Sinodalidade – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com Fri, 26 Apr 2024 19:01:00 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=6.5.4 https://i0.wp.com/observatoriodaevangelizacao.com/wp-content/uploads/2024/04/cropped-logo.png?fit=32%2C32&ssl=1 Sinodalidade – Observatório de Evangelização https://observatoriodaevangelizacao.com 32 32 232225030 O Clericalismo que habita em nós https://observatoriodaevangelizacao.com/o-clericalismo-que-habita-em-nos/ Fri, 26 Apr 2024 18:59:30 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.com/?p=49838 [Leia mais...]]]>  

O CLERICALISMO QUE HABITA EM NÓS

Por Toninho Kalunga

Francisco é o primeiro Papa a tocar em um tema de fundamental importância para a sobrevivência da Igreja Católica no meio dos pobres. É a chaga do clericalismo. Este mal nasce do entendimento de uma parcela dos padres, de que a fé que eles devotam a Deus, é uma fé mais importante do que a fé das pessoas que não são padres.

O clericalismo nasceu disso. O desenvolvimento desta perspectiva de fé trouxe uma tese de uma certa hierarquia na relação com Deus. Assim, primeiro, vem o Papa, com sua infalibilidade, logo em seguida são os poderosos cardeais, seguidos dos arcebispos, bispos e finalmente a massa sacerdotal. O povo é conduzido e a estes, basta este papel!

Por outro lado, quem cuida, de fato, da fé do povo católico são os padres. Aliás, neste ponto nem há tanta contradição, pois, eles se formam em seminários, num período que vai de 8 à 12 anos, para ajudar na construção e consolidação de uma perspectiva religiosa e sua consequente fé. No decorrer do tempo, infelizmente, ao invés de servir, optaram por ser servidos. E aí é que a coisa degringolou.

Podemos verificar nas lembranças de nossa juventude, “Igrejas que não cabiam gente” de tanta gente que ia às Missas! Era o tempo da Igreja Pastoral, de uma Igreja onde seus pastores tinham “cheiro de suas ovelhas”. Entre o Concílio Vaticano II e o final dos anos 1970, os seminários formaram padres que tinham como perspectiva e sonho, servir ao povo de Deus.

No começo dos anos 1980, com o advento do papado de João Paulo II, essa proposta de Igreja Pastoral, foi perdendo seu vigor e passou a ser combatida ferozmente com incentivo papal do anticomunismo. Se houve erro no papado de João Paulo II, certamente, esse foi o maior deles, pois sua visão de mundo e histórico pessoal, dava a ele a dimensão de que a Polônia era o mundo. E não era!

A Igreja Latino Americana, não era a mesma Igreja Européia. Nem é!! Essa falta de perspectiva cultural e de dimensão social e econômica de João Paulo II, fez com que seu papado passasse a ser de enfrentamento a uma Igreja alegre e popular, uma Igreja de dimensão profética e acolhedora. Uma Igreja gigantesca na dimensão espiritual, eclesial e popular. Foi uma Igreja libertadora e feliz, vocacionada a ser sal na terra e luz no mundo. Por isso, era cheia, vigorosa, devota e encarnada na vida do povo. O resultado é que a vitória dos conservadores, está sendo a derrota de toda a Igreja.

Assim, esta nova proposta ganhou força e os seminários passaram a construir com grande esforço e incentivo do Vaticano, uma formação cada vez mais clericalista, onde a ideia do padre tutor, com pouco interesse na dimensão cotidiana do povo e apegado ao status sacerdotal. A igreja católica passou então a abrir mão do tríplice múnus, que é o múnus sacerdotal, múnus profético e múnus pastoral, para assumir e incentivar apenas o primeiro.

A partir deste momento, começou a crise das ordenações sacerdotais; Diminuindo drasticamente a quantidade de seminaristas e vocações religiosas femininas nos conventos. Jovens que buscavam servir, deixaram de ver na Igreja um atrativo, afinal, para ter poder, melhor seria ser candidato a vereador, prefeito ou deputado e não a padre ou “freira”!!

Assim, fomos apresentados ao orgulhoso Padre de Sacristia, perdendo de vez o líder pastoral. Foi quando começou a surgir a figura dos padres cantores ou o padre popstar, que juntava muita gente em Igrejas enormes e afastavam ao mesmo tempo, o mesmo povo, de suas pequenas comunidades. Esse foi o começo do fim das Comunidades Eclesiais de Base. Enquanto o povo cantava que tinha:

 “anjos voando neste lugar, no meio do povo e em cima do altar, subindo e descendo em todas as direções”, 

O povo na periferia ficava vendo lobos em pele de pastores, engolindo sua fé e arrancando suas esperanças, dizendo que a culpa pelas dificuldades que passavam era em razão de seu pecado e não em razão de um sistema econômico e social que os escravizavam.

Assim, como suspiro de esperança, nas periferias que ainda resistiam, a canção era outra: Ao perceber que lhes faltavam pastores o povo clamava:

“Falta gente pra ir ao povo Descobrir porque o povo se cala Pastores e animadores pra incentivar o teu povo a falar.  Falta luz porque não se acende Não se acende porque faltam sonhos. E falta esse jeito novo de levar luz e falar de Jesus”

Em razão da perda de contato da Igreja Católica com a realidade do povo, surgiu um vácuo, que foi ocupado por uma dimensão religiosa já existente, que se pulverizou: pastores evangélicos oriundos e envolvidos com a realidade de suas comunidades, favelas e periferias em geral levando apoio em nome de Jesus.

Ao destruírem pastorais como a Pastoral Carcerária, os pastores passaram a dar assistência às famílias dos detentos pobres e dos próprios presidiários. Ao impedir a dimensão profética de Pastorais como a Pastoral da Terra, abrimos mão do apoio aos trabalhadores rurais e deixamo-los à própria sorte, sendo estes acolhidos por pequenas comunidades evangélicas nas pequenas cidades e no campo.

O que sobrou aos católicos foi uma elite paroquiana que ao pagar o dízimo e doar um bezerro para a festa da Padroeira, tirava o senso crítico da realidade vivida pelos mais pobres, assim, não fazia diferença participar de uma Igreja onde o padre culpava os pecadores por seus pecados, e o pastor que dizia que o pecado era coisa do demônio. Assim, melhor era falar com o pastor, que ao menos lhes falava que iam sair no tapa com o belzebu!

Nenhum destes, no entanto, se interessava mais em falar sobre a esperança de uma vida melhor aqui, neste lugar. Todos só garantiam isso depois da morte. Assim, a vida vivida, era abafada e o que restava era se adaptar e deixar o tempo passar. Os que não aceitavam essa condição, construíram sua própria fé! Contudo sem formação, sem dimensão filosófica e teológica pastoral. Não demorou para que a falta destas dimensões formativas, fossem adaptadas para o campo da política conservadora e o resultado desta pulverização está aí para que todos possamos ver!

Além dos seminários, outra figura que transforma bons padres, em padres clericalistas, é a própria comunidade de leigos e leigas que exigem destes homens uma postura que muitos não gostariam de ter – nem têm – responsabilizando e exigindo destes uma postura de super humanos. Não é sem razão que existem tantas desistências e frustrações com o sonho da vida sacerdotal.

No campo progressista não é muito diferente, lamentavelmente! O que deveria ser um sopro de alívio para os padres, passa a ser também uma exigência de posicionamentos que cabem aos leigos e não aos padres. E isso também é muito frustrante.

Ao fim, o que se tem é um séquito de religiosos, que chegam numa comunidade e destroem a organização histórica Pastoral dessas comunidades e impõe o seu estilo e ponto de vista, acompanhado de um viés ideológico de extrema direita e hipócrita,  em detrimento da história daquela comunidade. Não servem. Exigem serem servidos.

