“Ecumenismo: Do conflito à comunhão”, com a palavra Lorena Cristina Sousa Silva

O texto a seguir foi elaborado pela aluna Lorena Cristina Sousa Silva para o seminário promovido pela disciplina Pedagogia Dialógica Participativa, Corresponsabilidade e Ação Pastoral, ministrada pelo prof. dr. Edward Guimarães.

Confira:

Ecumenismo: Do conflito à comunhão

Uma vida humana sem reflexão não vale a pena ser vivida.

Sócrates

INTRODUÇÃO

Buscar uma experiência de Jesus Cristo que seja capaz de nos unir na busca de anunciar e testemunhar o Evangelho, de superar muros criados por conceitos e conflitos históricos que dividem a Igreja cristã. Por que até hoje o ecumenismo não funciona pra nós?

O termo “ecumênico” provém da palavra grega οἰκουμένη (oikouméne), que significa mundo habitado. Num sentido mais restrito, emprega-se o termo para os esforços em favor do diálogo e da unidade na pluralidade de igrejas cristãs (microecumenismo); no sentido lato, designa a busca da unidade entre as religiões apesar das diferenças (macroecumenismo ou diálogo inter-religioso).

A divisão cristã é uma realidade dramática que assola a Igreja por séculos. A história das divisões na Igreja é marcada tanto por uma série de mal entendidos, quanto pela falta de disponibilidade para entender as razões do outro. Segundo Elias Wolff, cerca de 2 bilhões de pessoas ao redor do mundo professam a fé em Jesus Cristo, acreditam no seu Evangelho, vivem em comunidades que se entendem como uma concretização da Igreja de Cristo neste mundo e buscam orientar a sua vida no horizonte do Reino de Deus. Mas há um drama no mundo cristão que todos sentem: a divisão nas formas de compreender e viver os ensinamentos do Evangelho e de concretizar o seguimento de Jesus.

Por meio deste trabalho, buscamos entender as razões por trás da divisão e das dificuldades do avanço no ecumenismo e de refletir sobre como a Igreja poderia atuar no sentido de reverter o quadro apresentado.

DESENVOLVIMENTO

Para o autor pesquisado, Elias Wolff, teólogo especialista em ecumenismo, para entender as premissas que separam as igrejas é primordial conhecer a história dos conflitos e divisões, e as razões decisivas para o rompimento da comunhão.

Agregam elementos de caráter cultural e político que, não poucas vezes, se sobrepõe aos propriamente teológicos. Nas querelas entre Egito e Síria, no século IV, por exemplo, estava em jogo o conflito entre as grandes sedes patriarcais. Alexandria lutava ao mesmo tempo contra Antioquia e contra Constantinopla. Antioquia era metrópole da Síria e das regiões que falavam siríaco, herdeiras da cultura semítica. Alexandria era metrópole do Egito e dos povos que falavam copto. Nessas regiões o povo simples falava a língua tradicional e a elite falava grego. Isso configurava as lutas contra a Igreja de Constantinopla como uma luta contra a elite grega, a dominação do império romano que falava o grego de Constantinopla.

Este primeiro fato presente na história das divisões cristãs é pertinente e válido, afinal manifestaram-se as diferenças das culturas grega e oriental que afetaram a compreensão dos dogmas cristológicos (compreensão teológica de Jesus Cristo). Pela explicitação do progressivo distanciamento cultural e religioso entre Ocidente e Oriente, no século XI, o autor do artigo, Elias Wolff, nos provoca pensar sobre o que de fato pesou e influenciou nas questões teológicas que levaram ao cisma, tais como o Filioque (A discussão se o Espírito Santo procede do Pai e do Filho ou somente do Pai é apontada como uma das causas do cisma entre o Ocidente e o Oriente cristão), o uso de pães ázimos na celebração eucarística, a crença no purgatório, a epíclese na consagração eucarística (Invocação do Espírito Santo), bem como as questões culturais e disciplinares como o celibato dos padres e o uso da barba, interpretações que expressam, na verdade, as diferenças de mentalidade entre gregos e latinos.

O fato de compreender de modo diferente os acontecimentos complexos da história passada, como as diferenças que persistem nas questões centrais da nossa fé, não deve dividir-nos para sempre. Nem mesmo as recordações dos acontecimentos do passado deve limitar a liberdade dos esforços atuais para reparar os desastres provocados por tais acontecimentos.

Elias Wolff, cita também o caso do Concílio de Trento, que se propôs, em seu primeiro momento (1546-1547), como um concílio reformador, projetar uma Igreja mais espiritual, um cristianismo menos ritualista e menos jurídico. Falava de “decretos dogmáticos” e “decretos de reforma”. Mas a apologia contra Lutero levou a uma verdadeira “contra-reforma”, institucionalizando e disciplinando a fé, com viés contrário ao que Lutero propunha. Também o Concílio Vaticano I pretendia desenvolver uma compreensão da Igreja sob a noção de corpo de Cristo. E essa noção, de fato, estava presente na primeira redação da proposta deste Concílio. Mas foi superada pela eclesiologia da Igreja como sociedade perfeita, que, levada ao grau máximo, fez a definição dogmática sobre o ministério do papa como Pastor aeternus.

A divisão dos cristãos vai além das divergências sobre determinados elementos da doutrina cristã. Ser cristão da igreja a ou b, por exemplo, ser católico romano, ser ortodoxo, ser protestante luterano, anglicano, metodista ou batista, ser membro de uma entre as muits denominações pentecostais ou neopentecostais diz respeito ao modo de entender e viver o conjunto das verdades do Evangelho. A divergência está no modo de conceber o conjunto do que chamamos fé cristã. Os modos distintos de conceber aos poucos se transformam em diferenças também de conteúdo e constituem uma tradição própria.

