Doutrina Social da Igreja – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Fri, 10 Dec 2021 09:55:19 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Doutrina Social da Igreja – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 “Direitos humanos”, com a palavra o prof. Élio Gasda, SJ https://observatoriodaevangelizacao.com/direitos-humanos-com-a-palavra-o-prof-elio-gasda-sj/ Fri, 10 Dec 2021 09:55:19 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=43118 [Leia mais...]]]> Levante sua voz contra a desigualdade, proteste, combata a violência dirigida às pessoas negras, aos mais pobres e indefesos, lute contra o machismo que agride as mulheres e as minorias. Que os países cumpram as obrigações dos tratados que ratificaram e respeitem o quadro de direitos humanos com que se comprometeram. Defender a vida! Denunciar as violações aos direitos humanos! Todas as formas de desrespeito à pessoa humana devem ser eliminadas. Desprezar o outro é ofender a Deus. Trabalhar contra os Direitos Humanos é opor-se ao Evangelho de Jesus.

Confira a reflexão do prof. dr. pe. Élio Gasga, SJ:

Direitos Humanos

Élio Gasda, SJ

São tantas lutas inglórias.

São histórias que a história qualquer dia contará….

Uma crença num enorme coração dos humilhados e ofendidos.

Explorados e oprimidos que tentaram encontrar a solução.

São cruzes sem nomes, sem corpos, sem datas.

Memória de um tempo onde lutar por seu direito é um defeito que mata.

Gonzaguinha

10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos

São tantas violações dos direitos à vida, à saúde e à proteção social; violências baseadas em gênero e ameaças aos direitos sexuais e reprodutivos; repressão de militantes, censura da imprensa.

1.323 ativistas dos direitos humanos foram assassinados entre 2015 e 2019 no mundo (Alto Comissariado da Organização das Nações Unidas). A maioria na América Latina: 993 execuções. No Brasil, 174 pessoas foram mortas por defender os direitos humanos.

Guerras, conflitos internos, pobreza, miséria, fome, desemprego, trabalho escravo, concentração de renda, racismo, xenofobia, violência de gênero, homotransfobia, assombram populações inteiras. Dezenas de milhares de pessoas continuam a fugir da violência, da pobreza e da desigualdade. A Covid-19 agravou a situação já precária de pessoas refugiadas e migrantes.

Desastres, exacerbados pelo aquecimento global e por instabilidade climática, afetam severamente, para milhões de pessoas, o exercício dos seus direitos à vida, à alimentação, à saúde, à moradia, à água e ao saneamento.

A destruição da natureza impacta diretamente nos direitos humanos: secas, tempestades, alagamentos, incêndios, ondas de calor. Somente em 2020 foram mortos 227 ambientalistas (Relatório A última linha de defesa – ONG Global Witness). O Brasil aparece na quarta posição, com 20 assassinatos. Levantamento da Comissão Pastoral da Terra aponta que até o final de agosto de 2021, 11 pessoas foram mortas por defenderem seus territórios, o meio ambiente, o acesso à terra e a água. Com o problema da subnotificação, os números são ainda maiores.

A violência com base no gênero (violência doméstica, violência sexual, estupros, feminicídios) é extremamente alta em todo o mundo. Muitos criminosos continuam impunes. Algumas autoridades praticam, elas mesmas, essa violência. É urgente agir para eliminar todas as formas de violência e práticas danosas contra todas as mulheres. Para alcançar a justiça de gênero, é preciso deter os retrocessos dos direitos das mulheres e das pessoas LGBTQI+.

Toda a espécie humana tem direito à vida e à liberdade, à dignidade, à paz, à educação, à saúde, direito à defesa e ao justo julgamento. Esses, entre outros diretos, devem ser garantidos, independentemente da nacionalidade, cultura, sexo, religião, idioma ou ideologia.

Direitos Humanos não são uma invenção ou um privilégio de alguns, mas sim o reconhecimento de que aspectos fundamentais da vida devem ser garantidos a todos. Por isso, em 1948, foi redigida a Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Hoje 193 países são signatários da Organização das Nações Unidas, consequentemente da Declaração Universal dos Direitos Humanos. O governo Bolsonaro, não tem seguido diversas recomendações e diretrizes da ONU. A desconstrução da proteção dos direitos humanos é um projeto do bolsonarismo.

A Constituição Federal de 1988, conhecida como Constituição cidadã por estar alinhada com a Declaração dos Direitos Humanos, está sendo desmantelada. Nunca se apresentou tanta Proposta de Emenda Constitucional (PECs) e Projetos de Lei (PL) que prejudicam principalmente o pobre, o trabalhador e o meio ambiente. Tempos sombrios!

As desigualdades, injustiças e violências marcam a história do Brasil e colocam em risco permanente a garantia dos Direitos Humanos aos mais pobres e indefesos: povos indígenas, quilombolas, trabalhadores, mulheres, população LGBTQI+.

A cena da moto do Policial militar remete ao pelourinho. O jovem negro de periferia é arrastado pelas ruas e torturado por agentes do próprio Estado. Imagem cruel do retrocesso civilizatório.

Levante sua voz contra a desigualdade, proteste, combata a violência dirigida às pessoas negras, aos mais pobres e indefesos, lute contra o machismo que agride as mulheres e as minorias. Que os países cumpram as obrigações dos tratados que ratificaram e respeitem o quadro de direitos humanos com que se comprometeram.

Defender a vida! Denunciar as violações aos direitos humanos! Todas as formas de desrespeito à pessoa humana devem ser eliminadas. Desprezar o outro é ofender a Deus. Trabalhar contra os Direitos Humanos é opor-se ao Evangelho de Jesus.

O mundo existe para todos, porque todos nós, seres humanos, nascemos nesta terra com a mesma dignidade. As diferenças de cor, religião, capacidade, local de nascimento, lugar de residência e muitas outras não podem antepor-se nem ser usadas para justificar privilégios de alguns em detrimento dos direitos de todos. Como comunidade, temos o dever de garantir que cada pessoa viva com dignidade e disponha de adequadas oportunidades para o seu desenvolvimento integral”.

(Papa Francisco, Fratelli Tutti, 118).

Sobre o autor:

Prof. dr. Élio Gásda, SJ

Élio Gasda é jesuíta, doutor em Teologia, professor e pesquisador na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia – Faje. Sua reflexão teológica sobre os desafios e urgências da contemporaneidade, à luz da Fé, da Ética e dos princípios estruturantes da Doutrina Social da Igreja, vem contribuindo significativamente na caminhada do movimentos populares, as pastorais sociais, grupos diversos e lideranças comprometidas com a transformação das estruturas injustas da sociedade e a cultura da paz fundada na justiça e na fraternidade. Além de inúmeros artigos, dentre seus livros destacamos: Trabalho e capitalismo global: atualidade da Doutrina social da Igreja (Paulinas, 2001); Cristianismo e economia (Paulinas, 2016). O Observatório da Evangelização tem publicado aqui alguns de seus artigos.

Fonte:

https://faculdadejesuita.edu.br/fajeonline/palavra-presenca/direitos-humanos/

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“Furto famélico: ‘Eu só estava com muita fome'”, com a palavra prof. Élio Gasda, SJ https://observatoriodaevangelizacao.com/furto-famelico-eu-so-estava-com-muita-fome-com-a-palavra-prof-elio-gasda-sj/ Thu, 28 Oct 2021 13:43:49 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=42346 [Leia mais...]]]> A dignidade humana implica na satisfação de necessidades básicas como a alimentação, moradia, saúde, trabalho, educação, cultura e lazer. Direitos fundamentais garantidos na Constituição Brasileira de 1988… Para quem tem fome, o amor de Deus se traduz num pedaço de pão. O pão é elemento central no anúncio do Evangelho. Saciar a fome deveria ser o projeto central da sociedade, da economia e dos poderes políticos… A fome se alastrou pelo Brasil. Mulheres, homens e crianças com rosto humilhado, flagelado, tal qual Jesus crucificado. “Tive fome” (Mt 25, 35) … e vocês me condenaram. Que ninguém se cale diante da fome! Que ninguém se omita diante de tanta barbárie! Em um país assolado pela fome, é dever dos cristãos levantar-se contra os responsáveis.”

