Bíblia – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Tue, 20 Sep 2022 20:24:52 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Bíblia – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 O testamento de Josué apelo à fidelidade e à sinodalidade https://observatoriodaevangelizacao.com/o-testamento-de-josue-apelo-a-fidelidade-e-a-sinodalidade/ Tue, 20 Sep 2022 20:24:52 +0000 https://atomic-temporary-74025290.wpcomstaging.com/?p=45966 [Leia mais...]]]> Mês da Bíblia 2022 (3/3)

Este é o terceiro texto de uma série em que condensamos uma reflexão em torno do livro de Josué, escolhido para o Mês da Bíblia 2022. Você pode ter acesso aos anteriores neste site: 1. Deus está com você; 2. A hospitalidade e a nova organização da terra.

“Seja firme e corajoso, não tenhas medo”

Josué é descrito como o juiz, o líder do povo de Deus, que não perde a sintonia e o foco do projeto do Deus Libertador. Sente, quando o povo se desvia deste projeto. Ele se penitencia, diante da derrota da primeira arrancada contra Hai, e usa de franqueza com Deus (Js 6, 3-8). Em sua vida, martelava aquele mantra: “Seja firme e corajoso, não tenhas medo”. Ele tinha certeza que, sendo fiel à Palavra de Deus, ele e o povo seriam bem sucedidos, em todos os empreendimentos (cf. Js 1, 6-9).

Josué, no exercício de sua liderança, zelava pela memória da caminhada do povo e pela fidelidade a Deus. Aí estava a garantia da promessa feita aos antepassados, e a certeza da vitória nas lutas e conquistas do povo. Esta memória, sempre viva, dava sustentação na caminhada do presente, e firmava o esperançar no futuro. Sentindo o peso da idade, e vivenciando a responsabilidade da sua missão de animar o povo a perseverar na caminhada, Josué convoca todo Israel, com seus anciãos, chefes de família, juízes e oficiais, para uma assembleia, onde ele iria deixar o seu Testamento.

O Testamento de Josué não é de coisas materiais. É o testemunho da sua experiência de fé; da certeza da presença de Deus na caminhada do povo; e da fidelidade a Deus, que garantia a conquista da terra e a permanência do povo nela. Josué deixa, no seu Testamento, a recomendação, para que o povo seja sempre fiel à lei de Deus. Não se desviar dela, nem para um lado e nem para outro. Ela é o foco, que vai nortear toda a caminhada do povo. Josué recomenda ao povo muito cuidado, para não cair na idolatria, adorando deuses falsos. Eles têm propostas bonitas, mas são falsos e enganadores. Por isso, recomenda: “apeguem-se unicamente a Javé, seu Deus” (Js 23, 8).

 

“Amem a Javé, seu Deus”

Em seu Testamento, a preocupação de Josué é que o povo não se acomode, e não reproduza o sistema opressor, que tira a vida e a liberdade do povo. O miolo, o cerne de seu Testamento é este: “Amem a Javé, seu Deus” (Js 23, 11). No entanto, se o povo for infiel a Deus que o libertou, e se misturar com a idolatria das nações vizinhas, Javé usará esta infidelidade como chicote, nas mãos dos inimigos, para surrar seu povo; e como espinhos, nos seus olhos. Fica claro, no Testamento de Josué, que o destino do povo está nas mãos do próprio povo. Isso nos aponta para as eleições deste ano de 2022. Nossa participação nesse processo e nosso voto podem ser uma ferramenta, para recuperar a dignidade de vida do povo, favorecer oportunidade de Terra, Teto e Trabalho para todos; pode ajudar a defender e proteger a Mãe Terra. Por isso, não podemos perder nem o rumo e nem o prumo do Deus libertador. Onde vamos reconhecer a presença de Deus, acima ou no meio do povo? O Deus que, na Bíblia, caminhou com seu povo, na posse da terra, deseja o quê para seu povo, hoje?

O Testamento de Josué é ainda muito oportuno, para uma avaliação das lideranças de nossas Comunidades e da Sociedade em geral. Um líder deve ter o senso do coletivo, o foco no bem comum; deve ser capaz de partilhar as decisões a serem tomadas. Ter o sentimento do povo marginalizado, e não das elites. Isto é possível, quando, a exemplo de Josué, o líder cultiva a contemplação de Deus, procura Deus nas pessoas, nos fatos, nos acontecimentos. Quando cultiva a intimidade com a Palavra de Deus, meditando-a e guardando-a e seu coração, para guiar suas ações e decisões. Ser ativo participante, na reflexão da Palavra na Comunidade. Líder é todo aquele/a que conduz a Arca da Aliança, quer dizer, a Palavra de Deus, nas atividades e lutas da Comunidade, independentemente de ter ou não um cargo específico.

