Para alimentar o horizonte meditativo no terceiro dia do Tríduo Pascal, neste sábado santo, vivido em contexto de Igreja doméstica por causa da quarentena por causa da pandemia de Covid-19, confira a instigante reflexão de Luis Miquel Modino, missionário na Amazônia:
(Nesta edição, com a produção, tradução e colaboração de Luis Miguel Modino, temos, no final, versão desta reflexão em espanhol.)
Sábado Santo: um sepulcro frio que nos desafia
São poucos os elementos narrados nos relatos evangélicos daquela parte da história que lembramos durante o Sábado Santo, algo que possa nos ajudar a entrar nos sentimentos daqueles mais próximos de Jesus, que jazia em um sepulcro frio.
O Sábado santo deve ter sido um tempo de sentimentos muito confusos, provavelmente dominados por um clima de fracasso, de não tem mais jeito, de pensar em que será de nós, que tudo o que foi construído até aquele momento entrou em colapso, como resultado de uma situação que ninguém ainda entende.
São sentimentos que igualmente podem estar presentes em muitas famílias, em muitas pessoas, nestes últimos dias e semanas. Ter ido embora para sempre, rápida e inexplicavelmente, um marido, uma esposa, um pai, uma mãe, um filho, uma filha, alguém que até recentemente alegrou e deu sentido à vida de sua família, de seus amigos. Eles morreram sozinhos e, mesmo sem serem velados, foram enterrados quase clandestinamente. A frieza do túmulo os domina e isso é algo que não sai da cabeça. As histórias que a gente lê são cruéis, narrando como essas pessoas viveram esses momentos, sempre difíceis, mas que agora provocam uma sensação ainda maior de dor.
Pensar nisso é algo que assusta e nos leva a pensar. Recentemente, conversando com minha avó, que aos 91 anos já viveu muitas coisas e que hoje sofre estoicamente e sozinha, o confinamento forçado a que o coronavírus nos submeteu, disse-me que ela não quer morrer, mas principalmente agora, porque você vai ser enterrado como um cachorro. Suas palavras, certamente duras e difíceis de assumir, remetem-nos a situações presentes na vida de muitas pessoas, dominadas por um sentimento que sempre nos ultrapassa.
O Cântico de Isaías, que acompanha a Oração das Laudes do Sábado Santo, mostra esses sentimentos muito humanos, que nos levam a pensar que somos privados do resto de nossos anos, que cortam a trama com a qual cada um está tecendo sua vida. Diante deles, em quem confia em Deus, surge um pedido para que o Senhor seja seu garante, para libertá-lo do frio e vazio túmulo, sempre movido pela confiança.
Nessa situação, somos chamados a aprender a ver o futuro com esperança, a mesma que a gente imagina nas mulheres que acompanharam Jesus mais de perto, as únicas que, no momento de sua morte, permaneceram firmes ao pé da cruz. Penso especialmente em Maria, sua mãe, o melhor exemplo de confiança em Deus, que desde o início havia dito que podia contar com ela. Nessa mãe, para quem o filho tinha significado tanto, deviam estar sendo enfrentados intensos e dolorosos sentimentos. Por um lado, a dúvida, a desconfiança, sempre presente em todo ser humano, por outro, a fé daqueles que se abandonam em Deus e n’Ele confiam acima de toda aparência e circunstância.
Essa esperança, esse compromisso com a vida, tão presente em quem se considera pequeno e carente, também tem sido revelado em pessoas que hoje em dia estão vivenciando tudo o que envolve a morte de alguém próximo. Seu testemunho de confiança, de fé, baseia-se em sentir-se próximo de Deus que nunca falha. A partir daí, entende-se que você pode apostar na vida, que sempre continua, mesmo diante da morte que nos desafia e constantemente nos questiona, às vezes nos atormentando.
Não se desespere, confie que Deus ainda está do seu lado, embora às vezes isso nos pareça implausível. Esse é o caminho que nos permitirá descobrir que a Vida está de volta, que ela tem a última palavra. Há momentos em que podemos apenas esperar e confiar, não porque isso toca e sim porque sabemos que há Alguém que nunca falha, que sempre foi fiel à sua promessa e que será novamente. O quando e o como é algo que nos escapa, mas não podemos duvidar, mesmo diante do sepulcro frio que nos desafia.
(Os grifos são nossos)
Sobre o autor:
Luis Miguel Modino – Padre diocesano de Madri, missionário fidei donum na Amazônia, residindo atualmente em Manaus – AM. Faz parte da Equipe de Comunicação da REPAM. Correspondente no Brasil de Religión Digital e colaborador do Observatório da Evangelização e em diferentes sites e revistas.
Confira, a seguir, a íntegra da matéria em espanhol:
Sábado Santo: un frío sepulcro que nos interpela
Son pocos los elementos que aparecen en los relatos evangélicos sobre aquella parte de la historia que recordamos durante el Sábado Santo, algo que nos ayude a entrar en los sentimientos de los más próximos a Jesús, que yace en un frío sepulcro. Es tiempo de sentimientos encontrados, probablemente dominados por un clima de fracaso, de que no hay futuro, de qué va a ser de nosotros, de que todo lo construido hasta aquel momento se ha ido a pique, consecuencia de una situación que todavía nadie entiende.
Son sentimientos que también deben estar presentes en muchas familias, en mucha gente, en estos últimos días y semanas. Se ha ido, de manera rápida e inexplicable, un esposo, una esposa, un padre, una madre, un hijo, una hija, alguien que hasta hace poco alegraba y daba sentido a la vida de su familia, de sus amigos. Han muerto solos, y, sin ni siquiera ser velados, se les ha enterrado casi clandestinamente. La frialdad del sepulcro les domina y eso es algo que no sale de la cabeza. Son crueles los relatos que uno va leyendo, en los que se narra como esas personas han vivido estos momentos, que siempre son difíciles, pero que ahora provocan un sentimiento de dolor todavía mayor.
Pensar en eso es algo que asusta y que nos lleva a pensar. En estos días, hablando con mi abuela, que a sus 91 años ya ha vivido muchas cosas y que hoy aguanta estoicamente, y sola, el encierro forzoso al que el coronavirus nos ha sometido, decía que ella no quiere morirse, pero sobretodo ahora, porque a uno le entierran como a un perro. Sus palabras, ciertamente duras y difíciles de asumir, nos remiten a situaciones presentes en la vida de mucha gente, dominadas por un sentimiento que siempre nos supera.
El Cántico de Isaías, que acompaña la oración de Laudes del Sábado Santo, muestra estos sentimientos tan humanos, que nos llevan a pensar que somos privados del resto de nuestros años, que nos cortan la trama con la que cada uno va devanando su vida. Ante ellos, en quien confía en Dios, brota una súplica para que el Señor sea su fiador, para que le libre de la tumba vacía y fría, siempre movido por la confianza.
En esa tesitura, somos llamados a aprender a ver el futuro con esperanza, la misma que uno imagina en las mujeres que más de cerca habían acompañado a Jesús, las únicas que, en el momento de su muerte, permanecieron al pie de la Cruz. Especialmente pienso en María, su madre, el mejor ejemplo de confianza en Dios, quien desde el principio había dicho que podía contar con ella. En esa madre, para la que tanto había significado su hijo, se debían entremezclar sentimientos encontrados. De un lado, la duda, la desconfianza, siempre presente en todo ser humano, de otro, la fe en quien se ha abandonado en Dios y en Él confía por encima de toda apariencia y circunstancia.
Esa esperanza, esa apuesta por la vida, tan presente en quien se sabe pequeño y necesitado, también se ha dejado traslucir en personas que en estos días están viviendo todo aquello que supone la muerte de alguien cercano. Su testimonio de confianza, de fe, tiene su fundamento en sentir cercano al Dios que nunca falla. Desde ahí se comprende que se puede apostar por la vida, que siempre continúa, inclusive ante esa muerte que nos interpela y constantemente nos cuestiona, llegando por momentos a atormentarnos.
No desesperarse, confiar en que Dios sigue ahí, aunque por momentos eso nos parezca inverosímil. Ese es el camino que nos permitirá descubrir que la Vida está de vuelta, que ella tiene la última palabra. Hay momentos en los que solo nos queda esperar y confiar, no porque toca y sí porque sabemos que hay alguien que nunca falla, que siempre ha sido fiel a su promesa y que de nuevo lo va a ser. El cuando y el como es algo que se nos escapa, pero del que no podemos dudar, inclusive ante ese frío sepulcro que nos interpela.