Quanto percebemos a diversidade a nossa volta? 2000 pessoas de mais de 60 países falando sobre a vida, é tudo o que você precisa ver para verificar o quanto não sabemos nada sobre o ser humano e suas infinitas possibilidades (e realidades).
SINOPSE — Com testemunhos e imagens aéreas exclusivas, o introspectivo documentário aborda quem nós somos hoje em dia. Não só como comunidade, mas como indivíduos. Através das guerras, descriminações e desigualdades, confrontamos a realidade que também contempla discursos de solidariedade. Uma reflexão do futuro que queremos para nós, seres humanos, e o planeta.
O documentário foi dirigido pelo fotógrafo, diretor e ambientalista francês Yann Arthus-Bertrand, que nasceu em 1946 e sempre nutriu paixão pelos animais e pelo mundo natural. Por ocasião da primeira Cúpula da Terra no Rio em 1992, Yann decidiu embarcar em um grande projeto fotográfico sobre o estado do mundo e seus habitantes: Earth from above. Este livro teve sucesso internacional, vendendo mais de três milhões de cópias. Sua exposição fotográfica ao ar livre foi exibida em cerca de 100 países e vista por cerca de 200 milhões de pessoas. Yann continuou seu compromisso com a causa ambiental com a criação da Fundação GoodPlanet. Desde 2005, esta organização sem fins lucrativos vem investindo na educação das pessoas sobre o meio ambiente e a luta contra as mudanças climáticas. Este compromisso o viu nomeado Embaixador da Boa Vontade do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente em 2009.
Nesse mesmo ano, ele fez seu primeiro longa-metragem, “Home”, sobre o estado do planeta. Este filme foi visto por quase 600 milhões de espectadores em todo o mundo.
“Eu sou um homem entre sete bilhões de outros. Nos últimos 40 anos, tenho fotografado nosso planeta e sua diversidade humana e tenho a sensação de que a humanidade não está progredindo. Nem sempre nós conseguimos viver juntos. Por que isso acontece? Não procurei uma resposta em estatísticas ou análises, mas no próprio homem. ”
Yann Arthus-Bertrand
Yann veem se especializando cada vez mais em olhar a terra de cima, e no YouTube é possível encontrar vários filmes de fotografias aéreas de lugares, desde Marrocos até Paris.
Segundo dados da ONU, em fins de 2011 nós, seres humanos, ultrapassamos a marca de sete bilhões de indivíduos vivendo sobre o planeta. Somando-se a isso em agosto de 2017 um grupo de cientistas reunidos na África do Sul, por ocasião do Congresso Internacional de Geologia, aprovou por unanimidade a tese de que a Terra vive uma nova época geológica: o Antropoceno, a primeira definida pela ação do homem e que apresenta desafios desconhecidos, pondo em perspectiva nossa própria existência como espécie.
O documentário Human tenta explorar uma grande variedade de perspectivas dos seres humanos para tentar entender o que ou quem realmente somos. Há depoimentos de refugiados sírios, veteranos de guerra dos Estados Unidos, condenados à pena de morte, camponeses, aborígenes e do uruguaio José Mujica, ex-guerrilheiro que ficou quase dez anos na solitária e foi eleito presidente. E assim, com grandeza e simplicidade, nossa pretensa humanidade é confrontada. A narrativa do documentário é feito em três vozes:
A) Vozes das pessoas
O que vemos em Human são rostos que alocados sobre um fundo negro e compartilhando o que trazem dentro, suscitam sentimentos no nosso mais profundo interior. Os rostos fazem uma pintura da raça humana, expondo contrastes, abrindo nossos corações e nos levando a tentar entender o que realmente nos separa, e nos encorajar a encarar o outro tendo a consciência de cada pessoa representa uma pequena parte de nós mesmos. O próprio trabalho do documentário é um exemplo disso, já que contou com estreita colaboração de coordenadores e tradutores locais, jornalistas, operadores de câmeras e a comunidade local, com centenas de voluntários, numa experiência tão íntima quanto os testemunhos precisos e pessoas que são o coração do documentário.
“Depois de entrevistas que foram bem, as pessoas envolvidas muitas vezes me agradeciam, dizendo que eu era a primeira pessoa a ouvi-los, ou que aquela era a primeira vez que disseram o que disseram. Apesar de passar tão pouco tempo juntos, você sente que fez algo bom para alguém, então você também se sente bem. E fiquei em contato com muitas pessoas que conheci — escrevemos um para o outro e compartilhamos nossas novidades. “
— Anastasia Mikova, Chefe de entrevistas
“Fiquei mais impressionada com o meu encontro com uma mulher indiana muito pobre em Uttar Pradesh. A mulher estava gritando em angústia e raiva. Eu não falei seu idioma, mas essa mulher estava me enviando uma mensagem poderosa, e mesmo assim eu entendi o que ela estava dizendo! Senti a universalidade de seu sofrimento e explodi em lágrimas. E então ela me levou em seus braços e eu entendi que sua mensagem era também de generosidade.“
— Mia Sfeir, Jornalista
B) Vozes do planeta
Yann Arthus-Bertrand deixa sua marca nesse documentário, e nos presenteia com diversas cenas aéreas, emprestando um pouco da sua visão particular, crítica e poética, de mundo. A beleza das cenas é lacônica, e representa ao mesmo tempo o desenvolvimento (ou a falta dele) e a desigualdade, não só entre os povos, mas também com a natureza. O documentário tenta a todo momento fazer o link entre a humanidade e o planeta, questionando o nosso futuro e a forma como convivemos com os recursos naturais e as paisagens, desde dos nossos passos, ao boom da vida urbana, nossas relações com o campo, da beleza da natureza e ao empobrecimento econômico e ambiental.
