Eclesiologia do Concílio Vaticano II – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Thu, 05 Dec 2019 19:01:24 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Eclesiologia do Concílio Vaticano II – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 O tripé da concepção de Igreja do Concílio Vaticano II: Reino-Igreja-Mundo (8) https://observatoriodaevangelizacao.com/o-tripe-da-concepcao-de-igreja-do-concilio-vaticano-ii-reino-igreja-mundo-8/ Thu, 05 Dec 2019 19:01:24 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=33709 [Leia mais...]]]> Uma vez abordadas cada uma das categorias do tripé da eclesiologia do Concílio Vaticano II – Reino-Igreja-Mundo, resta inter-relacionar Igreja-Reino e Igreja-Mundo.

O eclipse do Reino Deus na concepção de Igreja, bem como a postura de fuga mundi, foram superados pela renovação conciliar, em sua volta à fontes bíblicas e patrísticas.

O Concílio é claro:

… a Igreja, enriquecida com os dons de seu fundador, observando fielmente seus preceitos de caridade, de humildade e de abnegação, recebe a missão de anunciar o Reino de Cristo e de Deus, de estabelecê-lo em meio a todas as pessoas, e constitui na terra o gérmen e o princípio deste Reino” (LG5,2).

Frisa o Vaticano II que a Igreja não se identifica com o Reino de Deus, pois, é dele apenas “gérmen e princípio”. E sua missão consiste em anunciá-lo e, enquanto seu sacramento, também em torná-lo presente no Mundo.

Comecemos pela relação Igreja-Reino:

De uma Igreja absorvedora a uma Igreja servidora do Reino

Já vimos que, historicamente e, por longo tempo, a Igreja se auto-identificou com o Reino de Deus. De servidora, tornou-se absorvedora do Reino. Mas, o Vaticano II corrigiu esta anomalia. Afirmou que não é o Reino que está na Igreja, mas é a Igreja que faz parte do Reino, dado que ela é apenas seu “gérmen e princípio”. Pelo Espírito Santo, o Reino de Deus também se faz presente fora da Igreja. A justiça, a paz e o amor, não são monopólios dos cristãos. Onde quer que eles reinem e se faça a vontade de Deus, o Reino de Deus está presente. 

Além do Reino de Deus não se restringir à comunidade dos discípulos de Jesus, que é a Igreja, também não acontece somente na esfera estritamente religiosa ou na interioridade secreta da consciência.

O Reino se produz na concretude da realização do amor ao próximo, em suas objetivações empiricamente perceptíveis, apesar da ambiguidade da história. Consequentemente, história da Igreja e história da salvação não coincidem. Há salvação fora da Igreja porque há presença do Reino para além de suas fronteiras.

Assim, como sacramento do Reino, seu “gérmen e princípio”, cabe à Igreja mostrá-lo e testemunhá-lo, sem se orgulhar disso, pois é apenas depositária de um dom a ser partilhado com toda a humanidade. 

A relação Igreja-Reino está marcada por uma tensão

A relação Igreja-Reino, em virtude de a Igreja estar marcada pelos limites do humano e peregrinar na história, está caracterizada por uma tensão. Por um lado, há um abismo entre Igreja e Reino e, por outro, estreita relação. Ela se move entre infinita distância e proximidade.

Estreita relação e proximidade no sentido de que os dons do Reino, que são frutos do Espírito, já se fazem presentes na Igreja, ainda que de maneira imperfeita, misteriosa, mas real (Cl 13,2). E abismo e distância porque o Reino de Deus, enquanto plenitude e consumação da história, por mais que a Igreja o antecipe no mundo, suas realizações estarão sempre aquém do Reino definitivo, cuja plenitude se remete à meta-história.  

Esta tensão entre o que “já” chegou do Reino de Deus e o que “ainda” se espera que chegue um dia, caracteriza o ser da Igreja. Por isso, a Igreja é peregrina (2Cor 8,6). Vive ao mesmo tempo o “já” da presença do Reino, enquanto depositária dos meios de salvação e, o “ainda não” de sua plenitude, que a projeta para o futuro, a ser antecipado o máximo possível no presente.

Sempre que a Igreja elimina esta tensão, pretendendo se identificar com o Reino, deixa de ser a Igreja de Jesus e eclipsa o Reino.

 

Acolher e contribuir com a presença do Reino fora da Igreja

Finalmente, a relação Reino-Igreja conclama os cristãos a acolher e a colaborar com a edificação do Reino de Deus, presente para além das fronteiras da Igreja. Sua missão consiste, antes de tudo, em acolher a obra que Deus fez, pelo seu Espírito, também fora dela. Antes do missionário sempre chega o Espírito Santo. Tudo o que é vida, bondade, justiça, amor, paz¸ é obra do Espírito e presença do Reino de Deus, mesmo que se dê de modo implícito e fora da Igreja.

Na verdade, o Espírito Santo está presente, como dinamizador da vida, tanto na obra da Criação, como na obra da Redenção. Como dizia Santo Irineu, Jesus e o Espírito Santo são os dois braços pelos quais o Pai age e faz acontecer seu Reino no mundo.

Além de acolher a obra do Espírito que atua para além de suas fronteiras, a Igreja está chamada também a colaborar com aqueles que agem no Espírito e edificam o Reino, mas não são Igreja (GS 40). Colaborar com iniciativas de adeptos de outras religiões e de pessoas de boa vontade, é colaborar com a obra de Deus, realizada na graça de seu Espírito. O cristão, como cidadão do Reino, é companheiro de caminho de todas as pessoas de boa vontade, sejam elas pessoas de fé ou simplesmente professantes de um “humanismo aberto ao Absoluto” (Paulo VI).

Como dizia Dom Hélder Câmara, “às vezes, não apoiamos certas bandeiras, que são evangélicas, só porque estão em mãos que julgamos erradas”. O mesmo aconteceu com os apóstolos de Jesus: “Mestre, vimos um homem expulsando demônios em teu nome e procuramos impedi-lo, porque ele não era um dos nossos” (Mc 9,38). 

(os grifos são nossos)

Sobre o autor:

Agenor Brighenti

Doutor em Ciências teológicas e religiosas pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica; professor-pesquisador da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Curitiba; professor visitante do Instituto Teológico-Pastoral para América Latina do CELAM, em Bogotá, e membro da Equipe de Reflexão Teológica-Pastoral do CELAM. Foi um dos peritos da equipe de sistematização do Sínodo para a Amazônia.

Fonte:

www.amerindiaenlared.org

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O tripé da concepção de Igreja do Concílio Vaticano II: Reino-Igreja-Mundo (7) https://observatoriodaevangelizacao.com/o-tripe-da-concepcao-de-igreja-do-concilio-vaticano-ii-reino-igreja-mundo-7/ Tue, 03 Dec 2019 18:06:17 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=33679 [Leia mais...]]]> No artigo anterior, apresentamos a concepção de mundo no pensamento grego e na Bíblia. Agora, vejamos algumas características da concepção de mundo no itinerário da teologia, da antiguidade à época contemporânea.

Veremos que o modo como o mundo é concebido pelos cristãos e pela teologia, vai  influir diretamente na compreensão da missão da Igreja e na própria vivência da fé cristã. Veremos também que a evolução histórica da concepção de mundo permanecerá atrelada ao entendimento de Santo Agostinho, da Igreja antiga ao advento da era contemporânea, somente sendo superada com a profunda renovação do Concílio Vaticano II. 

A concepção de mundo em Santo Agostinho

Na Igreja antiga, mais precisamente no seio da teologia patrística, havia duas visões distintas de mundo: uma ligada a Santo Irineu (+ 202) e outra a Santo Agostinho (+ 430). A primeira vem da tradição bíblico-semita, fundada numa antropologia unitária, isto é, sem separação entre corpo-alma, espírito-matéria, história da salvação e história da humanidade; a segunda é oriunda da filosofia grega, mais exatamente do estoicismo, caracteriza pelos dualismos citados, com uma visão pejorativa do mundo, do corpo, da sexualidade, espiritualista.

Dada a cultura da época, marcada pelo neoplatonismo, a concepção bíblico-semita de Santo Irineu será eclipsada pela concepção dualista de Santo Agostinho, que reinará na Igreja até o advento da era contemporânea. 

Resumidamente, para Santo Agostinho, o cosmos se divide em dois reinos: a civitas terrena (a cidade dos homens) e a civitas Dei (a cidade de Deus). Pelo “pecado de Adão”, o mundo foi corrompido e tornou-se mau. E permanecerá mau até o juízo final, quando no Cristo Ressuscitado tudo será restaurado, recriado, recapitulado. Até lá, o cristão deve tomar distância do mundo – da Cidade dos homens, e refugiar-se na Cidade de Deus, no âmbito espiritual, procurando salvar sua alma. Dado que o pecado corrompeu o mundo, a oposição entre graça-pecado é entendida como oposição entre graça-natureza. O mundo passa a ser sinônimo de pecado e o corpo tido como fonte de concupiscência. Daí a atitude de Santo Agostinho de desconfiança do mundo material e as numerosas exortações para fugir do mundo (fuga mundi), desprezar o corpo, exaltando a virgindade e a vida contemplativa em relação ao casamento e à vida ativa. Segundo ele, o ser humano não encontra seu consolo no mundo; só em Deus se tranquiliza seu coração inquieto.

