ciência – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Wed, 16 Feb 2022 23:37:14 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 ciência – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 Ainda podemos falar em felicidade? https://observatoriodaevangelizacao.com/ainda-podemos-falar-em-felicidade/ Wed, 16 Feb 2022 23:37:14 +0000 https://atomic-temporary-74025290.wpcomstaging.com/?p=43498 [Leia mais...]]]> Felicidade é um tema abordado por filósofos, poetas, religiosos e tantos outros que buscaram encontrar algo próximo ao sentido da vida. Para Aristóteles, a finalidade humana é a busca pela felicidade. Se pararmos para pensar, de fato, não haveria nada mais importante na nossa existência do que ser feliz. Todas as outras dimensões deveriam convergir para a busca de uma vida feliz.

Essa busca é incessante, mas algumas vezes o ser humano demonstra muita ansiedade e se apressa em dar respostas e fixar um caminho para a felicidade. Nesses momentos, ele se equivoca! Afinal, ele busca a felicidade e encontra uma existência sem liberdade, onde todos os caminhos não pensados como importantes são ignorados. Não podemos fixar e limitar caminhos da nossa vida. Sempre teremos que fazer escolhas e essa é uma das dimensões para a vida feliz: estar sempre aberto às possibilidades e às mudanças. É comum ver na clínica psicanalítica pessoas que perdem completamente o sentido da vida após um término de relacionamento, de uma demissão do trabalho ou quando se aposentam. Todos esses processos devem ser vividos enquanto lutos, como transições existenciais. Ao contrário, muitas vezes a grande dificuldade é iniciar o processo de luto, de desapego.

Sempre teremos que fazer escolhas e essa é uma das dimensões para a vida feliz: estar sempre aberto às possibilidades e às mudanças.

Por vezes também as pessoas acham que ser feliz pode ser alcançado de forma prática. Quantos e quantos livros de autoajuda não foram lançados com a promessa de entregar uma vida feliz? E se pensarmos nos medicamentos? A indústria farmacêutica está cada vez mais voltando suas pesquisas (mais do que em outros setores de medicamentos) para a síntese entre neurociências, comportamento e inteligência artificial. Qual o motivo disso? Além de gerar muito dinheiro, é uma forma de controle. De fato, em muitos momentos da história alguma forma de poder tentou estabelecer caminhos únicos e necessários à busca da felicidade. Como falamos acima, não há nada mais importante do que esse tema, então a ciência também se volta a ele e promete entregar bons resultados. Ora, por que então, se temos tantos livros com fórmulas para a felicidade e tantos medicamentos psicotrópicos, nunca presenciamos tantos casos de depressão, ansiedade, suicídio como agora?

Precisamos aprender a lidar com a liberdade para buscarmos a felicidade. Contudo, em um momento em que entramos na era das decisões por algoritmos, o que podemos decidir? Será que ainda temos e teremos, em breve, liberdade? Não tenho dúvidas de que, se a humanidade perder seu potencial de decisões livres (mesmo que mantenha uma pequena possibilidade), não poderá ser feliz. Não seremos felizes sendo robôs, máquinas não são felizes ou tristes, simplesmente não fazem parte do mundo-da-vida. Também não somos felizes quando queremos esquecer de nós mesmos no fluxo da vida material. Em alguns contextos, a cultura indica um caminho único: a felicidade proveniente de sistemas sociais, como presenciamos na sociedade de consumo (onde há infinitas promessas de felicidade, tudo passa ser consumo, inclusive as relações humanas), bem como em sistemas totalitários, onde o Estado se vê no papel de direcionar a subjetividade.

Precisamos aprender a lidar com a liberdade para buscarmos a felicidade.

A felicidade é resultado de um horizonte humano ampliado, de uma memória apaziguada, de escuta, de alteridade, de empatia e de desejos bem elaborados. Os filósofos estavam certo: não é possível ser feliz sem buscar conhecer a si mesmo e sem a prática do bem comum. O maior equívoco do século XXI é: ninguém pode ser feliz sozinho. Narcisistas parecem ser felizes, mas encontram brevemente a melancolia proveniente de um mundo sem sentido, o seu mundo solo.

O Papa Francisco, no último domingo (13/02/2022), no Angelus, nos ofereceu uma bela reflexão a partir do evangelho de Lucas: mostra-nos o sentido da pobreza nas Bem-aventuranças, nos mostra que “o discípulo de Jesus não encontra a sua alegria no dinheiro ou em outros bens materiais, mas nos dons que recebe de Deus todos os dias: a vida, a criação, os irmãos e as irmãs, e assim por diante”. Ele ” sabe questionar-se, sabe buscar humildemente a Deus todos os dias, e isso lhe permite mergulhar na realidade, apreendendo dela a riqueza e a complexidade”.

René Dentz
É leigo, professor do departamento de Filosofia e do curso de Psicologia-Praça da Liberdade na PUC-Minas, onde também atua como membro da equipe executiva do Observatório da Evangelização. Psicanalista, doutor em Teologia pela FAJE, com pós-doutorado pelas Université de Fribourg/Suíça, Universidade Católica Portuguesa e PUC-Rio. É comentarista da TV Horizonte e da Rádio Itatiaia. Autor de 7 livros, dentre os quais “Horizontes de Perdão” (Ideias e Letras, 2020). Pesquisador do Grupo de Pesquisa CAPES “Mundo do trabalho, ética e teologia”, na FAJE-BH.

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