sacramento do Reino de Deus no mundo. Assim sendo, a visão do mundo é um elemento importante para caracterização do perfil dos “padres novos”, tendo-se em consideração que o modo como se dá a relação da Igreja revela muito do perfil daqueles que a integram e da própria instituição, pois não há como estar no mundo sem ser afetado por ele, para o bem e para o mal. Sair do mundo ou buscar nele uma presença neutra, supra ou extramundana, além de uma pretensão ilusória, do ponto de vista da fé cristã não só é contraditório como não é compatível com ela. Apesar dos obstáculos à missão da Igreja no mundo, este é sempre instância de enriquecimento e de possibilidades, pois é dele que ele tira as mediações de sua presença e ação, assim como é nele e para ele que a Igreja existe e age”.

O novo rosto do clero: perfil dos padres novos no Brasil, p. 53-54

Neste bloco perguntou-se:

  1. O que está piorando no mundo hoje?
  2. O que está melhorando no mundo de hoje?
  3. Quais os maiores problemas de nosso povo, hoje?
  4. Quais os maiores desafios que o mundo nos coloca para a vivência da fé cristã?
  5. Quais os principais antivalores reinantes na sociedade atual?
  6. Quais os principais valores que emanam de uma sociedade em mudança, hoje?
  7. Que realidades positivas estão emergindo no mundo de hoje?
  8. Que realidades considera como negativas no mundo de hoje?
  9. Qual deve ser a posição da Igreja frente ao mundo de hoje?
  10. Como a sociedade em geral vê a Igreja, hoje?

Concretamente, nesta primeira parte, em base a um relatório global dos dados (visão da totalidade das amostras, por perspectiva pastoral, por categoria de agentes eclesiais), relativos à “visão dos ‘padres novos’ sobre o mundo de hoje”, redigido por Andrea Damacena Martins e Agenor Brighenti (p. 56- 68), Brenda Carranza faz uma análise preliminar dos dados relativos às questões:  1, 2, 3  e 4 (p. 68-78) ; Andrea Damacena Martins das questões: 5, 6, 7 e 8 (p. 79-95); e, João Décio Passos das questões 9  e 10 (p. 96-110).

A abordagem dos dados desta primeira parte termina com algumas considerações feitas por Agenor Brighenti, o qual chama a atenção para: as ambiguidades de um tempo de travessia, o refúgio em uma subcultura eclesiástica, o individualismo e novas formas de sociabilidade, a crise das instituições e passagem da sociedade para a multidão, a crise de sentido e volta do religioso, a afirmação do simbólico e o escapismo do esotérico, a irrupção do pluralismo e o contraponto da intolerância (p. 110-122).

Parte II

Parte II (p. 123-190) apresenta os dados levantados pelas perguntas do segundo bloco do questionário que tinham por finalidade identificar o perfil dos “padres novos” em relação à visão sobre a Igreja no mundo de hoje.

Estas eram as questões:

  1. A renovação do Vaticano II está avançando, estancada, retrocedendo?
  2. Na prática, a tradição latino-americana (Medellín, Puebla, Santo Domingo e Aparecida) está avançando, estancada ou retrocedendo?
  3. Qual a valoração da Teologia da Libertação?
  4. Que ações do “modelo de pastoral” dos anos de 1970-1980 já não respondem mais na ação da Igreja, hoje?
  5. Que ações do “modelo de pastoral” dos anos de 1970-1980 continuam válidas na ação da Igreja, hoje?
  6. Quais as maiores lacunas ou vazios na ação pastoral, hoje?
  7. Quais os serviços pastorais mais importantes a serem desenvolvidos, hoje?
  8. Que novas frentes pastorais precisam ser abertas, hoje?
  9. Como a ação da Igreja tem contribuído para uma sociedade mais justa e fraterna?
  10. Que mudanças na estrutura da Igreja são mais urgentes, hoje?