 

Assembleia de Siquém, apelo à sinodalidade

O livro de Josué termina com um grande acontecimento: a Assembleia de Siquém, onde é celebrada a Aliança de compromisso do povo com Deus. Esta Aliança de Siquém nos lembra a Aliança do Sinai, que celebrou o Êxodo, o movimento de libertação da escravidão do Egito. Agora, trata-se da conclusão do movimento da Conquista e Partilha da Terra com esta Aliança. Esta Assembleia começa, com um relato da memória da ação de Deus, caminhando, libertando e promovendo a vida de seu povo. Um relato que traz à memória os patriarcas; menciona a liderança de Moisés, na caminhada do Êxodo e do deserto; lembra a ação de Deus, na derrota dos inimigo; e a conquista da Terra fértil. Este capítulo procura valorizar o passado, atualizar a ação de Deus na vida do povo (presente) e acenar para um futuro de união e fraternidade.

Josué reúne as 12 tribos de Israel, convoca os anciãos, os chefes, os juízes, os administradores e fala a todo o povo. Ele destaca que a mão protetora de Deus acompanhou toda a trajetória de conquista da terra, e garantiu o sucesso.

Na liderança de Josué, é interessante notar como ele procurava sempre despertar a memória do povo: Abraão e sua descendência (Js 24, 3-4); Moisés e a saída do Egito (Js 24, 5-7); a travessia do Jordão (Js 24, 8-10); a tomada de Jericó (Js 24, 11-13). Procurava mostrar que Deus é o referencial, é o foco que o povo não podia perder. Zelava sempre pela fidelidade do povo a Deus, que nunca descuidava de seu povo. Incentivava o povo a fazer a faxina de tudo que era sinal de idolatria, quer material, quer de ideia.

A pauta principal da Assembleia de Siquém foi a proposta colocada por Josué ao povo reunido: Escolher ser fiel a Deus e a seu projeto, deixando de lado as idolatrias dos povos vizinhos. Josué é muito firme em sua liderança; e arremata, dizendo: “Escolham hoje a quem vocês querem servir”; e dá o seu testemunho: “Quanto a mim e à minha família, serviremos ao Senhor!” (Js 24, 15). Diante desta decisão, o povo, a uma só voz, assume o compromisso de fidelidade ao Senhor: “Longe de nós, abandonarmos o Senhor, para servir a deuses estranhos” (Js 24, 16). Josué lembra ao povo que compromisso com Deus é coisa séria. Com Deus não se brinca. Ele lembra ao povo que Deus é fiel na sua Aliança, não aceita concorrência. No livro de Josué, se oficializa o culto a um único Deus. Um Deus ciumento, um Deus da memória.

No entanto, é importante lembrar que o Livro de Josué teve a sua redação final, depois do Exílio da Babilônia. A causa do povo ter perdido a terra e voltado para a escravidão foi o esquecimento da Aliança, foi ter esquecido a Deus. O Livro tenta ajudar o povo a voltar à sua fidelidade a Deus. Não tem como, andar em dois caminhos: ou levamos à frente a construção de uma sociedade justa e fraterna, onde todos tenham vida e liberdade; ou vamos reforçar um sistema de morte, onde o povo é reconduzido à perda de seus direitos trabalhistas, de seus direitos previdenciários, de sua dignidade no trabalho, enfim, a uma nova forma de escravidão.

Em cada momento da história, Deus suscita lideranças, para a defesa e garantia da vida de seu povo. Deus criou o mundo para todos. Ele nos oferece uma vida digna. Quer que sejamos felizes, já neste mundo. Ele quer que todos tenham acesso à terra, teto e trabalho. Quer vida em abundância para todos os seus filhos e filhas. A história do povo de Deus é um espelho para nós. Assim como eles reconheceram a mão de Deus, agindo a favor da vida do povo, nós também somos chamados a abrir os olhos e reconhecer, no hoje de nossa história, a mão operosa e generosa de Deus, agindo no meio de nós. O Senhor continua a descer, para libertar o seu povo, e para conduzi-lo a dias melhores, à plena dignidade de filhos de filhas de Deus.