Tem uma canção que gosto muito, que é bastante cantada na ceb nos atos penitenciais que diz assim:

“Quem não te aceita, quem te rejeita, pode não crer, por ver cristãos que vivem mal…”

Tenho visto cada vez mais pessoas que estão tristes com a Igreja Católica que trazem consigo características em comum: Não participam da vida comunitária, não batem um prego num sabão para ajudar na construção da reflexão e não ajudam na lida cotidiana da comunidade, mas querem espaço de liderança. Não topam estar numa turma de catequese com um grupo de 05 ou 10. Querem ser chamados para fazer palestra nos grupos x ou y, mas não estão dispostos a participar da formação na paróquia. Ou seja. Só aceitam posição de liderança ou de destaque, (igual ao padre) não querem, portanto, fazer parte da massa. O que não entendem é que se não se misturar a esta massa, jamais poderá ter de novo o prazer de se alegrar em uma comunidade.

Não é este o comportamento clericalista?? Não é essa a razão pela qual reclamamos dos Padres que não ouvem, não colocam os pés no barro, não frequentam a casa dos mais pobres?? Aí me pergunto, aos que reclamam daqueles: não estamos imitando e nos comportando da mesma forma??

Não é necessário brigar com o padre. Mas é necessário construir a comunidade junto com ele. Estar à disposição de uma comunidade de fé (E NÃO DO PADRE) significa também ter a humildade e a disposição de amadurecer a fé a partir do exemplo do lavapés e aí, sim, estar pronto para ajudar o padre. Afinal, o ensinamento Evangélico é que se não houver a permissão para que os próprios pés sejam lavados, não se compreenderá que este exemplo não é para usufruir de um serviço mas a ação diária para se fazer imitador de Cristo.

Portanto, esta reflexão não é um chamado de uma guerra contra os padres, muito menos de uma postura que queira lançar culpas a quem quer que seja, antes de mais nada é um apelo para que o clero, enquanto representantes tão privilegiados ( mas não únicos) do amor de Deus, se voltem novamente ao serviço profético de anunciadores do amor de Deus e denunciadores contra as mazelas que os poderosos infligem contra a razão maior das suas existências: os pobres.

Que todos nós, filhos e filhas de Deus e peregrinos por este mundo em busca do conforto espiritual, tenhamos a reciprocidade da acolhida de nossos pontos de vista e não da imposição do ponto de vista ideológico, travestido de teológico por parte do clero e de lideranças leigas fascistas, pois estas, destroem o amor, a fraternidade e a solidariedade entre nós!

Que nosso projeto de religiosidade tenha, na necessidade da dignidade de qualquer vida, o parâmetro da defesa da vida de todos, e que esta dignidade seja aplicada da concepção (e não apenas da concepção à Luz), indo até a morte natural como parâmetro da defesa da vida, conforme proposto pelo próprio Cristo. (João,10-10)

 

Toninho Kalunga é leigo orionita na Comunidade do Pequeno Cotolengo, Santuário São Luis Orione em Cotia e membro da Fraternidade Leiga Charles de Foucauld

Fonte: CEBs do Brasil

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Uma Igreja sinodal em missão https://observatoriodaevangelizacao.com/uma-igreja-sinodal-em-missao/ Fri, 26 Apr 2024 18:16:17 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.com/?p=49834 [Leia mais...]]]>

Uma Igreja Sinodal em Missão – Cartilha

Conheça a Cartilha “Igreja Sinodal em Missão” organizada pelo CNLB, Caritas Brasileira e CCB Jesuítas – Uma reflexão sobre a sinodalidade!

O Conselho Nacional do Laicato do Brasil (CNLB), a Caritas Brasileira e o Centro Cultural de Brasília (Jesuítas – Companhia de Jesus) lançaram a cartilha “UMA IGREJA SINODAL EM MISSÃO”. É possível fazer o download na versão digital bem como na versão para impressão, no site do CNLB.

A presidente do CNLB lembrou que a ideia de fazer uma cartilha para rezar e estudar o documento síntese da 1ª Sessão do Sínodo sobre a Sinodalidade surgiu em uma reunião do CNLB. “O Colegiado Deliberativo do Conselho fez a indicação de procurarmos a Caritas Brasileira e os Jesuíta para construção desse instrumento de oração, estudo e reflexão”, enfatizou Sônia Gomes.

Padre Miguel Martins, jesuíta, tem a expectativa de que, de modo especial, os cristãos leigos e leigas, possam se utilizar dessa cartilha se apropriar dos conteúdos do relatório síntese da 1ª Sessão do Sínodo da Sinodalidade. “O processo sinodal não é um evento. É um modo de ser Igreja que inclusive nós aqui no Brasil já vivemos. Mas precisamos reavivar isso, esse modo de ser igreja, que é um modo de participação de todos, para que todos tenham voz e vez”, destacou o jesuíta.

Marilza Schuina da Comissão de Assessoria Permanente (CAP) do CNLB lembra que a cartilha quer ajudar a aprofundar as questões que o Sínodo sobre Sinodalidade aponta a partir da realidade em que vivemos. “Nossa expectativa é que esta cartilha favoreça que os cristãos leigos e leigas, nas comunidades, movimentos e pastorais possam refletir sobre os temas apresentados no relatório síntese da primeira sessão sinodal”, finalizou Schuina.

 

O porquê da Cartilha “Uma Igreja Sinodal em Missão” …

Este subsídio deve ajudar as pessoas por meio da leitura orante, dos círculos bíblicos, textos, cantos e outros instrumento para uma reflexão orante do relatório síntese da 1ª Sessão do Sínodo sobre a Sinodalidade. “Aproximar aqueles e aquelas dos mais distantes lugares para refletir e ler o relatório síntese, entender o que é uma Igreja sinodal e assim ajudar a viver esse jeito de ser Igreja na prática”, destacou Sônia Gomes.

Já Marilza Schuina reforça que o objetivo da Cartilha não é apenas responder as questões do relatório, mas refletir e debater como podemos ser uma Igreja verdadeiramente Sinodal na sua essência, uma Igreja povo de Deus, de comunhão, participação e missão.

Como utilizar a Cartilha?

A Cartilha tem linguagem de fácil entendimento e muito simples de utilizar. Assim sendo, o jesuíta Miguel Martins, nos lembra que esse instrumento pode ser usado nos encontros dos grupos de jovens, das pastorais, dos movimentos, das CEBs. São 20 capítulos com temas ligados ao relatório síntese da 1ª Sessão do Sínodo da Sinodalidade. “Os animadores de comunidades, lideranças das pastorais, organismos, serviços, movimentos e demais forças vivas da Igreja são sujeitos eclesiais que podem liderar essa reflexão em seus espaços e assim ajudar na espiritualidade sinodal, nosso jeito de viver a fé”, reforçou padre Miguel.

Sônia Gomes nos lembra que a Cartilha pode ser usada em todos os espaços que participamos inclusive nos novos areópagos como a internet. “A cartilha pode inclusive ser usada em nossas reuniões virtuais para reflexão da Igreja Sinodal em comunhão com o Sínodo da Sinodalidade”, finalizou a presidente do CNLB.

Fonte: Conselho Nacional do Laicato do Brasil

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Uma experiência sinodal na Igreja do Brasil https://observatoriodaevangelizacao.com/uma-experiencia-sinodal-na-igreja-do-brasil-2/ Thu, 25 Apr 2024 18:10:29 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.com/?p=49792 [Leia mais...]]]> Neste texto, Neuza Mafra nos apresenta “Uma experiência sinodal na Igreja do Brasil”. Trata-se do Sínodo da Diocese de Tubarão, que foi uma proposta “gestada aos poucos no Conselho Diocesano de Pastoral, amparada pelas comarcas (regiões pastorais), paróquias, comunidades e pastorais, através de consultas, sendo assumida concretamente por todos numa Assembleia Diocesana de Pastoral”, com a missão de transformar a realidade social/eclesial à luz do Concílio Vaticano II”. Não é exatamente isso que o papa Francisco vem impulsionando com o seu projeto de reforma da Igreja, de modo especial, com o Sínodo sobre a sinodalidade? 

Este é um texto da iniciativa do Serviço Teológico-Pastoral, que publica quinzenalmente em diversas mídias católicas textos opinativos que contribuam para a reflexão e a formação na caminhada de conversão sinodal da Igreja Católica impulsionada pelo papa Francisco.

Desejamos a todos e todas uma boa leitura!

 

UMA EXPERIÊNCIA SINODAL NA IGREJA DO BRASIL

 “O caminho da sinodalidade é o caminho que Deus espera da Igreja do Terceiro milênio!” 

Papa Francisco

Por Neuza Mafra

Capa do Documento de Trabalho do Sínodo da Diocese de Tubarão.

O papa Francisco tem afirmado que a sinodalidade é uma dimensão constitutiva na vida da Igreja. Ou seja, é da sua natureza, o “caminhar juntos” dos irmãos e irmãs que acolhem o chamado de fazer parte do Povo de Deus e participar de sua missão. Daí a necessidade de realizar “sínodos” ao longo da caminhada, através de Assembleias Eclesiais para discernir, à luz da Palavra de Deus, questões pastorais, litúrgicas, doutrinais, que expressem o “modus vivendi et operandi da Igreja povo de Deus”. Esses são momentos específicos para tratar de determinados assuntos significativos para a caminhada, para tomadas de decisões conjuntamente. Evidencia, portanto, que a prática sinodal é recorrente na caminhada histórica da Igreja, inspirada na vivência das Primeiras Comunidades Cristãs, manifestações significativas inspiradas e referenciais da vida eclesial dos primeiros séculos. Não é uma invenção do papado de Francisco. Ele apenas deseja recuperar o que o próprio Concílio Vaticano II propôs.

Na caminhada recente da Igreja do Brasil, inúmeros eventos sinalizam essa prática: as Assembleias do Povo de Deus, as Conferências Episcopais, os Sínodos Diocesanos…

Voltemos em meados dos anos de 1984-1986, na Diocese de Tubarão, sul de Santa Catarina, onde se realizou o Sínodo Diocesano de Planejamento Participativo. Ele nasceu sob as inspirações do Concílio Vaticano II (1962-1965), das Conferências de Medellín (1968), Puebla (1979) e da organização da CNBB, no contexto da busca de uma pastoral de conjunto, como resposta ao cenário que naquele momento se apresentava na esfera eclesial. Uma experiência sinodal muito significativa que pode servir de inspiração profética para o nosso tempo. Vejamos.

 

Cenário eclesial da Diocese de Tubarão

O Sínodo da Diocese de Tubarão está situado no contexto histórico, social e eclesial dos anos de 1980. Passados vinte anos do Concílio Vaticano II, discernia-se que era chegado o momento da Igreja de Tubarão alinhar-se às perspectivas do grande Concílio. Isso porque, até então, as suas propostas e definições pastorais para a Igreja haviam chegado muito pouco à Diocese de Tubarão.

Mesmo com a reforma litúrgica e a catequese renovada, e embora já houvesse uma estrutura organizativa na Diocese de Tubarão, como o Secretariado Diocesano de Pastoral, a elaboração de planos de pastoral de conjunto, uma coordenação diocesana colegiada e também muitos setores de pastoral, a atividade eclesial ainda era desenvolvida numa perspectiva ad intra, a pastoral continuava centralizada nos padres e nas paróquias, em torno da sacramentalização e da Igreja-matriz, com a “pastoral de conservação”. Os movimentos eclesiais cresciam e multiplicavam-se, e mesmo tendo vida própria e participando pouco dos espaços de comunhão da Diocese, tinham a bênção do poder central da Igreja. Há que se considerar que houve um esforço na superação dessas práticas pré-conciliares, mas os resultados eram pequenos e estavam longe de caminhar numa perspectiva mais libertadora, voltada para a opção preferencial pelos pobres e com atuação no meio popular.

Da parte dos leigos e leigas, era nítido o desejo de pertencer a uma Igreja “Povo de Deus”, toda ministerial, servidora e comprometida com a vida e com os pobres, em diálogo com o mundo e, consciente de sua dimensão histórica. Contudo, estes ainda não se compreendiam como sujeitos eclesiais.

As Comunidades Eclesiais de Base – CEBs se apresentavam como uma promessa de renovação eclesial: fomentava-se Grupos de Reflexão em torno na Palavra de Deus, como sementeiras a fazer surgir novas lideranças, organização de projetos e lutas em defesa da vida, e futuras Comunidades Eclesiais de Base. Essa imagem de uma Igreja que emerge das bases, de baixo para cima, das periferias, era o horizonte desejado pelo Sínodo de Planejamento Participativo da Diocese de Tubarão.

 

A tomada de decisão 

A proposta de um Sínodo na Diocese foi gestada aos poucos no Conselho Diocesano de Pastoral, amparada pelas comarcas (regiões pastorais), paróquias, comunidades e pastorais, através de consultas, sendo assumida concretamente por todos numa Assembleia Diocesana de Pastoral (cf.: ASDT, 1985, v. 1, f.70).

 

O lema e os objetivos do Sínodo

A consulta feita às bases resultou num acúmulo de 50 sugestões vindas de toda a Diocese que apontavam para um lema: “Igreja, Povo a caminho da libertação” (ASDT, 1985, v. 2, f.14). Como dissemos, havia a preocupação em transformar a realidade social/eclesial à luz do Concílio Vaticano II.

Para fazer isso implicava olhar, profunda e atentamente, a realidade, suscitar pessoas, nos mais diferentes ambientes e situações, que assumissem um compromisso, ou seja, multiplicar lideranças. Para isso, foram assumidos os seguintes objetivos para o Sínodo:

  • 1º Elaborar um plano de pastoral;
  • 2º Tentar adaptar a Igreja aos novos tempos;
  • 3º Dar mais voz e vez aos leigos/as na Igreja;
  • 4º Conhecer a realidade global;
  • 5º Fazer um planejamento participativo e orgânico;
  • 6º Fazer do planejar um evangelizar. (DF, 75, 1983, p.2-7).

O número de participantes no Sínodo teve um tom de legitimidade: “será uma convocação de todas as pessoas, grupos e comunidades das cinquenta e três (53) paróquias que compõem a Diocese” (ASDT, 1985, v. 1, f. 7).

 

O que o Sínodo fortaleceu

Durante seu processo, a formação para a sinodalidade fervilhava por todos os lugares. Era comum ver leigos/as participando de formações lideradas pelos padres, e também os padres participando de formações lideradas pelos leigos/as.

O processo de planejamento participativo, com a metodologia assumida no Sínodo da Diocese de Tubarão, apontava os novos caminhos para a Igreja diocesana, firmando a eclesiologia do “Povo de Deus”.

Essa prática fortaleceu as instâncias de comunhão, participação e missão que estavam no bojo de todo o processo sinodal, tais como:

  • os Conselhos de Pastoral, em todas as instâncias, com a descentralização do poder nas tomadas de decisões e encaminhamentos;
  • as Assembleias em todas as instâncias, como órgãos máximos de tomada de decisão;
  • Conselho de Leigos/as;
  • Associação dos Presbíteros;
  • Escola de Teologia para Leigos e Leigas;
  • os Cursos de Capacitação;
  • bem como, outras forças vivas.

O Sínodo constituiu-se num processo vivo e criativo de renovação. Por meio dele algumas conquistas foram reafirmadas e passos concretos foram dados. A busca por respostas novas foi marcada por momentos de tensões, de incertezas e de conflitos, o que exigiu uma conversão pessoal e pastoral. E sempre exigirá.

Entre a implementação do processo do Sínodo, a organização, a realização e o pós-sínodo, enquanto momento próprio para a sua recepção na vida e no dinamismo concreto da Igreja, há uma caminhada de muitos passos. Exige espaço e tempo de reflexão, aprofundamento, abertura e paciência histórica, conflitos e discernimento de novos desafios que se apresentam. Não podemos esquecer que a Igreja é Povo de Deus que caminha rumo a libertação. E da caminhada da Igreja, como nos ensina o Concílio, se exige dupla fidelidade: primeiro, ao Evangelho e a Tradição da Igreja, segundo, ao tempo de hoje.

Talvez esteja na hora da Diocese de Tubarão realizar um novo sínodo!

Bibliografia:

  1. Compêndio dos Documentos do Sínodo de Planejamento Participativo 1984-1986;
  2. Anotações da Tese de Doutorado de Pe. Pedro Paulo das Neves;

(Os grifos são nossos.)