A concepção de mundo na Idade Média e na Modernidade

Na Idade Média, a teologia escolástica deixa para trás Platão, mostrando interesse por Aristóteles – o filósofo da natureza. É conhecido o axioma de Santo Tomás que “a graça se apoia sobre a natureza”. Entretanto, a falta de ciências que abordem as realidades terrestres a partir delas mesmas, contribuirá para que a concepção cristã de mundo continuasse atrelada ao modo como Santo Agostinho o havia entendido. 

No século XVI, com a irrupção da civilização moderna e o surgimento das ciências metodologicamente a-religiosas, culturalmente, dar-se-ia a superação da visão pejorativa e espiritualista de mundo. Mas, como a teologia não se abriu a estas ciências, continuou reproduzindo a visão de mundo de Santo Agostinho, tal como atesta a obra a “Imitação de Cristo”, de Tomás Kempis. Este livro de espiritualidade devocional, na perspectiva da “fuga mundi”, publicado em 1441, em diversos momentos, era mais lido do que a própria Bíblia.

A própria Reforma protestante, que acolhe valores da modernidade como razão individual e livre arbítrio, teologicamente, continuaria atrelada à concepção de mundo de Santo Agostinho. Para Lutero, que não podemos esquecer que quando católico era monge agostiniano, como o mundo foi corrompido pelo pecado de Adão e uma árvore má não pode dar frutos bons, o ser humano peca em tudo o que faz. Suas obras não têm mérito algum; só a fé e a confiança nos méritos de Cristo pode salvá-lo. 

A concepção de mundo na teologia contemporânea

Na época moderna, a teologia continuou antiga e medieval, apesar da mudança na compreensão do mundo operada pelas ciências da natureza e a filosofia.

Caberia à teologia contemporânea, no século XX, tanto a protestante, quanto a católica, uma vez superadas todas as tentativas de retorno à cristandade, tratar de recuperar o atraso. Isso só foi possível graças a um diálogo da teologia com as ciências naturais, em especial a teoria da relatividade, a física, a bioquímica e a astronáutica.

Vejamos alguns exemplos:

  • Para R. Bultmann, não dá para separar revelação de Deus da história, nem sua interpretação de uma consciência situada no mundo;
  • Para D. Bonhoeffer, a cruz de Cristo não nos leva a fugir do mundo, antes a assumi-lo para salvá-lo;
  • Para Teillard de Chardin, a história da humanidade, as ciências e o progresso, em meio a contradições, vão levando toda a obra da Criação a convergir para “Cristo tudo em todos”. 

A teologia, finalmente, depois de 1500 anos, através de uma releitura da Bíblia, em uma “volta às fontes” ajudada pelas ciências, foi transformando a sua compreensão do mundo e consequentemente da missão da Igreja.

Elenquemos alguns desdobramentos:

  • Que o pecado afetou a Criação, mas não a corrompeu;
  • Que o mundo, criado Deus, era bom e continua bom, ainda que marcado pelo pecado;
  • Que o plano da redenção recapitulou o plano da criação e, portanto, no Corpo Cósmico de Jesus ressuscitado, o mundo já está potencialmente redimido, desde agora, dando, assim, consistência salvífica à história da humanidade, sem ter que esperar pela escatologia final;
  • Que para continuar a obra redentora de Jesus, da qual a Igreja é sinal e instrumento, cabe aos cristãos não fugir do mundo, mas, ao contrário, é preciso se inserir nele, pois, “o que não é assumido não é redimido”;
  • Compreende-se que a Igreja está no mundo e existe para a salvação do mundo;
  • Que não é o mundo que está na Igreja, mas é a Igreja que está no mundo;
  • Que o mundo é constitutivo da Igreja, sem que ela deixe de ser santa, pois é lugar da presença de Deus, assim como a obra da Criação.

Sobre o autor

Agenor Brighenti

Doutor em Ciências teológicas e religiosas pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica; professor-pesquisador da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Curitiba; professor visitante do Instituto Teológico-Pastoral para América Latina do CELAM, em Bogotá, e membro da Equipe de Reflexão Teológica-Pastoral do CELAM. Foi um dos peritos da equipe de sistematização do Sínodo para a Amazônia.

(Os grifos são nossos)

Fonte:

www.amerindiaenlared.org

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O tripé da concepção de Igreja do Concílio Vaticano II: Reino-Igreja-Mundo (6) https://observatoriodaevangelizacao.com/o-tripe-da-concepcao-de-igreja-do-concilio-vaticano-ii-reino-igreja-mundo-6/ Sun, 01 Dec 2019 15:47:50 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=33649 [Leia mais...]]]> Reino-Igreja-Mundo constituem o tripé da eclesiologia do Vaticano II, em sua “volta às fontes” bíblicas e patrísticas. Nos artigos anteriores, abordamos o que se entende por Reino e por Igreja, tanto na Bíblia como no itinerário da teologia.

Vamos, agora, tratar do “mundo”, ao qual a Igreja pertence. O mundo constitui o lugar e a finalidade da missão da Igreja, que é a de tornar presente nele o Reino de Deus, do qual ela é sacramento. Vamos fazê-lo em dois momentos. Neste artigo, veremos o que se entende por mundo na filosofia grega e na Bíblia. No seguinte, como a Igreja foi compreendendo o mundo em seu itinerário histórico pela reflexão pela teologia. 

Como os gregos concebiam o mundo

Vamos, aqui, nos limitar ao pensamento clássico, anterior e contemporâneo ao nascimento do cristianismo. O termo grego para designar o mundo é “cosmos” que, originariamente, significa “ordem”, oposto a “caos”. Era utilizado somente pelos filósofos. Depois, com o estoicismo, tornou-se linguagem corrente. O que chama a atenção é que o significado do termo tem uma valoração qualitativa e positiva do mundo. Trata-se de um todo fundamentado internamente, como uma ordem harmoniosa (originariamente o termo se aplicava à ordenação jurídica e, logo, também ao ornato das mulheres; daí deriva o termo “cosméticos”). Também chama a atenção que o mundo tenha sido caracterizado com um conceito tomado da esfera humana, marcando a estreita relação entre o mundo do humano e o mundo das coisas.

Por “cosmos”, Platão designa “céu e terra, deuses e homens” (o mundo sensível é somente projeção do mundo real, só apreensível espiritualmente). Já para Aristóteles, o mundo é a natureza – uma realidade que opera incansavelmente, segundo a essência de Deus. Por isso, para ele, a ciência mais importante não é a antropologia, como para Platão, mas a cosmologia. 

Mas, a concepção de mundo, que iria preponderar e influenciar o cristianismo, viria de uma corrente filosófica e espiritual dos estoicos, à qual o apóstolo Paulo e Santo Agostinho, por exemplo, foram ligados antes da conversão. Para o estoicismo, Deus é a razão (alma) do mundo, que penetra tudo e sua providência é a lei do mundo. Entretanto, por uma forma de espírito invejoso de Deus, o cosmos está desvirtuado e nos leva a separarmo-nos de Deus. Consequentemente, a salvação não está em adaptar-se à realidade do cosmos ou à contemplação de sua beleza, mas na fuga do mundo sensível e do próprio corpo, através da gnose. Só pela gnose, uma espécie de ascese da mente, se pode caminhar em direção ao ápice supremo da alma, que é Deus. Tanto o platonismo, como o estoicismo, terão grande influência sobre o cristianismo. 

A concepção de mundo para os judeus e os cristãos

Ao contrário de Platão, para o povo de Israel, o mundo não é o espaço supremo e divino, que abarca deuses e seres humanos. Também não é, como para Aristóteles, uma realidade que opera segundo a essência de Deus. Muito menos o mundo se opõe a Deus, como para o estoicismo. Na revelação recebida por Israel, o mundo aparece como o “não-divino”, a obra boa do Deus supra-mundano.  Tanto que o mundo será logo objeto imediato de louvor ao poder de Deus e de admiração por seu sábio governo e ordem do mundo. 

Ao contrário do estoicismo, em que o mundo sensível se opõe ao espírito, para Israel, o mundo é bom, pois foi Deus quem o criou. Não foi criado, como para o gnosticismo, por uma divindade inferior, como vingança ao deus superior, aprisionando nele partículas (almas) do deus superior, fazendo do mundo uma prisão da alma. Ainda que a fé em Javé seja anterior à ideia de “criação”, entretanto, quando esta aparece, o mundo será objeto de louvor imediato ao poder criador de Javé. No Primeiro Testamento, o mundo não se opõe a Deus, nem é emanação ou prolongamento de Deus (panteísmo), mas “criação” de Deus. Deus é “Criador”, pois criou o mundo do nada – creatio ex nihilo.

No Segundo Testamento, o mundo é bom, pois foi criado por Deus e criado em Cristo – tudo foi criado por Ele e para Ele. … sem Ele, nada do que existe teria sido feito (Jo 1,10). É verdade que, “desde Adão”, o mundo está marcado pelo pecado e, portanto, é um “mundo caído”. Entretanto, continua bom e obra do Criador. Por isso, deve-se ter cuidado em distinguir, no Segundo Testamento – “mundo do pecado” e “pecado do mundo”. No mundo, há um “mundo do pecado”, que afasta cada vez mais de Deus, sinônimo de “hostilidade a Deus” e “condenado à perdição”. Mas, o “pecado do mundo” foi vencido pelo “Salvador do mundo”, que embora o mundo esteja sobre a influência do mal, em princípio, já está redimido e destinado à salvação definitiva. 