 

Do ontem para hoje

A pauta da Assembleia de Siquém é muito provocante, para o momento eleitoral que estamos vivendo. Também nós temos de tomar uma decisão. Que tipo de Sociedade estamos querendo: a que busca a vida prá todos, ou a que segue um projeto de morte? Uma sociedade onde todos tenham liberdade e qualidade de vida, sem tanta desigualdade, ou a que alimenta a violência, a injustiça, o ódio e o racismo? A nossa resposta será dada: no nosso compromisso com a defesa da vida, e nas urnas. É preciso alargar a visão, iluminar os olhos da mente e do coração, para compreendermos a esperança, à qual o Senhor nos chamou e chama (cf. Ef 1, 18).

A Assembleia de Siquém nos lembra da importância de caminhar juntos. Este é o desejo de Deus para nós e para toda a Igreja. Sínodo significa “caminhar juntos”. A nossa Igreja, conduzida pelo Papa Francisco, está nos lembrando que a Sinodalidade não é uma novidade, faz parte da natureza da Igreja. Recentemente, tivemos lampejos desta Sinodalidade: no Sínodo da Amazônia e na Assembleia Eclesial Latino-Americana e Caribenha. Precisamos caminhar juntos, na missão. É preciso ir pegando o ritmo, o dinamismo da Sinodalidade, a começar de nossos Conselhos Pastorais Comunitários, Paroquiais e Diocesanos, Conselhos Municipais de Saúde, Educação, Assistência Social e outros.

A Sinodalidade deve se converter, no nosso jeito de ser e de agir; deve fazer parte de nossa cultura. Somente um espírito sinodal e uma cultura sinodal serão capazes de transformar as nossas estruturas, para que sejam mais participativas. Por isso, precisamos sinodalizar nossas reuniões, nossas decisões, nossos Conselhos, nossas Pastorais, nossas Celebrações. Que tudo seja guiado pelo Espírito, que nos leva a caminhar juntos, decidir juntos, planejar juntos, avaliar juntos…

Para aprofundamento: A Sinodalidade está animando ou amedrontando as nossas lideranças? Por quê? O que podemos fazer para avançar, neste caminhar juntos?

/*! elementor – v3.7.6 – 20-09-2022 */
.elementor-widget-image{text-align:center}.elementor-widget-image a{display:inline-block}.elementor-widget-image a img[src$=”.svg”]{width:48px}.elementor-widget-image img{vertical-align:middle;display:inline-block}

* Doutor em teologia, membro do grupo de pesquisa de Teologia Pastoral (FAJE) e da SOTER- Sociedade de Teologia e Ciências da Religião. Redator da Revista O Lutador, Integrante do MOBON – Movimento da Boa Nova. Membro do Observatório de Evangelização – PUC Minas.

]]>
45966
A hospitalidade e a nova organização na terra https://observatoriodaevangelizacao.com/a-hospitalidade-e-a-nova-organizacao-na-terra/ Tue, 16 Aug 2022 16:24:59 +0000 https://atomic-temporary-74025290.wpcomstaging.com/?p=45657 [Leia mais...]]]> Mês da bíblia 2022 (2/3)

Continuando nosso estudo do Livro de Josué (cf. Deus está com você), antes da conquista da terra é preciso levar em conta que a vida nas montanhas de Canaã era muito sofrida: pobreza, doenças, secas prolongadas, disputa entre os clãs, guerras provocadas pelos reis cananeus, desnutrição e fome. Pesquisas arqueológicas, nos cemitérios da época, revelam que quase a metade das pessoas não ultrapassava os 18 anos de vida. Para sobreviver era preciso a mútua ajuda: cooperar e defender os “estranhos”, como membros de um único povo. A hospitalidade foi fundamental, para a sobrevivência do povo e para a conquista da terra de Canaã. É nas montanhas que o grupo saído do Egito se junta ao grupo das montanhas que lutava contra a dominação das cidades-estado. A hospitalidade aos viajantes, aos migrantes, tornou-se lei (cf. Gn 18, 2-8; Ex 22, 20-22; Lv 19, 33-34); eles deveriam ser acolhidos e protegidos (cf. Gn 19, 6-8; Jz 19.20-23). A história de Raab, mulher estrangeira e prostituta, é modelo de hospitalidade (cf. Js 2,1-24).