Neuza Mafra é pedagoga, com pós-graduação em Doutrina Social da Igreja. Trabalha na Cáritas, faz parte da Ampliada das Comunidades Eclesiais de Base – CEBs e é colunista do Portal das CEBs.
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Igreja em saída para as periferias. Caminhar juntos na missão https://observatoriodaevangelizacao.com/igreja-em-saida-para-as-periferias-caminhar-juntos-na-missao-2/ Thu, 25 Apr 2024 14:18:18 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.com/?p=49783 [Leia mais...]]]>
IGREJA EM SAÍDA PARA AS PERIFERIAS. CAMINHAR JUNTOS NA MISSÃO
Por Francisco Aquino Júnior
A Primeira Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe (novembro de 2021), proposta pelo papa Francisco em resposta à solicitação de uma nova Conferência do Episcopado Latino-americano, reuniu as várias expressões e os vários organismos do Povo de Deus. Ela aconteceu no contexto do processo de escuta sinodal em preparação ao próximo sínodo dos bispos em outubro de 2023 (Por uma Igreja Sinodal: comunhão, participação, missão) e no espírito da última conferência do episcopado latino-americano em Aparecida em maio de 2007 (Discípulos e missionários de Jesus Cristo, para que nele nossos povos tenham vida). Essa dupla referência dá o tom e a perspectiva dessa Primeira Assembleia Eclesial: sinodalidade e missão. E aparece claramente no tema da assembleia: Todos somos discípulos missionários em saída. São aspectos inseparáveis que se remetem e se implicam mutuamente: a missão é de todos e deve ser assumida por todos (“caminhar justos” do povo de Deus) e a sinodalidade se dá na e em função da missão (“caminhar juntos” na missão). Nunca é demais insistir na natureza sinodal da missão (povo de Deus) e na natureza missionária da sinodalidade (missão).
Mas aqui queremos insistir nesse segundo aspecto: a natureza missionária da sinodalidade. Pode parecer algo simples e evidente, mas na prática é muito mais complexo e problemático do que possa parecer. Primeiro, porque a insistência na participação de todos na Igreja pode acabar relativizando e/ou deixando em segundo plano o “onde” e o “em que” consiste e se dá essa participação e terminar em disputa de poder que não deixa de ser mais uma expressão de clericalismo (disputa de chefia/mando). Segundo, porque a missão pode e comumente costuma ser entendida/realizada de maneira autocentrada ou autorreferencial, relativizando ou mesmo negando seu caráter de “sacramento” de salvação ou do reinado de Deus no mundo e de “serviço” aos pobres e marginalizados desse mundo (crescimento e dinamismo interno da Igreja). Basta ver em que consiste (na prática, não nos textos e documentos) os movimentos de animação missionária em nossas comunidades, paróquias e dioceses…
Não basta dizer que a Igreja é missionária. É preciso compreender bem em que consiste esta missão que não é outra senão a missão de Jesus, tal como está narrada/testemunhada nos Evangelhos: anunciar e tornar presente o reinado de Deus no mundo. Na prática, isso significa/implica socorrer os caídos, curar as feridas, consolar os aflitos e desesperados, acolher os marginalizados/excluídos e fazer comunhão de mesa com eles, afrontar costumes e leis que agridam a dignidade humana, denunciar os poderosos e opressores, viver e desencadear processos de fraternidade (amor, perdão, compaixão, serviço etc.), exercitar o poder como serviço. Numa palavra: viver na lógica do reinado de Deus: filiação divina que se concretiza no amor e na fraternidade entre todos, até com os inimigos. Toda atividade eclesial (catequese, liturgia, encontros de formação, Santas Missões Populares, visitas missionárias etc.) deve ser pensada e realizada em vista da missão fundamental da Igreja que é anunciar e tornar presente no mundo o reinado de Deus que é um reinado de fraternidade, de justiça e de paz.
Francisco não se cansa de insistir na necessidade e urgência de uma “transformação missionária da Igreja” (EG, cap. I), entendida como “saída para as periferias” geográficas, sociais e existenciais (EG, 20, 30, 46, 191). Frente a tendências autorreferenciais da Igreja, insiste sem cessar na necessidade e urgência de “saída para as periferias”. Contra todo comodismo, é preciso sair (Igreja em saída). Mas não se trata de uma saída qualquer para qualquer lugar e/ou qualquer coisa, mas de uma saída em direção à humanidade sofredora para viver a fraternidade, curar suas feridas, socorrer suas necessidades, participar de suas lutas por direitos etc. (saída para as periferias).
E essa perspectiva missionária constitui o coração da Primeira Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe. Isso aparece claramente no tema da assembleia: Todos somos discípulos missionários em saída. E é melhor explicitado nos desafios pastorais identificados e assumidos pela assembleia. É verdade que a ordem/sequência de apresentação dos desafios (não se sabe bem o critério usado aqui) pode relativizar a até perder de vista esse horizonte da missão cristã, pondo mais ênfase na vida interna da Igreja (participação eclesial, protagonismo dos leigos) que em sua missão no mundo (saída para as periferias). É a tentação permanente à autorreferencialidade e ao clericalismo… Em todo caso, alguns dos desafios identificados e assumidos pela assembleia indicam a perspectiva e o caminho fundamentais da Igreja nesse mundo e, concretamente, em nosso tempo:
“acompanhar as vítimas das injustiças sociais e eclesiais com processos de reconhecimento e reparação”;
“promover e defender a dignidade da vida e da pessoa humana desde sua concepção até sua morte natural”; “escutar o clamor dos pobres, excluídos e descartados”;
“reafirmar e dar prioridade a uma ecologia integral em nossas comunidades, a partir dos quatro sonhos da [Exortação Apostólica] Querida Amazônia”;
“acompanhar os povos originários e afrodescendentes na defesa da vida, da terra e das culturas”.
Certamente, esses não são os únicos desafios de nosso mundo. E certamente não basta identificar os desafios: Eles precisam ser concretizados e enfrentados em cada território e/ou contexto. Precisam ser transformados em projetos pastorais. Precisam ser assumidos como missão fundamental de toda a Igreja. Mas os desafios identificados e assumidos indicam onde deve estar o coração da Igreja de Jesus e para onde ela deve caminhar, se quiser ser fiel a Jesus e seu Evangelho do reinado de Deus que consiste na manifestação do amor de Deus pela humanidade sofredora, por mais que isso seja escandaloso para os “sacerdotes e escribas”, o “filho mais velho” ou os “operários da primeira hora” que somos todos nós. Os pobres e marginalizados desse mundo são, n’Ele, juízes e senhores de nossas vidas, igrejas e teologias (Mt 25, 31-46).
Francisco Junior Aquino é presbítero da Diocese de Limoeiro do Norte – CE, membro do grupo Emaús, assessor das CEBs e das Pastorais Sociais, ele é professor de teologia da Faculdade Católica de Fortaleza (FCF) e da Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP).
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Processos educativos para a sinodalidade https://observatoriodaevangelizacao.com/processos-educativos-para-a-sinodalidade/ Thu, 25 Apr 2024 11:03:50 +0000 https://atomic-temporary-74025290.wpcomstaging.com/?p=46561 [Leia mais...]]]> Neste texto, a teóloga Alzirinha Souza nos mostra a relação estreita fecunda e pedagogicamente decisiva entre sinodalidade e comunidade. Isso porque sinodalidade é “a construção comum de uma nova forma de caminhar juntos, de modo que todos tenham voz, vez e lugar na comunidade eclesial, onde as diferenças sejam superadas em favor da comum-união que se estabelece em torno da pessoa de Jesus” e a comunidade é “a base dos processos de formação. É ela que dá à humanidade e à Igreja a possibilidade de existirem concretamente na história… a personificação da realidade histórica, da humanidade nova (homens novos) na expressão paulina, em que se reflete, a partir do Evangelho, valores humanos que constroem e formam os que ali convivem”.

Alzirinha enfatiza que “é em comunidade que se revela a verdadeira superação das relações de dominação” e “a real comunidade existe no ágape, no compromisso vivido por seus membros. Ele (o ágape) é o bem superior e permanece para sempre, cria koinonia, cria vida comum que leva à participação de todos aos mesmos bens (1Cor 13)”. E ao constatar que “muitas vezes que não reaprendemos a dialogar como sujeitos eclesiais até os dias de hoje”, afirma que “é urgente desenvolver processos de educação para o diálogo — logo, para a sinodalidade — que rompam com lógicas não pertencentes ao sentido evangélico de comunidade”.

