Andreu Navarra – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Sat, 21 Sep 2019 11:00:00 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Andreu Navarra – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 Ciberproletariado: um desafio de nosso tempo à ação evangelizadora. https://observatoriodaevangelizacao.com/ciberproletariado-os-precarizados-incapazes-de-lidar-com-a-vida-adulta-e-ir-alem-de-slogans-politicos-vazios/ Sat, 21 Sep 2019 11:00:00 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.wordpress.com/?p=31754 [Leia mais...]]]> Evangelizar verdadeiramente tem muitas implicações. Uma delas é discernir os sinais do tempo e captar os desafios e urgências do tempo e do contexto onde acontece o anúncio-testemunho do Evangelho. Cuidar do acesso de todos a uma educação libertadora merece destaque.

Confira o provocante artigo de Berna González Harbour sobre o livro do professor espanhol Andreu Navarra, publicado no jornal El País:

“Estamos criando o ciberproletariado, uma geração sem dados, sem conhecimento e sem léxico”

Após anos de magistério, professor relata impasse do ensino contemporâneo. Formação submete-se à tecnologia, e não o contrário. Surge um exército de precarizados incapazes de lidar com a vida adulta e ir além de slogans políticos vazios

Por Berna González Harbour, no El País

O mundo da educação debate as horas de aulas, a avaliação dos professores e os maus resultados da Espanha nos testes do PISA, mas tudo isso é bastante secundário no universo de Andreu Navarra, um professor de língua e literatura no Ensino Médio que retrata desde as vísceras do ensino, da própria sala de aula, uma realidade de emergências mais prementes: da desnutrição de uma boa parte dos estudantes à incapacidade de se concentrar da nova geração do “ciberproletariado” ou a ausência de debate sobre o futuro a que esta sociedade quer conduzir seus jovens. Navarra não é um teórico, mas uma torrente de verdades que acaba de publicar Devaluación Continua (desvalorização contínua) pela editora Tusquets, uma chicotada contra a cegueira, um chamado emergencial diante da degradação do modelo educacional.

Nós, professores, queremos criar cidadãos autônomos e críticos, mas, em vez disso, estamos criando o ciberproletariado, uma geração sem dados, sem conhecimento, sem léxico. Estamos vendo o triunfo de uma religião tecnocrática que evolui para menos conteúdo e alunos mais idiotas. Estamos servindo a tecnologia e não a tecnologia a nós”, diz Navarra. “O professor está exausto, devorado por uma burocracia para gerar estatísticas que lhe tiram a energia mental para dar aulas.

O testemunho de Andreu Navarra (Barcelona, 1981), historiador, tem o valor de quem leciona há seis anos em escolas públicas e em subvencionadas, em áreas ricas e em degradadas, onde encontra por igual “professores heroicos” em um sistema educacional estressado pela própria sociedade da qual é espelho: há pais ausentes porque trabalham demais; há violência; há crianças sem comer ou tomar café da manhã; há muitos problemas mentais; e há uma geração ausente por causa de sua concentração nas redes sociais e sua identidade virtual.

O audiovisual está criando uma nova Idade Média de pessoas dependentes de satisfazer o prazer aqui e agora, quando a vida é muito diferente. Na vida você precisa saber ler contratos, alugar apartamentos, cuidar dos idosos, criar filhos. Mas o ciberproletariado desmorona por qualquer problema. São pessoas que não serão capazes de trabalhar porque têm a concentração sequestrada pelas redes”, diz ele.

Não que todos os jovens se encaixem em seu olhar crítico, mas ele vê o risco de exclusão de um quarto dos alunos em uma tempestade perfeita de precariedade e vida virtual.