Confira toda a reflexão do prof. dr. pe. Élio Gasda, SJ:

Em um país assolado pela fome, é dever dos cristãos levantar-se contra os responsáveis (Valmir Fernandes/Coletivo Marmitas da Terra/Fotos Públicas)

A dignidade humana implica na satisfação de necessidades básicas como a alimentação, moradia, saúde, trabalho, educação, cultura e lazer. Direitos fundamentais garantidos na Constituição Brasileira de 1988. Tais direitos objetivam construir uma sociedade livre, justa e fraterna. Erradicar a pobreza e a fome é dever do Estado.

A fome é a uma tortura. Leva ao desespero.Quem pode remediar a fome e por avareza esconde o remédio, com razão pode ser condenado como homicida” (São Basílio, Homilia em tempos de fome).

A fome é uma ofensa à dignidade humana

A fome é uma ofensa à dignidade humana. A falta de alimentos no organismo, por tempo prolongado, faz o estômago doer, causa mal-estar, fraqueza e morte. O Brasil tem mais de 20 milhões de famintos e 40% da população vive em insegurança alimentar. “Falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira. Passa-se mal, não se come bem. Agora, passar fome, não.” (Jair Bolsonaro). Bolsonaro devolveu o país ao Mapa da Fome.

Enquanto o povo revira caminhões de lixo em busca de comida, bancos privados aumentam em 53% os lucros (R$ 62 bilhões só no primeiro semestre). Não falta produção de alimentos, mas comida virou mercadoria. O agronegócio, cresceu 24,31% em 2020 (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada). O mesmo agronegócio que provoca queimadas, destrói florestas, contamina as águas e o meio ambiente com os agrotóxicos. Sua única preocupação é o lucro. São grandes responsáveis pela fome do povo.

Todo aquele que em seus negócios se der a práticas usurárias e mercantis que provocam a fome e a morte de seus irmãos comete indiretamente um homicídio” (Catecismo da Igreja Católica, 2269). Causar a fome é um crime!

A fome dói no corpo e na alma

A fome dói no corpo e na alma. A realidade vivida pelos mais pobres é tratada com crueldade pela justiça. São cada vez mais comuns os furtos de alimentos em supermercados. São furtos famélicos, aqueles cometidos pela necessidade de alimentar a si ou à família. Como aquela mulher de 41 anos, mãe de cinco filhos, acusada de furtar uma Coca-Cola, dois pacotes de macarrão instantâneo e suco em pó, totalizando menos de R$ 22. Teve prisão decretada. Uma juíza e três desembargadores entenderam que a mulher representava um perigo para a sociedade.

Para Santo Tomás de Aquino, um dos maiores teólogos da Igreja, casos de extrema necessidade humana eliminam integralmente o delito de furto. As coisas indispensáveis à vida humana, sobremodo o alimento, perdem a qualidade de particulares e se tornam comuns a todos. Não se pode considerar furto quando algo é retirado de seu titular para atendimento de uma necessidade vital básica. Os casos de fome e nudez não podem ser permitidos pelo Estado e pela sociedade, porque os alimentos e as vestes são direito naturais (Suma Teológica, II-II q. 66 a. 6-7).

Furto famélico não é crime

Furto famélico não é crime. O artigo 24 do Código Penal considera “em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se“. O Supremo Tribunal Federal adota, além do furto famélico, o “princípio da insignificância“, “bagatela” ou “estado de necessidade” furtar alimento para saciar a fome.

Proteger os ricos e condenar os pobres. Essa tem sido a prática de muitos juízes. Com salários milionários e privilégios escandalosos, os integrantes do poder judiciário fazem parte da alta sociedade. Vivem em um mundo paralelo, não sabem o que é desemprego, pobreza, fome. O dinheiro roubado do povo, da educação, da saúde, não tem importância. Penalizam o furto de alimentos e absolvem desvio de recursos públicos. De um lado a ostentação dos ricaços; do outro, o desespero dos famintos.

Para quem tem fome, o amor de Deus se traduz num pedaço de pão. O pão é elemento central no anúncio do Evangelho. Saciar a fome deveria ser o projeto central da sociedade, da economia e dos poderes políticos.

Que ninguém se cale diante da fome!

Prender uma mãe pelo furto de miojo para matar a fome! A que ponto chegou a justiça brasileira! Vergonha! Que país nos tornamos! O principal responsável pela fome de milhões e pela morte de mais de 600 mil pessoas continua na presidência com sua política genocida.

A fome se alastrou pelo Brasil. Mulheres, homens e crianças com rosto humilhado, flagelado, tal qual Jesus crucificado. “Tive fome” (Mt 25, 35) … e vocês me condenaram.

Que ninguém se cale diante da fome! Que ninguém se omita diante de tanta barbárie! Em um país assolado pela fome, é dever dos cristãos levantar-se contra os responsáveis.

Que juízo mais severo te espera, ó rico. O povo sente fome e tu fechas teus celeiros; o povo implora e tu exibes tuas joias” (Santo Ambrósio, Livro de Naboth, 56).

(Adaptação e grifos, Edward Guimarães, para o Observatório da Evangelização)

Sobre o autor:

Prof. dr. Élio Gásda, SJ

Élio Gasda é jesuíta, doutor em Teologia, professor e pesquisador na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia – Faje. Sua reflexão teológica sobre os desafios e urgências da contemporaneidade, à luz da Fé, da Ética e dos princípios estruturantes da Doutrina Social da Igreja, vem contribuindo significativamente na caminhada do movimentos populares, as pastorais sociais, grupos diversos e lideranças comprometidas com a transformação das estruturas injustas da sociedade e a cultura da paz fundada na justiça e na fraternidade. Além de inúmeros artigos, dentre seus livros destacamos: Trabalho e capitalismo global: atualidade da Doutrina social da Igreja (Paulinas, 2001); Cristianismo e economia (Paulinas, 2016). O Observatório da Evangelização tem publicado aqui alguns de seus artigos.

Fonte:

www.domtotal.com

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“Solidariedade: fé sem obras de justiça é morta (Tg 2,14-18)”, com a palavra Elio Gasda, SJ https://observatoriodaevangelizacao.com/solidariedade-fe-sem-obras-de-justica-e-morta-tg-214-18-com-a-palavra-elio-gasda-sj/ Tue, 05 Oct 2021 02:05:00 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=41779 [Leia mais...]]]> Somos solidários? Sentimento de amor pelos necessitados e injustiçados, que impele o indivíduo a prestar-lhes ajuda moral ou material. Situação de um grupo que resulta do compartilhamento de atitudes e sentimento, tornando-o coeso e sólido, com capacidade de resistir aos tempos de crise e perseguição. Solidariedade é também ato de resistência… A solidariedade encontra seu maior referencial na pessoa de Cristo… é uma prática que nos transforma em amigos do Senhor… Praticar a solidariedade é resistir, é reconquistar diretos e reconstruir a sociedade.” 

Confira a reflexão do prof. dr. Élio Gasda, SJ:

Comunicação MST/Fotos Públicas

Você é solidário? Somos solidários?

Solidariedade, do latim solidus, firme, inteiro, sólido. Em português, o substantivo feminino significa qualidade de solidário. Sentimento de amor pelos necessitados e injustiçados, que impele o indivíduo a prestar-lhes ajuda moral ou material. Situação de um grupo que resulta do compartilhamento de atitudes e sentimento, tornando-o coeso e sólido, com capacidade de resistir aos tempos de crise e perseguição. Solidariedade é também ato de resistência.