Este é um texto da iniciativa do Serviço Teológico Pastoral, que publica em diversas mídias católicas textos opinativos que contribuam para a reflexão e a formação na caminhada de conversão sinodal da Igreja Católica impulsionada pelo papa Francisco.

Desejamos a todos e todas uma boa leitura!

Processos educativos para a sinodalidade

Em tempos de distanciamentos, secularismos, individualismos e dinâmicas de poder que já entraram em nossas comunidades eclesiais, a sinodalidade — enquanto nova forma de convivência proposta a partir do Evangelho — torna-se “o” caminho por excelência para cristãos e cristãs desejosos de constituir uma Igreja que quer ser sinal do Reino de Deus nesse processo histórico.

Por isso, não se trata apenas de “caminhar juntos”. Isso é o que vimos tentando fazer desde o princípio da Igreja. Sinodalidade é, antes, a construção comum de uma nova forma de caminhar juntos, de modo que todos tenham voz, vez e lugar na comunidade eclesial, onde as diferenças sejam superadas em favor da comum-união que se estabelece em torno da pessoa de Jesus (EG, 228).

Tal processo de retomada exige que voltemos a nos compreender como comunidade. Elemento central para o cristianismo e, em especial, para a teologia paulina (que a toma como modelo concreto de caminho de transformação humana), a reflexão sobre a comunidade deve ser a base dos processos de formação. É ela que dá à humanidade e à Igreja a possibilidade de existirem concretamente na história. Desde o Novo Testamento, elas são em si mesmas a personificação da realidade histórica, da humanidade nova (homens novos) na expressão paulina, em que se refletem, a partir do Evangelho, valores humanos que constroem e formam os que ali convivem. Por isso, desde o cristianismo primitivo, “homens novos” constituem uma realidade social, concreta, visível e palpável que vai sendo afirmada através da expressão revestir-se do homem novo (Ef 4,22-24).

Revestir-se significa entrar na comunidade cristã e adotar seu modo de viver. Dessa forma, a comunidade cristã reafirma o que é a mensagem fundamental do Novo Testamento: o homem novo não é um indivíduo nem é uma humanidade total concebida como grande corpo, em que os indivíduos seriam uma grande engrenagem. A comunidade é mais: “representa o homem novo, frente a todos os individualismos e todos os totalitarismos sociais, eclesiásticos, civis ou militares” (Comblin, 1987, p. 23)[2].. É em comunidade que se revela a verdadeira superação das relações de dominação. Elas são constituídas pela liberdade. Todos tomam a iniciativa e ninguém está obrigado a fazer a vontade do outro — o que não quer dizer uma anarquia, mas, sim, que cada um faz voluntariamente o que é bom para a comunidade. A liberdade sem serviço mútuo leva ao individualismo, e o serviço sem liberdade leva ao totalitarismo (Gal 5,13) (Comblin, 1987, p. 114)[3]. Ser livre é ser com os outros, entrar nas relações novas movidas pelo amor. Nesse sentido, não existe liberdade do homem só. O conteúdo concreto da liberdade é a relação mútua entre homens e mulheres a partir da chave do serviço mútuo (Comblin, 1974, p. 91)[4].

Essas relações são baseadas pelo ágape, que, ao contrário do amor como disposição subjetiva individual, é a alma da comunidade, pois permite estabelecer uma relação de compromisso mútuo entre pessoas, em que todos participam do bem comum. Logo, a real comunidade existe no ágape, no compromisso vivido por seus membros. Ele (o ágape) é o bem superior e permanece para sempre, cria koinonia, cria vida comum que leva à participação de todos nos mesmos bens (1Cor 13). Por isso, o papa Francisco nos pede que promovamos uma comunhão dinâmica, aberta e missionária, que estimule os organismos de participação e outras formas de diálogo pastoral com o desejo de ouvir a todos, e não apenas alguns (EG, 31).

Ora, esse processo não é dado por si mesmo. É necessário formar as pessoas para essa dinâmica, conscientizá-las da possibilidade de novas formas de ser Igreja. Estabelecer uma nova dinâmica que nasce do diálogo para nós, não é fácil. Como apresentado anteriormente, à luz do pensamento de Joseph Moingt[5], recordamos as bases históricas da formação eclesial que limitaram o aprendizado para o diálogo. E, apesar de o Concílio Ecumênico Vaticano II ter afirmado que a vida de todo cristão é sacerdotal na medida em que ele se entrega ao poder do amor (encarnado na autodoação salvífica de Jesus Cristo ao nos olharmos hoje), constatamos muitas vezes que não reaprendemos a dialogar como sujeitos eclesiais até os dias de hoje.

Por isso, é urgente desenvolver processos de educação para o diálogo — logo, para a sinodalidade — que rompam com lógicas não pertencentes ao sentido evangélico de comunidade. É preciso que esses processos incluam todos(as) em seu sentido mais lato, ou seja, tanto aqueles(as) que pretendem formar para a sinodalidade (mas que, eventualmente, não percebem que em muitas práticas não o fazem) como os que se formam para uma mudança de atitude, estabelecendo uma dinâmica global na Igreja.

Não é nossa intenção aqui propor métodos ou práticas formativas. Antes, queremos exortar a que eles sejam desenvolvidos, considerando cada contexto concreto, e implementados a partir da chave de ressignificação da comunidade em todos os espaços de nossa comunidade eclesial, desde as comunidades e paróquias até os seminários e casas de formação. A riqueza da Igreja consiste numa diversidade ampla, constituída por cada pessoa que pode contribuir para o estabelecimento de uma nova dinâmica. Isso é apreendido, exercitado e construído à medida que nos colocamos na dinâmica do Espírito que nos impulsiona às transformações de nós mesmos e de nossas realidades.

 

Referências:

Comblin, José. Antropología Cristiana. Madrid: Ediciones Paulinas, 1987

Comblin, José. Liberté et libération, concepts théologiques. Revue Concilium, n. 96, p. 85-95 (p. 91), jun. 1974.

Souza, Alzirinha. Fazer a Igreja Católica se mover: a pertinência do Evangelho no mundo contemporâneo. Paralellus, Recife, v. 9, n. 22, p. 667-697 (p. 673), set./dez. 2018.

Notas:

[2] Comblin, J. Antropología Cristiana. Madri: Ediciones Paulinas, 1987. p. 23. (Colección Teología y Liberación).

[3] Comblin, J. Antropología Cristiana. Madri: Ediciones Paulinas, 1987. p. 114. (Colección Teología y Liberación).

[4] Comblin, J. Liberté et libération, concepts théologiques. Revue Concilium, n. 96, p. 85-95 (p. 91), jun. 1974.

[5] Souza, Alzirinha. Fazer a Igreja Católica se mover: a pertinência do Evangelho no mundo contemporâneo. Paralellus, Recife, v. 9, n. 22, p. 667-697 (p. 673), set./dez. 2018.

Profª Drª Alzirinha Souza é leiga, doutora em Teologia pela Université catholique de Louvain, na Bélgica, mestre em Teologia pela Universidad San Dámaso (Madri, Espanha), e bacharel em Teologia pela PUC-SP. Membro da Sociedade Internacional de Teologia Prática (SITP); fundadora e colaboradora do Centro de Pesquisa de Documentação José Comblin – Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP). Atualmente, é professora do Mestrado Profissional em Teologia Prática da PUC Minas.

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Sinodalidade e missão: na Igreja sinodal, onde estão e qual o lugar das jovens e dos jovens? https://observatoriodaevangelizacao.com/sinodalidade-e-missao-na-igreja-sinodal-onde-estao-e-qual-o-lugar-das-jovens-e-dos-jovens-2/ Tue, 23 Apr 2024 18:22:51 +0000 https://observatoriodaevangelizacao.com/?p=49797 [Leia mais...]]]> Neste texto de dom Luiz Fernando Lisboa, “Sinodalidade e missão: na Igreja sinodal, onde estão e qual o lugar das jovens e dos jovens?”, no qual recorda a primeira prioridade da Assembleia Eclesial da América Latiana e Caribe – “Reconhecer e valorizar o protagonismo dos jovens na comunidade eclesial e na sociedade como agentes de transformação” -, lança como desafio: “temos longo caminho a percorrer. As comunidades cristãs devem ´criar´ estes espaços para os adolescentes e jovens. Os adolescentes e jovens, quando perceberem que não têm este espaço, devem ´conquistar´, ´exigir´ até que consigam. Quando é conquistado, tem ainda mais valor“.

