A Arquidiocese de Belo Horizonte e a luta contra o Rodoanel

A luta contra o Rodoanel de Belo Horizonte é, sobretudo, em defesa da nossa Casa Comum e está em plena sintonia com os princípios ecoteológicos e humanísticos das cartas Encíclica Laudato Si’ e Fratelli Tutti, da Economia de Francisco e Clara, do Pacto Educativo Global, bem como do documento final do Sínodo para a Amazônia.

A Arquidiocese de Belo Horizonte, cujo território episcopal poderá ser intensamente impactado pela referida obra viária, tem contribuído na defesa do meio ambiente e das comunidades tradicionais, contra o Rodoanel, por meio do Vicariato Episcopal para Ação Social, Política e Ambiental, da Academia dos Juristas Católicos Humanistas de Belo Horizonte e da Comissão Arquidiocesana Justiça e Paz.

No dia 4 de maio de 2022, os movimento socioambientais Salve Santa Luzia e SOS Vargem das Flores, protocolaram na Procuradoria-Geral do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, uma Manifestação de Apoio da Academia dos Juristas Católicos Humanistas de Belo Horizonte e da Comissão Arquidiocesana Justiça e Paz da Arquidiocese de Belo Horizonte, à Representação dos deputados Rogério Correia (PT) e Beatriz Cerqueira (PT) sobre os impactos socioambientais e étnico-culturais do Rodoanel sobre as cidades metropolitanas[1].

O Rodoanel Metropolitano de Belo Horizonte

O Rodoanel se apresenta como uma rodovia de trânsito rápido destinada, especialmente, ao escoamento interestadual de carga pesada e de baixo valor agregado como o minério de ferro. Possuirá de 200m à 500m de largura por 100,6Km de extensão, os quais perpassarão mais de 10 municípios da RMBH entre a BR381 em Sabará e a BR040, na saída para o Rio de Janeiro. A obra custará R$4,5 bilhões, dos quais R$3,5 bilhões advém do acordo de compensação entre a mineradora Vale e o Estado de Minas Gerais, pelo crime do rompimento da barragem B1, Mina Córrego do Feijão em Brumadinho, em 2019, que vitimou mais de 200 pessoas. Não obstante, a Parceria Público Privada do Rodoanel prevê um contrato de concessão de 30 anos, bem como a cobrança de pedágios entre R$0,28 à R$0,32 por Km rodado e uma estimativa de arrecadação de R$6,4 bilhões pela concessionária. O projeto estabelece que os estudos de impacto da obra só serão realizados pela empresa contratada após o leilão. A mesma empresa terá a autonomia para modificar o traçado do Rodoanel segundo o seu interesse econômico.

A luta popular contra o Rodoanel

 Desde 2021, vários movimentos sociais, ambientais e pastorais da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), como a Comissão Pastoral da Terra de Minas Gerais, o Serra Sempre Viva de Ibirité, o SOS Vargem das Flores de Contagem e o Salve Santa Luzia de Santa Luzia, tem defendido a ideia de que o Rodoanel Metropolitano é uma obra que gera destruição socioambiental local e contribui para a crise climática regional e planetária.

Os referidos movimentos participaram de todas as Audiências Públicas e do Seminário realizados pela Secretaria de Estado de Infraestrutura e Mobilidade (Seinfra) do Governo de Minas, para discutir o projeto do Rodoanel. Destarte, constatou-se que os protocolos de divulgação do projeto, bem como os das consultas públicas e da promoção da participação popular, adotados pela Seinfra, resultaram em notória desinformação por parte dos munícipes das cidades da RMBH.

As Audiências Públicas foram recorrentemente, marcadas às pressas, em horário comercial, em localidades de difícil acesso para a população das cidades da RMBH e sem um protocolo de divulgação social eficiente. Tratou-se de reuniões esvaziadas em que os gestores do referido projeto fizeram proselitismo impositivo do Rodoanel, não apresentaram pesquisas que esclarecessem a população sobre os impactos do empreendimento nas cidades, nem estudos que comprovassem a efetividade dos objetivos da obra e ignoraram completamente as preocupações e anseios apresentados pelos movimentos sociais, ambientais e pastorais.

Os vários problemas e inconsistências da condução do projeto do Rodoanel, constatados durante 20° Reunião Especial da Assembleia Legislativa de Minas Gerais, à 26 de novembro de 2021, resultaram no pedido, do presidente da casa legislativa Agostinho Patrus (PSD), de suspenção dos trâmites do projeto para a realização de auditoria pelos deputados. Não obstante, à 21 de janeiro de 2022, o governo do Estado de Minas Gerais, por meio da Seinfra, publicou o Edital n°001/2022 de licitação e concorrência internacional do Rodoanel, sem diálogo com a população, com as prefeituras municipais e com a Assembleia Legislativa. E recentemente foi marcado o leilão do Rodoanel na Bolsa de Valores de São Paulo para o dia 28 de julho.