“Quando Yann vê um lugar, ele imediatamente sabe o que ele quer. Eu tento me adaptar a sua abordagem peculiar que nos faz sentir emoções através do estilo ou da beleza. Às vezes, é um site importante que já foi filmado ou fotografado milhares de vezes, mas muitas vezes, é um lugar que pode parecer insignificante para qualquer outra pessoa, mas Yann transforma isso em algo sublime através de suas imagens. Usamos um helicóptero montado, sistema de câmera “Cineflex”, que oferece grande estabilidade e qualidade de imagem maravilhosa, mesmo com o foco muito longo que Yann gosta particularmente.“
— Bruno Cusa, Operador chefe de fotografia aérea
“Eu tive o privilégio de poder trabalhar nas fotografias aéreas, onde cada imagem é um poema e cada história de uma batalha. Todos os problemas envolvidos no processo de preparação e produção desaparecem quando você volta satisfeito por uma experiência profissional única que está cheia de esperanças de outras pessoas. “
— Tizi, Head de fotografia aérea
C) Vozes das músicas
A trilha sonora do documentário é um espetáculo a parte. Entre um grupo de entrevistas e outros, Yann mostra o que tem de melhor com belas fotografias e músicas que conseguem extrair o que tem de melhor dentro de nós, além de criar uma narrativa audiovisual impressionante, com textura e tão profunda que é capaz de nos provocar empatia com as diversas realidades.
Destaque para alguns dos temas abordados no documentário (e alguns dos trechos que eu mais gostei):
1. Felicidade — Dona Maria
Um dos vários depoimentos sobre felicidade é o de dona Maria, brasileira humilde do interior do nordeste que encontra sua felicidade na luta por um pedaço de terra, em aprender e em cada uma das coisas mais simples do dia a dia: “Era tão bom, que ainda é”.
2. Amor
Nada mais universal do que o amor. O primeiro amor, de forma verdadeira e completa, é uma das grandes sensações humanas.
3. Família
Costumamos ser bombardeados por diversos padrões de sucesso: o carro do ano, o corpo perfeito, a família estruturada e tradicional. O documentário mostra que existem mais do que um único padrão, as versões de família são diversas, entretanto ainda é algo que esta muito ligada a auto estima e felicidade de cada um de nós, e sofremos com ela.
4. Relação com a vida e a morte
Entre a relação de cada um de nós com a espiritualidade e religião, está o sentimento de revisitar pessoas queridas que já morreram e o medo de também deixar esse mundo. O recado do documentário, é que acima de tudo devemos sempre agradecer por viver: “sou grato pelo dom da vida”.
5. Pobreza
A pobreza já se tornou algo inerente a nossa sociedade atual: “todo mundo sabe que a pobreza existe”. O que o documentário faz é questionar o porquê ninguém fazer nada (dos governos a cada um de nós), quem vive e sente aquilo, sabe que dá pra mudar, mas o isolamento do restante da sociedade é o grande pecado dessa história.
6. Consumo — ex-Presidente Mujica
Dentre desconhecidos e personalidades, o documentário conta com as palavra do ex presidente do Uruguai, Mujica, para explicar como é a nossa relação com o dinheiro e o consumo, mas deixa claro que não está fazendo uma apologia a pobreza, mas sim a sobriedade: “tudo se compra, menos a vida”.
7. Otimismo
Entre o copo meio cheio e meio vazio, fique sempre com a beleza do copo. Mesmo nos piores momentos, é possível extrair uma lição e enxergar o lado bom da vida.
8. Liberdade
O documentário aborda também o preço e o desejo das pessoas por liberdade, principalmente de se expressar e viverem suas próprias vidas e sonhos, e como a força de pressão quase sempre é desproporcional (e como as pessoas criam mecanismos de escapes da realidade — como as drogas).
9. Superação
O ser humano passou a vida sabendo superar os principais obstáculos, a sobrevivência e nossa evolução seletiva está estampada em cada átomo de nossos DNA. Ainda assim, continuamos a sobreviver, e enfrentamos grandes desafios em bombas nucleares e até em nossas relações amorosas.
Enfim, Human é um documentário que tenta apresentar parte da diversidade das pessoas e do planeta, com depoimentos e histórias de diferentes experiências de vida, diferentes formas de superar alguma circunstância e diferentes maneiras de expressar os sentimentos, tratando de temas tão simples de forma profunda e sem proferir lugares comuns. É de fato um grande estudo da espécie humana.
Links úteis:
Reportagem da Wired: https://www.wired.com/2015/09/humans-documentary/
Outro filme similar do Yann:
Filme completo e expandido no YouTube (dividido em três partes):
Human – Vol. 1
Human – Vol. 2
Human – Vol. 3
Sobre o autor:
Bruno Oliveira é auditor, escritor, leitor e flanador. Mestrando em TI, tropecei na bolsa de valores. Acredito nas estrelas, não nos astros. Resenho pessoas e o tempo presente.
Tem um pequeno espaço para divagações minha (Bruno) sobre arte, religião (ou a falta dela), poesia (e minhas Crônicas do Tempo) e as resenhas sobre o que eu vi por aí:
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