Por isso, para o Segundo Testamento, os discípulos de Cristo vivem (são) “neste” mundo (Jo 17,11), mas não vivem (são) “deste” mundo (Jo 17,14), porque em Cristo já pertencem a outro mundo celestial. Tanto que Jesus não pede que o Pai os tire do mundo (Jo 17,15), ao contrário, os envia ao mundo (Jo 17,18). E, precisamente porque eles pertencem, desde agora, a outro mundo “celestial” (redimido) (Ef 2,7), e não vivem segundo o modo deste mundo (Rm 12,2), podem usar livremente das coisas do mundo (1Cor 3,22ss).

Como se pode perceber, o Segundo Testamento nunca prega a fuga do mundo enquanto “criação”, apesar da exortação de usar as coisas do mundo como se não as usasse (1Cor 7,31). 

Sobre o autor

Agenor Brighenti

Doutor em Ciências teológicas e religiosas pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica; professor-pesquisador da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Curitiba; professor visitante do Instituto Teológico-Pastoral para América Latina do CELAM, em Bogotá, e membro da Equipe de Reflexão Teológica-Pastoral do CELAM. Foi um dos peritos da equipe de sistematização do Sínodo para a Amazônia.

Fonte:

www.amerindiaenlared.org

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O tripé da concepção de Igreja do Concílio Vaticano II: Reino-Igreja-Mundo (5) https://observatoriodaevangelizacao.com/o-tripe-da-concepcao-de-igreja-do-concilio-vaticano-ii-reino-igreja-mundo-5/ Thu, 28 Nov 2019 10:00:00 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=33608 [Leia mais...]]]> Vimos, na reflexão anterior, que Jesus pregou o Reino de Deus e quis a Igreja para ser seu sacramento, assim como a fundou no Espírito Santo. A Igreja, portanto, procede de Jesus e do Espírito Santo. Mas, qual é a sua razão de ser? Com que finalidade ela foi fundada e instituída por Deus? 

Tradicionalmente, a razão de ser da Igreja era atribuída à “salvação da humanidade”. Apesar de ter parte de verdade, entretanto, é uma definição simplista e ambígua, pois ainda que não exista salvação fora de Jesus Cristo, existe salvação fora da Igreja. Esta, enquanto sacramento do Reino de Deus, é uma mediação de salvação privilegiada, mas não a única. Como diz o Vaticano II, pelo Espírito, Deus salva também por outros meios que só ele conhece. Na realidade, continuam existindo maneiras de entender a razão de ser da Igreja, que o Vaticano II superou. Para não nos alongarmos, vejamos brevemente o modo como entendia a razão de ser da Igreja na eclesiologia pré-conciliar e a compreensão atual segundo o Concílio. 

I – A razão de ser da Igreja na eclesiologia pré-conciliar

Na eclesiologia tradicional, superada pelo Vaticano II, havia basicamente três maneiras insuficientes de compreender a razão de ser da Igreja:

1. A Igreja está no mundo “para tornar possível a salvação”.

Ora, a rigor, não é a Igreja que salva, mas Deus. Além do mais, a salvação oferecida por Deus a toda a humanidade não passa necessariamente pela mediação da Igreja. A graça salvadora atua na Igreja e também fora dela. Neste particular, o papel específico da Igreja consiste em “qualificar” a salvação universal oferecida a todos, dando-lhe, através da comunidade dos discípulos de Jesus, uma visibilidade particular. 

2. Ela está no mundo “para tornar mais fácil a salvação”.

É verdade que a Palavra de Deus e os sacramentos, meios dos quais a Igreja é depositária e vividos no seio de uma comunidade eclesial, são o caminho mais adequado na busca e na acolhida da salvação. Entretanto, viver segundo o Evangelho não é mais fácil. Como advertiu o próprio Jesus – “estreita é a porta e apertado é o caminho que conduz à vida” (Mt 7,14). Além disso, infelizmente, muitas vezes a Igreja, por suas infidelidades e contradições, pode tornar-se um caminho mais difícil de acesso ao Reino de Deus. 

3. Ela está no mundo para explicitar ou apontar o caminho da salvação.

Em parte é verdade, pois, quando uma pessoa de “boa vontade” se torna cristã, é tarefa da Igreja reconhecer como cristão todos os seus valores vividos e compatíveis com o Evangelho. Entretanto, a função da Igreja com relação à salvação não se reduz à sua explicitação, precisamente porque ela não é a única mediação de salvação, ainda que constitua uma forma original e especial, uma mediação privilegiada. 

II – A razão de ser da Igreja segundo o Vaticano II

Frente a estas três maneiras insuficientes de entender a razão de ser da Igreja, na ótica da renovação do Vaticano II, poderíamos evocar três maneiras satisfatórias.

1. A Igreja, enquanto sacramento do Reino, está no mundo “para permitir que Jesus Cristo perpetue na história da humanidade a forma evangélica da salvação”.

Essa forma consiste em visibilizar ou mostrar com a vida o que Jesus disse e fez. Sem testemunho e obras concretas, a Igreja é sal que perdeu sua força, que “de nada mais serve que ser pisado pelos homens” (cf. Mt 5, 13). Como sacramento do Reino, a Igreja só será sinal de salvação, na medida em que for também seu instrumento. Por isso, a missão da Igreja é continuar a obra redentora de Jesus, dizendo o que ele disse, fazendo o que ele fez, vivendo como ele viveu.

2. Ela está no mundo “para fazer com que a forma evangélica de salvação chegue a um maior número possível de pessoas”.

Esta é a missão da Igreja: “ide pelo mundo inteiro. E anunciai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16,15). A forma evangélica de salvação, que pela Palavra revelada e os sacramentos é uma forma privilegiada, foi dada à Igreja para ser comunicada a todos os povos, de todos os tempos e lugares. Em outras palavras, esta “objetividade” não é propriedade da Igreja e nem ela pode guardar para si. Ela a recebeu, no Espírito, para ser partilhada com toda a humanidade – “recebestes de graça, dai de graça” (Mt 10,31). Por isso a Igreja é essencialmente missionária, uma “Igreja em saída”, cuja missão é “tornar presente o Reino de Deus no mundo” (EG 172). 

3. A Igreja está no mundo “para que seja comunitariamente partilhada a responsabilidade de anunciar o Evangelho do Reino”.

Enquanto realidade coletiva, o Reino de Deus só é autenticamente anunciado quando mostrado com a vida, quando respaldado pelo testemunho de uma vivência comunitária da fé. A fé cristã é inter-relação com Deus, com os irmãos e com a criação. Diz o Vaticano II que Deus quis nos salvar em comunidade, como povo. O Reino é uma realidade coletiva, a vivência fraterna da justiça, da paz e do amor. Quem acolhe o Reino inaugurado por Jesus, adere a uma comunidade de fé, de vida e missão. A Igreja é uma forma especial desta comunidade, por isso é seu sacramento, seu sinal e instrumento.

Sobre o autor:

Agenor Brighenti

Doutor em Ciências teológicas e religiosas pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica; professor-pesquisador da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Curitiba; professor visitante do Instituto Teológico-Pastoral para América Latina do CELAM, em Bogotá, e membro da Equipe de Reflexão Teológica-Pastoral do CELAM. Foi um dos peritos da equipe de sistematização do Sínodo para a Amazônia.

Fonte:

www.amerindiaenlared.org

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O tripé da concepção de Igreja do Concílio Vaticano II: Reino-Igreja-Mundo (4) https://observatoriodaevangelizacao.com/o-tripe-da-concepcao-de-igreja-do-concilio-vaticano-ii-reino-igreja-mundo-4/ Tue, 26 Nov 2019 02:43:47 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=33554 [Leia mais...]]]> A missão da Igreja será melhor explicitada mais adiante, ao abordar a sua relação com o Reino de Deus e o Mundo. Limitar-nos-emos aqui e no artigo seguinte, à questão da fundação e da instituição da Igreja, assim como de sua razão de ser. Comecemos com a questão de sua fundação e instituição. 

Já houve quem afirmou que Jesus pregou o Reino de Deus e, em seu lugar, os discípulos criaram a Igreja. Questões tais como se Jesus fundou a Igreja e, em que sentido ele o fez ou se realmente ele quis uma Igreja ou se, pelo menos, não a excluiu no futuro, só podem ser respondidas, abordando uma série de questões prévias. 

As origens da Igreja

Onde está o começo da Igreja? Antigamente, para falar das origens da Igreja, se recorria aos escritos do Segundo Testamento. Entretanto, são textos escritos pela Igreja e quase uma geração depois de seu nascimento. Para isso, se evocava as aparições do Ressuscitado, crendo que elas foram ocasião para que os discípulos dispersos voltassem a congregar-se. Entretanto, a expressão – “Jesus ressuscitou” – já é uma afirmação de fé, própria de uma comunidade de fiéis. Também se recorria ao texto de Mateus – “tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei minha Igreja”. Mas, é um texto tardio, uma profissão de fé de uma Igreja já atuante. As aparições legitimam a comunidade dos fiéis, mas não a criam. 

Outro caminho que se costumava usar para identificar as origens e fundação da Igreja era evocar a efusão do Espírito de Pentecostes. Argumentava-se que foi com a efusão do Espírito que os discípulos inativos se tornaram ativos e, assim, teve início a Igreja. É verdade que, segundo a concepção de Lucas, a função histórico-salvífica dos doze consiste em transmitir a possessão do Espírito recebido em Pentecostes. Entretanto, seria o Espírito de Pentecostes uma realidade desconectada do evento histórico Jesus Cristo? Neste caso, a Igreja não teria nascido de Jesus, mas do Espírito.

Jesus e o Espírito Santo são constitutivos da Igreja 

Estudos mais recentes mostram que, na realidade, a Igreja nasce nem só de Jesus e nem só do Espírito.

Para Lucas, a Igreja se faz presente sempre aonde se transmite, por tradição, o que foi recebido antes, na convivência com Jesus e na efusão do Espírito Santo que atuava em Jesus. Assim, o acontecimento de Pentecostes não é o único que constitui a fundação da Igreja, mas somente uma etapa da mesma.

Para Lucas, o acontecimento fundante da Igreja é a vocação ou a eleição dos doze (Lc 6,13), que são a Igreja em gérmen, que, pouco a pouco, vai se constituindo sob o dinamismo do Espírito.

Sem Pentecostes não haveria Igreja. O Espírito é constitutivo da Igreja. Mas também, sem Jesus, que chamou os doze como a Igreja em gérmen, tampouco ela teria nascido. Sem a obra de Jesus, por um lado, não teria havido a Igreja em gérmen no Cenáculo e, por outro lado, sem Pentecostes, os inativos não teriam se tornado ativos.

Será que Jesus quis fundar a Igreja?

Mesmo que a Igreja se remeta a Jesus de Nazaré, será que ele quis expressamente fundar a Igreja ou ela é consequência de sua obra?

Para W.G. Kumel, Jesus contava com a chegada iminente da parusia e, necessariamente, teve que excluir a intenção de fundar uma instituição para continuar sua obra.  Para Kumel, ainda que relacionada com Jesus, a Igreja é posterior à Páscoa e considerada como uma solução intermediária. Como a parusia não veio e a segunda vinda de Jesus não aconteceu, os discípulos teriam criado a Igreja para esperar sua volta. A Igreja seria, por um lado, o resultado da dilatação da parusia e, por outro, da institucionalização da possessão do Espírito. Em outras palavras, pela possessão do Espírito os discípulos criaram a Igreja, que veio substituir o Senhor que não retornou.

Entretanto, como explicar uma continuidade, quase ininterrupta, entre a missão de Jesus e a atuação de seus discípulos, sem que Jesus tivesse querido um movimento para continuar sua obra?

Crer que a Igreja seja resultado da dilatação da parusia e uma solução intermediária, esbarra no fato justamente desta continuidade ininterrupta entre a morte de Jesus e Pentecostes, quando já aparece uma Igreja atuante. 

A instituição da Igreja 

E a Igreja, como instituição – sua organização, estruturas, ministérios, os sacramentos – vem de Jesus ou a comunidade dos discípulos foi criando de acordo com as necessidades que foram se apresentando na missão?

As duas coisas. Como a Igreja nasce nem só de Jesus e nem só do Espírito, também ela é instituída por Jesus e no Espírito. Os apóstolos e discípulos escolhidos e formados por Jesus já são a Igreja em gérmen, que no Espírito vai se constituindo em seu caminhar. Tradição é a história do Espírito Santo na história do Povo de Deus. 

Da mesma forma que não há Igreja sem Jesus Cristo, também não há Igreja sem Espírito Santo. Igreja não é nem anterior e nem exterior ao Espírito Santo. Jesus e o Espírito são constitutivos da Igreja. Ela é, ao mesmo tempo, uma realidade histórica e escatológica. Como realidade histórica está referida ao mundo e como realidade escatológica está referida ao passado e ao futuro. Só desde este círculo histórico dialético-hermenêutico se pode entender a Igreja, como de fato ela é, fundada por Deus.

Sobre o autor:

Agenor Brighenti

Doutor em Ciências teológicas e religiosas pela Universidade Católica de Louvain, Bélgica; professor-pesquisador da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR), Curitiba; professor visitante do Instituto Teológico-Pastoral para América Latina do CELAM, em Bogotá, e membro da Equipe de Reflexão Teológica-Pastoral do CELAM. Foi um dos peritos da equipe de sistematização do Sínodo para a Amazônia.

Fonte:

www.americanenlared.org

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A Igreja como povo de Deus, com a palavra Mario de França Miranda https://observatoriodaevangelizacao.com/a-igreja-como-povo-de-deus-com-a-palavra-mario-de-franca-miranda/ Sat, 24 Aug 2019 10:00:00 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=31251 [Leia mais...]]]> Introdução

As verdades da fé cristã, que foram patrimônio tranquilo de séculos de cristianismo e guias inquestionáveis de muitas gerações passadas de cristãos, podem, entretanto, ver-se consideradas em certas épocas temas de debates e causas de dissensões. A razão deste fato está no contexto existencial, histórico, sociocultural em que esta verdade de fé é anunciada, entendida e vivida por uma geração. Porque todo anúncio salvífico jamais é feito ao ser humano em geral já que este não existe, mas encontra sempre este mesmo ser humano já inserido numa determinada sociedade com características próprias.

A eclesiologia predominante durante séculos na Igreja, chamada por alguns de hierarcologia por se limitar ao clero, reduzindo os demais fiéis a uma massa passiva e sem voz, se verá enfraquecida por sólidos estudos bíblicos que deixam transparecer melhor a vida das primeiras comunidades cristãs. Estes testemunhos neotestamentários, juntamente com estudos históricos e sistemáticos que procuravam corrigir uma eclesiologia que ignorava a maior parte dos membros da Igreja, não deixaram de influenciar os participantes do Concílio Vaticano II levando-os a debates acalorados na aula conciliar e a opções eclesiológicas de sérias consequências para o futuro da Igreja. A expressão bíblica Povo de Deus constitui apenas mais um caso desta mudança na eclesiologia vigente.

Sendo assim se revela insuficiente um estudo que procure esclarecer apenas o seu sentido bíblico ou que o pense numa perspectiva de teologia sistemática deixando no esquecimento a situação concreta vivida pela comunidade de fiéis. Naturalmente sabemos que todos os dados da revelação ao serem abordados, entendidos e expressos, o são sempre no interior de uma perspectiva de leitura, de um horizonte de compreensão, que irá simultaneamente desvelar e velar certas dimensões da mensagem salvífica, mesmo que implicitamente. Mas aqui este condicionamento histórico e cultural será abordado explicitamente, situando esta reflexão no atual momento eclesial marcado, sobretudo por um debate em curso sobre o valor e a pertinência do Concílio Vaticano II.

  • Trataremos esta noção primeiramente a partir dos dados da Escritura e como passou por transformações semânticas ao longo da história.
  • Numa segunda parte buscaremos uma compreensão teológica desta expressão, fundamentando-nos especialmente no Vaticano II.
  • Em seguida veremos sua recepção na Igreja da América Latina, abordando então os debates nos anos que se seguiram ao Concílio.
  • Finalmente veremos o que implica de mudança por parte da Igreja, seja em sua mentalidade, seja em sua estrutura institucional, para que todos em seu seio se sintam realmente um Povo de Deus adulto, responsável e atuante.
  • Concluiremos com uma breve reflexão que ressalta a importância do tema para a Igreja atual.

I. Povo de Deus na Escritura e na história do cristianismo

No Primeiro Testamento encontramos a expressão “nação”, de conotação mais sociopolítica, e o termo “povo” que implica mais parentesco, relações pessoais, escolha. Nunca se fala de Israel como a nação de Javé e sim como Povo de Deus, constituído por eleição de Deus, manifestada na aliança realizada no Monte Sinai (Ex 6,7) e que coloca Israel numa relação íntima e familiar com Deus. A consciência de ser o Povo de Deus fundamenta tanto a intervenção de Deus em favor de seu povo, como também o correspondente comportamento ético de Israel na obediência ao Deus da aliança. Esta noção ofereceidentidade ao povo, sobretudo em momentos de crise, de tal modo que podemos afirmar ser uma aliança irreversível e fundamental para Israel. Depois do exílio, contudo a expressão ganhará certa universalidade pela inclusão das demais nações no povo de Deus, por ser Deus o único Deus e criador de tudo, fornecendo assim base para a unidade escatológica de toda a humanidade. A expressão “novo Povo de Deus” no Antigo Testamento não indica uma nova aliança, mas simplesmente a restituição da mesma que é indestrutível e perene. Se, por um lado, a eleição por parte de Deus torna esta noção veterotestamentária imprescindível para uma eclesiologia, por outro, esta deve respeitar a precedência e a legitimidade de Israel como povo de Deus, que é só um, indicando que a separação de judeus e cristãos deverá ser suprimida na escatologia.(1)

No Novo Testamento o tema do Povo de Deus aparece com frequência e designando Israel. Constitui a meta da missão de Jesus: reunir as doze tribos num só povo no fim dos tempos, daí a escolha dos doze apóstolos. A primeira geração de cristãos se compreende como a Igreja (ekklesía) convocada por Deus em Cristo que sucessivamente acolhe também os não judeus. Paulo sustenta ser Israel o Povo de Deus escolhido, embora constituam os cristãos um “resto” (Rm 11,5) que acolheu Jesus como Messias, beneficiando-se, porém, das promessas de Deus a Abraão. Assim utiliza a expressão Povo de Deus apenas nas citações veterotestamentárias. Mais tarde o cristianismo começa a se separar do judaísmo e utiliza outras expressões que deixam de fora os judeus (1Pd 2,9; Ef 2,19), sendo que nos Atos dos Apóstolos o tema do Povo de Deus ocorre com frequência, mas sem que haja uma substituição de Israel pela Igreja que só acontecerá mais tarde (Epístola de Barnabé). (2) Enquanto assembleia do Povo de Deus ganha novos matizes: o protagonismo de todos, a igualdade de todos prévia a funções e carismas, a consciência comum de pertença, a dignidade de um povo santo, consagrado e sacerdotal (1Pd 2,7-10).