Diante disso

a pesquisa se centrou na recepção da renovação do Vaticano II e sua implementação na América Latina, nos parâmetros da tradição eclesial libertadora, que tem na Teologia da Libertação um de seus pilares, bem como no modelo de pastoral daí derivado, apontando para seu alcance, limites e novas frentes pastorais a serem abertas” (p. 175), entendendo que “a adesão ou distanciamento da eclesiologia do Vaticano II, que reconcilia a Igreja com o mundo moderno e a situa no seio da sociedade pluralista, deixando para trás uma Igreja autorreferencial como frisa o papa Francisco, são reveladoras de identidade ou perfil de um cristão ou mais propriamente de um católico em situação contemporânea” (p. 126).

O novo rosto do clero: perfil dos padres novos no Brasil, p. 175 e 126.

Nesta segunda parte, concretamente, em base a um relatório global dos dados relativos à “visão dos ‘padres novos’ sobre a Igreja hoje”, (visão da totalidade das amostras, por perspectiva pastoral, por categoria de agentes eclesiais), redigido por Andréa Damacena Martins e Agenor Brighenti, este faz uma análise dos dados relativos às questões 1, 2 e 3 (p. 127-142); Alzirinha Rocha de Souza das questões 4, 5, 6, e, 7 (p. 143-160); e Antônio Manzatto das questões 8, 9, 10 (p. 161-175).

A abordagem dos dados desta segunda parte termina com algumas considerações gerais feitas por Agenor Brighenti (p. 175-190). Este salienta que

diante da renovação do Vaticano II e das contribuições da Igreja na América Latina, antes de tudo, os quatro modelos inconsequentes com as mudanças de nosso tempo [1) de neocristandade: pastoral de conservação – que desconhece as mudanças; 2) de neocristandade: pastoral apologista – que teme as mudanças; 3) de pós-modernidade: pastoral secularista – que padece diante das mudanças; 4) de encantamento com a modernidade: a pastoral liberacionista – que nega as mudanças], desafiam superar a tentação de voltar às velhas seguranças do passado. Como o mundo mudou também a renovação do Vaticano II e da tradição libertadora precisam passar por uma ‘segunda recepção’ no novo contexto. Se, por um lado, é ser inconsequente com o novo contexto repetir modelos do período pré-conciliar, por outro, além do resgate da renovação do Vaticano II e da tradição libertadora, que se acreditava perdidas, o momento atual já não permite repetir o modo de ser Igreja e de atuar das décadas de 1970/1980” (p. 188).

O novo rosto do clero: perfil dos padres novos no Brasil, p. 188.

Parte III

Parte III (p. 191-278) apresenta os resultados da pesquisa em relação com a visão dos católicos dos Brasil sobre o exercício do ministério presbiteral.

Estas eram as dez perguntas do terceiro bloco:

  1. O que está superado, hoje, do modelo de ministério dos presbíteros da “geração 1970-1980”?
  2. O que continua válido do modelo de ministério dos presbíteros da “geração 1970-1980”?
  3. Quais as principais novidades que os “padres novos” trazem no exercício de seu ministério?
  4. O que não tem futuro no modo dos “padres novos” exercerem o ministério?
  5. Valoração sobre o  processo de formação dos futuros presbíteros
  6. O que parece motivar um jovem ser padre, hoje?
  7. O que parece desmotivar um jovem ser padre, hoje?
  8. Como está a vida e a relação do presbítero de sua diocese, entre seus membros e com o bispo?
  9. como vê s presbíteros, em geral?
  10. Para cumprir sua missão qual o modo mas adequado para um presbítero vestir-se, hoje?

