As mulheres e o futuro da Igreja. Um artigo do teólogo jesuíta Joseph Moingt (1916-2020)

O remédio para o enfraquecimento da Igreja nos tempos atuais parece-me estar em colocar resolutamente em prática as recomendações do Vaticano II, em vez de desconfiar delas e ir contra elas: permitir uma maior liberdade de iniciativa e de experimentação para as Igrejas locais; menos preocupada em fortalecer as estruturas administrativas da instituição do que em fazer viver as comunidades cristãs, por menores que sejam, onde residam; chamar os fiéis a assumirem a responsabilidade pelo seu ser cristão e pela sua vivência na Igreja, não individualmente ou apenas entre si, mas em comum e em harmonia com a autoridade episcopal; confiar mais na liberdade inventiva do que na obediência passiva; levar os leigos, devidamente delegados pelas suas comunidades, aos lugares onde se tomam as decisões pastorais, a todos os níveis e em igualdade de condições com o clero, e não apenas em grupos de simples consulta; e permitir que as mulheres entrem nesses lugares de tomada de decisão em pé de igualdade com os homens […]. O reconhecimento efetivo da emancipação da mulher, tanto na Igreja como no mundo, tornou-se condição de possibilidade para a evangelização do mundo.”

Joseph Moingt, teólogo jesuíta francês

Um traço maior da evolução da civilização ocidental ao alvorecer do século XXI – seguramente o mais significativo desde milênio – concerne à condição feminina, que, depois de ter adquirido seus direitos cívicos e ter se emancipado da tutela parental e marital na segunda metade do século precedente, está em vias de conquistar – posto que o combate está longe de ter terminado – a igualdade de trato profissional com os homens e de se abrir um acesso equitativo aos postos mais altos de responsabilidade em todos os campos, econômico, cultural e político, da vida em sociedade.

Outro traço de evolução, dos mais consideráveis, apareceu no mesmo tempo e espaço cultural, é o declínio da Igreja Católica, cujo número de fiéis dissolveu-se tão rapidamente como o de seus quadros pastorais, e que está em vias de perder o pouco que resta da influência que exercia há 2 mil anos sobre a sociedade e sobre os indivíduos, até o ponto de que seu futuro próximo levanta questões angustiantes.

Existe correlação entre esses dois aspectos da evolução que vivemos e, se é o caso, qual deveria ser a condição da mulher na Igreja para evitar esse declínio e devolver a esperança no futuro? Este será o objeto da presente reflexão.

Conflito no campo dos costumes

A Igreja orgulha-se de ter sido ela quem ensinou o respeito à mulher ao mundo pagão ou bárbaro, de tê-la defendido e sustentado sempre e de professar a eminente dignidade da mulher, chamada à própria santidade como o homem, prova é o fato de que ela elevou muitas mulheres às honras dos altares e inclusive declarou muitas como doutoras da Igreja universal, com o mesmo título que bispos e teólogos de renome.

Esta dignidade está ligada, segundo seu ponto de vista, a aquilo que define a condição da mulher no estado conjugal. Segundo a lei do Criador: a castidade, que exclui as relações sexuais antes e fora do matrimônio, e a maternidade, que destina a mulher à procriação, à educação dos filhos, ao sustento do seu marido, à união das famílias e ao bom cuidado da casa.

A Igreja utiliza Maria como modelo, mãe de Jesus, e conciliou nela, em grau sobre-eminente, a castidade e a maternidade, e cujo destino ilustrou a dignidade na qual o cristianismo considera a condição feminina.

Agora, esta condição é a mesma que davam à mulher os costumes das sociedades patriarcais e tradicionais, nas quais o povo da Bíblia meditou e reescreveu a lei do Criador e onde a Igreja nasceu, depois desenvolveu, sem tratar de transformá-la, salvo que ela própria sempre se dispôs – e é justo reconhecer – a defender as mulheres contra os maus tratos que as ameaçavam, a proteger as famílias, a favorecer a instrução das jovens e inclusive, mais recentemente, a sua entrada na vida profissional e cívica.