Posteriormente a expressão irá designar o novo Povo de Deus distinguindo-se da expressão Povo de Deus, atribuída pelos autores desta época ao Antigo Testamento. Na liturgia aparece (populus) ao lado de outras designações como ecclesiaplebs família. Mais tarde numa perspectiva de organização social aparecerá como christianitasou populus christianus distinto da hierarquia, reduzido à passividade, privado da característica de consagrado (reservada apenas a alguns) e de sua missão messiânica. (3) Só mais recentemente recuperou-se o sentido de toda a Igreja como Povo de Deus, tal como aparece na eclesiologia do Concílio Vaticano II. (4)

II. No Concílio Vaticano II

A designação da Igreja como “Povo de Deus” tematizada logo no início da Constituição Dogmática Lumen Gentium se deveu à intenção da maioria dos bispos conciliares de abordar o que diz respeito a todos os membros da Igreja antes de tratar da hierarquia, (5) ao contrário do que estava previsto no esquema da Comissão Preparatória, encerrando assim uma visão hierarcológica da Igreja, o que foi conseguido depois de intensos debates. O segundo capítulo dedicado ao “Povo de Deus” se situa logo depois do capítulo anterior que considera o “mistério da Igreja” e que tem como sujeito da ação salvífica o próprio Deus, respectivamente as três pessoas trinitárias, caracterizando a Igreja como obra da Santíssima Trindade. Entretanto com a imagem de Povo de Deus é a própria Igreja que aparece como sujeito atuante na história, complementando assim a doutrina do primeiro capítulo.(6)

Esta imagem(7) demonstra sua fecundidade ao apontar características fundamentais da Igreja até então esquecidas na eclesiologia anterior. Primeiramente o fato de que na economia cristã Deus quis se servir de um povo para realizar seu desígnio salvífico destinado a toda humanidade. “Aprouve, contudo, a Deus santificar e salvar os homens não singularmente, sem nenhuma conexão uns com os outros, mas constituí-los num povo, que O conhecesse na verdade e santamente O servisse” (LG 9). Primeiramente esta afirmação desqualifica qualquer interpretação individualista da salvação cristã, já que exige a pertença a uma concreta comunidade humana, mesmo que seja em graus diversos (LG 13). A atuação salvífica do Espírito Santo tem sempre uma tendência encarnatória inata, que leva o ser humano a Cristo e à comunidade dos que se reúnem em nome de Cristo. Consequentemente, mesmo a escuta da Palavra de Deus deve acontecer no interior da comunidade de fé, num espaço eclesial, verdade esta esquecida na Reforma com consequências desastrosas para a unidade cristã e para as próprias Igrejas nascidas da Reforma.

Esta noção designa também que o projeto salvífico de Deus se desenvolve no interior da história por meio de um Povo escolhido inserido numa sociedade e numa época histórica. Sendo assim esta comunidade de homens e mulheres é incumbida de levar adiante o projeto de Deus para a humanidade, é responsável como luz do mundo, fermento na massa e sal da terra, em transformar a sociedade na família de Deus. Daí poder ser chamado de “povo messiânico”, não só proclamando, mas sendo já o “germe firmíssimo de unidade, esperança e salvação” (LG 9), que irá constituir a comunidade dos bem-aventurados na vida futura em Deus.

Enquanto povo messiânico todo ele voltado para a realização do Reino de Deus é a Igreja sinal, sacramento e instrumento deste mesmo Reino já acontecendo na história. “Sua meta é o Reino de Deus, iniciado pelo próprio Deus na terra, a ser estendido mais e mais até que no fim dos tempos seja consumado por Ele próprio” (LG 9). Com outras palavras a Igreja deve deixar transparecer para o mundo em suas palavras e em sua vida a família de Deus, a humanidade querida por Deus, a exemplo de seu fundador Jesus Cristo. Ela constitui a mediação histórica da salvação de Deus, tornando-a sempre atual para seus contemporâneos na fé e na vida de seus membros. Deste modo toda ela está voltada para fora de si, seja como comunidade de fiéis, seja como instituição visível. Enquanto leva adiante a missão de Israel na história como Povo de Deus a Igreja pela nova aliança em Jesus Cristo e pela ação do Espírito Santo, constitui o Novo Povo de Deus formado por judeus e gentios e destinado a abarcar toda a humanidade.

O texto conciliar trata em seguida do modo como o Povo de Deus exerce sua missão messiânica na história. Jesus Cristo vem caracterizado como o Sumo sacerdote, sem que esta afirmação, neste lugar, receba a necessária distinção do sacerdócio no Antigo Testamento, conforme nos apresenta a mesma Carta aos Hebreus (7,27; 9,11-28; 10,1-18). Então vem afirmado: “Pois os batizados, pela regeneração e unção do Espírito Santo, são consagrados como casa espiritual e sacerdócio santo” (LG 10), com base no texto da Carta de S. Pedro (1Pd 2,9s). Observe-se, entretanto, que este texto se dirige aos cristãos gentios e constitui uma exortação batismal, a qual pressupõe a novidade da salvação realizada por Jesus Cristo, acolhida na fé e tornando-os assim membros do Povo de Deus.(8) O Concílio retorna assim à tradição das comunidades neotestamentárias e à Igreja primitiva que reservavam o termo “sacerdócio” a Jesus Cristo e ao Povo de Deus até o século III. Este sacerdócio se concretiza na oração, no louvor, na oferta de si, no testemunho de vida, na verbalização das razões da esperança cristã. Esta teologia fundamenta a participação, a corresponsabilidade e o protagonismo de todos na Igreja e em sua atividade evangelizadora, que irá desabrochar numa adequada teologia do laicato.(9)

No parágrafo seguinte que trata da relação do sacerdócio comum dos fiéis com o sacerdócio ministerial podemos notar a dificuldade em se libertar de um uso linguístico secular, já que conservam a expressão sacerdócio também para o ministério ordenado. Daí a necessidade de estabelecer uma clara distinção entre ambos (são essencialmente diferentes, e não apenas gradualmente), estão ordenados um ao outro e participam, cada qual a seu modo, do único sacerdócio de Cristo. O serviço sacerdotal dos ministros ordenados consiste em formar, reger e celebrar a eucaristia na pessoa de Cristo para todo o povo. “Os fiéis, no entanto, em virtude de seu sacerdócio régio, concorrem (coatuam) na oblação da Eucaristia e o exercem na recepção dos sacramentos, na oração e ação de graças, pelo testemunho de uma vida santa, pela abnegação e pela caridade ativa” (LG 10).

Este texto apresenta certas imprecisões.(10) Pois o termo “fiéis” designa todos os membros da Igreja e não só os não ordenados, que também coatuam quando não presidem a eucaristia. Além disso, a atuação dos fiéis não se limita à oblação da Eucaristia e, portanto à forma litúrgica do exercício do sacerdócio comum enquanto distinto do sacerdócio ordenado, pois o termo “fiéis” vale também para a hierarquia e designa uma dignidade comum a todos. Observe-se também que os fiéis leigos exercem seu sacerdócio não apenas na “recepção” dos sacramentos, pois tal não vale para o batismo e o matrimônio. Neste sentido o texto da Constituição sobre a Liturgia é mais claro: “Com razão, pois, a Liturgia é tida como o exercício do múnus sacerdotal de Jesus Cristo, no qual, mediante sinais sensíveis, é significada e, de modo peculiar a cada sinal, realizada a santificação do homem; e é exercido o culto público integral pelo Corpo Místico de Cristo, Cabeça e membros” (SC 7). Também a concretização do sacerdócio comum poderia ser mais incisiva com relação à missão fundamental de toda a Igreja em propagar e realizar o Reino de Deus.

A imagem da Igreja como Povo de Deus deve ser completada pela de Corpo de Cristo, pois depois da encarnação do Verbo, do mistério pascal e da vinda do Espírito, este Povo tem na pessoa de Jesus Cristo o fundamento de sua identidade e de sua fé constituindo assim uma comunidade que deve viver à semelhança do Filho na obediência ao Pai e animada, iluminada e fortalecida pelo Espírito Santo.(11) A participação num mesmo pão constitui o Corpo de Cristo, que é a Igreja (1Cor 10,17). A eucaristia celebra e torna presente o mistério pascal. Os cristãos que buscam viver este mistério em suas vidas e que dela participam constituem um Povo de Deus qualificado, que entra verdadeiramente em comunhão com Deus e constitui uma comunidade de fiéis.(12) As duas imagens se completam, embora sejam imagens de um mistério que nos ultrapassa.

