A consciência da gravidade dos riscos vividos no contexto atual
Trouxe a tentação de reduzir os horizontes e as perspectivas do Natal
Com agudo senso de responsabilidade e esmerada dedicação ao cuidado,
Muitos asseveram: “este será um inédito Natal pandêmico virtual, em casa
Com familiares separados uns dos outros por medidas sanitárias”.
No entanto, quando recordamos o contexto do nascimento de Jesus
As muitas dificuldades vividas pelo casal Maria e José…
Quando conhecemos de perto os desafios da vida diária dos pobres
Com suas lutas em defesa da dignidade da vida e por cidadania…
Percebemos, imediatamente, que as dificuldades do caminho
Desigualdade, pobreza, exclusão, perseguição, preconceito, violência…
Nunca impediram o Mistério do Amor Divino irradiar a sua luz
Na singeleza e resistência dos presépios de ontem e de hoje
E em toda criança que nasce, Deus renova seu sim à humanidade.
Desse modo, o grave contexto contemporâneo de pandemia da COVID – 19
Com suas exigências de distanciamento, isolamento social e de ficar em casa
Quando assumido, de fato, por cada lar cristão no seio das Igrejas domésticas
Não traz grandes ameaças e barreiras para uma rica celebração de Natal em 2020.
Ao contrário, o que ameaça o brilho do Advento libertador de Deus em nossa história,
Fonte instigante de esperança, encorajamento para a luta e cultivo de Vida Nova,
São, na verdade, homens e mulheres com fé e mentalidade religiosa deturpadas,
Com mentes fechadas ao diálogo fraterno, corações indiferentes às dores alheias
E, sobretudo, com mãos atadas para o dinamismo criativo do amar solidário e libertador.
O Natal não deve ser reduzido ao que é vivido no simbólico dia 25 de dezembro
O Natal de Jesus acontece todos os dias quando pessoas, movidas por fé confiante
Cultivam vidas enraizadas em Cristo Ressuscitado e sempre estradeiro conosco
E, pela força do Espírito Santo, Deus em nós, decidem cuidar da dignidade da vida
Dar as mãos aos pobres e praticar a justiça, a partilha, a misericórdia, a boa política…
Pelo cultivo do Memorial do Senhor, celebrado nas Eucaristias vividas com fé na caminhada
No seio da Igreja doméstica, podemos, sim, celebrar vivamente o Natal de Jesus:
Quando nos dispomos a aprender as importantes lições desta pandemia;
Quando nos deixamos iluminar pela Palavra de Deus, rezada e meditada com fé;
Quando nos purificamos nas experiências diárias de amor-atenção-cuidado compartilhados;
Quando nos comprometemos com a partilha fraterna-sororal do tempo e dos bens;
Quando acolhemos as consequências do cultivo diário da consciência crítica, solidária e cidadã;
Quando apoiamos e participamos juntos das lutas dos pobres e seus movimentos populares;
Assim, que este tempo forte de preparação e desejo de vida nova: Advento, Natal, Ano Novo
Seja, de fato, tempo de abertura à luz do amor de Deus, uma experiência espiritual intensa
Como o barro nas mãos do oleiro, nos deixemos fecundar e transformar pela vida de Jesus
Que os ensinamentos e gestos proféticos d’Ele sejam critérios para nossa conversão à vida nova
Viver autenticamente a vida humana nesta sociedade em construção, com tantos desafios e lutas
Que o amar a Deus se faça concretamente amar aos irmãos e irmãs caídos no caminho
A todos os que precisam de apoio, solidariedade material-espiritual, atenção, cuidado
E cultivo sociopolítico da ecologia integral nos âmbitos pessoal, social e ambiental.
Desse modo, desejamos a você e aos membros de sua Igreja Doméstica
Um abençoado e santo Natal e Ano Novo, com aquela luz irradiada da certeza da fé
Fé na presença de Deus, sempre estradeiro conosco, a nos impulsionar criativamente
Para a alegria e a festa divina, no dia em todos terão vida e vida em abundância.
Nesta travessia, além do amar, da vivência da fé e na esperança dizemos
Juntos e irmanados na utopia do Reino de Deus, Reino da justiça, Reino da vida: Amém!
Sobre o autor:
Edward Guimarães é teólogo leigo, doutor em Ciências da Religião, pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas), mestre em Teologia, pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE). Professor do Departamento de Ciências da Religião da PUC Minas, onde atua como secretário executivo do Observatório da Evangelização. É membro do Conselho Pastoral Arquidiocesano na Arquidiocese de Belo Horizonte, assessor da Comissão Ecumênica da CNBB Leste 2, das pastorais sociais, da catequese e das CEBs. Membro da atual diretoria da Sociedade de Teologia e Ciências da Religião (SOTER).
Caro Edward!
Parabéns por sua reflexão. Como diz, o Natal não é só um dia, um encontro de pessoas, uma festa. É tudo isso, também – com o devido sentido – mas, sobretudo, uma atitude, uma opção e uma ação perante nós próprios, os outros, a vida e a natureza com base no ser, falar e agir de Jesus de Nazaré, o Cristo da fé. Tem a ver com a presença de Deus na história, com defesa e promoção da vida, com dignidade humana e libertação integral para tudo e todos. Neste contexto pandêmico, como Jesus nasce, é reverenciado, presenteado e glorificado? Como é perseguido, ameaçado, negado?… Devemos interpretar o Natal à luz da Covid e dar sentido a ela à luz do Natal. E sermos, cada vez mais, “outros Jesus”, em nosso tempo, em nossos lugares, em nossas situações. Abraços!
Obrigado, Waldemar. Estamos juntos neste desafio exigente e belo do seguimento de Jesus no complexo contexto contemporâneo.