Proposta de medidas urgentes para a contenção do Covid-19 nas periferias
O Centro de Estudos Periféricos listou algumas medidas que devem ser tomadas com urgência para proteger as populações de aglomerados, favelas e periferias contra a disseminação do Coronavírus. Importa que todos nós pressionemos e exijamos que as distintas esferas do poder público cumpram seu papel com responsabilidade e que as populações moradoras dos territórios empobrecidos se unam, fazendo da solidariedade a força para vencer o desafio atua que se coloca e os que virão no futuro.
A pandemia de coronavírus, no Brasil, vai expor, mais uma vez, a face cruel da nossa enorme desigualdade social sobre a vida das pessoas pobres, negras e periféricas. Este impacto tende a ser muito duro nas grandes cidades do país, com sua alta quantidade de aglomerados, favelas, moradias precárias e insalubres. Essas pessoas também estão mais sujeitas a empregos precários, vínculos empregatícios frágeis e à terceirização e serão as mais atingidas por demissões em massa. Entendemos que a aprovação da Renda Básica Emergencial será um pequeno alívio para estas populações.
Ainda assim, tendo em vista a gravidade do caos sanitário e social que pode se instalar com a pandemia da Covid-19 nas periferias das grandes cidades do Brasil, o Centro de Estudos Periféricos de São Paulo elenca uma série de medidas urgentes para sua contenção.
I – Além das importantíssimas redes de apoio, solidariedade e dos comitês de ajuda mútua que vêm sendo organizados de maneira autônoma nestas regiões, é necessário que governos municipais, estaduais e federal também assumam certas medidas em suas respectivas alçadas de responsabilidade. Quais sejam:
- Montagem urgente de hospitais de campanha nas escolas e terrenos ociosos das quebradas;
- Distribuição de água com a disponibilização de caminhões pipas para regiões que não tem saneamento básico;
- Distribuição gratuita de kits de higiene, limpeza e prevenção (álcool gel, álcool líquido, sabonetes, toalhas, escovas de dente, pastas de dente, máscaras);
- Suspensão da cobrança de contas de água e luz;
- Suspensão da cobrança de parcelas e juros de financiamentos em geral, incluindo as famílias com dívidas com a Caixa;
- Suspensão da cobrança aluguéis residenciais e comerciais;
- Congelamento do preço do botijão de gás e dos alimentos da cesta básica;
- Compra de itens de primeira necessidade dos comércios de bairro, por parte do poder público, para distribuição gratuita nas quebradas;
- Rápida liberação dos recursos da renda mínima para trabalhadores/as informais e desempregados;
- Manutenção da distribuição de merendas nas escolas nas regiões mais pobres;
- Campanha de conscientização mais amplas, com carros de som, músicas e vídeos que dialoguem com as quebradas;
- Não à policialização da situação, evitando o aumento do encarceramento;
- Não ao isolamento vertical. Nas periferias, diversas gerações da mesma família dividem a mesma casa ou o mesmo quintal com frequência. Quem tiver a obrigação de sair pra trabalhar, vai certamente trazer o vírus para casa;
- Reforço às medidas de proteção para quem trabalha em setores essenciais, como transportes, supermercados, feiras livres, farmácias, fábricas, abastecimento, entre outros;
- Transferência de pessoas que fazem parte dos grupos mais vulneráveis para quartos adequados de hotéis disponibilizados pelo poder público;
- Descentralização dos kits de testagem do centro para os bairros de periferia em UPAs e UBS, com orientação e insumos para o gerenciamento de casos menos graves. Essa medida evitaria também deslocamentos desnecessários;
- Ampliação da rede de wi-fi grátis nas periferias;
- Estabelecimento de fluxo para o abrigo de mulheres em situação de risco de morte com a desburocratização imediata do acesso às Casas-Abrigo para as mulheres, dispondo de um número público que disponha de vagas para o abrigo emergencial em caso de violência, além do acolhimento das demais demandas divulgadas em Nota pela Rede de Prevenção e Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres da Zona Leste (leia aqui);
- Não fechamento do atendimento nos hospitais de referência mais próximos;
- Não à diminuição da quantidade de trens e metrôs, evitando assim aglomeração no transporte de trabalhadores de serviços essenciais;
II – Como medidas para conter a crise, o Centro de Estudos Periféricos recomenda também:
- Taxação das grandes fortunas e vinculação desses recursos ao SUS;
- Suspensão imediata do pagamento dos juros da dívida pública;
- Fim do teto de gastos para saúde e educação;
Por fim, nos posicionamos contra toda e qualquer medida que vise o aumento da exploração dos trabalhadores ou a militarização da sociedade.
Periferias de São Paulo, 30 de março de 2020