Entretanto, uma primeira avaliação da caracterização da Igreja como Povo de Deus apresenta uma vantagem com relação à noção de Corpo de Cristo. Pois ela aceita diversas modalidades de se relacionar com a Igreja em virtude da acolhida da graça divina: desde a criação (Ecclesia ab Abel; LG 2), passando pelos outros cristãos (LG 15) e chegando até mesmo aos não cristãos (LG 16). Deste modo facilita seu relacionamento com outras instituições. Outro ponto positivo desta imagem diz respeito a seu caráter histórico que elimina uma visão triunfalista da Igreja, já que ela está constantemente necessitada de conversão e renovação, sujeita às dificuldades e perigos inerentes a qualquer instituição histórica, sendo uma realidade relativa porque ainda a caminho de sua plenitude na outra vida. Desse modo ela pode apresentar sempre (como realmente aconteceu) configurações institucionais diversas, conforme os contextos históricos e socioculturais nos quais ela se encontra inserida. Sem dúvida alguma a consequência eclesiológica de maior importância está na igual dignidade (LG 32) de todos os membros da Igreja, prévia aos diversos ministérios e carismas, que fundamenta a comunhão, a participação e a responsabilidade missionária de todos na evangelização.(13)

III. A recepção da Igreja como Povo de Deus na América Latina

A recepção da eclesiologia conciliar na América Latina provocará uma nova reflexão sobre a noção da Igreja como Povo de Deus. Vários fatores contribuíram para esta tomada de consciência: maior conhecimento dos dados bíblicos, da história do cristianismo, da diversidade das configurações históricas da Igreja, do peso na estrutura institucional por parte do poder, do prestígio e das riquezas e, sobretudo, da realidade da Igreja latino-americana constituída majoritariamente de pobres. Conhecemos as conclusões das Assembleias Episcopais do CELAM, especialmente as de Medellín e de Puebla, que resultaram na opção preferencial pelos pobres, na inserção de agentes pastorais entre as camadas mais carentes da população, no florescimento das Comunidades Eclesiais de Base, nas diversas teologias da libertação. A consciência da importância dos pobres, enquanto protagonistas das urgentes transformações sociais, levou alguns a pensar numa Igreja Popular, ou numa compreensão da expressão “Povo de Deus” como de uma Igreja constituída e estruturada a partir dos pobres.

Naturalmente se evitamos compreender uma Igreja exclusiva de certa classe social em oposição com as demais, e, portanto, sem reduzir o termo bíblico à sua conotação sociológica, embora reconhecendo que esta mesma dimensão não pode ser negada nem na história de Israel e nem das primeiras comunidades cristãs, então resta indagarmos por seu sentido para uma eclesiologia, sobretudo em nossos dias quando nos choca o descompasso entre a atual sociedade e a configuração medieval da Igreja Católica. Corretamente, a nosso ver, alguns criticaram a compreensão tradicional da expressão Povo de Deus como demasiado universal e formal.

De fato, a existência histórica de Jesus de Nazaré, suas palavras e suas ações em favor dos mais desfavorecidos, sua distância com relação aos poderosos de seu tempo, revelam a intenção de Deus de realizar a salvação da humanidade na humildade, na fraqueza, na pobreza e na privação de poder humano. Portanto, o fundamento último e decisivo da opção pelos pobres é estritamente teológico, porque baseado no modo de agir do próprio Deus.(14) Daí a afirmação taxativa do Concílio, embora não tenha conseguido realizar plenamente seu objetivo: “Mas assim como Cristo consumou a obra da redenção na pobreza e na perseguição, assim a Igreja é chamada a seguir o mesmo caminho a fim de comunicar aos homens os frutos da salvação” (LG 8).

Deste modo uma Igreja inserida e configurada em conformidade com a realidade dos pobres, que já pode ser encontrada em muitas dioceses da América Latina com seus pastores próximos ao povo por sua simplicidade e humildade, corresponde mais ao desígnio salvífico de Deus, sem, entretanto, excluir outras configurações legítimas do Povo de Deus(15) devidas a outros contextos socioculturais e a outros desafios pastorais como o mundo da cultura. Mas estas outras configurações deverão se deixar orientar em sua estrutura e ação pastoral pelas Igrejas dos pobres, pois estas se apoiam na força de Deus, como o Mestre de Nazaré e os primeiros cristãos, evitando assim se mundanizarem pela aliança com o poder, as riquezas e as honrarias. A vivência encontrada atualmente em muitas Igrejas do Terceiro Mundo, em contraste com as europeias, confirma a legitimidade e a importância desta configuração do Povo de Deus, que deveria ser levada mais a sério pelas autoridades eclesiásticas.(16)

Sem falar dos anteriores, o Documento de Aparecida é incisivo neste ponto: “O serviço de caridade da Igreja entre os pobres é um campo de atividade que caracteriza de maneira decisiva a vida cristã, o estilo eclesial e a programação pastoral” (n. 394). E mais adiante: “Que seja preferencial (nossa opção pelos pobres) implica que deva atravessar todas as nossas estruturas e prioridades pastorais” (n. 396) e que possa ser um dia verdade sua afirmação de que “a Igreja de Deus na América Latina e no Caribe é morada de seus povos; é casa dos pobres de Deus” (n. 524). O que já é uma realidade em muitas dioceses deveria abarcar toda a Igreja do continente no uso de meios, nos gastos de recursos, na linguagem da proclamação, na confecção do culto, na proximidade com os mais pobres, no exercício da dimensão profética da fé, na valorização dos valores cristãos presentes e atuantes na vida dos mais simples. A Igreja dos pobres é e permanece sempre uma interpelação à Igreja Universal.

IV. Povo de Deus nos anos posteriores ao Concílio Vaticano II

Os textos conciliares são claros. Toda a Igreja recebe seu sentido da missão que lhe é confiada, a saber, promover o Reino de Deus na história. Esta missão “não consiste só em levar aos homens a mensagem de Cristo e sua graça, senão também em penetrar do espírito evangélico as realidades temporais e aperfeiçoá-las” (AA 5). Ela deve, assim, influenciar os diversos âmbitos da sociedade em vista do ideal cristão de fraternidade, justiça, caridade (AA 7). Consequentemente todos na Igreja estão incumbidos de tal missão, laicato e clero, não havendo membros ativos e passivos, pois a tônica está na complementaridade (LG 32; AA 25). “Existe na Igreja diversidade de ministérios, mas unidade na missão” (AA 2).

Essa missão enquanto diz respeito a todos os seus membros (AA 2) compete ao laicato não por delegação ou mandato da hierarquia, mas do “próprio Senhor”, por força de seu batismo e confirmação (AA 3; LG 33). Daqui se deriva “o direito e o dever do apostolado” próprio do laicato (AA 3). Esta afirmação significa que a missão profética dos leigos/as não está reduzida a repetir a hierarquia, mas que desempenham um papel que lhes é próprio. Esta capacidade fundamenta o texto conciliar no testemunho de vida, no sentido da fé (sensus fidei) e na graça da palavra (LG 35). Os dons do Espírito devem ser postos a serviço de todos, daí “o direito e o dever de exercê-los” (AA 3). O indicativo precede e funda o imperativo. De fato, a Igreja jamais poderia ser sal da terra sem a ação missionária do laicato (LG 33), sobretudo numa sociedade tão complexa como a atual (AA 1).

O Novo Código de Direito Canônico contemplou uma maior participação de todos na Igreja com a criação de órgãos representativos como o Conselho Presbiteral, o Conselho Pastoral Diocesano, o Sínodo Diocesano, o Sínodo dos Bispos, o Conselho Paroquial, para citar alguns. Mas devemos reconhecer que as conquistas conciliares só foram parcialmente recebidas na legislação da Igreja ou, quando recebidas, nem sempre conservaram integralmente seu valor.(17) Assim a temática da colegialidade episcopal recebeu uma expressão insuficiente nos Sínodos romanos. Também a afirmação conciliar sobre o direito e o dever que têm os leigos/as de exercer seus carismas (AA 3) foi omitida no Novo Código, lesando a identidade eclesial e jurídica dos mesmos/ as.(18) Deve-se reconhecer que nele os leigos/as são valorizados, mas alguns setores deixam a desejar. Assim o munus regendi que lhes é reservado não recebe um cânon específico, ao contrário do munus docendi e do munus santificandi (cânon 759 e 835). Embora habilitados pelo Batismo “a serem assumidos pela hierarquia para algumas tarefas eclesiásticas” (LG 33), o Código lhes reserva apenas uma colaboraçãono exercício do poder da hierarquia (cânon 129 §2), assim podem participar de sínodos diocesanos ou de conselhos pastorais apenas com voto consultivo, ou mesmo constituir associações apostólicas.