Isso não impede que essa condição limite estreitamente seus horizontes de vida e suas ambições mais legítimas e as mantenha em uma posição líquida inferior em relação aos homens. Mas a mulher dos tempos modernos acabou se emancipando dessa condição, aproveitando a evolução da cultura, da ciência e da tecnologia, principalmente com a ajuda – ou a custo? – da “libertação sexual” e da prevenção de nascimentos. É neste ponto que a emancipação da mulher encontra a viva resistência da Igreja Católica, que tem multiplicado os apelos à lei natural e divina que liga, segundo ela, o ato sexual à procriação e condena todo tipo de uso de preservativos e anticoncepcionais.

Sentindo-se incompreendidas, desprezadas ou agredidas por ela, muitas mulheres então começaram, e continuam, com mais força a abandonar a Igreja, enquanto a confiança de quem permanece fiel – no momento em que dirige sua vida sexual de acordo com sua própria consciência, foi e continua a ser consideravelmente enfraquecida.

Depois de ter perdido grande parte do mundo operário e depois do mundo intelectual, a Igreja perdeu, no campo dos costumes, grandes áreas do mundo feminino, que havia, no entanto, fornecido a maior parte de suas tropas no último século. Agora, uma vez que ela havia estabelecido a regra de batizar crianças desde o nascimento, o papel das mulheres era despertá-las para a fé e a piedade, depois educá-las na obediência às regras da moralidade e às práticas da religião.

Em vez do sacerdote instruir os catecúmenos adultos, como nos séculos anteriores, foi a mulher que desde então assegurou o crescimento da Igreja na sociedade através do fluxo das gerações. Mas, vejam só, a mulher dos tempos modernos, emancipada das estruturas em que as sociedades tradicionais a aprisionavam, desprende-se da vocação de gerar filhos cristãos que lhe são atribuídos pela tradição da Igreja. Este último, portanto, tende a se opor tanto quanto possível à emancipação da mulher, que vem daí para ver na Igreja o maior obstáculo à sua promoção social: esta hostilidade recíproca compromete seriamente o futuro do catolicismo.

No campo da cidadania

As mulheres não eram e não são somente as mais numerosas entre os fiéis, mas também foram e continuam a ser, mais do que nunca, as mais ativas em todas as áreas em que se edifica a Cidade de Deus no seio dos homens. Entre elas estavam muitas religiosas, que ainda existem, mas cada vez menos, devido ao declínio das vocações para o estado religioso, de modo que as leigas são de longe as principais auxiliares do clero.

Elas ocupam cargos de responsabilidade na maioria dos campos da vida da Igreja: catequese e catecumenato, movimentos de ação católica e de espiritualidade, ensino religioso e também teológico, obras missionárias, serviços pastorais de animação litúrgica, preparação para o batismo, ao casamento, ao funeral; em muitos lugares, elas são também, devido ao afastamento e à escassez de padres, o único suporte da vida paroquial. São? Apresso-me a corrigir: elas foram, não são mais “responsáveis” por nada, exceto que tudo continua a cair em grande parte sobre elas.

No impulso inicial do Vaticano II, não houve hesitação em confiar-lhes responsabilidades em todos os níveis: paroquial, diocesano, regional, nacional. Até sei de um caso (sem dúvida houve outros) em que uma mulher (teologicamente qualificada, é verdade) foi devidamente incumbida pelo seu bispo para fazer a homilia e a animação da Eucaristia dominical. Mas desde os anos 80 houve uma desaceleração que, posteriormente, só aumentou. Ó, sempre e cada vez mais se conta com a ajuda das mulheres, como poderia se prescindir delas? Mas permanecendo em seu lugar de servidoras dóceis, bem enquadradas em equipes “pastorais” sob responsabilidade “sacerdotal”.

Em quase todos os lugares e em todos os setores, elas se distanciaram, ainda não das atividades que lhes foram confiadas, mas de sua animação, orientação e direção. Pelo que pude ler e ouvir, o motivo era o desejo de restaurar a “identidade” dos padres, perturbada, pensava-se, pela perda de funções que lhes haviam sido reservadas até então e da consideração que tinham, perda de identidade que também se tentou explicar pela trágica diminuição das vocações ao estado presbiteral.

Em todas as dioceses multiplicaram-se os apelos ao “diaconato permanente” para se reposicionar sob a obediência e especificidade do sacramento da Ordem o mais possível das responsabilidades que havia caído no campo do laicato. Esta motivação contemplava tanto aos homens quanto às mulheres, por mais que estas fossem as primeiras afetadas, dado que eram as mais numerosas no serviço da Igreja.

A vontade da hierarquia, porém, manifesta-se em distanciar as mulheres, elas em particular, de tudo o que afeta o serviço do altar e os sacramentos, a ponto, um tanto ridículo, de proibir a seleção de coroinhas entre as meninas. O motivo, claro se não confessado, era o medo de promover entre elas o desejo pelo sacerdócio. As ordenações de mulheres ao sacerdócio já haviam ocorrido, de fato, muito oficialmente em muitas Igrejas Anglicanas que se gabavam de permanecer fiéis ao ritual romano, e as mulheres católicas também conseguiram se ordenar sacerdotes de maneira descontrolada em vários países. A questão preocupava a opinião pública católica e teólogos sérios consideravam a possibilidade de proceder a tais ordenações. O papa João Paulo II julgou ter encerrado o debate com uma rejeição “definitiva”, seu sucessor acaba de relembrar, prova de que o debate não está efetivamente encerrado.

A maioria das mulheres dedicadas à Igreja está longe de ambicionar o presbitério ou reivindicar o poder; isso não as impede de se sentirem magoadas pela desconfiança de que se sentem objeto, até que a imprensa, intervindo neste debate, frequentemente censura o papado por discriminação entre os sexos contrária aos direitos humanos. Essas mulheres, que ocuparam ou ainda ocupam cargos de responsabilidade na vida cívica e profissional, percebem claramente que a Igreja não está disposta a lhes conceder direitos e poderes equivalentes aos que adquiriram na sociedade. Muitas, desanimadas, partem; muitas outras, que frequentavam a Igreja sem se colocarem a seu serviço, humilhadas pelas proibições e exclusões que se referem ao sexo, abandonam-na e pela recusa em não reconhecer uma “cidadania” de pleno exercício faz com que aumente a hemorragia, com a qual a Igreja corre o risco de morrer.

Afrouxar o espartilho da tradição

Pode surpreender uma atitude “suicida”, que priva a Igreja do único apoio ativo à sua disposição, dissuade as mulheres de se engajarem na educação religiosa das crianças como no passado e arruina sua credibilidade perante uma sociedade “definitivamente” focada na promoção feminina. Diante disso, a Igreja opõe sua tradição imemorial que a proíbe de se acomodar aos costumes e evoluções do mundo contrários à lei de Deus.

Mas há espaço para identificar um e outro? No plano da moralidade, ela relaciona o uso da sexualidade ao casamento legítimo e à procriação em virtude de uma lei natural que tem Deus como seu autor e da qual ela é a guardiã. Mas os antropólogos sabem bem que as regras do casamento são questões de convenções sociais que variam de acordo com a época e o lugar; o que os antigos moralistas consideravam “lei natural” não estava isento de costumes sancionados pela lei civil; e a partir do momento em que se recorre à “natureza”, ela é colocada sob o regime da razão comum.

Certamente, esta está sujeita a modificações e erros, mas a moral da Igreja também não está isenta delas, e muitas vezes teve em conta as mudanças de costumes. Hoje, por exemplo, por mais que diga que casais jovens não casados “vivem em pecado”, ela os acolhe graciosamente para prepará-los para o casamento sacramental ou para batizar seus filhos; cada vez mais vozes autorizadas defendem uma recepção semelhante nas comunidades cristãs para o benefício dos divorciados e recasados.