Frente as várias irregularidades identificadas no projeto do Rodoanel, bem como o seu grande potencial poluidor e degradador, afetando o meio ambiente, comunidades quilombolas, sítios arqueológicos e bairros urbanos periféricos, o deputado federal Rogério Correia (PT) e a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT) protocolaram uma Representação na Procuradoria-Geral do Ministério Público de Minas Gerais

Leia abaixo o documento escrito pela Academia dos Juristas Católicos Humanistas de Belo Horizonte e a Comissão Arquidiocesana de Justiça e Paz:

 

EXMO. SENHOR PROCURADOR GERAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

A Academia dos Juristas Católicos Humanistas de Belo Horizonte (AJUCH/ABH) e a Comissão Arquidiocesana Justiça e Paz da Arquidiocese de Belo Horizonte (CAJP), ambos órgãos ligados à Mitra Arquidiocesana de Belo Horizonte, vêm, em nome de seus representantes e membros, apresentar MANIFESTAÇÃO DE APOIO aos pedidos apresentados na Representação protocolada sob o número 20220019191 perante ao Ministério Público do Estado de Minas Gerais, quais sejam:

a)Instauração de inquérito civil público para apurar as potenciais irregularidades e ameaças às comunidades quilombolas referidas, bem como e à integridade do patrimônio histórico inerentes às referidas comunidades;

b)Requerer os estudos preliminares de impacto junto ao Poder Público Estadual proponente;

c)Acompanhar as alterações eventuais no traçado projetado para o Rodoanel e seu impacto nas comunidades objetos desta representação;

d)Oitiva de especialistas, entidades e organizações da sociedade civil de defesa das comunidades quilombolas e do patrimônio histórico;

e)Adoção de medidas judiciais obstando assegurar a preservação das comunidades, do patrimônio histórico e do patrimônio público.

Os manifestantes reafirmam a importância constitucional de ouvir formalmente os setores da sociedade civil com o fito de evitar a violação de direitos coletivos de suma importância para toda à sociedade. A Representação protocolada chama a atenção deste importante Órgão Público para as diversas irregularidades que podem ser constatadas com a construção do Rodoanel. Impactos na flora, fauna, rios e nos povos quilombolas merecem a investigação e apuração pelo parquet.

Os representantes denunciam irregularidades que violam diretamente importantes dispositivos constitucionais. Ora, não se pode deixar de averiguar as informações trazidas pelos Movimentos Sociais, uma vez que são estes sofrem diretamente os impactos da obra em comento. Destaca-se o trecho em que se coloca em evidência irregularidades que merecem ser verificadas pelo MP, vejamos:

Os documentos integrantes do projeto do Rodoanel evidenciam uma série de irregularidades e ilegalidades que atingem áreas de preservação ambiental, ameaça a bacias hidrográficas imprescindíveis ao abastecimento humano e demais usos razão do traçado apresentado, bem como ordenamento urbano dos municípios.

De igual forma, o referido o traçado proposto originariamente afeta direta ou indiretamente as comunidades quilombolas indicadas anteriormente, bem como o patrimônio histórico, sendo que a maioria destas comunidades também estão associadas ao culto religioso de matriz africana, devendo, pois ser preservadas e protegidas.

Ocorre que, não se identifica dentre os projetos os estudos prévios de impacto da obra de grande magnitude, notadamente em relação ao meio ambiente, organização urbana, nem tampouco os efeitos do empreendimento em relação às comunidades quilombolas e religiosas indicadas, constituindo ameaça real desconsiderada pelo Poder Público Estadual, devendo, pois, ser objeto da atuação dos órgãos de controle e de proteção da sociedade e patrimônio público, em particular o Ministério Público Federal.

Nesse diapasão, em atenção aos direitos constitucionais e coletivos apresentados na representação, a AJUCH/ABH e a CAJP vêm, em nome de todos os seus membros e dirigentes, manifestar apoio à causa apresentada ao Ministério Público de Minas Gerais, bem como requerer que sejam apuradas as denúncias apresentadas.

Belo Horizonte, 05 de abril de 2022.

Professor Marciano Seabra de Godoi – Presidente da AJUCH/ABH
Academia dos Juristas Católicos Humanistas da Arquidiocese de Belo Horizonte

Professor José Luiz Quadros de Magalhães – Presidente da CAJP
Comissão Arquidiocesana Justiça e Paz da Arquidiocese de Belo Horizonte


[1] Vídeo do Ato em frente ao Ministério Público de Minas Gerias na entrega da Manifestação de Apoio: https://www.facebook.com/100003188967630/videos/385201936834528/

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Glaucon Durães da Silva Santos
Católico leigo da paróquia Bom Jesus e Nossa Senhora Aparecida, Santa Luzia/MG, doutorando em Ciências Sociais pela PUC Minas, professor de Sociologia, membro da Associação Brasileira de Ensino de Ciências Sociais e colaborador jovem do Observatório da Evangelização da PUC Minas. Desenvolve pesquisa nas áreas da Sociologia da Religião e da Sociologia Política
Atualmente é representante da Mitra Arquidiocesana de Belo Horizonte (Santuário Arquidiocesano de Santa Luzia) no Conselho Municipal de Patrimônio Cultural de Santa Luzia.