Estas questões mostram que

é na interação entre ‘padres novos’ e ‘padres das décadas de 1970/1980’ que o perfil dos ‘padres novos’ se mostra com mais clareza, pois se está pondo lado a lado duas perspectivas sociopastorais – a perspectiva ‘institucional/carismática’, à qual estão vinculados os ‘padres novos’, e a perspectiva ‘evangelização/libertação’, à qual estão vinculados os ‘padres das décadas de 1970/1980’. A valoração do modelo de ministério relaciona-os com sua perspectiva sociopastoral; dados relativos a seu processo de formação ajudam a ter um conhecimento de causa de certos comportamentos e práticas; e a relação entre presbíteros e do presbitério com o bipo pode medir o grau de fraternidade ou de tensões entre as duas perspectivas de Igreja frente à recepção do Vaticano II e de sua implementação pelo viés da tradição eclesial libertadora, a marca da Igreja na América Latina” (p. 193-194).

O novo rosto do clero: perfil dos padres novos no Brasil, p. 193-194.

Nesta terceira parte, concretamente em base a um relatório global dos dados relativos à “visão dos ‘padres novos’ sobre o exercício do ministério presbiteral na Igreja e no mundo de hoje”, redigido por Andréa Damascena Martins e Agenor Brighenti, (visão da totalidade das amostras, por perspectiva pastoral, por categoria de agentes eclesiais), a análise preliminar dos mesmos é feita por Antônio José de Almeida – questões 1, 2, 3 e 4 (p. 195-216), Fernando Altemeyer Júnior – questões 5, 6 e 7 (p. 217-231), Manoel José de Godoy – questões 8, 9 e 10 (p. 232-256). As considerações finais sobre o conjunto desta terceira parte foram feitas por João Décio Passos (p. 256-269).

O referido autor tece comentários sobre a individuação religiosa e o perfil do presbítero, ficando “duas dinâmicas sociológicas presentes nos tempos de mudança na era conciliar e, por conseguinte, nas práticas ministeriais. A primeira relacionada à preservação de modelos ministeriais tradicionais. A segunda a mudanças ocorridas nas práticas ministeriais nos últimos tempos, desde as renovações desencadeadas pela renovação conciliar” (p. 257). Conclui ressaltando que “assiste-se, hoje, a um avanço progressivo de um individualismo religioso tradicionalista ou de um tradicionalismo individualizado” (p. 269).

Visão geral da pesquisa e do livro

Este livro apresenta parte dos dados levantados por uma pesquisa de campo levado a cabo em todo o território nacional, seguida de uma análise dos resultados, ainda que de modo preliminar, por parte de renomados teólogos-pastoralistas e cientistas sociais. Frente a isso

as categorias utilizadas para pensar os resultados de uma pesquisa operam numa dinâmica de circularidade, quando os elementos teóricos e empíricos se iluminam mutuamente e se complementam, na medida em que possibilitam a construção de um quadro compreensivo. As reflexões aqui apresentadas nasceram dessa operação metodológica. Não se trata de um discurso normativo, mas tão somente interpretativo. Seu uso quiçá útil se restringe às possibilidades e limites dessa hermenêutica” (p. 268).

O novo rosto do clero: perfil dos padres novos no Brasil, p. 268.

O novo perfil de presbíteros na Igreja Católica “não é um fenômeno simplesmente passível de ser desqualificado ou desprezado. O fenômeno têm atraído a atenção de teólogos, cientistas da religião e analistas sociais, tal como demonstram pesquisas” (p. 18), comprovando que o ministério presbiteral revela nos últimos anos um deslocamento de um modelo construído pelo Vaticano II para um avanço progressivo de um individualismo religioso tradicionalista ou de um tradicionalismo individualizado (cf. p. 268-269).

Diante da complexidade do perfil dos “padres novos” na Igreja do Brasil – esta obra é um convite para pensar o ministério presbiteral e seu exercício na Igreja e no mundo de hoje –  com lucidez e criticidade, pois, em

meio a práticas e pastorais e comportamentos pessoais, por um lado ligados aos valores da pós-modernidade e às novas tecnologias e, por outro, a devocionismos e tradicionalismos nostálgicos de um passado sem retorno, é preciso identificar em meio à ambiguidade de um sujeito incômodo, críticas precedentes à forma como se tem levado a cabo a renovação do Vaticano II e a tradição eclesial libertadora, bem como possíveis novidades e valores por eles vinculados a serem levados em consideração” (p. 18).

