A Igreja do Brasil, por meio da Comissão Episcopal para a Ação Sóciotransformadora da CNBB, juntamente com outras organizações, organismos e pastorais sociais, produziu um subsídio de formação para ajudar na divulgação e propiciar maior engajamento a nível nacional da VI Jornada Mundial dos Pobres (JMP). Essa Jornada é celebrada pela Igreja Católica em todo o mundo dia 13 de novembro de 2022 (XXXIII Domingo do Tempo Comum), mas no Brasil é vivenciada durante toda a semana, de 06 a 13 de novembro de 2022, com momentos de articulação, formação, celebração e gestos concretos. Em resumo, a proposta da Igreja para todos os cristãos e pessoas de boa vontade.
‘Dai-lhes vós mesmos de comer’
O documento faz uma motivação para a VI JMP, apresenta a mensagem do Papa Francisco, traz uma breve reflexão teológica, aprofunda um pouco a realidade da fome e busca provocar uma roda de conversa em torno desta temática. Sem dúvida alguma, este documento pode ser considerado um pré-lançamento da Campanha da Fraternidade 2023, que se debruça sobre essa dura realidade da fome em nosso país.
Dom José Valdeci, da Diocese de Brejo – MA e presidente da Comissão Episcopal para a Ação Sóciotransformadora da CNBB, ao apresentar o documento, destaca que o tema proposto pelo Papa Francisco é Jesus Cristo fez-se pobre por vós (cf. 2 Cor 8, 9). Um convite para uma profunda reflexão e ação evangélica para a solidariedade transformadora junto aos irmãos e irmãs empobrecidos/as. O chamado é para aprofundarmos a compreensão das causas das desigualdades para uma atuação engajada e profética de transformação dessas realidades.
Porém salienta que, no Brasil, “estamos motivando as pessoas de boa vontade a partir do tema: ‘Dai-lhes vós mesmos de comer’, que nos coloca como protagonistas das mudanças sociopolíticas, – essa é – nossa missão em uma conjuntura onde mais de 33 milhões de pessoas passam fome no país e por consequência são vítimas de tantas outras violações contra a dignidade humana”. Recorda ainda os 66 anos da Cáritas Brasileira e seu empenho nos gestos de solidariedade humana e social.
Dom Valdeci incentiva que, além do envolvimento das comunidades nesta VI Jornada, deseja que elas “assumam compromissos concretos de incidência política para que as políticas públicas de segurança e soberania alimentar sejam implementadas de fato no país”.
Jesus Cristo fez-se pobre por vós (cf. 2 Cor 8, 9)
Em sua mensagem para o VI Dia Mundial dos Pobres, o Papa Francisco apoia-se nas palavras de São Paulo Apóstolo aos Coríntios. Nela fundamenta o compromisso de solidariedade com os irmãos necessitados e busca ser uma ajuda para refletir sobre o nosso estilo de vida e as inúmeras pobrezas na atualidade.
O Papa sinaliza que, passada a pandemia, pudéssemos “trazer o alívio a milhões de pessoas empobrecidas pela perda do emprego”. No entanto, “uma nova catástrofe assomou ao horizonte”: a guerra na Ucrânia, somada às guerras regionais, geram uma imensidão de empobrecidos e famintos e, tragicamente, “alguns poderosos abafam a voz da humanidade que implora a paz”.
O Papa aponta que “uma multidão de gente simples, vem juntar-se ao número já elevado de pobres”. E questiona: “Como dar uma resposta adequada que leve alívio e paz a tantas pessoas, deixadas à mercê da incerteza e da precariedade?”. Retornando a Paulo, lembra a solidariedade da comunidade de Corinto e incentiva a todos nós: “como se o tempo tivesse parado naquele momento, também nós, cada domingo, durante a celebração da Santa Missa, cumprimos o mesmo gesto, colocando em comum as nossas ofertas para que a comunidade possa prover às necessidades dos mais pobres”. E, na linha da “sinceridade do amor”, salienta a necessidade de não desanimarmos diante das dificuldades: “a solidariedade é precisamente partilhar o pouco que temos com quantos nada têm, para que ninguém sofra. Quanto mais cresce o sentido de comunidade e comunhão como estilo de vida, tanto mais se desenvolve a solidariedade”.
O Papa retoma ainda a Evangelii Gaudium: “Ninguém pode sentir-se exonerado da preocupação pelos pobres e pela justiça social” (EG 201). Ele deixa claro que não basta palavras bonitas, boas intenções ou atitudes simplesmente assistencialistas, é preciso ações concretas: “No caso dos pobres, não servem retóricas, mas arregaçar as mangas e pôr em prática a fé através dum envolvimento direto, que não pode ser delegado a ninguém.” E deixa bem claro a sobriedade no uso dos bens e da riqueza: “Nada de mais nocivo poderia acontecer a um cristão e a uma comunidade do que ser ofuscados pelo ídolo da riqueza, que acaba por acorrentar a uma visão efêmera e falha da vida”.