Tudo isso significou ganhos, mas não satisfaz o desejo dos bispos conciliares. Pois o Concílio Vaticano II caracterizou o laicato “especialmente por sua índole secular” (LG 31) que abre espaço para uma participação ativa do mesmo no governo “pela sua experiência”, a qual possibilita à hierarquia decisões mais claras e competentes nas coisas espirituais e temporais (LG 37). Além disso, a Constituição Dogmática reconhece ao múnus profético do laicato “uma nota específica e uma eficácia particular pelo fato de se realizar nas condições comuns do século” (LG 35). O Código desconhece tais afirmações e priva o laicato de seu papel na relação Igreja-mundo, de sua contribuição própria para fora e para dentro da Igreja, e também em decorrência de certos limites impostos ao ministério hierárquico.(19) Para alguns a noção da “índole secular” própria dos leigos/as continua sendo depreciada. Pois se observa que lhes são oferecidas possibilidades e ação no âmbito da pregação e da santificação, que pode levar a certa clericalização dos mesmos, e lhes são impostas limitações no âmbito das decisões.(20) E com isso a Igreja se priva de uma colaboração própria e responsável na missão que é una (AA 2) e de todos. E ainda hoje nos faltam as correspondentes estruturas institucionais que possam torná-la realidade.(21)

V. Nova mentalidade e correspondente instituição eclesial

Os bispos participantes da Assembleia Episcopal de Aparecida tinham consciência clara da importância da Igreja como Povo de Deus. Assim afirmam que “na elaboração de nossos planos pastorais queremos favorecer a formação de um laicato capaz de atuar como verdadeiro sujeito eclesial e competente interlocutor entre a Igreja e a sociedade, e entre a sociedade e a Igreja” (DAp 497a). Entretanto a atual mentalidade encontrada em grande parte do clero e do laicato, assim como a atual estrutura eclesial de cunho medieval não favorecem a emergência deste laicato como sujeito eclesial. Daí a consequente preocupação dos bispos com uma mudança de mentalidade, especialmente da parte do clero (DAp 213) e com a supressão de estruturas ultrapassadas (DAp 365). Ambas devem ser transformadas, pois ambas interagem continuamente, se condicionam e se influenciam mutuamente. Não pode haver uma Igreja de comunhão e de participação se não existem estruturas de comunhão e de participação. Mas estas últimas, por sua vez, enquanto são produção humana dependem de pessoas conscientes de sua necessidade.

Naturalmente uma nova mentalidade eclesial deve apresentar uma adequada fundamentação teológica. Primeiramente demonstran- do que a concepção clerical recebida do passado é de cunho histórico, foi gerada ao longo dos séculos devido aos desafios enfrentados pela Igreja, e, portanto, pode e deve ceder lugar a outra mentalidade eclesial devido não só aos fatores provindos das atuais mudanças socioculturais, mas também devido ao testemunho dos textos neotestamentários acolhidos e explicitados pelo Concílio Vaticano II, conforme vimos anteriormente. Aí aparece a Igreja como o sujeito coletivo cujo sentido último de seu existir é exatamente ser instrumento da promoção do Reino e seu sinal sacramental na história, enquanto proclama e testemunha pela vida de seus membros a realidade do Reino para cuja plenitude caminha.

Desse modo todo cristão é sujeito eclesial ativo, não funcionalmente, mas constitutivamente,(22) pelo que ele é e não por alguma investidura ou delegação posterior, na própria Igreja e na sociedade onde vive. Comumente se enfatiza a missão do laicato no mundo da cultura, da política, da economia, da ciência, das artes, com pouca alusão a suas atuações no interior da Igreja. Esta percepção é corrigida pela missão de implantar o Reino de Deus, tarefa comum de todos na comunidade eclesial, pela participação de todos na constituição do sensus fidelium (LG 12), no desenvolvimento do patrimônio da fé (DV 8), ou ainda no papel ativo de todos nas celebrações litúrgicas (SC 7) e até nas expressões mais adequadas para o anúncio salvífico (GS 44). O Documento de Aparecida segue esta mesma linha ao recomendar maior espaço de participação aos leigos/as, também na elaboração e execução de projetos pastorais (DAp 213) e na tomada de decisões (DAp 371), confiando-lhes ainda ministérios e responsabilidades (DAp 211). Este objetivo, contudo, não será atingido sem uma séria e profunda mudança de mentalidade de todos na Igreja, especialmente da hierarquia (DAp 213).

A fundamentação última da legitimidade da participação ativa de todos na Igreja nos oferece a presença e a atuação do Espírito Santo em todos os seus membros. De fato, tanto em Paulo como em João o Espírito é enviado à comunidade e seus destinatários são sempre nomeados no plural. Realmente somos cristãos pela ação do Espírito que nos faz confessar Jesus como Senhor (1Cor 12,3), nos possibilita rezar (Rm 8,26), invocar Deus como nosso Pai (Gl 4,6), participar devidamente das celebrações litúrgicas. Na verdade todas as ações salvíficas da Igreja são epicléticas, como afirma Y. Congar,(23) poderíamos mesmo afirmar que toda a vida da Igreja é epiclética sem mais. Daí a afirmação de Santo Irineu: “Onde está a Igreja (comunidade dos fiéis) aí está o Espírito de Deus”.(24)

Daqui se seguem consequências importantes. O Espírito Santo é a fonte primeira dos carismas na Igreja. Ele atua nos cristãos dotados de talentos humanos diversos, estimulando-os a investir tais carismas na construção do Reino de Deus, bem como lhes concedendo seus dons em vista da edificação da Igreja. Deste modo a plenitude do Espírito na Igreja reside na totalidade dos diversos carismas ou ministérios concedidos a todos os seus membros. Daí que silenciá-los autoritariamente seria procurar “extinguir o Espírito” (1Ts 5,19). Naturalmente não se nega a necessidade do discernimento (1Ts 5,21), como já observara Paulo: “que seja para a edificação da assembleia” (1Cor 14,12). Podemos assim concluir que a representação tradicional de uma parte ativa e de outra passiva na Igreja contraria os dados da Escritura, empobrece a comunidade e deve ser eliminada.

Mais complexa é a tarefa de estabelecer em termos jurídicos as estruturas necessárias para que uma doutrina se possa tornar realidade na vida da Igreja.(25) Já vimos que o Código de Direito Canônico abriu novas possibilidades de presença de leigos/as em órgãos colegiados como se dá no Conselho Pastoral (cânon 512), embora apenas com valor consultivo (cânon 513). Na Constituição Apostólica que promulgou o Novo Código João Paulo II enumera o que constitui sua novidade: a doutrina da Igreja como Povo de Deus, a autoridade eclesiástica como serviço, a Igreja como comunhão, o tríplice múnus de Cristo participado por todos os membros do Povo de Deus, os direitos e deveres de todos os fiéis e expressamente dos leigos, bem como o ecumenismo. Deste modo o Papa reconhecia a importância dos decretos conciliares para a legislação da Igreja, que não deveria ser estabelecida numa perspectiva de poder no sentido de jurisdição, mas numa consideração do que cada cristão pode realizar por força dos sacramentos recebidos, no caso dos leigos/as por força do batismo.(26)

Sabemos que a legislação atual abriu novas possibilidades para certa participação do laicato, enquanto Povo de Deus, no que diz respeito ao munus docendi e ao munus santificandi. O mesmo não podemos afirmar com relação ao munus regendi. O cânon 129 reserva este múnus apenas aos “que foram promovidos à ordem sacra” e possibilita aos fiéis leigos apenas “cooperar” no exercício deste poder. Para alguns, a ambiguidade dos textos conciliares permitiu que o modelo do Vaticano I para a constituição jurídica da Igreja, bem como seu espírito, determinasse o novo Código, e assistisse nos anos seguintes a um maior rigor quanto à obediência, também com relação ao magistério ordinário da Igreja.(27)

Não devemos nos resignar nem nos revoltar diante desta situação, mas sim batalhar por uma mudança de mentalidade que possa gerar uma ordem jurídica que, sem rejeitar a legítima autoridade dos pastores, consiga concretizar possíveis formas de maior participação de todos também nos destinos da Igreja. Não basta mais repetir a justificação teológica para tal. Devem ser buscados novos caminhos de diálogo, de participação, de colaboração, de escuta. Os pastores deveriam ouvir suas ovelhas antes de tomar decisões importantes para a diocese, para poder captar o sopro do Espírito de Deus que atua também nos fiéis leigos/as. Iniciativas deste gênero já estão em curso por parte de alguns bispos. Mesmo atribuindo a palavra decisiva ao ministro ordenado (resolução final), seu amadurecimento é um processo gradativo que pode acolher contribuições de todos.(28) Pois é toda a comunidade que é chamada a promover o Reino de Deus; portanto toda ela é responsável por esta missão, também no que concerne o governo da Igreja, naturalmente no respeito à autoridade legítima. Essa faculdade lhe compete pelo sacramento do Batismo recebido.(29)

VI. Conclusão

Nesta exposição procuramos mostrar o profundo alcance da opção feita no Concílio Vaticano II situando no início da Constituição Dogmática sobre a Igreja a imagem do Povo de Deus, que realça a igual dignidade de todos os seus membros fundamentada no Batismo. Vimos também, devido ao peso de séculos nos quais somente o clero era sujeito ativo, gozava do poder sagrado e constituía o protagonista privilegiado da missão evangelizadora da Igreja, como resulta difícil transformar em realidade vivida as afirmações doutrinárias do Concílio. Não só por certa ambiguidade das mesmas, mas especialmente pela dificuldade de traduzi-las em normas jurídicas. Vivemos hoje um processo em andamento, com suas idas e vindas, que se reflete bem no “conflito de interpretações” em torno deste grande Concílio.(30) Por outro lado, a atual sociedade marcada pelo pluralismo e pela secularização não mais aceita, como no passado, na era da cristandade, uma tutela por parte da hierarquia eclesiástica, nem reconhece na instituição eclesial o prestígio e a autoridade que já teve. Além disso, vivemos num contexto sociocultural histórico e somos marcados fortemente por suas características: valor da subjetividade, respeito à liberdade, direito à participação, tolerância e acolhimento da diversidade, necessidade de fundamentar o próprio discurso não mais aceito por provir de uma autoridade etc. A primazia dada no Concílio à imagem de Povo de Deus aponta indiretamente para uma hipertrofia da hierarquia e da instituição eclesiástica vigente em séculos anteriores e hoje não mais aceita, evidenciada em sua irrelevância e sua ineficácia para nossos contemporâneos.