O povo brasileiro se auto define solidário. Faz campanhas do agasalho, de cestas básicas para os que tem fome, faz doação de sangue, roupas, ajuda idosos a atravessar ruas, compra rifas de entidades sociais, visita os enfermos, é criativo em seu “empreendedorismo social”. Mas ser solidário não é apenas ser assistencialista. Se assim o fosse, o Brasil jamais voltaria ao mapa da fome. Somamos 20 milhões de famintos.

Não adianta dizer “somos um povo cheio de fé” se somos um povo um povo cheio de fome!

  • Que adianta ter cruz nos tribunais se estão cheios de injustiça?
  • Que adianta ter cruz nas casas legislativas, cheias de leis iníquas, de acertos, corrupção e maldade?
  • Que adianta colocar na cédula “Deus seja Louvado” e explorar o pobre, o trabalhador, maltratar o aposentado, o desempregado, o desalentado?

A fé tem que estar presente na vida… Como nos diz Thiago: assim também acontece com a fé, se não se traduz em obras, por si só está morta! (padre Júlio Lancellotti).

A solidariedade encontra seu maior referencial na pessoa de Cristo. Sua fonte é a própria experiência de Jesus. Como afirma Bento XVI, “dar de comer aos famintos é um imperativo ético para toda a Igreja, é resposta aos ensinamentos de solidariedade e partilha do seu Fundador, o Senhor Jesus” (Caritas in Veritate, 27).

A solidariedade é uma prática que nos transforma em amigos do Senhor. 

“Em Jesus a solidariedade alcança as dimensões do mesmo agir de Deus. N’Ele, e graças a Ele, também a vida social pode ser redescoberta, mesmo com todas as suas contradições e ambiguidades, como lugar de vida e de esperança, enquanto sinal de uma graça que de contínuo é a todos oferecida”. É ver o próximo não só como sujeito de direitos, é vê-lo como “imagem viva” de Deus, e assim deve ser amado. O próximo é aquele que merece todo nosso esforço: “dar a vida pelos irmãos”.

Compêndio da Doutrina Social da Igreja, n.196

Não se pode amar verdadeiramente a Deus e dar as costas aos necessitados

A solidariedade, ao lado da Dignidade da pessoa humana, do Bem comum, da Subsidiariedade e da Participação, é um princípio permanente da Doutrina Social da Igreja. Os princípios, articulados entre si, são referências para a interpretação da realidade e dos acontecimentos, são critérios orientadores do agir em todas as esferas: política, social, econômica, interpessoal. São “caminhos possíveis para edificar uma vida social verdadeira e boa” (Compêndio, n. 162).

A solidariedade é princípio social que deve inspirar as instituições sociais. As “estruturas de pecado” que dominam as relações entre as pessoas e os povos devem ser superadas e transformadas em estruturas de solidariedade.

Como virtude moral, a solidariedade não pode se reduzir ao desejo transitório de ajudar os sofredores. Pelo contrário, é 

“determinação firme e perseverante de se empenhar pelo bem comum, pelo bem de todos e de cada um, porque todos nós somos verdadeiramente responsáveis por todos [….]. A solidariedade é uma virtude social fundamental, pois se coloca na dimensão da justiça. A solidariedade com sentido evangélico de perder-se em benefício do próximo em vez de o explorar, de ‘servi-lo’ em vez de o oprimir para proveito próprio” .

Compêndio da Doutrina Social da Igreja, 193

Viver a solidariedade é indispensável para possibilitar que as práticas políticas recuperem a sua inteireza” (dom Walmor). Nunca foi tão importante resistir a uma política corrompida e fragmentada que corrói o tecido social brasileiro. Praticar a solidariedade é resistir, é reconquistar diretos e reconstruir a sociedade.

A solidariedade não pode ser compreendida como “gestos de generosidade esporádicos”, talvez, por isso, seja uma palavra de significado pouco conhecido. Solidariedade, ensina papa Francisco, 

é pensar e agir em termos de comunidade, de prioridade da vida de todos sobre a apropriação dos bens por parte de alguns. É também lutar contra as causas estruturais da pobreza, a desigualdade, a falta de trabalho, a terra e a casa, a negação dos direitos sociais e laborais. É enfrentar os efeitos destrutivos do império do dinheiro”.