Este um texto da iniciativa do Serviço Teológico-Pastoral, de publicar quinzenalmente textos opinativos que contribuam para a reflexão e a formação na caminhada de conversão sinodal da Igreja Católica impulsionada pelo papa Francisco.

Como afirma dom Luiz Fernando, “Para que este caminho da Sinodalidade seja realmente autêntico, é fundamental a participação e a contribuição dos Jovens na missão da Igreja, especialmente trazendo o que eles têm de melhor: a provocação, a inquietação e a alegria“.

Desejamos a todos e todas uma boa leitura!

 

Sinodalidade e missão: na Igreja sinodal, onde estão e qual o lugar das jovens e dos jovens?

Por Dom Luiz Fernando Lisboa, cp

Bispo de Cachoeiro de Itapemirim, ES

A Assembleia Eclesial da América Latina e Caribe e o Sínodo sobre a Sinodalidade tiveram início na mesma época: Outubro e Novembro de 2021. Os dois acontecimentos são processos abertos, iniciados, mas sem data de conclusão. São um verdadeiro desafio para colocar a Igreja Povo de Deus, em sinodalidade, a caminho, em missão.

O papa Francisco pediu que a Assembleia Eclesial retomasse Aparecida e assim o fizemos. Na verdade, muitas reflexões da Conferência de Aparecida já tinham sido feitas nas Conferências passadas, sobretudo nas de Medellin e Puebla: a opção preferencial pelos pobres, a opção preferencial pelos jovens, as comunidades eclesiais de base, a centralidade da Palavra, a participação das mulheres, as culturas e a interculturalidade, a missão, entre outras.

A Assembleia Eclesial, com o Documento de Aparecida nas mãos, a partir testemunhos, de reflexões teológico-bíblico-pastorais e dos trabalhos em grupos, alertou nossa Igreja latino-americana para 41 desafios pastorais e, juntos, chegamos à escolha de 12 prioridades, sem deixar de lado os desafios. Entre as prioridades, chamou a atenção que a primeira delas tenha sido: “Reconhecer e valorizar o protagonismo dos jovens na comunidade eclesial e na sociedade como agentes de transformação”.

Registro de jovens protagonistas na Igreja Católica no projeto Economia de Francisco e Clara.
  1. O que já se disse sobre a Juventude na Igreja após o Vaticano II?

A Conferência de Medellín (1968) afirmou que

frequentemente os jovens identificam a Igreja com os bispos e os sacerdotes. Por não terem sido chamados a uma plena participação na comunidade eclesial, não se consideram como integrantes da Igreja. A linguagem comum da transmissão da palavra (pregação, documentos pastorais etc.), são-lhes muitas vezes estranhos e por isso não têm influência em suas vidas. Esperam dos pastores que não somente divulguem princípios doutrinais, mas que os provem com atitudes e realizações concretas. Dá-se o caso de jovens que condicionam a aceitação dos pastores à coerência de suas atitudes com a dimensão social do Evangelho: («…o mundo, disse Paulo VI, nos observa hoje de modo particular com relação à pobreza e à simplicidade de vida…»). (Med 5. Juventudes 1.1.5).

Na Conferência de Puebla (1979) a Igreja fez a “opção preferencial pelos jovens” e afirmou que “confia neles e que eles são a sua esperança” (DP 1186), além de que

os jovens devem sentir que são Igreja, experimentando-a como lugar de comunhão e participação. Por isso, a Igreja aceita suas críticas, por reconhecer-se limitada em seus membros, e os quer gradualmente responsáveis na sua construção até que os envie como testemunhas e missionários, especialmente à grande massa juvenil. Nela, os jovens sentem-se povo novo, o povo das bem-aventuranças, sem outra segurança que a de Cristo; um povo dotado de coração de pobre, contemplativo, em atitude de escutar e discernir evangelicamente, construtor de paz, portador de alegria e de um projeto libertador integral em favor, sobretudo, de seus irmãos jovens. (DP 1184).

            Para Puebla, é preciso investir fortemente na Pastoral Juvenil pois

a juventude não se pode considerar em abstrato, nem é um grupo isolado no corpo social. Por isso, ela requer pastoral articulada que permita comunicação efetiva entre os diversos períodos da juventude e continuidade de formação e compromisso depois, na idade adulta. (DP 1204).

 Santo Domingo (1992) dá continuidade ao apoio e àquele espaço que os jovens devem ocupar nas suas comunidades e ressalta que

na Igreja da América Latina, os jovens católicos organizados em grupos, pedem aos pastores acompanhamento espiritual e apoio em suas atividades, mas necessitam sobretudo em cada país de linhas pastorais claras que contribuam para uma pastoral juvenil orgânica” (SD 113).

Os bispos em Santo Domingo chegam a prometer:

Nós nos propomos executar as seguintes ações pastorais: – Reafirmar a “opção preferencial” pelos jovens proclamada em Puebla, não só de modo afetivo mas também efetivamente; isto deve significar uma opção concreta por uma pastoral juvenil orgânica, onde haja um acompanhamento e apoio real com diálogo mútuo entre jovens, pastores e comunidades. A efetiva opção pelos jovens exige maiores recursos pessoais e materiais por parte das paróquias e das dioceses. Esta pastoral juvenil deve ter sempre uma dimensão vocacional. (SD 114).

Em Aparecida (2007), a Igreja é chamada a estimular a pastoral dos adolescentes, com suas próprias características pois o adolescente procura uma experiência de amizade com Jesus (DAp 442) e, além disso, os jovens e adolescentes constituem a grande maioria da América Latina e do Caribe e representam enorme potencial para o presente e o futuro da Igreja e de nossos povos, como discípulos missionários (DAp 443).

Aparecida ainda acentua a importância da Pastoral da Juventude pois ela “ajudará os jovens a se formar de maneira gradual, para a ação social e política e a mudança de estruturas, conforme a Doutrina Social da Igreja, fazendo própria a opção preferencial e evangélica pelos pobres e necessitados” (DAp 446e).

Na Exortação Apostólica Christus Vivit, elaborada depois e como fruto do Sínodo sobre a Juventude (2019), o papa Francisco pergunta:

«Para onde Jesus nos manda? Não há fronteiras, não há limites: envia-nos a todas as pessoas. O Evangelho é para todos, e não apenas para alguns. Não é apenas para aqueles que parecem a nossos olhos mais próximos, mais abertos, mais acolhedores. É para todas as pessoas. Não tenhais medo de ir e levar Cristo a todos os ambientes, até às periferias existenciais, incluindo quem parece mais distante, mais indiferente. O Senhor procura a todos, quer que todos sintam o calor da sua misericórdia e do seu amor». E convida-nos a levar, sem medo, o anúncio missionário aos locais onde nos encontrarmos e às pessoas com quem convivermos: no bairro, no estudo, no desporto, nas saídas com os amigos, no voluntariado ou no emprego, é sempre bom e oportuno partilhar a alegria do Evangelho. É assim que o Senhor Se vai aproximando de todos; e pensou em vós, jovens, como seus instrumentos para irradiar luz e esperança, porque quer contar com a vossa coragem, frescor e entusiasmo” (CV 177).

 

  1. Qual o espaço que a juventude tem ocupado na Igreja, hoje? Outras interrogações pertinentes

Quando levamos em conta todos os documentos da Igreja que estimulam e valorizam a participação da juventude, todas as últimas JMJs, a recente priorização da Juventude pela Assembleia Eclesial e tantos outros bons propósitos, nos perguntamos: Eles ajudaram ou fizeram realmente a juventude ocupar o seu espaço dentro da Igreja e na sociedade? Sim e Não!

