Dom José Maria Pires, o primeiro bispo negro do Brasil, como declarou em entrevista ao OE (confira abaixo), quando celebrávamos os cinquenta anos do Concílio Ecumênico Vaticano II, foi um homem que, humildemente, fez história.
Exaltava sempre a figura do grande amigo, o profeta Dom Hélder Câmara, que, parece, “marcou” um encontro com ele para ontem: 27/08. É que o amigo querido se despedira em direção à casa do Pai exatamente em 27/08/99. E ontem foi a vez de Dom José Maria nos deixar.
Hoje, quando nos despedíamos dele na missa presidida por Dom Walmor, nosso arcebispo lembrava, a propósito das bem-aventuranças proclamadas no evangelho, que Dom José parece ter vivido todas as bem-aventuranças, porque ele se fez pobre e chorou com os que sofriam, era um homem de incrível mansidão, pacificador e puro de coração, mas também se indignava e lutava contra toda tipo de injustiça, tendo vivido em uma época de grandes perseguições.
Foi sem dúvida um profeta, como tantos testemunharam. Profeta da simplicidade evangélica e da acolhida a todas/os, como testemunho extremo.
Quando o conheci, em uma celebração eucarística em casa de um padre casado, há mais de dez anos, ele vendia polpa de frutas do seu quintal, precisava de uma fonte extra para as despesas. De fato, como bispo emérito da Paraíba, escolheu viver na capital de seu estado, Minas Gerais, primeiro com pessoas de sua família, depois, em uma comunidade jesuíta, que o acompanhou e cuidou até que o pavio que ofereceu luz a tantos, se apagasse. Aqui, em Belo Horizonte, acompanhou um grupo de famílias às quais, carinhosamente, chamava de famílias sacerdotais. Seu trabalho de acompanhamento de padres casados e de sacerdotes em vias de deixar o ministério auxiliou e fortaleceu muitas pessoas… Aquelas que o desejarem poderão, inclusive, relatar aqui algo de sua experiência.
E o que torna esse bispo — que neste momento é recebido por seu povo, na Paraíba, após 98 anos de fecunda caminhada — um pastor tão especial? Ele mesmo responde: ter buscado ser fiel ao Pacto das Catacumbas. Durante o Concílio, vários bispos assinaram esse pacto, redigido na catacumba da mártir Santa Domitila; esses pastores assumiram o compromisso de viver a vida próxima do povo, pobremente. De príncipes tornaram-se servidores do Povo de Deus. Reconheceram que os demais sacerdotes de suas dioceses não eram pessoas a quem dar ordens, mas companheiros na missão comum de continuar o que Jesus de Nazaré e os apóstolos haviam iniciado, por isso, em cada ano deveriam celebrar, na Missa da Unidade, o compromisso de viver verdadeiramente como irmãos — bispos e padres. Os bispos signatários desse pacto buscaram que sua maneira de se vestir, de viver, de se comunicar, fosse comum àquela do povo. Dom José, a quem o povo da Paraíba apelidou de “Dom Pelé”, e que era chamado em outros meios de “Dom Zumbi” (em alusão a Zumbi dos Palmares), denunciou profeticamente, até o fim de sua vida, o distanciamento do evangelho em que alguns bispos e padres vivem por buscar um estilo de vida tão distante daquele do povo: querendo reconhecimento, status, e vivendo em palácios. Seu testemunho maior, que encantou e convenceu: Viver como o povo de Deus pode viver. Simplesmente. Humildemente. Evangelicamente!
Da diocese de Araçuaí/MG à arquidiocese da Paraíba, foi um homem que lutou por dignidade e vida para todos, ciente de seu papel de pastor, jamais se afastando de seu povo.
Hay hombres que luchan un día y son buenos. Hay otros que luchan un año y son mejores. Hay quienes luchan muchos años, y son muy buenos. Pero hay los que luchan toda la vida, esos son los imprescindibles.
Bertolt Brecht
Entrevista a Dom José Maria II
Entrevista a Dom José Maria III
Entrevista a Dom José Maria IV
Saudades, Dom José Maria! E fiquei lhe devendo uma galinha ao molho pardo…
Tânia Jordão.
Agradeço imensamente a Deus pela vida e missão de D. Zumbi: homem de Deus, terno, manso e humilde de coração. Acolheu-me e acompanhou-me nos momentos de transição em minha vida de opção vocacional. Marcante foi sua espiritualidade e serenidade diante da vida. Que Deus o tenha. Obrigado por tudo, tudo mesmo, querido D. Zumbi.