O novo rosto do clero: perfil dos padres novos no Brasil, p. 18.

A busca permanente de fidelidade ao Deus da história na ação evangelizadora exige debruçar-se com seriedade sobre o fenômeno dos “padres novos”. Tenha-se em conta que, em 2019, segundo os dados do Censo Anual da Igreja Católica no Brasil, temos um contingente presbiteral de 21.812, sendo 14.690 integrantes do clero diocesano e 7.121 do clero religioso.

Certamente este estudo analítico em muito ajudará a superar juízos precipitados ou preconceituosos, bem como tomadas de posição que desconheçam a realidade concreta da vida e do ministério desse segmento importante do clero, sobretudo quando este vai ser o depositário da responsabilidade, nas décadas futuras, de estar à frente dos processos pastorais nas Igrejas Locais e da formação dos futuros presbíteros. Em suma, O novo rosto do clero: perfil dos “padres novos” no Brasil contribuirá com a “obra evangelizadora da Igreja católica no Brasil e sua missão na sociedade atual” (p. 11).

Uma correção a ser feita futuramente e uma observação. A correção: na página 126, onde se diz que Alzirinha Rocha de Souza faz a análise dos dados relativos às questões 4, 5, 6 e 8; e Antônio Manzato das questões 7, 8 e 10.

A observação: na página 23, Brighenti utiliza como referência a obra Cenários da Igreja (Edições Loyola), do teólogo jesuíta João Batista O novo rosto do clero: perfil dos padres novos no Brasil, p. 188. (1932-2014) – o faz a partir da sua primeira edição publicada em 1999. Nesta edição Libanio traçou visões da Igreja a partir de quatro categorias centrais: a “instituição”; o “carisma”; a “pregação” e a “práxis transformadora”. Naquele contexto estes quatro cenários cobriram o conjunto de movimentos e tendências no interior da Igreja católica.  

Na quarta edição desta obra, em 2009, Libanio, acrescentou um quinto cenário: a Igreja plural fragmentada pós-moderna (p. 159-196), entendendo que a categoria da “fragmentação”, com o crescente pluralismo de expressões religiosas, permite entender melhor o momento atual da Igreja em choque com o relativismo daí resultante. No contexto dos últimos anos de pontificado de João Paulo II e no pontificado de Bento XVI, este veio a renunciar em 2013, o quinto cenário pretendeu mostrar o que estava a acontecer naquele momento, destacando uma nova maneira de viver o conflito, preferindo prescindir das tensões a enfrentá-las bem no espírito pós-moderno. O futuro deste quinto cenário, segundo Libanio “dependerá de como a Igreja institucional reagirá e de como o povo de Deus tomará consciência de sua vocação. Enquanto se permanecer no embate entre o cenário tradicional duro e o leve pós-moderno, como alternativas, parece que o último levará vantagem por força dos fatos e da cultura dominante” (p. 194).

Os resultados desta pesquisa sobre o perfil dos “padres novos” e as análises dos renomados teólogos-pastoralistas e cientistas sociais confirmam em grande parte os apontamentos apresentandos por Libanio neste quinto cenário: “a radiografia mostra como está a funcionar o corpo eclesial com a pluralidade de componentes que atuam nele” (p. 198).

Fonte:

IHU

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“Pastoral numa Igreja em saída”, reflexões em vista da recepção do Documento 100 da CNBB https://observatoriodaevangelizacao.com/pastoral-numa-igreja-em-saida-um-convite-a-reflexao/ Tue, 25 Jun 2019 18:53:22 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=30769 [Leia mais...]]]> A obra Pastoral numa Igreja em saída foi organizada por Francisco das Chagas de Albuquerque e Manoel José de Godoy, ambos, especialistas em Teologia Pastoral. Albuquerque é doutor em Teologia Sistemática e professor de Teologia pastoral desde 2009 na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE – Belo Horizonte); Godoy é mestre em Teologia pastoral e supervisor de estágios pastorais na FAJE.

Trata-se de um livro gestado no meio acadêmico, pelo Grupo de Pesquisa Teologia e Pastoral, que reúne pesquisadores e estudantes de instituições acadêmicas e de formação de Belo Horizonte (FAJE, PUC Minas, ISTA, Centro Loyola de Fé e Cultura). O Prefácio é de autoria do Prof. Agenor Brighenti (PUC PR). Ele ressalta que, em tempos de imediatismos, pragmatismos e providencialismos, é sempre bem-vindo um livro de teologia pastoral, na esperança de que não fique no meio acadêmico, mas chegue aos agentes engajados na capilaridade das comunidades eclesiais, atreladas a paróquias que necessitam de urgente reconfiguração, na perspectiva da renovação conciliar e da tradição eclesial libertadora da Igreja na América Latina.

Destaca, ainda, que os textos do livro mostram que a pastoral é uma ação complexa. Por isso, a pastoral precisa situar-se numa relação interdisciplinar com aquelas ciências imprescindíveis para um engajamento consequente dos cristãos num mundo plural e cada vez mais diversificado. É a inter-relação da teologia pastoral com outros saberes, que lhe permitem precisar o “ponto de partida” e vislumbrar o “ponto de chegada” da ação evangelizadora.

Observa, outrossim, que o ponto de partida diz respeito a colocar os pés no chão (a realidade é mais importante que a ideia). Para caminhar do ponto de partida ao ponto de chegada, é preciso fazer processo (o tempo é superior ao espaço). Para fazer processo, faz-se necessária uma ação conjunta, que incida sobre a globalidade da realidade (o todo é superior à parte). Finalmente, fazer processo a partir da realidade, envolvendo tudo e todos, implica assumir conflitos e superá-los (a unidade é superior ao conflito).

Na apresentação feita pelos organizadores descreve-se a gênese desse livro. O Grupo e Pesquisa Teologia e Pastoral, a partir do estudo do Documento 100: Comunidade de Comunidades: uma nova paróquia (CNBB, 2014), propõe chaves de leitura que possam guiar as várias instâncias da pastoral preocupadas com a realidade efetiva na vida da Igreja. Ao longo de mais de um ano, os membros do grupo se debruçaram sobre as temáticas abordadas no documento, aprofundando-as e ampliando-as em perspectiva acadêmica e pastoral, descobrindo, assim, novas pistas para se pensar a pastoral no século XXI. Os resultados da pesquisa constituem-se no conteúdo deste livro disponibilizado para um amplo público.

A obra é composta de 10 capítulos. Os dois primeiros trazem um aprofundamento da situação cultural e religiosa da atualidade; os seguintes, do terceiro ao sexto, abordam temas centrais do documento 100; o sétimo e o oitavo lançam um olhar sobre os ministérios eclesiais; o nono e o décimo trabalham questões referentes ao planejamento pastoral.

1) Geraldo de Mori (FAJE), em O anúncio de Jesus Cristo em novos tempos – nas fronteiras da “insignificância”, do “sujeito vulnerável e da tecnociência, privilegiando um recorte sistemático, faz, num primeiro momento, uma leitura teológica de nosso tempo e mostra que entramos num período de “debilidade”, que afeta nossa concepção de Deus, do ser humano e de mundo. Nesses três âmbitos, percebe-se a “mudança de época” em curso nas sociedades avançadas e nas que por elas são influenciadas. Esclarece que, nas sociedades latino-americanas, esse processo tem outra dinâmica, uma vez que nelas predomina a cosmovisão pré-moderna, combinada com elementos socioeconômicos, políticos e culturais que as tornam complexas. Tendo como base essa análise, o Autor debruça-se sobre o que seriam as fronteiras da evangelização hoje: a insignificância dos pobres, a vulnerabilidade do sujeito e a tecnociência. Essas fronteiras da evangelização desafiam a Igreja à saída das zonas de conforto e da estabilidade para a redescoberta da alegria do Evangelho.