A Igreja deve aceitar um debate livre sobre as questões éticas que dizem respeito a todas as sociedades e entrar nela mesma, sem assumir o direito exclusivo e absoluto de ensinar. A sua condenação ao uso de preservativos, o único meio unanimemente reconhecido de conter a propagação da AIDS, enfraqueceu fortemente o seu crédito perante os organismos internacionais que se preocupam com este flagelo; os tristes crimes sexuais cometidos por padres e “encobertos” por sua hierarquia deveriam incitá-la a um maior pudor.

Que não queira debater com uma opinião pública hostil a todas as regras morais, é compreensível; mas, ela podia confiar em seus teólogos e nos fiéis também instruídos pelo Espírito Santo, especialmente mulheres, as primeiras interessadas, cuja consciência e experiência merecem ser ouvidas antes que seu destino seja decidido por homens celibatários.

A Igreja teria medo de perder o poder consultando seus fiéis? A alternativa é perdê-los. Ainda é uma questão de poder que a impede de conquistar um lugar em sua liderança para as mulheres que trabalham para ela. Se sua tradição se absteve disso, é pela mesma razão que outras sociedades se deram ao trabalho de abandonar seu espírito patriarcal, feudal ou corporativista. Não se trata apenas da ordenação de mulheres ao sacerdócio. Sem ser totalmente hostil a ela, nunca pressionei neste sentido, não mais do que pela ordenação de homens casados ou pela supressão da lei do celibato sacerdotal, pela única e simples razão de que o poder na Igreja é ligado ao sagrado e porque o interesse da fé não é estender o domínio do sagrado, mas temperar o poder e, para isso, compartilhá-lo fora do sagrado.

Com efeito, no nosso mundo laicizado e secularizado, isto é, democrático, a fé se enfraquecerá se for privada da liberdade a que Cristo chama todos os cristãos, como diz São Paulo – que sem dúvida lembrava que na única vez que Jesus falou sobre o poder foi para proibir seus apóstolos de usá-lo como os poderosos que gostam de impor seu domínio e fazê-lo ver e sentir.

É por isso que o remédio para o enfraquecimento da Igreja nos tempos atuais parece-me estar em colocar resolutamente em prática as recomendações do Vaticano II, em vez de desconfiar delas e ir contra elas: permitir uma maior liberdade de iniciativa e de experimentação para as Igrejas locais; menos preocupada em fortalecer as estruturas administrativas da instituição do que em fazer viver as comunidades cristãs, por menores que sejam, onde residam; chamar os fiéis a assumirem a responsabilidade pelo seu ser cristão e pela sua vivência na Igreja, não individualmente ou apenas entre si, mas em comum e em harmonia com a autoridade episcopal; confiar mais na liberdade inventiva do que na obediência passiva; levar os leigos, devidamente delegados pelas suas comunidades, aos lugares onde se tomam as decisões pastorais, a todos os níveis e em igualdade de condições com o clero, e não apenas em grupos de simples consulta; e permitir que as mulheres entrem nesses lugares de tomada de decisão em pé de igualdade com os homens.

Por que em igualdade? Para não erguer a Igreja como símbolo de uma contracultura. Portanto, para se abrir ao espírito do mundo, apesar de São Paulo que exorta os cristãos a “não se contentar com o tempo presente”? Não, mas para abrir o mundo à penetração do espírito evangélico. Não é mais o tempo em que a Igreja instruía os povos bárbaros ou populações iletradas ou analfabetas; ela agora está caminhando para um mundo “maior”, ela não pode mais ensinar de cima de sua cadeira, ela tem que reconhecer seus valores para fazer sua palavra ser ouvida. Portanto, adaptar-se aos “valores” de um mundo secularizado? Não exatamente, porque muitos desses valores são frutos das sementes evangélicas que a Igreja espalhou no mundo ao longo de sua vida comum, é especialmente o caso das ideias de liberdade e igualdade de onde germina a emancipação da condição feminina. Talvez pudessem ter sido desviadas de seu significado original e produzir frutos desnaturados, o que não é um obstáculo para a Igreja não poder redirecioná-las e regenerá-las, exceto reconhecendo sua origem evangélica, e ela não pode fazer isso exceto deixando que essas mesmas ideias produzam seus frutos em seu ventre, dos quais ela os rejeitou. É assim que o reconhecimento efetivo da emancipação da mulher, tanto na Igreja como no mundo, tornou-se condição de possibilidade para a evangelização do mundo. E, sendo a missão evangélica a razão da existência da Igreja, o novo acolhimento que dará às mulheres será o “símbolo” ativo da sua presença evangélica no mundo de hoje, o penhor da sua sobrevivência.

As mulheres já não usam mais o espartilho: a Igreja deve emancipar-se da tradição que a vincula às sociedades patriarcais do passado para se dar, através do espaço que sabe abrir às mulheres, o direito de sobreviver neste novo mundo.

Reler os evangelhos no feminino plural

A Igreja tem o hábito de interpretar suas Escrituras apelando para sua tradição. No rigor teológico, o inverso tem mais legitimidade; e quando a tradição não tem resposta para novos problemas e não admite quem se propõe, o recurso à Escritura é imposto por direito. Foi o que fez João Paulo II quando quis resolver a questão da ordenação das mulheres: observa que Jesus, querendo estabelecer o seu colégio apostólico no final de uma noite de oração, não chamou a mais digna das suas criaturas, a sua mãe, e deduziu daí que as mulheres foram, por esse fato, deliberadamente excluídas do sacerdócio.

Mas Jesus não alimentou nenhum projeto de instalar sua Igreja ao longo do tempo, ele que apenas a contemplou em termos do Reino de Deus, e não deu a seus apóstolos nenhuma instrução de tipo institucional, pois eles, na véspera de sua ascensão, assumiram seu próximo retorno para restaurar o reino de Israel.

O Papa também tinha registrado como Jesus, rompendo a esta altura com o costume de seu tempo e de sua pátria, se cercou voluntariamente de companhia feminina; e este destaque merece ser levado em consideração, mas ao contrário das conclusões negativas que dele se extraiu. Os encontros de Jesus com mulheres não são, de fato, nada brandos, e são para nossa instrução o que eles têm sido relatados. Ele manifesta sua glória pela primeira vez em Caná, a pedido de sua Mãe; em várias ocasiões, eleva mulheres como modelos de fé e realiza curas que atribui à sua fé; da unção recebida de uma mulher na véspera de sua morte, ele faz um memorial de sua paixão que manda transmitir às gerações futuras; credencia as duas irmãs, suas amigas Marta e Maria, como autênticas discípulas, recebendo de uma delas o mais belo testemunho de sua divindade: “Vós sois a Ressurreição e a Vida”, e apresentando a outra como receptáculo perfeito da sua Palavra: “Maria escolheu a melhor parte e não lhe será tirada”; Em suma, é a outra mulher, outra amiga, Maria de Magdala, a quem ele aparece em primeiro lugar ao sair do túmulo e a quem confia a mensagem da sua ressurreição para que comunique a sua Boa Nova aos seus apóstolos.

Destes exemplos, por mais eloquentes que sejam (sem dúvida, outros teriam de ser encontrados), eu teria o cuidado de não tirar um argumento a favor da ordenação de mulheres, visto que Jesus nunca pronunciou a palavra sacerdócio; Mas recebo a clara indicação que ele as creditaria, confiou nelas e confiou o seu Evangelho, como aos seus apóstolos, talvez de outra forma: não as envia a viajar pelo mundo, entretanto, não menos autenticamente, faz delas espaços de descanso da missão que recebera do Pai de prolongar a Vida no mundo.

Ele também convidou sua Igreja a obter recursos das mulheres para continuar seu trabalho. Em suma, nenhum princípio de exclusão pode ser extraído das palavras ou exemplos de Jesus, nada menos que uma exortação insistente para não ter medo de levar o ministério do Evangelho, seja quem for, homem ou mulher, para ter fé suficiente nele para se oferecer a esta tarefa: porque só ele dá a força para realizá-la e a faz frutificar.

