Amar e ser amado: uma experiência que nos humaniza

Foto: Jardim de Burle Marx

O projeto do Criador parece ser esse… Primeiro, todos precisamos ser amados, receber afeto, atenção cuidado. É a base. Depois, com a memória do vivido, somos interpelados a aprender, de forma artesanal a arte de amar.

Curioso como a experiência do amor “pro-voca” a nossa lucidez e como ela forja em nosso interior a livre “de-cisão” de cuidar, no cotidiano, do necessário “des-centrar-se de si”. Desse modo aprendemos a vencer as tentações do egoísmo. Adquirimos o que é necessário para deixar-se lapidar no dinamismo impulsionado pela lógica do servir.

Por que é assim? Confesso que não sei, mas desconfio. Sim, desconfio que Deus seja um grande jardineiro. Não foi inocente e nem aleatório o livro do Gênesis narrar o imenso prazer do Criador em seu enigmático projeto do “Jardim do Éden” (Gn 2, 4b-25; 3, 8-10). A narrativa nos permite “ver” o Mistério de Amor sempre presente a cuidar, contemplar e até mesmo a passear pelas alamedas daquele belo e instigante Jardim.

No entanto, fica imediatamente claro a insuperável fragilidade do Jardim. Hoje, celebrando meus 53 anos de busca e imerso nesta longa pandemia de COVID-19, dei-me conta de uma realidade fundamental: a fragilidade faz parte do projeto divino e entrega-nos o grande segredo escondido na “experiência do Paraíso”. Importa aprender a artesanal arte de cuidar e de descentrar-se de si mesmo.

Engraçado reconhecer que nem Adão nasceu, nem ninguém de nós nasce pronto. O nosso “ser humano” é uma semente preciosa, colocada por Deus no fundo de cada um de nós. E tudo parece depender da fragilidade de um Jardim sempre carente de cuidados e de cuidadoras/res: da fecundidade do terreno, do equilíbrio ambiental e, sobretudo, da dedicada arte do jardineiro.

Para ser despertada, germinar, crescer, florir e frutificar, a “semente”, colocada no profundo de cada um de nós, precisa da sabedoria de dedicados artesãos: pais, familiares, amigas/os, professoras/es, catequistas, companheiras/os de Jardim. Sim definitivamente não é natural nem espontâneo o desenvolvimento de nosso “ser humano”. Somos constitutivamente relação, sempre inconclusa, de amor!

Agora eu sei, que tudo isso não é defeito de fabricação, mas de sábia estratégia do próprio Mistério de Amor. Para amar precisamos ser livres. E somente quando tomamos consciência de nossa potencialidade, sempre frágil, e da necessidade do cuidado em nossas relações, alcançamos a necessária sabedoria para assumir, com autonomia e entrega, a arte de amar e servir ao outro e de cuidar de nosso “Jardim do Éden”, a Terra que nos alberga a todos.

Belo Horizonte, 01 de julho de 2021

Meditação nestes tempos de pandemia

Edward Guimarães

Edward Guimarães é teólogo leigo. Doutor em Ciências da Religião pela PUC Minas e mestre em Teologia pela FAJE. Professor de Teologia do Centro Loyola de Espiritualidade, Fé e Cultura e do Departamento de Ciências da Religião da PUC Minas. Nesta Universidade, ele atua como secretário executivo do Observatório da Evangelização. Assessor das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs), pastorais sociais, movimentos populares e da comissão de catequese e da para o ecumenismo e diálogo inter-religioso do Regional Leste 2 da CNBB. Membro da atual diretoria da Sociedade de Teologia e Ciências da Religião (Soter 2019-2022).