A hospitalidade e a confissão de fé

A conquista da Terra começa com a estratégia da espionagem, à semelhança do que acontecera com Moisés (1300 a.C), quando a terra de Canaã não era habitada: “Javé falou a Moisés: ‘mande alguns homens para explorar a terra de Canaã, que vou dar aos filhos de Israel’” (Nm 13, 1). A releitura dos acontecimentos mostra agora Josué, em uma ação militar, para reconquistar a cidade, como parte de um plano divino. Os espiões que Josué enviou chegam à casa da prostituta Raab, na cidade de Jericó. Eles são acolhidos por ela e protegidos das ameaças do rei. Raab põe em prática a lei da hospitalidade, honrando o dever sagrado de acolher o estrangeiro, conforme a fé do povo de Israel.

Mesmo ariscando a sua vida e a de sua família, Raab enganou o rei e escondeu os dois israelitas (Js 2, 4-6). Após a saída dos perseguidores, ela faz uma confissão de fé: “Sei que Javé deu a vocês esta terra e estamos apavorados” (Js 2, 9). Ela reconhece a grandeza e o poder de Deus, que é dono da terra. Assim Jericó, a terra de Javé, será conquistada pelos israelitas. Por exercer a hospitalidade com os membros do povo de Deus, ela tem direito a exigir o pacto de aliança, pela qual os israelitas protegeriam a ela, na hora da conquista. Ela não os denunciaria e eles usariam de misericórdia para com ela e sua família. Esta aliança não leva em conta o moralismo, mas a fidelidade às promessas de Deus. A senha para os israelitas identificarem a casa de Raab seria um cordão vermelho, amarrado na janela de sua casa, que invoca o sangue nos umbrais das casas dos israelitas, por ocasião da saída do Egito (cf. Ex 12-13) A figura de Raab tornou-se muito importante, a ponto de ser lembrada na genealogia de Jesus e em outros textos do Novo Testamento (cf. Mt 1, 5; Hb 11, 31; Tg 2, 25).

Josué, de posse das informações dos dois espiões e sabendo que os cananeus estavam com medo dos israelitas, parte com todo o seu povo em direção ao rio Jordão. Ele ordena ao povo purificar-se e ouvir a Palavra. Os sacerdotes iriam à frente com a Arca da Aliança e, quando seus pés tocassem as águas do rio Jordão, elas ficariam separadas em dois blocos, para que o povo atravessasse o rio a pé enxuto (Js 3). Se a saída do Egito trouxe a liberdade, a travessia do Jordão significava uma nova vida, com a posse da terra.

Além disso, é preciso levar em conta que o Livro de Josué passa por várias redações e sofre alterações, para justificar certas decisões tomadas pelos líderes do povo, em tempos muito distantes de Josué. O rei Josias, por volta do ano 620 a.C, busca justificar a política de expansão do seu reinado, aproveitando a crise da Assíria, que tinha sido tomada pelos babilônios. O Livro de Josué procura legitimar a política expansionista e militarista de Josias. Daí também o uso constante da violência armada, na (re)conquista da terra. As cidades de Jericó e Hai (Js 8, 14-29) já haviam sido tomadas por Josué, no passado; assim, Josias, como legítimo descendente de Davi e Salomão, teria autoridade para promover a reconquista destas terras.

Além disso é preciso levar em conta que o Livro de Josué passa por várias redações e sofre alterações, para justificar certas decisões tomadas pelos líderes do povo, em tempos muito distantes de Josué. O rei Josias, por volta do ano 620 a.C, busca justificar a política de expansão do seu reinado, aproveitando a crise da Assíria, que tinha sido tomada pelos babilônios. O Livro de Josué procura legitimar a política expansionista e militarista de Josias. Daí também o uso constante da violência armada, na (re)conquista da terra. As cidades de Jericó e Hai (Js 8, 14-29) já haviam sido tomadas por Josué, no passado; assim, Josias, como legítimo descendente de Davi e Salomão, teria autoridade para promover a reconquista destas terras.