Fratelli tutti, 116
  • A solidariedade é o sentimento que melhor expressa o respeito pela dignidade humana.” 

Franz Kafka

  • Que importa ao Senhor que sua mesa esteja cheia de objetos de ouro se Ele está passando fome? Sacia primeiro Sua fome e, se sobrar, enfeitai sua mesa“.

São João Crisóstomo

(Adaptação e grifos, Edward Guimarães, para o Observatório da Evangelização)

Sobre o autor:

Prof. dr. Élio Gásda, SJ

Élio Gasda é jesuíta, doutor em Teologia, professor e pesquisador na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia – Faje. Sua reflexão teológica sobre os desafios e urgências da contemporaneidade, à luz da Fé, da Ética e dos princípios estruturantes da Doutrina Social da Igreja, vem contribuindo significativamente na caminhada do movimentos populares, as pastorais sociais, grupos diversos e lideranças comprometidas com a transformação das estruturas injustas da sociedade e a cultura da paz fundada na justiça e na fraternidade. Além de inúmeros artigos, dentre seus livros destacamos: Trabalho e capitalismo global: atualidade da Doutrina social da Igreja (Paulinas, 2001); Cristianismo e economia (Paulinas, 2016). O Observatório da Evangelização tem publicado aqui alguns de seus artigos.

Fonte:

www.domtotal.com

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MP 1045: agressão ao sagrado direito do trabalho, com a palavra o prof. élio Gasda, SJ https://observatoriodaevangelizacao.com/mp-1045-agressao-ao-sagrado-direito-do-trabalho-com-a-palavra-o-prof-elio-gasda-sj/ Sat, 21 Aug 2021 14:28:19 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=40217 [Leia mais...]]]> Os trabalhadores sofrem os maiores ataques aos seus direitos em todo o período da república

MST distribui mais de mil cestas e 7 toneladas de alimentos frescos em Curitiba e Araucária (PR). Falta trabalho para 33 milhões de pessoas (Valmir Neves Fernandes/MST-PR e Giorgia Prates)

Uma trapaça contra os trabalhadores e trabalhadoras do Brasil

O desfile de blindados e a votação da Câmara sobre o voto impresso foram a trapaça utilizada por Bolsonaro para desviar as atenções da plateia enquanto na jaula dos leões os trabalhadores e as trabalhadoras eram devorados. Sim, 304 deputados aprovaram, no último dia 10/08/2021, a Medida Provisória 1045, um terrível pacote de maldades contra os trabalhadores e trabalhadoras do Brasil.

A MP foi encaminhada ao Congresso pelo governo para evitar demissões durante a pandemia. Deveria ser apenas a segunda fase do programa de redução de jornadas de trabalho e salários. Contudo, a articulação entre o ministro Paulo Guedes e o relator do texto, deputado Christino Aureo, recebeu emendas esdrúxulas. A aprovação da MP mostra de que lado estão os políticos que votaram a favor. Difícil saber quem é mais perverso, o executivo ou o legislativo.

Encaminhada ao Senado, a MP cria o Regime Especial de Trabalho Incentivado, Qualificação e Inclusão Produtiva (Requip), o Programa Primeira Oportunidade e Reinserção no Emprego (Priore) e o Programa Nacional de Prestação de Serviço Social Voluntário. Prevê redução de horas extras para algumas categorias, FGTS menor para quem for demitido e flexibilização da fiscalização trabalhista. E determina quem pode contar com gratuidade no acesso à Justiça.

Espoliação e perversidade institucionalizada

O Priore, por exemplo, permite a contratação de jovens entre 18 e 29 anos e pessoas com idade igual ou superior a 55 sem vínculo trabalhista, sem férias, FGTS e 13º salário. Redução de direitos nunca gerou mais empregos. Muito pelo contrário.

Para burlar a lei que impede que o trabalhador ganhe menos que o salário mínimo (R$1.100,00), quem for contratado através do Requip vai receber uma Bolsa de Incentivo à Qualificação (BIQ) e um Bônus de Inclusão Produtiva (BIP), ou compensação financeira para fazer algum curso de qualificação. O governo não se importa com o desemprego que beira a 15%, só quer acabar com a dignidade que resta aos trabalhadores e trabalhadoras.

Falta trabalho para 33 milhões de pessoas. Bolsonaro é responsável pela perda de 377 empregos por hora! (Consultoria IDados, com base no IBGE). Bolsonaro só faz aumentar as desigualdades sociais em plena pandemia. As mulheres negras são 60% do universo de desempregados (IBGE). Além disso, segundo o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Econômicos (Dieese) são elas que também recebem menos, R$10,95 por hora contra R$18,15 das mulheres brancas e R$20,95 dos homens brancos.

“Quando o trabalho vivo (trabalhadores de fato) é eliminado, o trabalhador se precariza, vira camelô, faz bico etc.” (Ricardo Antunes). Os antigos bicos são a uberização de hoje, o falso empreendedorismo arrasta o trabalhador para um panorama ainda mais dramático, sem perspectiva, sem direitos.

Espoliação! Os trabalhadores sofrem os maiores ataques aos seus direitos em todo o período da república. Mais do mesmo: privatizar, destruir forças produtivas, liquidar direitos! Bolsonaro será lembrado como o pior inimigo dos trabalhadores e trabalhadoras. Reina a barbárie. Milhões de desempregados. Pais, mães que não têm o que dar de comer para os filhos. O país afunda. O cenário é de destruição e desespero do povo.

Trabalho e dignidade na vida em sociedade

O trabalho é elemento fundamental de socialização, de identidade, de equilíbrio psicológico. A insegurança laboral e a precarização impossibilitam viver o presente e planejar o futuro. O trabalho precário “é uma ferida aberta para muitos trabalhadores e trabalhadoras, que vivem no medo de perder o próprio trabalho. Precariedade total. Isso é imoral. Isso mata: mata a dignidade, mata a saúde, mata a família, mata a sociedade” ressalta papa Francisco.

Ser pessoa é a única condição para a titularidade de direitos. “Que haja trabalho para todos, e trabalho digno, não escravo” insiste papa Francisco. O valor primeiro do trabalho está vinculado ao fato de que quem o executa é uma pessoa criada à imagem e semelhança de Deus. Onde há um trabalhador, aí está o olhar de amor do Senhor.

Crises sistêmicas confirmam a necessidade de reestruturar a economia. Não existe outra forma de sair da precariedade no trabalho, da insegurança social e deter a destruição ambiental sem uma profunda transformação. Propor um outro sentido da vida que supere a visão capitalista.

Papa Francisco aposta em uma “Economia do trabalho”. Compartilhar o trabalho e compartilhar os frutos do trabalho. Descartados e trabalhadores explorados devem estar do mesmo lado nas lutas por outra sociedade.

A terra, o teto e o trabalho pelo qual vocês lutam, são direitos sagrados. Afirmar isso é Doutrina Social da Igreja“.

Papa Francisco

(Adaptação e grifos, Edward Guimarães, para o Observatório da Evangelização)

Sobre o autor:

Prof. dr. Élio Gásda, SJ

Élio Gasda é jesuíta, doutor em Teologia, professor e pesquisador na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia – Faje. Sua reflexão teológica sobre os desafios e urgências da contemporaneidade, à luz da Fé, da Ética e dos princípios estruturantes da Doutrina Social da Igreja, vem contribuindo significativamente na caminhada do movimentos populares, as pastorais sociais, grupos diversos e lideranças comprometidas com a transformação das estruturas injustas da sociedade e a cultura da paz fundada na justiça e na fraternidade. Além de inúmeros artigos, dentre seus livros destacamos: Trabalho e capitalismo global: atualidade da Doutrina social da Igreja (Paulinas, 2001); Cristianismo e economia (Paulinas, 2016). O Observatório da Evangelização tem publicado aqui alguns de seus artigos.

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