São Paulo, não querendo mais conhecer Jesus Cristo “segundo a carne”, ciente de ter renovado a velha humanidade com sua morte e ressurreição, extraiu dele o único princípio fundador do Cristianismo, a exclusão de todo exclusivismo: “Já não há judeu ou grego, nem escravo nem livre, nem homem nem mulher, porque todos sois um só em Cristo Jesus”. Ele não quis dizer que não haja mais diferenças entre cada um do casal, mas que nenhuma dessas diferenças poderia ser, no corpo de Cristo, que é a Igreja, fonte de divisão ou exclusão.

Inclusive, ainda que não tenha podido tirar disso todas as consequências, Paulo enunciava assim o princípio fundador das sociedades abertas, libertadas dos compartimentos das sociedades antigas, que permitiram à mulher dos tempos modernos libertarem-se da opressão do homem e reivindicar a igualdade com ele. A instituição eclesial não tem outra lei orgânica.

Por um pouco de sexo frágil…

Só de pertencer ao “sexo mais frágil”, como o chama uma tradição orgulhosamente “machista”, pode ser motivo de discriminação e eliminação em uma Igreja que tira seu orgulho e força da fraqueza da Cruz? Jesus não encontrou imagens suficientemente humildes, tocantes, para falar do seu Reino: as flores do campo, o grão de mostarda, uma moeda escondida, a ovelha perdida, o dono da casa em atitude de serviço… Ele mesmo não deixou de ter qualidades geralmente atribuídas ao sexo feminino: intuição, sensibilidade, compaixão, a arte de extrair confidências, e também fraqueza: às vezes ela se rendia à mãe, mas evitava julgá-la, explodia de alegria, raiva ou lágrimas, e sabia sofrer, esperar, suportar como poucos homens são capazes.

Introduzir um pouco de feminilidade na Igreja, com a condição de lhe abrir um buraco onde ela possa irradiar, seria devolver-lhe a parte da humanidade demasiado reduzida ou mascarada por um poder exclusivamente masculino e sagrado, isto é, intolerante. Mas, repito, o primeiro problema não é o de empoderar as mulheres. Não vamos embalar imagens idílicas: as mulheres facilmente se sentiriam encantadas em deslizar para o personagem do padre, dando-lhe uma dose de sedução que torna o poder mais perigoso. Trata-se antes de restaurar o solo das comunidades cristãs, de estabelecer nelas a liberdade, a alteridade, a igualdade, a corresponsabilidade, a co-gestão, de deixar penetrar nelas as preocupações do exterior, de tornar as celebrações mais “conviviais”, na imagem dos primeiros jantares eucarísticos em que se repartiu o pão e de vivê-los sob a benevolente presidência de um chefe de família, sem esquecer o princípio paulino de excluir todo aquele que exclui.

Nesse novo ambiente, o compartilhamento do poder apresentar-se-á de uma nova forma. Recorde-se que o “presbitério” dos primeiros séculos, cujo nome foi restaurado à honra, não tinha muito sacerdócio, então o sacerdócio era reservado ao bispo, e seria capaz de reinventá-lo, para desfazer o perigoso vínculo de poder, do sexo masculino e do sagrado. Não se correrá então o risco de enfraquecer o poder monárquico sobre o qual a tradição construiu a organização da instituição eclesiástica? Talvez, mas é preciso ter medo de antemão? Não foi sobre uma mulher e através de sua boca que foi profetizado que: “Ele derrubou os poderosos de seus tronos e exaltou os humildes?”. Não se trata de derrubar nada, mas de elevar o que foi rebaixado injustamente. Mulheres e o futuro da Igreja? A mulher é e será o futuro da Igreja.

(Este artigo foi publicado originalmente em francês pela Revista Études Nº 414, janeiro de 2011, foi publicado em espanhol por Arratia, 07/03/2020. Publicado recentemente pelo IHU no contexto da Páscoa definitiva do autor, que faleceu aos 104 anos, no último dia 28 de julho. A tradução para o português é de Wagner Fernandes de Azevedo. Os grifos são nossos.)

Sobre o autor:

Pe. Joseph Moingt, S.J. (1915-2020).

O pe. Joseph Moingt foi um jesuíta francês e renomado teólogo, autor, entre outros, do livro L’esprit du christianisme, Paris: Temps Présent, 2018.

Fonte:

IHU

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