Há comunidades, paróquias, dioceses nas quais a juventude é protagonista e tem grande envolvimento na participação e nas tomadas de decisão. Elas – comunidades, paróquias, dioceses – entenderam o ensinamento de Puebla que afirma que os jovens devem sentir que são Igreja, experimentando-a como lugar de comunhão e participação. E ainda, que, aceitam suas críticas e os quer gradualmente responsáveis na sua construção e os enviam como testemunhas e missionários, especialmente à grande massa juvenil (DP 1184).

No entanto, há muitas comunidades, paróquias e dioceses parecidas com realidades da Europa, onde a participação é maioritariamente de adultos e idosos. Em certas realidades, e não são poucas, a juventude ainda está afastada e não tem vontade de participar porque “incomoda muito”, tamanha a falta de sensibilidade, de acolhida e vontade dos adultos de conviver com esta faixa etária. Muitos jovens não veem nenhum “atrativo” na Igreja. Também é verdade que não se preparam suficientemente pessoas para assessorarem a juventude. Esta assessoria faz muita falta e faz toda a diferença.

Algumas perguntas para ajudar na nossa reflexão: Quantos jovens há nos nossos conselhos de pastoral comunitário, paroquial e diocesano? Como cuidamos da formação da juventude? Qual o acompanhamento que se dá aos nossos crismandos e crismados? Por que a maioria abandona a Igreja? Qual a relação e o trabalho conjunto entre a PJ e a Catequese Crismal? Qual a importância que damos ao acompanhamento dos adolescentes em geral? Em que medida envolvemos a juventude em nossas ações missionárias? Qual o conhecimento que oferecemos sobre a Doutrina Social da Igreja, já que eles são tão sensíveis a esta temática? Quais os espaços são oferecidos ou conquistados pela juventude na Igreja? Como são acolhidos, acompanhados e orientados os Movimentos juvenis? Qual a ligação dos Movimentos juvenis com a Pastoral da Juventude e com a Pastoral de Conjunto? O que nos falta fazer para esta integração?

Ainda: Como é a formação nos nossos Seminários? Por que muitos padres jovens não querem trabalhar com a juventude? Por que há tão poucos padres, religiosas, religiosos, leigos e leigas especializando-se em pastoral juvenil? Por que os bispos não enviam de cada Diocese ao menos três ou quatro pessoas para se especializarem em Pastoral juvenil? Onde estão no Brasil e na América Latina os Centros especializados em Pastoral juvenil?

 

  1. A Igreja não será sinodal sem os jovens e as jovens

A Igreja sempre foi conduzida por um adulto, aliás, na maior parte do tempo e nos últimos séculos, por um idoso. Isto, porém, não tira a importância do quanto ela foi ajudada a mudar e avançar a partir da visão e audácia de muitos jovens e muitas jovens que a desafiaram: Paulo de Tarso, Francisco e Clara de Assis, Terezinha do Menino Jesus, Joana D’arc, Agostinho, Rosa de Lima, Carlos Lwanga, entre tantos outros e outras.

A Assembleia Eclesial aponta esta prioridade da Juventude justamente porque temos longo caminho a percorrer. As comunidades cristãs devem “criar” estes espaços para os adolescentes e jovens. Os adolescentes e jovens, quando perceberem que não têm este espaço, devem “conquistar”, “exigir” até que consigam. Quando é conquistado, tem ainda mais valor.

Jovens, adolescentes, adultos, crianças, idosos, vulneráveis, descartados, todos e todas fazem parte deste Povo de Deus a caminho.

O papa Francisco enviou aos Jovens uma belíssima mensagem em preparação para a 36ª Jornada Mundial da Juventude, a realizar-se em Lisboa, em 2023, baseado no texto bíblico de Atos dos Apóstolos 26, 16, quando Jesus diz a Paulo: “Levanta-te! Eu te constituo testemunha do que viste!”. Eis o que o Papa propõe aos jovens de hoje:

– Levanta-te e testemunha a tua experiência de cego que encontrou a luz, viu o bem e a beleza de Deus em si mesmo, nos outros e na comunhão da Igreja que vence toda a solidão.

– Levanta-te e testemunha o amor e o respeito que se podem estabelecer nas relações humanas, na vida familiar, no diálogo entre pais e filhos, entre jovens e idosos.

– Levanta-te e defende a justiça social, a verdade e a retidão, os direitos humanos, os perseguidos, os pobres e vulneráveis, aqueles que não têm voz na sociedade, os imigrantes.

– Levanta-te e testemunha o novo olhar que te faz ver a criação com olhos cheios de maravilha, te faz reconhecer a Terra como a nossa casa comum e te dá a coragem de defender a ecologia integral.

– Levanta-te e testemunha que as existências fracassadas podem ser reconstruídas, as pessoas já mortas no espírito podem ressuscitar, as pessoas escravizadas podem voltar a ser livres, os corações oprimidos pela tristeza podem reencontrar a esperança”.

– Levanta-te e testemunha com alegria que Cristo vive! Espalha a sua mensagem de amor e salvação entre os teus coetâneos, na escola, na universidade, no trabalho, no mundo digital, por todo o lado. (Mensagem do papa Francisco em preparação para a 36ª Jornada Mundial da Juventude)

Para que este caminho da Sinodalidade seja realmente autêntico, é fundamental a participação e a contribuição dos Jovens na missão da Igreja, especialmente trazendo o que eles têm de melhor: a provocação, a inquietação e a alegria.

Dom Luiz Fernando Lisboa, bispo de Cachoeiro – ES
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X Assembleia Nacional dos Organismos do Povo de Deus: um caminho de sinodalidade https://observatoriodaevangelizacao.com/x-assembleia-nacional-dos-organismos-do-povo-de-deus-um-caminho-de-sinodalidade/ Wed, 19 Oct 2022 16:49:15 +0000 https://atomic-temporary-74025290.wpcomstaging.com/?p=46247 [Leia mais...]]]>  

Igreja do Brasil reúne representantes da totalidade do Povo de Deus.

Com o tema “Comunhão e Missão: caminho para a Igreja do Brasil”, aconteceu em Brasília-DF, a X Assembleia Nacional dos Organismos do Povo de Deus. Encontro que reúne representantes da totalidade do povo de Deus: cristãos leigos e leigas, membros dos Institutos Seculares, da Vida Religiosa Consagrada, representantes dos diáconos, dos presbíteros e dos bispos. Um encontro que expressa a busca da “sinodalidade” na Igreja do Brasil, desde a sua primeira assembleia, em 1991. Esta aconteceu entre os dias 14 a 16 de outubro e lema que animou o caminho a ser feito foi “Preservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz” (cf. Ef. 4,5).

A caminho de uma Igreja mais sinodal

Dois acontecimentos importantes marcaram o primeiro dia da Assembleia: a celebração dos 70 anos da CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, presidida pelo Núncio Apostólico no Brasil, Dom Giambatistta Diquattro e concelebrada por Dom Jaime e Dom Joel, membros da Diretoria da CNBB. Outro acontecimento importante foi a abertura da X Assembleia dos Organismos do Povo de Deus. Dom Walmor de Oliveira Azevedo, atual Presidente da CNBB, por motivos de saúde, não pode estar presente e enviou uma vídeo mensagem para os participantes. Ele destacou que vivemos tempos de grandes dificuldades, mas também de riquezas e entre elas, uma grande riqueza e representada pelos Organismos do Povo de Deus. Assim, de corações abertos à graça de Deus, no amor fraterno e sororal desejou que seja reforçada a comunhão na Igreja do Brasil.

Cada representante dos vários Organismos teve oportunidade de fazer uso da palavra no momento de abertura da Assembleia. Nas falas sobressaíram os temas da sinodalidade, a colegialidade, da busca de caminhar juntos, o cuidado com a Casa Comum,  a missão da Igreja diante da crise civilizatória que vivemos, a necessidade de discernir os sinais dos tempos. Olhando para a SSma. Trindade, somos todos iguais, precisamos caminhar juntos para dar respostas urgentes aos clamores do povo, nas periferias geográficas e existenciais. Para isso é preciso vencer o clericalismo, em todas as suas formas e dimensões, pois este vem sendo empecilho para a missão da Igreja.