Qual a causa mais profunda da divisão na Igreja?

Segundo Elias Wolff, na raiz de todas as causas está o pecado, que se expressa pelo orgulho e a vontade humana em desarmonia com a ação da graça divina. A divisão é, em última instância, expressão do pecado. Como os corações humanos têm dificuldades para se deixarem possuir plenamente pelo Espírito, e muitos, mesmo possuindo “as primícias do Espírito” (Rm 8,23), são ainda governados pela obstinação, fazendo com que a fidelidade ao Evangelho da comunhão e abertura para a graça da unidade não seja plena.

Para divergências de compreensão, culturais ou teológicas, se tornarem e se consolidarem em divisões, muros e separações, muitas outras coisas acontecem e contribuem para tal: a falta de escuta uns dos outros, de busca e de conversão à vontade de Deus, de diálogo fraterno, de respeito mútuo, bem como a sede de poder, de autoritarismo e de tentativa de dominação do outro etc.

Depois de tantas divisões históricas, muitas delas com ações violentas e mortes, é possível superarmos o ódio e os ressentimentos transmitidos de geração em geração? É possível aprendemos a conviver acolhendo o pluralismo e respeitando as diferenças, em nome do Evangelho? Muitos acreditam que sim. É preciso mudança de mentalidades. Muitas experiências de estudo e de práticas ecumênicas estão em curso em muitos lugares entre algumas igrejas. Outras acreditam que não e permanecem fechadas ou olham com desconfiança para a possibilidade histórica do ecumenismo. O ecumenismo está entre os maiores desafios para todos os cristãos. Há alguma pedagogia pastoral que pode ajudar a avançarmos no ecumenismo? E você, o que pensa sobre isso?

PARA REFLETIR…

Diante do imenso desafio do ecumenismo, duas questões para a discussão:

1. Por que avançamos tão pouco no ecumenismo, ou seja, por que ele não funciona tanto em nossa caminhada de fé?

2. Qual(is) a(s) causa(s) mais profunda(s) de divisão na Igreja de Jesus Cristo?

CONCLUSÃO

Sobre o desafio do ecumenismo, concordo com o autor lido, a realidade da divisão da Igreja nos leva a pensar que “as divisões são sim obras do homem, mas são também permitidas por Deus“. Nelas se verifica uma divisão dos espíritos, mediante a qual deve vir à luz a fidelidade dos cristãos. Afinal, não devemos pedir a ninguém que renuncie às próprias convicções sobre a verdade eterna, mas todos devem abandonar o que deve ser abandonado, no interesse da unidade e do que se pode desfazer em boa consciência.

O autor fala algo que me provocou muito, ele diz: Muitas vezes ‘a parte de verdade irrenunciável’ que habita cada igreja corre sempre o risco de ser também o lugar da própria perversão – isto me traz convicção que por trás de grandes sermões existem grandes perversões, se Cristo é inclusivo e veio ao mundo pra nos salvar e somar junto, porque estamos usando do fato pra fatiar?

Com isto, acredito que a forma de dar a volta por cima e fazer deste limão uma limonada é trabalhar em movimentos que buscam fortalecer equipes para ações sociais ecumênicas de forma criativa. Na cidade onde eu resido, por exemplo, há um fluxo de migrantes gigantesco, pois Nova Serrana é a capital do calçado esportivo e atrai muitas famílias em busca de um futuro melhor e emprego.

Em resposta ao desafio pastoral para promover o ecumenismo, algumas sugestões práticas:

  • 1. Criar a casa da sopa ecumênica: Com campanhas de doação de utensílios, alimentação e incentivo à leitura, curso de alfabetização etc. tudo em perspectiva ecumênica;
  • 2. Criar, inspirado no programa “Jovem aprendiz”, o programa pastoral jovem ecumênico: nele jovens de diferentes religiões seriam reunidos para produzir conteúdo digital para as mídias de evangelização (músicas, paródias, forma dinâmica de ler a bíblia) em perspectiva ecumênica;
  • 3. Criar o grupo escoteiro para adolescente: Poderia haver retiros nos quais o tema do ecumenismo ocupasse a temática central para desenvolver um olhar amplo sobre este propósito e a experiência do Deus acolhedor.
  • 4. Criar experiências de visita orientada ao asilo: Com tardes de louvor e/ou leituras orientadas, de forma ecumênica, com o objetivo de anunciar Jesus Cristo para os idosos.

A partir da característica principal da cidade, que é a diversidade cultural e religiosa, desenvolver o espírito de acolhida como expressão de amor fraterno. Nesse sentido, importa criar uma linguagem religiosa simples que seja capaz de anunciar e testemunhar o Deus único e amoroso. Cientes de que nenhuma igreja possui um conhecimento exaustivo da verdade do Evangelho que nada tenha a acrescentar ou a tirar no diálogo com as demais.

REFERÊNCIAS

https://pt.wikipedia.org/wiki/Ecumenismo. Acesso em 06 agosto de 2021.

WOLFF, Elias. Caminhos do ecumenismo no Brasil. História, teologia e pastoral. São Paulo: Paulus, 2002.

Wolff, Elias. “Divisões na Igreja: Desafios para o ecumenismo hoje.” Theologica Xaveriana 180
(2015): 381-407. http://dx.doi.org/10.11144/javeriana.tx65-180.dideh. Disponível em: < http://www.scielo.org.co/pdf/thxa/v65n180/v65n180a05.pdf >. Acesso em 06 de agosto de 2021.

SANCHES, Jesus Hortal. E haverá um só rebanho. História, doutrina e prática católica do ecumenismo. São Paulo: Loyola, 1989.