Navarra descreve, por exemplo, uma turma de 20 alunos com dificuldades de aprendizado em que, depois de lhes perguntar, descobriu que nenhum havia tomado o café da manhã. “Estão pálidos e ficam inquietos. Há estudantes que não comem por causa de distúrbios alimentares, outros por negligência da família, outros por pura miséria.” No entanto, na ausência de professores de apoio e de especialistas, as patologias (teve classes em que 30% tinham algum diagnóstico) concentram a atenção dos professores nas reuniões de avaliação e os impedem de pensar nos conteúdos. O pedagogo se confunde com o terapeuta, diz ele. E no debate da inclusão se esquece, diz ele, que “o que realmente falta incluir é a instituição”.

Navarra conta como ele e seus colegas se alegram quando encontram um livro didático de segunda mão dos anos 90 e o compram “como se fosse ouro”. “Nos livros de Lázaro Carreter há explicações, agora temos excertos, flipped classroom [um método participativo que ele considera inaplicável havendo excesso de alunos]. Explique Quevedo com uma flipped classroom! O que não pode haver é uma pedagogia indecente. Temos pessoas inteligentes, queremos uma sociedade inteligente, não a rebaixemos. Temos de distinguir o tempo da escola do tempo externo, e não reduzi-lo. Ser aluno é importante. Ser professor é importante. Vamos explicar quem é Quevedo! Tiramos a literatura do currículo e depois nos perguntamos por que a nação é fraca. É que a nação é isso! Temos que dar a eles a oportunidade de um debate crítico.

Nem tudo é negativo, é claro. Seu livro tem tantos problemas detalhados como sinais de esperança em experiências possíveis, diz ele, quando a autonomia do professor é respeitada: oficinas de poesia, contos, recreio dedicado ao tempo de leitura, como em sua atual escola, em Collbató, onde os alunos leem e depois contam o que leram, com êxito. “A chave é a autonomia da instituição frente a um pensamento único, frente às teorias da panaceia. Quando Portugal concedeu 25% de autonomia às escolas, melhorou.

O livro de Navarra recorre a Ortega y Gasset para apelar a um debate necessário antes de tudo o mais: para onde estamos indo. “Se você sabe para onde está indo, se abrirmos um debate sobre o modelo de futuro para o qual queremos avançar, você depois regulará a tecnologia, os horários ou o que for, mas antes de aumentar ou diminuir as horas é preciso pensar no que se quer fazer com elas”, argumenta. E o modelo de sociedade que transforma Pablo Escobar ou Jesús Gil em heróis carismáticos nas séries; o mau exemplo de alguns políticos malandros; a mentalidade Fraga do “turismo e populismo que continua em Salou, em Magaluf, em destroçar Barcelona” não ajuda.

Falta reflexão sobre a sociedade que queremos porque não apostamos em um MIT espanhol, em exportar literatura, engenharia patenteada aqui em vez de exportar engenheiros”.

Mas “o papel da educação de promover a ascensão social está fracassando e estamos criando bolsões de guetos, de pessoas sem futuro”. Menciona também a ação de “maquiar” a ignorância que as escolas praticam para melhorar as estatísticas. E insiste repetidamente na incapacidade de fixar a atenção, grande carência da nova geração com fotos nas redes, mas sem memória. “Conhecemos vários capitalismos e agora estamos no capitalismo da atenção, em uma economia de plataformas que mercantilizam a atenção. Se você estiver vendo algumas mensagens, alguém ganha dinheiro e, se vê outras, outro alguém ganha. Não podemos repensar a educação se não pensarmos em como devolver a atenção às salas de aula, o regresso do mundo virtual. Agora não podemos nos ensimesmar, como Ortega defendia, porque tudo é ruído, política é gritaria e slogans, ninguém pensa, ninguém escreve, tudo é bobagem e slogan e isso chegou às salas de aula: o simplista, o binário, o bem e o mal. Os Steve Jobs e Zuckerberg, lembre-se, receberam educação analógica. E os gurus da tecnologia mandam seus filhos para escolas analógicas. É por isso que enquanto não consertarmos a sociedade, não podemos consertar o sistema educacional”.

E você, o que pensa sobre as ideias discutidas neste artigo?

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Fonte:

El país

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