Esses relatos da conquista mostram uma ação miraculosa de Deus; há uma liturgia, ligada a traços de uma guerra santa, pois, não se trata de uma crônica dos fatos, mas de uma releitura (Js 6). O rei Josias (620 a.C.), para ampliar suas conquistas, usa da religião, para justificar a violência sobre outros povos. O nome de Deus é usado para justificar a violência, o avesso da proposta do reino de justiça e paz, anunciada por Jesus. Não podemos nos esquecer de que Jesus é chave para a leitura e interpretação de toda a Escritura Sagrada (cf. Mc 9, 2-13; Lc 9, 28-36). É a partir de Jesus, que temos de reler Josué e sermos capazes de nos indignar contra toda forma de violência.

Importa destacar a fidelidade do povo a Javé. Quando alguém “pisava na bola” com Deus, perdendo o foco da Aliança, as lutas do povo terminavam em derrotasHoje, quando perdemos a conexão com Deus, batemos com a testa no barranco.

Outro fato marcante era a presença da Arca da Aliança, com as tábuas da Lei. Para atacar o povo de Deus, os inimigos tinham como “senha” a ausência da Arca no meio deles. Isso nos leva a perguntar: como está a nossa Arca dos Grupos de Reflexão em nossas Comunidades? A pandemia é a única culpada da decaída dos Grupos? Comunidade sem esta “Arca dos Grupos de Reflexão” perde sua vitalidade. É a vivência da Palavra, refletida em grupos, que nos motiva e dá sentido à nossa caminhada cristã. Outra coisa importante é o cuidado de Josué, em preparar as estratégias de lutas da conquista da Terra. Elas eram planejadas, tendo em vista a situação do terreno e as informações que colhia…

Partilha da terra e organização do povo

Para construir uma sociedade onde seus habitantes tivessem direito à vida, era necessária a partilha da Terra. Era preciso uma “reforma agrária”, para que todos pudessem ter acesso ao necessário para viver. O latifúndio cria uma sociedade dividida, onde poucos têm muito e muitos não têm quase nada. Josué então divide as terras conquistadas com as tribos, de acordo com a necessidade de cada uma. Josué deixa claro que a terra é obra das mãos de Deus, é um dom de Deus, que possibilita a vida do povo. Terra é garantia de vida, de autoestima e de felicidade. Ela é distribuída entre os seus habitantes, para que a vida seja humanizada, digna para todos. Isso nos lembra que estamos na Terra só de passagem, temos a missão de preservá-la, para que as gerações futuras tenham possibilidades de sobreviverem, também com dignidade.

Josué recebe de Deus a ordem de fazer a partilha da Terra (Js 13, 1-7). Para que fosse feita com justiça, foram necessários o esforço humano, o mapeamento da Terra e a acolhida da vontade de Deus, através do sorteio. Os capítulos 13 a 19 do livro de Josué narram como os territórios ocupados foram repartidos entre as tribos. Estes capítulos fazem menção das cidades de refúgio e da tribo dos levitas, que não receberam Terra, para que se ocupassem do cuidado espiritual do povo. Ainda aparecem nestes capítulos diversos relatos sobre a partilha da Terra.

No Egito, os israelitas sentiram na pele os sofrimentos provocados por um governo centralizado, que usava da mão de obra escrava. Agora, chegando às Terras de Canaã, a Terra prometida, eles encontram as cidades-estado, que tinham também governo centralizado. A partir do sofrimento do deserto, inicia-se uma vivência mais participativa, mais hospitaleira. Os israelitas organizam o sistema tribal de governo, com a participação e o envolvimento de todos, na busca de uma sociedade igualitária, com defesa e produção em comum. Era um governo mais participativo, e comprometido com a causa do povo. O sistema tribal ficava assim constituído:

Sociedade igualitária: fundada no interesse comum e organizada a partir da base: família patriarcal – clã – tribo (Nm 1, 1 – 2, 34);

Autonomia produtiva: a Terra pertence ao povo e é distribuída entre as famílias ou grupos. Proíbe a acumulação (Ex 16), celebra o ano jubilar e o ano sabático, para devolver a Terra aos seus antigos donos e permitir o descanso da Terra (Lv 25, Dt 15, 1-18);

Exército ocasional improvisado: para se defenderem, as tribos se reúnem e organizam suas forças, para lutar contra o inimigo comum (Jz 4, 6-10);

As leis defendem o sistema igualitário: os mandamentos se baseiam no compromisso mútuo, preservando a liberdade e prescrevendo relações sociais, justas e fraternas (Ex 20, 1-17; Dt. 5, 1-21);

O poder participado e subsidiário: as decisões são tomadas progressivamente pelos anciãos (chefes da família, de clã e de tribo). Grandes decisões são tomadas em assembleias do povo. (Ex 18, 13-27; Nm 11, 16-25; Js 24);

Fé unicamente em Javé: o Deus libertador, que promove a liberdade e a vida para todos, através da fraternidade e da partilha (Ex 31, 15; 22, 20-26; Dt 24, 6-22);

Culto descentralizado: para celebrar a vida e a história, nas famílias e, depois, nos santuários; celebra a presença e a ação de Javé, que liberta o povo e o põe em marcha para a vida (Ex 19, 1-18; Dt 26, 1-11; Js 24, 1-28; Jz 17);

Sacerdotes-levitas a serviço do povo: exercem uma liderança, que não permitia a acumulação dos bens. Não podiam ter Terras e deveriam viver de seu trabalho, ao lado dos pobres e necessitados (Nm 18, 20; Dt 12, 12.18-19; 14, 27; Js 13, 14).

O sistema tribal era “um sistema alternativo de sociedade, que se concretizou graças à partilha igualitária da economia (Terra e produção) e à participação igualitária na política. Essas duas coisas implicavam sérias mudanças no modo de ver e de agir. Durou cerca de 250 anos” (cf. Storniolo).

A fidelidade a Javé e a memória das lutas do povo eram o apoio do sistema tribal, que teve altos e baixos. Sofreu muito a influência dos cananeus. Este sistema é uma inspiração, para repensarmos o sistema das sociedades de hoje, com suas formas de governo, de modo especial para uma participação popular mais atuante. É um convite para não ficarmos indiferentes, diante das coisas públicas. Assumir nosso compromisso de cidadania. Não é sem motivo que o Papa Francisco vê, nos movimentos populares, uma alavanca para a transformação da sociedade.

As minuciosas listas de lugares com a distribuição da Terra, que aparecem no livro de Josué, são uma demonstração da alegria e da gratidão pelo dom de Deus; e mostram que Terra conquistada é Terra partilhada. Importante lembrar que Terra, Teto e Trabalho são os três Ts do Papa Francisco, frisados sempre nos encontros mundiais com as lideranças dos movimentos populares (2014, 2015, 2016 e 2017): “Terra, Teto e Trabalho, aquilo pelo qual lutais, são direitos sagrados. Exigí-lo não é estranho, é a Doutrina Social da Igreja.”

Para aprofundamento: Inspirados pela partilha da terra e pela organização do povo, no livro de Josué, em que precisamos avançar, em nossa Igreja e sociedade? Dê exemplos.

/*! elementor – v3.7.1 – 15-08-2022 */
.elementor-widget-image{text-align:center}.elementor-widget-image a{display:inline-block}.elementor-widget-image a img[src$=”.svg”]{width:48px}.elementor-widget-image img{vertical-align:middle;display:inline-block}


* Doutor em teologia, membro do grupo de pesquisa de Teologia Pastoral (FAJE) e da SOTER- Sociedade de Teologia e Ciências da Religião. Redator da Revista O Lutador, Integrante do MOBON – Movimento da Boa Nova. Membro do Observatório de Evangelização – PUC Minas.

]]>
45657
Encontro Arquidiocesano dos Animadores Comunitários de Círculos Bíblicos https://observatoriodaevangelizacao.com/encontro-arquidiocesano-dos-animadores-comunitarios-de-circulos-biblicos/ Wed, 10 Sep 2014 11:04:50 +0000 http://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=111 [Leia mais...]]]> mes-da-biblia

09/08/2014

Para capacitar os grupos que se encontram comunitariamente para a escuta e o diálogo a partir da Palavra de Deus, no contexto do Mês da Bíblia, a Comissão Arquidiocesana para as Comunidades Eclesiais de Base convida para o Encontro Arquidiocesano dos Animadores Comunitários de Círculos Bíblicos, no dia 13 de setembro. O Encontro será realizado no Museu de Ciências Naturais da PUC Minas, Unidade Coração Eucarístico, de 14h às 17h, e terá assessoria do Professor Edward Neves. As inscrições devem ser feitas pelo e-mail secpastoral@arquidiocesebh.org.br (enviar nome e endereço completo, paróquia, forania, região episcopal e contatos). Mais informações: 3428-7909

(Fonte: http://www.arquidiocesebh.org.br/site/noticias)

]]>
111