2) Cleusa Caldeira (FAJE), em Novos rostos, novos desafios: uma Igreja atenta aos “sinais dos tempos”, analisa a crise das instituições religiosas no contexto brasileiro a partir do Censo de 2010 e aponta o crescimento dos “sem religião” como um dos desafios no campo religioso brasileiro. Mostra que, no contexto da pós-modernidade, não há um sujeito, previamente vivido como tendo uma identidade unificada e estável, mas um indivíduo fragmentado, composto de múltiplas identidades, muitas vezes contraditórias ou não resolvidas, configurando identidades religiosas, segundo a clássica classificação da socióloga francesa Danièle Hervieu-Léger, denominadas como: a) praticante; b) peregrino; c) convertido. Para discernir como acontece a redenção no seio da história da humanidade fragmentada, a Autora aponta alguns elementos teológicos: a lógica da kénosis, da encarnação e da redenção. Por meio delas, é possível despojar-se de toda a pretensão de domínio e anunciar a mensagem da salvação.

3) Manoel José de Godoy (FAJE), em Paróquia no meio urbano, rede de comunidades, e a contribuição das Comunidades Eclesiais de Base, tem como ponto de partida a paróquia e levanta alguns aspectos em que o modelo das CEBs pode contribuir para que essa estrutura milenar se abra para uma perspectiva mais missionária. As CEBs, na área rural e urbana, deram vida nova à velha estrutura paroquial. Procurando viver no espírito do Concílio Vaticano II, elas buscaram praticar a hospitalidade, sobretudo com os pobres e excluídos, e lutar pela superação de todas as discriminações, que impedem viver como verdadeiros irmãos e irmãs. Destaca que, após um longo inverno eclesial, com o advento do Papa Francisco, elas ganharam novo fôlego e são um potencial para a evangelização no mundo urbano. Apresenta um desafio a ser enfrentado: recuperar em novos moldes seu elã. Será tarefa para os próximos anos. Como rede de comunidades, as CEBs já contribuíram com as paróquias, mas podem continuar, sobretudo no meio urbano.

4) Gelson Luiz Mikuszka (FAJE), em Reflexões metodológicas a partir de uma experiência. Suscitar comunidades cristãs, a partir da experiência de ação evangelizadora realizada numa paróquia do Estado do Paraná, por um período de dois anos, descreve metodologicamente como tal ação poderá contribuir com a reflexão sobre as novas práticas em relação à suscitação de comunidades cristãs numa paróquia. Num segundo momento, o Autor faz uma autocrítica de sua experiência e, a partir daí, amadurece princípios e critérios que visem suscitar comunidades de fé.

5) Francisco das Chagas de Albuquerque (FAJE), em Comunidade missionária: pastoral de manutenção ou de fronteira, reflete sobre o imperativo de a comunidade eclesial assumir sua missionariedade com a alegria evangélica, própria de uma comunidade missionária. Mostra que, em nosso contexto, são várias as situações de fronteira que desafiam e interpelam os cristãos, individual e comunitariamente, ao anunciar e testemunhar o Evangelho em vista da plena libertação e realização do ser humano. Destaca que ser missionária é, por excelência, o modo de toda a Igreja ser. A comunidade missionária se forma a partir do chamado de Jesus: Ele chama seus seguidores, forma-os na convivência cotidiana e os envia, constituindo-os, assim, em apóstolos-missionários. A vida missionária da comunidade eclesial se desenvolve no fiel seguimento de Jesus Cristo, comprometido com o Reino de Deus e com o serviço à sociedade. Uma Igreja “em saída” supera as práticas de pastoral de manutenção e assume a proposta de uma pastoral de fronteiras, num espírito de Igreja verdadeiramente missionária.