Depois das falas de abertura, Laudelino fez uma memória das Assembleias anteriores por meio de uma contextualização eclesial e social da caminhada dos Organismos do Povo de Deus. Fundamentando-se nos documentos da Igreja lembrou que as raízes desta caminhada encontram-se no Vaticano II, de modo especial na Constituição Dogmática Lumen Gentiun e que, mesmo antes de tratarmos da sinodalidade, já a experimentamos nessa caminhada das Assembleias dos Organismos do povo de Deus. E com boa fundamentação bíblica  expressou, com clareza, a contextualização social e, diante do quadro político atual, cheio de tantas contradições e ameaças, não dá para ficar do lado de quem apoia a morte, a violência, o ódio, a mentira e finalizou citando Charles de Foucauld: pergunte o que Jesus faria neste contexto e faça.

Anseio por uma Conferência Eclesial do Brasil

O segundo dia da Assembleia dos Organismos do Povo de Deus foi dedicado a uma retomada  do processo sinodal na Igreja do Brasil. Dom Joel enfatizou a caminhada feita até o momento, a experiência pessoal de cada um e a síntese nacional enviada a Roma. Das sínteses enviadas à CNBB, ressaltou o desafio da síntese final organizada em três eixos: Valores, Preocupações e Sugestões. Para o trabalho da manhã focou-se nos dois primeiros eixos deixando as sugestões para serem apresentadas na parte da tarde em outro momento de trabalho em grupos. Formaram-se quatro grupos: 1. Ministerialidade; 2. Ação Sócio-Transformadora; 3. Solidariedade aos vulneráveis; 4. Cuidado com a Casa Comum. Na parte da tarde o trabalho das oficinas ocupou-se na busca de sugestões a serem apresentadas para as próximas Diretrizes da Ação Evangelizadora da Igreja do Brasil.

Em dois momentos, um pela parte da manhã e outro pela parte da tarde, ocorreram partilhas de vida, com testemunhos de representantes de cada um dos Organismos do Povo de Deus. Cada testemunho procurava identificar como a sinodalidade está sendo vivida em diferentes regiões. Foi um momento enriquecedor sinalizando o Evangelho transformado em ação diante de realidades desafiantes,  na busca da justiça, da solidariedade e na promoção da vida. Foram destacadas ações e projetos desenvolvidos com a juventude, iniciativas de geração de renda, defesa dos povos originários e da Casa Comum, empoderamento da mulher, acolhida e amparo de crianças em situação de vulnerabilidade,  participação nas lutas populares e na promoção humana, entre outras.

Na parte da tarde, houve a apresentação de uma minuta da “carta compromisso” da Assembleia e uma breve “fila do povo” na qual sobressaiu o anseio de uma maior participação dos organismos na vida eclesial salientando que os eixos sinodais “Comunhão, Participação e Missão”, pois formam um conjunto e devem ser tomados sem uma hierarquização de um sobre os demais. Com isso manifestou-se o anseio da criação de mecanismos que garantam maior participação efetiva de todos. Também retomou-se o anseio pela criação de uma Conferência Eclesial do Brasil, apelo que vem desde a Assembleia do Conselho Nacional do Laicato, celebrada em agosto deste ano. Outro anseio apresentado foi a manutenção da denominação CEBs: “Comunidades Eclesiais de Base”, por sua raiz na história e teologia latino-americanas. Os Intereclesiais expressam o encontro e o trabalho conjunto de comunidades, Igreja viva,  e, desde às suas origens, são expressão viva de sinodalidade no seio da Igreja.

Pistas de ação para a Igreja no Brasil

Nos dois primeiros dias da Assembleia, a dinâmica dos trabalhos voltou-se para um olhar a realidade e para uma iluminação bíblica à luz do lema: “preservar a unidade do Espírito pelo vínculo da paz” (cf. Ef 4,5). O terceiro dia, domingo, foi dedicado a reunir as pistas de ação, fruto das oficinas de trabalho realizadas no sábado, à apresentação da carta da Assembleia e à celebração festiva de encerramento.

Entre as pistas de ação, fruto das oficinas de trabalho, destacam-se: que as Assembleias dos Organismos do povo de Deus sejam realizadas antes das Assembleias da CNBB, afim de poder oferecer eventuais contribuições para as Diretrizes de Ação Evangelizadora ; resgate do uso do termo CEBs, com maior valorização das Comunidades Eclesiais de Base; dar passos para a construção da Assembleia Eclesial do Brasil; propiciar mais espaços de formação sobre a Doutrina Social da Igreja e sobre a Ecologia Integral; fortalecer as pastorais sociais e assumir com maior ênfase a Semana Social Brasileira; dar maior importância às notas oficiais da CNBB em nossas paróquias e comunidades; cultivar a ecologia integral como uma dimensão da nossa espiritualidade, capaz de nos irmanar com a Criação de Deus; assumir, como Igreja, maior cuidado e defesa efetiva dos povos originários e da Amazônia; recuperar a voz profética da Igreja diante das ameaças à vida humana e à nossa Casa Comum; criar a “Semana da Ecologia Integral” a ser realizada na 1ª semana de setembro; realizar uma Assembleia das juventudes a nível diocesano, regional e nacional, com vistas a recuperar a presença dos jovens na Igreja; buscar o resgate da eclesialidade fortalecendo o “grito dos excluídos”, a Campanha da Fraternidade, as CEBs e os sonhos de Francisco no documento Querida Amazônia.

Dom Severino, fazendo uso da “fila do povo” destacou a necessidade de se fortalecer ainda mais a participação dos Organismos do Povo de Deus e reforçou a necessidade de se dar passos para uma Assembleia Eclesial do Brasil por ser mais representativa da totalidade dos batizados. Ela poderá fazer com que as decisões, documentos e diretrizes da Igreja cheguem mais rapidamente às nossas paróquias e comunidades e sejam abraçadas com maior ênfase e colocadas em prática.

Fez-se também o anúncio e pediu-se empenho para o III Ano Vocacional que será aberto no dia 20 de novembro de 2022, na festa de Cristo Rei,  encerrando-se em 26 de novembro do próximo ano. Este Ano Vocacional foi inspirado no Documento Final do Sínodo dos Bispos sobre Os jovens, a fé e o discernimento vocacional”. Ele tem como tema: “Vocação: Graça e Missão” e o lema é Corações ardentes, pés a caminho” (cf. Lc 24, 32-33). 

Depois disto foi apresentada a Carta Mensagem da X Assembleia dos Organismos do povo de Deus.

A Conclusão da Assembleia se deu de forma solene com uma missa celebrada na Catedral de Brasília, contando com a presença dos membros da Assembleia e da comunidade presente. A missa foi presidida por Dom Joel e concelebrada pelos demais bispos e presbíteros presentes.

O secretário-geral da CNBB, ao comentar o Evangelho (Lc 18,1-8) ressaltou: “somos uma Igreja rica em sua diversidade, de muitos dons e carismas, muitas formas de ser. Mas nunca poderemos ser uma Igreja como o homem do Evangelho, que só pensa em si, nos seus interesses, de costas e de olhos fechados para as dores de tantas pessoas. Aquele homem significa tudo o que nós, como Igreja, não podemos ser”.

Que esta X Assembleia dos Organismos do Povo de Deus fecunde a sinodalidade na Igreja do Brasil, que Comunhão, participação e Missão, sejam, verdadeiramente, o caminho para a Igreja envolvendo, efetivamente a totalidade dos batizados e batizadas. Como bem expressa a mensagem final: “Em sintonia com a Igreja no mundo inteiro, atentos aos apelos do Papa Francisco, vivemos a feliz expectativa pelo Sínodo em 2023, dispondo-nos a “caminhar juntos”, na fidelidade ao Evangelho”.

Crédito da Foto: Marcus Tullius

Denilson Mariano – Doutor em teologia, membro do grupo de pesquisa de Teologia Pastoral (FAJE) e da SOTER- Sociedade de Teologia e Ciências da Religião. Redator da Revista O Lutador, Integrante do MOBON – Movimento da Boa Nova. Membro do Observatório de Evangelização – PUC Minas.

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