Por uma Igreja que, consciente de sua missão, sendo santa e pecadora, se apresente ao mundo “em obras”

O cardeal Carlo Maria Martini há cinco anos nos deixou. Grande perito em Sagradas Escrituras, afirmou em uma de suas últimas entrevistas, pouco antes de sua morte ocorrida em 31 de agosto de 2012, há praticamente sete meses da eleição do papa Francisco:

“A Igreja está cansada, na Europa do bem-estar e na América. A nossa cultura envelheceu, as nossas igrejas são grandes, as nossas casas religiosas estão vazias e a burocracia da Igreja aumenta, os nossos ritos religiosos e as vestes que usamos são pomposos. Mas será que tudo isto exprime aquilo que somos hoje?”

Martini propunha três vias de reforma para a Igreja:

  • a via da conversão
  • a via da Palavra de Deus
  • a via dos sacramentos

Em relação à primeira via, dizia:

“a Igreja deve reconhecer os próprios erros e deve percorrer um caminho radical de mudança, começando pelo papa e pelos bispos.”

Entre os temas desta conversão ele destacava a posição da Igreja em matéria de sexualidade:

As questões sobre a sexualidade e sobre todos os temas relacionados com o corpo são um exemplo desse caminho de conversão. Devemos perguntar-nos se as pessoas ainda ouvem os conselhos da Igreja em matéria de sexualidade. Neste campo, a Igreja é ainda uma autoridade de referência ou apenas uma caricatura nos meios de comunicação?

Quanto à segunda via, dizia:

“A Palavra de Deus é simples… Nem o clero nem o Direito eclesial podem substituir a interioridade do seu humano. Todas as regras externas, as leis, os dogmas, são-nos dados para clarificar a voz interior e para o discernimento de espíritos.”

Por fim, referendo-se à terceira via, dizia que devemos responder a uma questão fundamental:

“Para quem são os sacramentos? Os sacramentos não são um instrumento ao serviço da disciplina, mas sim uma ajuda aos seres humanos nas etapas do seu caminho e nas fraquezas da vida. Estaremos a levar os sacramentos àqueles que precisam de renovar as forças?”

O Cardeal mostrava-se preocupado com os divorciados que se sentem excluídos de uma participação plena na vida da Igreja e do socorro que a graça de Deus lhes pode dar através dos sacramentos. E se perguntava:

A pergunta sobre se os divorciados podem receber a Comunhão deveria ser invertida. Como pode a Igreja ajudar com a força dos sacramentos quem vive em situações familiares complexas?

“A Igreja atrasou-se duzentos anos. Porque não se mexe? Temos medo? Medo em vez de coragem? Mas a fé é o fundamento da Igreja. A fé, a confiança, a coragem.”

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Se estivesse ainda entre nós, certamente, o cardeal Martini estaria feliz e ao lado do papa Francisco, animando-o e apoiando-o, em seu projeto de reforma da Igreja, no mesmo espírito e horizonte da eclesiologia do Concílio Vaticano II.

Fonte de inspiração:

Já em estado terminal, ele concedeu uma longa entrevista, considerada o seu “testamento espiritual”, à jornalista Federica Radice, do jornal Corriere della Sera.

Edward Guimarães

Secretário Executivo do Observatório da Evangelização – PUC Minas

1 Comentário

  1. Felizmente o Espírito Santo providenciou o Papa que a Igreja necessitava. Vivi 30 anos e nove meses em “segunda união”, meu marido era divorciado. Jamais nos afastamos da Igreja, dando testemunho da indissolubilidade do Matrimônio como nos orientava Pe. Jaime Snock, Redentorista de Juiz de Fora-MG, Teólogo e Moralista. Não recebíamos a Santa Comunhão.

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