A expressão Povo de Deus liberta a Igreja de certo imobilismo institucional enquanto vista como sociedade perfeita, já que implica seu percurso através da história humana, às voltas com novos questionamentos e desafios, que exigem adaptações e mesmo transformações. A identidade da comunidade cristã enquanto realidade vivida tem aqui prioridade sobre o institucional herdado.(31) Vemos hoje a dificuldade que enfrenta a hierarquia, mesmo conhecendo os traços principais desta sociedade, em se fazer entender através de um discurso pertinente e significativo. Pior ainda por parte daqueles que ignoram a época em que vivem e despejam, de cima para baixo, condenações moralizantes e inócuas.

A imagem Povo de Deus recupera não só a cidadania de cada cristão na Igreja, mas ainda a dimensão missionária de seu batismo, bem como de toda a comunidade eclesial, como vimos anteriormente.(32)

Esta afirmação ganha especial importância em nossos dias, devido não só à enorme complexidade da sociedade atual, mas também às sucessivas transformações que experimenta. Daí a crise das grandes instituições que não conseguem corresponder a esta realidade complexa e cambiante. A atividade evangelizadora da Igreja deverá se realizar através dos fiéis, já que imersos nesta sociedade, estão dotados da linguagem adequada para irradiar sua fé e conscientes dos condicionamentos e limites de seu contexto. Naturalmente deverão estar devidamente formados e vivendo autenticamente sua fé, pois o testemunho de vida é fundamental numa época caracterizada pela inflação de imagens e de discursos.

Cada vez mais a presença evangelizadora da Igreja na sociedade através do prestígio e do poder institucional demonstra sua ineficácia. Sua missão através de todos seus membros através de contatos pessoais demonstra a importância das relações humanas na propagação e realização do Reino de Deus.(33) De fato, a fé é uma opção livre e como tal ela deve poder se posicionar diante do que lhe vem transmitido. Poderíamos dizer que hoje o existencial é componente fundamental da evangelização.

Notas

  1. CH. FREVEL, art. Volk Gottes, Lexikon für Theologie und Kirche3 X. Freiburg: Herder, 2006. p. 843-846.
  2. W. KRAUS, art. Volk Gottes (NT), LThKX, p. 846s.
  3. Para uma breve visão histórica, ver G. ALBERIGO. O Povo de Deus na experiência de fé, Concilium 1984/6, p. 35-49.
  4. S. WIEDENHOFER, art. Volk Gottes (dogmengeschichtlich), LThK3 X, p. 847s.
  5. “O próprio Povo e sua salvação pertencem no projeto de Deus à categoria de fim, en- quanto a hierarquia está ordenada a este fim como meio” (Relatio, AS III/I, p. 208).
  6. P. HÜNERMANN. Theologischer Kommentar zur dogmatischen Konstitution über die Kirche, em: P. HÜNERMANN; B. J. HILBERATH (Hrsg.). Herders Theologische Kommentar zum Zweiten Vatikanischen Konzil (HThK) II. Freiburg, 2009. p. 371.
  7. Sendo a Igreja um mistério, não conseguimos encerrá-la num conceito. Daí utilizarmos imagens para caracterizá-la. Talvez o símbolo fosse um termo mais correto, pois contém de certo modo o que expressa, embora aberto para outros símbolos que o completam e interpretam. Ver W. KASPER, Katholische Kirche. Wesen, Wirklichkeit, Sendung. Freiburg: Herder, 2011. p. 180.
  8. W. KASPER, ob. cit., p. 183.
  9. J. A. ESTRADA, art. Pueblo de Dios, em: I. ELLACURÍA-J; SOBRINO (Ed.). Mysterium Liberationis II. Madrid: Ed. Trotta, 1994. p. 185.
  10. HÜNERMANN, ob. cit., p. 377s.
  11. Y. CONGAR. La Iglesia como Pueblo de Dios, Concilium 1 (1965) p. 26-33.
  12. J. RATZINGER. O Novo Povo de Deus São Paulo: Paulinas, 1969. p. 82s; e também W. PANNENBERG. Systematische Theologie III. Vandenhoeck: Göttingen, 1993. p. 120s.
  13. M. KEHL, art. Volk Gottes, LThK3 X, p. 848s.
  14. G. GUTIÉRREZ, art. Pobres y opción fundamental, em: ELLACURIA-SOBRINO (Ed.).Mysterium Liberationis I, Madrid: Ed. Trotta, 1994. p. 308-310.
  15. A. DULLES. A Igreja e seus modelos. São Paulo: Paulinas, 1978. Para a noção de configuração ver M. FRANÇA MIRANDA. Igreja e sociedade. São Paulo: Paulinas, 2009. p. 69-105.
  16. Cito aqui a experiência em curso na diocese de Poitiers na França, que adotou o modelo das comunidades eclesiais de base com ótimos resultados. Ver A. ROUET. Un nouveau visage d’Église, Paris: Bayard, 2005, e Un goût d’espérance. Paris: Bayard, 2008.
  17. G. ALBERIGO. Synodalität in der Kirche nach dem Zweiten Vatikanum, em: W. GEERLINGS-M. SECKLER (Hrsg.). Kirche Sein. Nachkonziliäre Theologie im Dienst der Kirchenreform. Freiburg: Herder, 1994. p. 333-347.
  18. E. CORECCO, La réception de Vatican II dans le Code de Droit Canonique, em: G. ALBERIGO-J.P. JOSSUA (Ed.). La réception de Vatican II. Paris: Cerf, 1985. p. 350.
  19. Ibid., p. 357s.
  20. A. BORRAS. La régulation canonique des ministères confiés à des laics, em: G. ROUTHIER-L. VILLEMIN (dir.). Nouveaux apprentissages pour l’Église. Mélanges en honneur de Hervé Legrand. Paris: Cerf, 2006. p. 377-399; S. DEMEL. Alle können mitwirken, niemand ist ausgeschlossen – nur eine schöne Theorie?, em: M. HEIMBACH-STEINSG. KRUIP-S. WENDEL (Hrsg.). Kirche 2011: Ein notwendiger Aufbruch”. Argumente zum Memorandum. Freiburg: Herder, 2011. p. 156-166.
  21. G. TURBANTI, Knotenpunkte der Rezeption von Gaudium et Spes und Apostolicam Actuositatem. Theologische Forschungsaufgaben, em: P. HÜNERMANN. Das Zweite Vati- kanische Konzil und die Zeichen der Zeit heute. Freiburg: Herder, 2006. p. 326s.
  22. S. DIANICH-S. NOCETI. Trattato sulla Chiesa. Brescia: Queriniana, 2002. p. 410s.
  23. Y. CONGAR. Je crois en l’Esprit Saint III. Paris: Cerf, 1980. p. 343-351.
  24. Adv. Haer. III, 24, 1.
  25. M. WIJLENS. The Doctrine of the People of God and hierarchical Authority as Service in Latin Church Legislation on the local Church, The Jurist 68 (2008) p. 328-349.
  26. O que foi em parte realizado. Ver os cânones 204, 208, 210, 211, 212, 216.
  27. W. BÖCKENFÖRDE. Statement aus der Sicht eines Kirchenrechtlers, em: D. WIEDERKEHR (Hg.). Der Glaubenssinn des Gottesvolk, Konkurrent oder Partner des Lehramtes? Freiburg: Herder, 1994. p. 208s
  28. WIJLENS, art. cit. 345, nota 36, onde distingue “decision making” e “choice making”.
  29. L. ORSY. Receiving the Council. Theological and canonical Insights and Debates. Collegeville: Liturgical Press, 2009. p. 35-45.
  30. Ver M. FAGGIOLI. Vatican II. The Battle for Meaning. New York: Paulist Press, 2012; M. FRANÇA MIRANDA. Uma Igreja em processo de renovação. Concílio Vaticano II: o legado e a tarefa, Revista Eclesiástica Brasileira 72 (2012) p. 366-375.
  31. Ch. DUQUOC, “Je crois en l’Église”. Precarité institutionelle et Règne de Dieu. Paris: Cerf, 1999. p. 182.
  32. O próprio Código de Direito Canônico, embora ainda temeroso de um autêntico prota- gonismo laical na Igreja, reconhece expressamente no cânon 211: “Todos os fiéis têm o direito e o dever de trabalhar, a fim de que o anúncio divino da salvação chegue sempre mais a todos os homens de todos os tempos e de todo o mundo”.
  33. S. DIANICH. Chiesa e laicità dello Stato. La questione teologica. Milano: San Paolo, 2011.

Referências

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Sobre o autor:

Pe. Mário França Miranda, SJ.

Doutor em Teologia pela Universidade Gregoriana (Roma); Professor de Teologia na PUC-Rio. Autor de diversos artigos e livros de teologia. Algumas publicações: A Igreja numa sociedade fragmentada. São Paulo: Loyola, 2006; Igreja e sociedade. São Paulo: Paulinas, 2009; A salvação de Jesus Cristo: a doutrina da graça. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2011.

Fonte:

Revista de Cultura Teológica da PUC – SP

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