6) Maria Eugenia Lloris Aguado (PUC-Minas), em Comunidades ambientais: o território da afinidade, mostra como a mobilidade alcançada pelos meios de comunicação e pela tecnologia facilitam transitar por diferentes lugares em curtos espaços de tempo. Percepções de tempo e espaço mudaram consideravelmente, uma vez que a vida humana desenvolve-se em ambientes e territórios diversificados. Tal realidade exige que pensemos alternativas de agrupação ou sociabilidade e, portanto, de comunidade. Imersos em um mundo globalizado, sabe-se que a comunidade virtual não se opõe à comunidade presencial e que as redes estabelecidas na internet são duradouras, quando mantêm um vínculo real. A Autora indica de que maneira as comunidades ambientais criadas na rede social podem iluminar nossas práticas e abrir espaços reais para as comunidades afins ou ambientais presenciais e como as comunidades ambientais, nascidas de um interesse comum, podem ser autênticas comunidades de vida e de fé.

7) Cleto Caliman (PUC- Minas), em Igreja e ministérios eclesiais, defende que os ministérios eclesiais adquiriram maior relevância depois do Concílio Vaticano II (1962-1965). Este concílio deu impulso renovador à vida eclesial, dentro de uma nova moldura histórica, que suscita novas interrogações decorrentes, primeiro, da renovação da própria autocompreensão da Igreja em sua relação consigo mesma. Mostra que essa mudança de enfoque pode caracterizar-se brevemente pelo deslocamento do acento da hierarquia para Povo de Deus, partindo da eclesialidade batismal e da igualdade fundamental de todos os fiéis. Partindo deste novo quadro histórico-cultural e reconhecendo a complexidade da problemática, o Autor explora a possibilidade de uma nova configuração dos ministérios eclesiais, perfazendo dois momentos: o das transformações dos ministérios eclesiais na era constantiana, com um rápido aceno a a seus desdobramentos eclesiais dos primeiros séculos até as vésperas do Concílio Vaticano II, e o da sondagem dos caminhos de um novo paradigma: a) alguns aspectos da teologia da Igreja à luz do Concílio Vaticano II; b) possibilidades de florescimento e renovação do ministério ordenado; c) ministérios ordenado para mulheres?

8) Edward Neves Monteiro de Barros Guimarães (PUC – Minas), em Conversão pastoral na estrutura da Igreja: o desafio de um novo jeito de ser presbítero, propõe uma reflexão sobre a urgente tarefa da Igreja de formar seus presbíteros para a missão em um modelo de Igreja que seja comunidade de irmãos, pensando conforme a sugestão do Documento 100 da CNBB a possibilidade de uma nova configuração pastoral dos presbíteros. Por isso, faz-se necessário compreender que os presbíteros são, antes de tudo, cristãos batizados e situados em determinado contexto histórico e, como qualquer ser humano, sendo portadores de dons e qualidades, como também de limites e ambivalências. Destaca que não só é possível, mas necessário buscar novos caminhos. Apresenta algumas propostas concretas de conversão pastoral e defende que o desafio de trilhar o caminho da conversão pastoral de nossas estruturas paroquiais – proposta assumida pelo Documento de Aparecida e com os apelos lançados pelo papa Francisco, na Evangelii Gaudium – exige “novos” perfis de presbíteros e o cultivo de “novas” relações eclesiais entre hierarquia e laicato.

9) Manoel José de Godoy (FAJE), em Por que planejar?, oferece um balanço da atual situação da pastoral e, em seguida, expõe razões teológicas, pastorais e conjunturais em defesa do planejamento participativo. Destaca que o planejamento participativo ressalta a importância do desenvolvimento de uma eclesiologia segura da Igreja Local. Conclui apresentando algumas exigências para a recepção do plano diocesano, tendo-se em conta que é a partir da diocese – do Bispo e de seus colaboradores diretos – que a Igreja Local poderá articular suas diversas expressões e mostrar a unidade e a variedade de sua vitalidade. Em anexo, apresenta algumas pistas práticas para a elaboração de um Projeto Pastoral.

10) Felipe Magalhães Francisco (PUC Minas), em Nos passos da 5ª Assembleia do Povo de Deus, da Arquidiocese de Belo Horizonte: memória pedagógica de um planejamento pastoral, faz a memória de um caminho percorrido pela Arquidiocese de Belo Horizonte por meio das Assembleias do Povo de Deus (APD). Mostra que o Projeto Construir Esperança, que marcou o início de uma pastoral organizada e orgânica, colocou a Arquidiocese de Belo Horizonte diante de um horizonte muito amplo, que ecoa desde o Concílio Vaticano II, e que, 25 anos depois, quando já se trilhou o caminho da 5ª Assembleia do Povo de Deus, os temas aí surgidos evocam uma práxis pastoral que atenda às exigências pastorais de nosso tempo, diante daquilo que se discerne como interpelação pastoral para o hoje da ação evangelizadora. Entre os temas, destacaram-se: a participação e todos na vida eclesial, presbíteros e leigos, a centralidade da Palavra e Deus, consciência missionária, uma Igreja em pequenas comunidades. Destaca qual foi a pedagogia da 5ª APD e conclui apontando algumas mudanças e novidades que surgiram nas últimas APDs.

Os organizadores desta obra bem como o Grupo de Pesquisa Teologia e Pastoral merecem um elogio por trazer a público um texto de Teologia Pastoral. Uma abordagem bem desenvolvida em ambientes acadêmicos protestantes e escasso em ambientes acadêmicos católicos. A obra tem o mérito de tratar de um assunto relevante para a caminhada eclesial em tempos de mudança e de papa Francisco. Poderíamos classificá-la como o GPS das atividades pastorais.

Diante de modelos de pastoral inconsequentes com os tempos atuais (pastoral de conservação; pastoral apologista; pastoral secularista; pastoral liberacionista), urge um paradigma pastoral aberto, acolhedor e inclusivo. Os autores desta obra caminham nesta perspectiva e apontam indicações práticas para uma “Igreja em saída”.

O livro cumpre a função de ser um ótimo instrumento para estudantes de teologia, pois, mostra como conciliar teoria e prática pastoral. Afinal, uma boa teologia leva à prática e a prática precisa ser nutrida por uma boa teologia. Teologia e prática pastoral se retroalimentam. Nas palavras de Agenor Brighenti, “com os teólogos latino-americanos aprendemos que uma teologia consequente com os desafios da realidade é sempre um “ato segundo”, precedido por um “ato primeiro”, que são as práticas eclesiais e sociais” (p. 8).

A obra traz atualização de algumas temáticas fundamentais no campo pastoral e, por isso, é indicada também para agentes de pastoral. Estamos diante de um texto de leitura fácil, exceto os dois primeiros capítulos que exigem do leitor familiaridade com o campo sociológico (tendo-se em conta que a ação pastoral precisa da normatitividade de um discurso inter transdiciplinar).

Ao se pensar a pastoral da Igreja na atualidade e em vista da recepção do Documento 100 da CNBB, vale a pena conferir as oportunas reflexões, provocações e indicações contidas nesse livro.

Sobre o autor:

Eliseu Wisniewski é doutorando em Teologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, PR, Brasil.

Rua Pedro Gawlak, 174
83704-560 Araucária – PR/BRASIL

E-mail: <eliseu.vicentino@gmail.com

Fonte:

Revista Eclesiástica Brasileira

(REB, Petrópolis, volume 79, número 312, p. 251-256, Jan./Abr. 2019)

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