A pobreza de Cristo torna-nos ricos
Ele ainda faz um paralelo entre a pobreza que humilha e mata, que é a miséria causada pela injustiça, exploração e violência, imposta pela cultura do descarte e sem perspectivas de saídas e a pobreza (de Jesus) que nos torna ricos. Pois, “a verdadeira riqueza não consiste em acumular ‘tesouros na terra, onde a traça e a ferrugem os corroem e os ladrões arrombam os muros, a fim de os roubar’ (Mt 6, 19), mas, antes, no amor recíproco que nos faz carregar os fardos uns dos outros, para que ninguém seja abandonado ou excluído”. E assim alerta o Papa: “na realidade, os pobres, antes de ser objeto da nossa esmola, são sujeitos que ajudam a libertar-nos das armadilhas da inquietação e da superficialidade”. Ou seja: é “a pobreza de Cristo que nos torna ricos”. “A riqueza de Jesus é o seu amor, que não se fecha a ninguém, mas vai ao encontro de todos, sobretudo de quantos estão marginalizados e desprovidos do necessário”.
E assim conclui a carta: “Oxalá este VI Dia Mundial dos Pobres se torne uma oportunidade de graça, para fazermos um exame de consciência pessoal e comunitário, interrogando-nos se a pobreza de Jesus Cristo é a nossa fiel companheira de vida.”
Não desprezemos os pobres, os humildes, os operários…
Uma breve reflexão teológica, feita por Jardel Neves Lopes, enfatiza alguns pontos da Carta de Francisco para a VI JMP, ele enfatiza a sintonia da carta com o Magistério do Vaticano II, com Igreja Latino-americana e com o Francisco: “existe um vínculo indissolúvel entre a nossa fé e os pobres” (EG 48).
Destaca três tarefas presentes no apelo evangélico de Jesus: “dai-lhes vós mesmos de comer!” (Mt 14,16): 1. A cooperação para resolver as causas estruturais da pobreza e promover o desenvolvimento integral dos pobres; 2. Não basta “uma política para os pobres, mas nunca com os pobres, nunca dos pobres” (Fratelli Tutti, 169). Faz necessário “promover um desenvolvimento integral”, do qual os pobres façam parte da mudança”; 3. Os “gestos simples e diários”, de caráter assistencial são fundamentais. […] Mas, deve servir também para “refletir sobre o nosso estilo de vida e as inúmeras pobrezas da hora atual”.
E retoma a Carta do Papa com o testemunho de São Carlos Foucauld, dizendo: “não desprezemos os pobres, os humildes, os operários; são não só nossos irmãos em Deus, mas também os que mais perfeitamente imitam a Jesus na sua vida exterior. Eles apresentam-nos perfeitamente Jesus, o Operário de Nazaré”.
A fome é o prato principal de milhões de pessoas no Brasil
Além da pandemia de COVID-19, o enfraquecimento dos direitos sociais, o corte de políticas públicas, o desemprego e subempregos agravaram a fome no Brasil. A análise sobre a realidade retoma informações recentes: “De acordo com o Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, desenvolvido pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN), divulgado em 2021, cerca de 55,2% dos lares brasileiros vivenciavam um cenário de insegurança alimentar, um aumento de 54% em relação a 2018, quando esse percentual era de 36,7%. São 116,8 milhões de brasileiros sem acesso pleno e permanente à comida. Ainda, cerca de 19 milhões de brasileiros se encontram em situação de insegurança alimentar grave.”
Desta forma, “a fome é o prato principal de milhões de pessoas no Brasil”. E isso não é uma fatalidade, ou fruto de uma causa natural ou acidental, antes advém de interesses políticos e soma-se ao papel omisso do Estado, que “promove o enfraquecimento da democracia e os interesses corporativos em detrimento da vida”. O resultado disso é o “cenário de aprofundamento de violações sistemáticas dos direitos humanos e ambientais, a superexploração do trabalho e a perda de direitos trabalhistas e sociais. […] na promoção de políticas públicas para a superação da fome e garantia de segurança e soberania alimentar para todas as pessoas.”
Esse retrato da realidade destaca para a criação da “Frente Nacional contra a fome e a sede” e convida a população a integrar essa rede de solidariedade!
O documento termina com uma proposta de encontro celebrativo em torno do tema da VI JMP tendo momento de reflexão bíblica e partilha solidária. Vale a pena baixar o material, divulga-lo em suas redes sociais e animar as pessoas e comunidades a abraçar essa VI Jornada Mundial dos Pobres: Dai-lhes vós mesmos de comer – VI Jornada Mundial dos Pobres.
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É religioso missionário sacramentino, Mestre e Doutor em Teologia (FAJE), Licenciado em Filosofia (PUC Minas), presidente do Movimento Boa Nova (MOBON) e agente da formação de cristãos leigos e leigas. É membro da Sociedade de Teologia e Ciências da Religião (SOTER), apoiador da Animação Bíblica da Pastoral no Regional Leste II da CNBB e colaborador voluntário do Observatório da Evangelização.