Conversão ao Evangelho

Victor Codina, SJ

Sem conversão ao Evangelho não se pode evangelizar. Em todo caso esta mudança pastoral não se conseguirá só com programas e normas pastorais se não há uma autêntica conversão de todos, clero e leigos, ricos e pobres, modernos e originários, ao Evangelho de Jesus de Nazaré, a seu projeto de filiação e de fraternidade que constitui o objetivo do Reino. É necessária uma espiritualidade e uma mística de comunhão entre todos os agentes pastorais e entre eles e seus pastores a serviço da única missão de Deus.

Esta mística de comunhão eclesial é a que nos abrirá ao ecumenismo com outros cristãos, ao diálogo com os não cristãos, a nos solidarizar com todas as alegrias e dores da humanidade, em especial a dos pobres, buscando que todos tenham vida abundante, começando pelo mínimo, que todos tenham uma vida digna.

Esta conversão ao Evangelho é suscitada a partir de dentro, pelo Espírito Santo, Senhor e doador da vida. O Espírito presente no início da criação, o Espírito que guiou Israel, o Espírito que fez nascer Jesus de Maria, o Espírito que orientou a vida de Jesus, o ressuscitou dentre os mortos e desceu sobre a Igreja e sobre todo o mundo em Pentecostes.

É este mesmo Espírito que inspirou João XXIII a convocar o Vaticano II para que fosse um novo Pentecostes. Só a partir da fidelidade a este mesmo Espírito que impulsionou João XXIII a convocar o Concílio que poderemos ler, interpretar e receber vitalmente o Concílio e colocá-lo em prática.

Um exemplo da espiritualidade de João XXIII pode ser este fragmento de seu Diário escrito poucos dias antes de sua morte:

Papa João XXIII
Papa João XXIII

Hoje, mais do que nunca, certamente mais que nos séculos precedentes, somos chamados ao serviço do homem como tal, não só dos católicos. Somos chamados a defender, sobretudo e em todas as partes, os direitos da pessoa humana e não só os da Igreja católica. As condições atuais, as investigações dos últimos 50 anos levaram-nos a realidades novas, conforme disse no discurso de abertura do Concílio. Não é que tenha mudado o Evangelho, nós é que começamos a compreendê-lo melhor. (…). Chegou o tempo de discernir os sinais dos tempos, de agarrar-se à oportunidade de olhar adiante”.

Fonte: Revista Perspectiva Teológica, Belo Horizonte, v. 45, n. 127, p. 461-472, Set./Dez. 2013