Dom Vicente faz pronunciamento na ONU sobre gravidade das consequências da mineração
Dom Vicente Ferreira, bispo auxiliar da Arquidiocese de Belo Horizonte, partilhou, nesta segunda-feira, dia 2 de março, na 43ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU sobre Meio Ambiente, a situação das comunidades de Brumadinho, amparadas pela Igreja, em decorrência do rompimento da barragem de rejeitos de mineração no Córrego do Feijão, e os desafios na defesa da Ecologia Integral.
Em pronunciamento perante os representantes dos países que integram o Conselho, dom Vicente contestou o relatório das Nações Unidas que considera boas as práticas do Brasil na preservação do meio ambiente. Destacou que as populações não são consultadas no processo de licenciamento para a implantação de megaprojetos e pediu que o governo do Brasil ratifique o Acordo de Escazú, fornecendo informações, consultas e participação suficientes das comunidades e da sociedade nos processos de licenciamento. E ressaltou também que os rompimentos das barragens em Brumadinho – há um ano – e em Mariana, há cinco anos – continuam produzindo efeitos nocivos nas comunidades e no meio ambiente, nada tendo sido feito para impedir outros eventos semelhantes.
Dom Vicente, que integra a Comissão episcopal de ecologia integral e mineração da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), cumpre uma intensa agenda de compromissos na Europa, ao lado do francisco frei Rodrigo Peret, da Rede igrejas e mineração. Ele declara que orações, debates, encontros, anúncios e denúncias fazem parte dessa busca por novos caminhos.
Após a reunião na ONU, dom Vicente concedeu entrevista coletiva à imprensa internacional, e participou de reunião no escritório da Franciscans International, que atua na proteção da dignidade humana e da justiça ambiental, nas Nações Unidas.
Com uma intensa agenda, até o dia 7 de março, dom Vicente Ferreira participa de debates e encontros, concede entrevistas a jornalistas e reúne-se com parlamentares em outros quatro países da Europa, além da Itália: Áustria, Suíça, Bélgica e Alemanha, partilhando iniciativas de defesa da ecologia integral, desenvolvidas pela Comissão especial sobre mineração e ecologia integral da CNBB e pela Rede igrejas e mineração.
Dom Vicente Ferreira iniciou a viagem pela cidade de Roma, Itália. Em seu primeiro compromisso, participou de evento sobre impactos da mineração e acompanhamento dos atingidos por parte da Igreja, promovido pela União internacional das superioras gerais (UISG) – Centro per la vita religiosa regina mundi . O Bispo falou sobre questões relacionadas às consequências da atividade mineradora e a ação da Igreja junto à população e ao poder público. No mesmo dia, participou de reunião com a equipe do escritório geral da Comissão justiça, paz e integridade da criação (JPIC) da Ordem dos Frades Menores – Franciscanos.
O Bispo atende ao convite de organizações de defesa do meio ambiente, após coordenar importante trabalho da Arquidiocese de Belo Horizonte no amparo às vítimas do rompimento barragem de rejeitos de mineração no Córrego do Feijão, no município de Brumadinho, em janeiro de 2019. Esta experiência fez com que a Arquidiocese de Belo Horizonte se tornasse referência no apoio da Igreja às comunidades atingidas, em suas necessidades de reparação e respeito à cidadania.
43ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU
Item 3
Diálogo interativo com o relator especial sobre direitos humanos e meio ambiente
Março 2, 2019
Obrigado Sr. Vice-Presidente,
Congratulamo-nos com o relatório do relator especial, Sr. Boyle. Também concordamos que proteger o meio ambiente contribui para o cumprimento dos direitos humanos e isso contribui para salvaguardar nossa casa comum.
Embora o Brasil tenha sido listado no seu relatório como um exemplo de boas práticas, a realidade difere do que o país possui em sua legislação, particularmente no acesso a informações ambientais.
As comunidades geralmente não são consultadas quando da concessão de licenças para megaprojetos ou essas licenças são concedidas sem seguir o procedimento legal.
Nesse sentido, pedimos ao governo do Brasil que ratifique o Acordo de Escazú* e forneça informações, consultas e participação suficientes das comunidades e da sociedade civil no processo de licenciamento de megaprojetos, principalmente de mineradoras.
Faz um ano desde a quebra da barragem de rejeitos em Brumadinho e cinco anos desde Mariana. Até agora, os dois desastres continuam produzindo efeitos nocivos nas comunidades e no meio ambiente locais e nada foi feito para impedir eventos semelhantes. Somente no estado de Minas Gerais, existem pelo menos 40 barragens com risco de colapso e grande risco de possíveis danos.
Não será possível realizar progressivamente o direito a um ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável no Brasil se o governo não assumir suas obrigações internacionais, inclusive ao prevenir e garantir que as empresas sejam responsabilizadas e ao combater a impunidade como um impedimento para evitar que desastres criminosos aconteçam de novo e de novo.
Obrigado, Sr. Vice-Presidente.
* Entenda o Acordo Escazú
O Acordo de Escazú é o primeiro tratado ambiental de direitos humanos na América Latina e no Caribe. Foi aprovado em março de 2018 após uma negociação que durou cerca de seis anos. Desenvolve o Princípio 10 da Declaração do Rio de 1992 sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que visa a garantir o acesso à informação, a participação do cidadão e o acesso à justiça em questões ambientais. O Acordo de Escazú desenvolve esses três direitos e visa a promover uma melhor governança dos recursos naturais na região. Vinte e quatro estados aprovaram seu texto final em março de 2018, na cidade costarriquenha de Escazú, onde foi realizada a última das nove reuniões do Comitê de Negociação. O Brasil assinou, contundo não ratificou, o que o torna ineficaz, no país.
O Acordo de Escazú incorpora vários elementos inovadores:
- Primeiro, possui uma disposição específica sobre defensores de direitos humanos ambientais (DRHs) sem precedentes na região.
- Segundo, consagra uma abordagem baseada em direitos aos povos indígenas e populações vulneráveis, com disposições para favorecer o acesso à informação, a participação e o acesso à justiça por esses grupos.
- Terceiro, também responde ao espírito dos Princípios Orientadores das Nações Unidas sobre Negócios e Direitos Humanos em relação às obrigações específicas das empresas de respeitar os direitos humanos no contexto de suas atividades.
Fontes: