O Sínodo para a Amazônia, depois da publicação de Querida Amazônia, entrou numa nova fase, dificultada nas últimas semanas pela pandemia do Covid-19, que tem obrigado a Igreja a procurar novos modos de realizar a missão evangelizadora. Mesmo diante da situação, a Igreja da Amazônia está acolhendo e refletindo sobre a Exortação do papa Francisco, um documento bem acolhido pela Igreja do Brasil, onde em poucos dias foi esgotada a primeira edição do texto.
Entre os padres sinodais estava dom Giovane Pereira de Melo, bispo de Tocantinópolis – TO, e Presidente da Comisão Episcopal Pastoral para o Laicato da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB. Em referência ao laicato, o trabalho que levam nas comunidades “é um caminho para a gente tornar concreto alguns aspectos do documento”. Por isso, precisa ser fortalecido o trabalho que já está sendo desenvolvido, incidindo na formação, que ajude a serem considerados como sujeitos de transformação na Igreja e na Amazônia. Segundo o bispo, tem deixado caminhos abertos, onde “vamos avançando, vamos dialogando e vamos encontrando novos caminhos”.
O papa Francisco tem ajudado a impulsionar uma Igreja sinodal, segundo dom Giovane, onde se faz possível “sentar juntos, conversar, discutir e buscar caminhos”. Ele destaca que com o Sínodo para a Amazônia, “os indígenas se sentiram abraçados pela Igreja”, fazendo possível que sua voz “chegasse a todo mundo. Todo mundo ouviu as necessidades, as demandas, as lutas e esperanças dos povos indígenas”. Essa atitude se contrapõe, no Brasil, com “uma perseguição em relação aos indígenas, às suas organizações, aos movimentos populares, e aos setores da Igreja que estão mais comprometidos com esta causa”.
Um dos grandes desafios, segundo o bispo de Tocantinópolis, é “fazer com que os nossos presbíteros abracem essa ideia de uma Igreja com rosto amazônico”. Junto com isso, ele insiste na “construção de uma Igreja de caminho sinodal. Precisamos recuperar essa eclesiologia da Igreja Povo de Deus, que, principalmente as gerações mais jovens de presbíteros, às vezes não entendem, não abraçaram essa ideia”. Do contrário, “se nós não escutarmos e não entender que a missão da Igreja não se faz só com o ministério dele, mas que se faz com o serviço, com a presença, com a atuação de todos os batizados, nós não iremos cumprir a missão de Cristo de anunciar a boa nova do Evangelho”. Daí, o sonho de Dom Giovane, “uma Igreja toda ela ministerial”.
(Com a produção, tradução e colaboração de Luis Miguel Modino, temos, no final, versão desta entrevista em espanhol.)
Confira a entrevista na íntegra:
Entrevista com dom Giovani Pereira de Melo
1. Depois de ter recebido a Exortação pós sinodal Querida Amazônia, alguém que participou da Assembleia Sinodal que aconteceu no mês de outubro, qual é sua reação?
No Brasil, os cinco regionais que compõem a Amazônia, nós estamos na fase de recepção do documento. Em termos locais, a imprensa, ela, no geral, não focou o documento, apenas a questão dos ministérios, principalmente dos homens casados, e não não foi muito além disso. A gente esperava, pelo menos se preparou, para que pudesse ser feito uma divulgação maior, através dos meios de comunicação local, da Exortação, mas o interesse foi mais direcionado para esta questão dos ministérios, e de modo particular para a questão dos viri probati. A imprensa, no geral, ficou um pouco na periferia do eixo fundamental, do eixo central do documento, que era a questão de toda a problemática que envolve a Amazônia e o planeta.
Em termos de Igreja, nós estamos agora na fase de realização dos seminários regionais, diocesanos, para tomar conhecimento do documento como um todo. Nesse sentido, a REPAM (Rede Eclesial Pan-Amazônica) vem fazendo seu papel de assessoria nesses seminários. Há uma série de iniciativas já encaminhadas em termos de CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), de REPAM, para tornar o documento conhecido, e, dentro daquilo que é possível, assim fazer. O documento, pelo jeito, teve uma acolhida bastante grande. Tanto é que a primeira edição da CNBB, do documento, foi esgotada. Já estão fazendo uma segunda edição do documento.
2. Quais são os passos que devem ser dados nos próximos meses?
Nós estamos nesta fase de acolhida do documento, de estudo como as lideranças, com os padres, e de certa forma a gente pode dizer que, no interior da Igreja, há uma acolhida. As comunidades, principalmente aquelas que foram ouvidas no decorrer do processo sinodal, elas sentiram que foram ouvidas, que a Igreja as ouviu e tornou porta-voz dos seus clamores, dos seus gritos. Tem passos práticos que precisam ser dados, que exige tempo, e também outros tipos de articulação, por exemplo a Comissão para Amazônia. Nós, os bispos da Amazônia, não nos encontramos depois do Sínodo.
Mas certamente a partir de agora, da publicação da Exortação, nós seremos convidados a nos encontrar para ver como o conjunto dos bispos que estão na Amazônia, podemos levar adiante algumas propostas que estão nas Exortação, ou que estão no Documento Final, e que não nos impede, como bispos, como pastores das igrejas locais, levar adiante. Por exemplo, a questão dos ministérios, a questão das iniciativas que já existem, o fortalecimento de iniciativas que já existem na defesa da Casa Comum. Outros aspectos que as nossas igrejas precisam retomar. Nós temos um grande desafio que o Documento Final colocou, que é a questão da formação, esse é um grande desafio, e foi um dos clamores do Encontro Continental das CEBs.
Há muito tempo, nós precisamos rever o processo de formação dos nossos presbíteros. E se nós queremos preparar presbíteros para a missão na Amazônia, respeitando os povos da Amazônia, sua cultura, suas experiências religiosas, a questão do diálogo, que precisa existir na Amazônia, tendo em vista a grande força pentecostal que tem na Amazônia, de Igrejas de outras confissões religiosas. Então precisamos rever a questão da formação dos presbíteros.
3. O Sínodo para a Amazônia tinha como objetivo novos caminhos. Quais são os novos caminhos que a gente pode dizer que estão sendo propostos, que podem ser assumidos a partir desse proceso sinodal?
No encontro de Belém dos bispos da Amazônia, foi falado bastante das experiências que existem na questão ministerial, seja de animação das comunidades, seja o ministério da Palavra. Partindo de questões práticas, este é um caminho para a gente tornar concreto alguns aspectos do documento. Já existem uma diversidade de ministérios, da Palavra, da visitação, mas nós podemos avançar ainda nesse aspecto, e dar oficialidade a esses ministérios. Alguns existem, mas não há uma oficialidade para isso, uma ritualidade para isso. Esse é um aspecto que precisa ser ter levado em conta.
O Papa fala do papel dos cristãos leigos e leigas nesse processo de evangelização da Amazônia, e aí há um caminho que já existe, mas que precisa ser fortalecido, da formação dos cristãos leigos, precisa ser direcionado, no sentido de que eles são “amazônidas”, e que precisa levar em conta, não só aspectos teológicos da fé, mas trabalhando toda essa articulação da ecologia, da defesa dos povos, dos grandes desafios sociais que estão presentes na Amazônia. Isso precisa entrar na dinâmica do processo de evangelização, isso precisa fazer parte do conteúdo formativo dos nossos cristãos leigos, exatamente para serem sujeitos, não só na Igreja, mas também no processo de transformação da Amazônia.
4. Tem vozes críticas, em referência a Querida Amazônia, ao respeito do sonho eclesial, mas tanto na Laudato Si como ao longo do proceso sinodal, ficou claro que tudo está interligado e que não se entende um sonho sem os outros. O que dizer diante dessas críticas, como ajudar a entender que a proposta do Papa Francisco, como ele mesmo falou, é mais centrada nos diagnósticos do que as pequenas coisas, os avanços concretos que alguns pretendem alcançar?
O Papa na Exortação, principalmente nesse capítulo que trata da questão eclesial, do sonho eclesial, ele não fechou a questão. A discussão sobre a ministerialidade, sobre a presença da mulher na Igreja, dos leigos na Igreja, e a continuidade da busca desses novos caminhos, está muito presente no documento. Embora o Papa não tenha de direcionado, como nós durante o Sínodo apontamos, no sentido concreto, e dizer que o caminho é por aqui, ele não fechou essa discussão, deixou em aberto.
Aí é um caminho a ser percorrido pelas igrejas locais, nós bispos, a partir das das nossas realidades, podemos avançar e continuar propondo. No caso dos ministérios, no caso da mulher, no caso do laicato, são caminhos abertos que o Papa deixou para que nós também, vamos avançando, vamos dialogando e vamos encontrando encontrando novos caminhos.
5. Como o senhor falou, estão previstas a assembleia da CNBB, seminários nos regionais, nas dioceses, está prevista a visita ad límina, tudo dependendo da situação que estamos viviendo diante da pandemia do coronavírus. Esses momentos podem avançar na concretização da questão ministerial que aparece no sonho eclesial?
Eu acho que sim, porque há um clima favorável para isso, e é um clima favorável não só no episcopado brasileiro, de modo particular no episcopado da Amazônia, como também do Papa. Diferentemente do período de João Paulo II, que não queria discutir essa questão da experiência da ministerialidade, a experiência da dinâmica sinodal do papa Francisco, a experiência sinodal, por exemplo, da Igreja do Brasil, e aí nesse sentido, as Comunidades eclesiais de base – CEBs, nesses 50 anos, têm contribuído na construção desta experiência de sinodalidade, de sentar juntos, conversar, discutir e buscar caminhos.
O que talvez nos falta é a gente tirar tempo, sentar seriamente com todas as forças da Igreja, e trabalhar profundamente as questões e repropor caminhos, fortalecer caminhos de avanço significativos, que a Igreja, de modo particular no Brasil, já fez. E aí, as Comunidades eclesiais de base – CEBs, nesta questão da sinodalidade, da valorização do laicato, deste compromisso de fé e política, ligar a fé com os compromissos sociais, se nós criamos ambientes, por exemplo, a Assembleia dos Organismos do Povo de Deus, que estava deixado de lado há um tempo atrás, que foi retomado a partir do ano passado.
Se nós criamos pautas para esses espaços que nós já temos, seja na Conferência, seja na Comissão da Amazônia, seja no Intereclesial das CEBs, seja na Assembleia dos Organismos do Povo de Deus, seja no Encontro Nacional de Presbíteros, que talvez seja um dos grandes desafios, e fazer com que os nossos presbíteros abracem essa ideia de uma Igreja com rosto amazônico, nós temos um caminho largo para ser ser percorrido, e com um horizonte de esperança. O Papa, pelos sonhos, nos aponta esse caminho e de um horizonte de esperança, de perspectivas positivas, de abertura, e é claro, alguns caminhos a gente vai mais rápido, outros caminhos se vai caminhando conforme é possível avançar.
6. A voz dos povos indígenas na assembleia sinodal foi, segundo diferentes vozes, decisiva. As reações dos indígenas diante de Querida Amazônia são de grande acolhida por tudo o que o papa Francisco tem feito por eles. Poderiamos dizer, ainda mais diante da realidade sociopolítica que o Brasil está vivendo, que Querida Amazônia contribui para que os indígenas, na prática tenham carta de cidadania?
Sim, porque os indígenas se sentiram abraçados pela Igreja. Os povos indígenas presentes no Sínodo para a Amazônia sentiram que a Igreja, através dos seus canais, deu voz aos seus clamores. Se eles já tinham, pelas suas organizações, os canais locais em que eles podiam falar e fazer ouvir a sua voz, a Igreja, através do Sínodo, fez com que essa voz, esses clamores, esses gritos dos povos indígenas, chegasse a todo mundo. Todo mundo ouviu as necessidades, as demandas, as lutas e esperanças dos povos indígenas.
O desafio é grande porque há uma força muito forte, contrária a Querida Amazônia, no sentido político social. Eu olho especificamente a realidade do Brasil. O atual contexto político que nós estamos vivendo, não é um contexto favorável. Pelo contrário, nós temos visto que há uma perseguição clara em relação aos indígenas, às suas organizações, aos movimentos populares, e aos setores da Igreja que estão mais comprometidos com esta causa. A questão do CIMI (Conselho Indigenista Missionário), a questão da CPT (Comissão Pastoral da Terra).
O ambiente da Igreja universal, principalmente com a figura do papa Francisco, com Querida Amazônia, e boa parte do episcopado brasileiro, da Igreja no Brasil, o clima é favorável para esse reconhecimento da cidadania dos povos indígenas. Agora, temos grandes desafios, a questão é saber se estamos com a disposição, com a coragem profética, de abraçarmos com os povos indígenas os desafios e as propostas que Querida Amazônia coloca para a Amazônia.
7. O senhor é presidente da Comissão Episcopal para o Laicato. Numa Igreja sinodal, e o papa Francisco tem apostado decisivamente por essa Igreja sinodal, tendo convocado o próximo sínodo com esse tema, o papel dos leigos é fundamental. O que representa esta Igreja sinodal e como isso pode ser assumido desde a Comissão Episcopal para o Laicato e dentro da Igreja do Brasil?
Nós temos no Brasil espaços em que a gente pode viver e praticar esta dinâmica de uma Igreja sinodal. Os conselhos de pastoral, os conselhos comunitários, as experiências de assembleias, os conselhos diocesano do laicato. Nós temos espaços em que esta dimensão sinodal, de comunhão, de participação, de decidir juntos, existe. O que precisamos é fortalecer esses espaços e colocar isso como ponto fundamental nesta construção de uma Igreja de caminho sinodal. Precisamos recuperar essa eclesiologia da Igreja Povo de Deus, que, principalmente as gerações mais jovens de presbíteros, às vezes não entendem, não abraçaram essa ideia.
Precisaria recuperar essa eclesiologia, recuperar esta dimensão de ministerialidade, de ampliar esta questão da ministerialidade. Precisaríamos reconhecer que a ministerialidade não se reduz apenas ao aspecto interno da Igreja, mas que um leigo que atua em nome do Evangelho, em nome da Igreja, no sindicato, no partido político, ele também exerce um ministério e compromisso da sua fé no contexto da sociedade. Precisamos ampliar e aprofundar estas experiências e respaldá-las com uma eclesiologia que nós temos, que é a eclesiologia do Concílio Vaticano II, que pensa a Igreja como Povo de Deus.
8. Na prática, diante dessa proposta de Igreja sinodal, poderiamos dizer que é possível que o clero comece escutar o laicato e especialmente as mulheres?
Se nós não escutarmos e não entender que a missão da Igreja não se faz só com o ministério do clero, mas que faz com o serviço, com a presença, com a atuação de todos os batizados, nós não iremos cumprir a missão de Cristo de anunciar a boa nova do Evangelho. Hoje, na realidade da Igreja, e em particular da Igreja do Brasil na Amazônia, eu como padre, como bispo, não posso, de maneira nenhuma, pensar uma evangelização sem a presença, sem a missão, sem o testemunho dos cristãos leigos. E os cristãos precisam ser sujeitos, não apenas executores, é preciso que padres, leigos, toda a Igreja, sentem, conversem, e como irmãos encontrem caminhos para a evangelização. Do contrário, não temos como cumprir a missão do Senhor.
9. Alguém que nasceu na Amazônia, que é bispo na Amazônia, qual é seu sonho para a Amazônia e para a Igreja da Amazônia?
A gente precisa acreditar e precisa trabalhar para que tenhamos, de fato, uma Igreja toda ela ministerial, que tenhamos uma Igreja em que os cristãos leigos e leigas se sintam sujeitos na Igreja e na sociedade. Para isso, a Igreja invista na formação do laicato. Assim como nós investimos na formação dos nossos futuros presbíteros, dos atuais presbíteros, nós precisamos também, senão no mesmo tanto, investir.
Eu, por exemplo, na diocese de Tocantinópolis, a minha prioridade é a formação do laicato, não deixo de formar os presbíteros, mas através de duas escolas, nós temos uma Escola de Formação de iniciadores à vida cristã e temos uma escola que forma lideranças leigas para atuação na Igreja e também fora na sociedade. Investir na formação, fortalecer e ampliar a ministerialidade na Igreja, e fortalecer esses ambientes em que nós podemos viver uma experiência de Igreja sinodal, de Igreja de irmãos, que caminham juntos, que decidem juntos, que celebram juntos.
(Os grifos são nossos)
Sobre o autor:
Luis Miguel Modino – Padre diocesano de Madri, missionário fidei donum na Amazônia, residindo atualmente em Manaus – AM. Faz parte da Equipe de Comunicação da REPAM. Correspondente no Brasil de Religión Digital e colaborador do Observatório da Evangelização e em diferentes sites e revistas.
Confira, a seguir, a íntegra da entrevista em espanhol:
Giovane Pereira de Melo: “Necesitamos recuperar la eclesiología de la Iglesia Pueblo de Dios, que, las generaciones más jóvenes de presbíteros, a veces no entienden”.
El Sínodo para la Amazonía, después de la publicación de Querida Amazonia, entró en una nueva fase, dificultada en las últimas semanas por la pandemia de Covid-19, que ha obligado a la Iglesia a buscar nuevas formas de llevar a cabo la misión evangelizadora. En esta situación, la Iglesia de la Amazonía está acogiendo y reflexionando sobre la Exhortación del Papa Francisco, un documento acogido con beneplácito por la Iglesia de Brasil, donde en pocos días se agotó la primera edición del texto.
Entre los padres sinodales estaba Monseñor Giovane Pereira de Melo, obispo de Tocantinópolis, y presidente de la Comisión Pastoral Episcopal para los Laicos de la Conferencia Nacional de los Obispos de Brasil – CNBB. En referencia a los laicos, el trabajo que llevan a cabo en las comunidades “es una forma de concretar ciertos aspectos del documento”. Por lo tanto, el trabajo que ya se está desarrollando debe fortalecerse, centrándose en la formación, que ayude a que sean considerados como sujetos de transformación en la Iglesia y en la Amazonía. Según el obispo, se han dejado caminos abiertos, por donde “estamos avanzando, estamos hablando y estamos encontrando nuevos caminos”.
El Papa Francisco ha ayudado a promover una Iglesia sinodal, según Monseñor Giovane, desde donde es posible “sentarse juntos, hablar, discutir y buscar caminos”. Señala que con el Sínodo para la Amazonía, “los pueblos indígenas se sintieron abrazados por la Iglesia”, haciendo posible que su voz “llegue a todos. Todos escucharon las necesidades, demandas, luchas y esperanzas de los pueblos indígenas”. Esta actitud se opone, en Brasil, a “una clara persecución en relación con los pueblos indígenas, sus organizaciones, movimientos populares y los sectores de la Iglesia que están más comprometidos con esta causa”.
Según el obispo de Tocantinópolis, uno de los grandes desafíos es “hacer que nuestros presbíteros abracen esta idea de una Iglesia con rostro amazónico”. Junto con esto, insiste en “construir una Iglesia en camino sinodal. Necesitamos recuperar esta eclesiología de la Iglesia Pueblo de Dios, que, especialmente las generaciones más jóvenes de presbíteros, a veces no entienden, no han aceptado esta idea”. De lo contrario, “si no escuchamos y no entendemos que la misión de la Iglesia no se hace solo con su ministerio, sino que se hace con el servicio, con la presencia, con el desempeño de todos los bautizados, no cumpliremos con la misión de Cristo de anunciar la buena nueva del Evangelio”. De ahí el sueño de Monseñor Giovane, “una Iglesia que sea toda ministerial”.
1. Después de recibir la exhortación post-sinodal Querida Amazonía, para alguien que participó en la Asamblea Sinodal que tuvo lugar en octubre, ¿cuál es su reacción?
En Brasil, los cinco regionales que conforman la Amazonía, estamos en proceso de recibir el documento. En términos locales, la prensa, en general, no se centró en el documento, solo en el tema de los ministerios, especialmente los hombres casados, y no fue mucho más allá de eso. Esperábamos, al menos nos preparamos, para poder hacer una mayor difusión, a través de los medios locales, de la Exhortación, pero el interés se dirigió más a este tema de los ministerios, y en particular al tema de viri probati. La prensa, en general, se mantuvo un poco en la periferia del eje fundamental, el eje central del documento, que era la cuestión de toda la problemática que involucra a la Amazonía y al planeta.
En términos de Iglesia, ahora estamos en la etapa de celebrar seminarios diocesanos, regionales, para tomar conocimiento sobre el documento en su conjunto. En este sentido, la REPAM (Red Eclesial Panamazónica) está desempeñado su papel de asesora en estos seminarios. Ya hay una serie de iniciativas en marcha en términos de CNBB (Conferencia Nacional de los Obispos de Brasil), y REPAM, para dar a conocer el documento y, dentro de lo posible, hacerlo. El documento, por cierto, tuvo una gran acogida. Tanto es así que se agotó la primera edición de la CNBB del documento. Ya están haciendo una segunda edición del documento.
2. ¿Qué pasos se deben dar en los próximos meses?
Estamos en esta fase de acoger el documento, de estudiar con los líderes, con los sacerdotes, y de alguna manera podemos decir que, dentro de la Iglesia, hay una acogida. Las comunidades, especialmente aquellas que fueron escuchadas durante el proceso sinodal, sintieron que fueron escuchadas, que la Iglesia las escuchó y se convirtió en portavoz de sus clamores, de sus gritos. Hay pasos prácticos que deben darse, que llevan tiempo, y también otros tipos de articulación, por ejemplo, la Comisión para la Amazonía. Nosotros, los obispos de la Amazonía, no nos reunimos después del Sínodo.
Pero ciertamente a partir de ahora, desde la publicación de la Exhortación, seremos invitados a reunirnos para ver cómo el grupo de obispos que estámos en la Amazonía, podemos llevar a cabo algunas propuestas que están en la Exhortación, o que están en el Documento Final, y que no nos impide, como obispos, como pastores de iglesias locales, hacerlas realidad. Por ejemplo, la cuestión de los ministerios, la cuestión de las iniciativas que ya existen, el fortalecimiento de las iniciativas que ya existen en la defensa de la Casa Común. Otros aspectos que nuestras iglesias necesitan retomar. Tenemos un gran desafío que plantea el Documento Final, que es el tema de la formación, este es un gran desafío, y fue uno de los clamores del Encuentro Continental de las CEBs.
Desde hace mucho tiempo, necesitamos revisar el proceso de formación de nuestros presbíteros. Y si queremos preparar a los presbíteros para la misión en la Amazonía, respetando a los pueblos de la Amazonía, su cultura, sus experiencias religiosas, la cuestión del diálogo, que debe existir en la Amazonía, en vista de la gran fuerza pentecostal que existe en la Amazonía, de iglesias de otras denominaciones religiosas. Por lo tanto, debemos revisar el tema de la formación de los presbíteros.
3. El Sínodo para la Amazonía apuntó a nuevos caminos. ¿Cuáles son los nuevos caminos que podemos decir que se proponen, que se pueden asumir desde este proceso sinodal?
En el encuentro de Belém de los obispos de la Amazonía, se habló mucho sobre las experiencias que existen en la cuestión ministerial, ya sea en la animación de las comunidades o en el ministerio de la Palabra. Partiendo de preguntas prácticas, esta es una forma de concretar ciertos aspectos del documento. Ya existe una diversidad de ministerios, de la Palabra, de la visita, pero aún podemos avanzar en este aspecto y hacer que estos ministerios sean oficiales. Algunos existen, pero no hay oficialidad para esto, no hay ritual para eso. Este es un aspecto que debe tenerse en cuenta.
El Papa habla del papel de los cristianos laicos y laicas en este proceso de evangelización en la Amazonía, y hay un camino que ya existe, pero que debe fortalecerse, la formación de los cristianos laicos, debe ser dirigida, en el sentido de que son amazónidas, y que es necesario tener en cuenta, no los aspectos teológicos de la fe, sino trabajar en toda esta articulación de la ecología, la defensa de los pueblos, los grandes desafíos sociales que están presentes en la Amazonía. Esto debe ser parte de la dinámica del proceso de evangelización, debe ser parte del contenido formativo de nuestros cristianos laicos, exactamente para ser sujetos, no solo en la Iglesia, sino también en el proceso de transformación en la Amazonía.
4. Hay voces críticas, en referencia a Querida Amazonia, con respecto al sueño eclesial, pero tanto en Laudato Si como a lo largo del proceso del Sínodo, quedó claro que todo está interconectado y que un sueño no puede entenderse sin los otros. ¿Qué decir ante estas críticas, cómo ayudar a comprender que la propuesta del Papa Francisco, como él mismo dijo, está más centrada en los diagnósticos que en las pequeñas cosas, los avances concretos que algunos pretenden lograr?
El Papa en la Exhortación, especialmente en este capítulo que trata el tema eclesial, el sueño eclesial, no cerró el tema. La discusión sobre la ministerialidad, sobre la presencia de mujeres en la Iglesia, sobre los laicos en la Iglesia y la continuidad de la búsqueda de estos nuevos caminos, está muy presente en el documento. Aunque el Papa no se haya dirigido, como lo señalamos durante el Sínodo, en un sentido concreto, dijo que el camino está aquí, el Papa no cerró esta discusión, la dejó abierta.
Ese es un camino a seguir por las iglesias locales, nosotros los obispos, a partir de las de nuestras realidades, podemos avanzar y seguir proponiendo. En el caso de los ministerios, en el caso de las mujeres, en el caso de los laicos, estos son caminos abiertos que el Papa dejó para que nosotros también avancemos, dialoguemos y encontremos nuevas formas.
5. Como usted ya ha dicho, la asamblea de la CNBB está programada, los seminarios en los regionales, en las diócesis, la visita ad limina está programada, todo dependiendo de la situación que estamos viviendo ante la pandemia del coronavirus. ¿Pueden estos momentos ayudar a avanzar en la realización de la cuestión ministerial que aparece en el sueño eclesial?
Creo que sí, porque hay un clima favorable para eso, y es un clima favorable no solo en el episcopado brasileño, en particular en el episcopado de la Amazonía, sino también del Papa. A diferencia del período de Juan Pablo II, que no quiso discutir esta cuestión de la ministerialidad, la dinámica sinodal del Papa Francisco, la experiencia sinodal, por ejemplo, de la Iglesia de Brasil, y en ese sentido, las comunidades eclesiales de base, en estos 50 años, han contribuido a la construcción de esta experiencia de sinodalidad, de sentarse juntos, hablar, discutir y buscar caminos.
Lo que nos puede faltar es que tomemos tiempo, nos sentemos seriamente con todas las fuerzas de la Iglesia, y trabajemos profundamente en los problemas y propongamos formas, para fortalecer caminos de progreso significativos, lo cual la Iglesia, particularmente en Brasil, ya ha hecho. Y luego, las comunidades eclesiales de base, en este tema de la sinodalidad, de la valorización de los laicos, de este compromiso con la fe y la política, para vincular la fe con los compromisos sociales, crear entornos, por ejemplo, la Asamblea de los Organismos del Pueblo de Dios, que se omitió hace un tiempo, que se reanudó desde el año pasado.
Si creamos pautas para estos espacios que ya tenemos, ya sea en la conferencia, en la Comisión de la Amazonía, en el Interecclesial de las CEBs, en la Asamblea de los Organismos del Pueblo de Dios o en el Encuentro Nacional de Presbíteros, que puede ser un de los grandes desafíos, hacer que nuestros sacerdotes adopten esta idea de una Iglesia con rostro amazónico, tenemos un amplio camino a seguir y con un horizonte de esperanza. El Papa, a través de los sueños, nos señala este camino y un horizonte de esperanza, perspectivas positivas, apertura, y, por supuesto, algunos caminos en que avanzamos más rápido, en otros caminos se avanza en la medida en que podemos avanzar.
6. La voz de los pueblos indígenas en la asamblea sinodal fue, según diferentes voces, decisiva. Las reacciones de los pueblos indígenas a Querida Amazonia son de gran acogida por todo lo que el Papa Francisco ha hecho por ellos. ¿Podríamos decir, aún más frente a la realidad socio política que está viviendo Brasil, que Querida Amazonía contribuye para que los indígenas, en la práctica, tengan un documento de ciudadanía?
Sí, porque los indígenas se sintieron abrazados por la Iglesia. Los pueblos indígenas presentes en el Sínodo para la Amazonía sintieron que la Iglesia, a través de sus canales, dio voz a sus clamores. Si ya tenían, a través de sus organizaciones, los canales locales en los que podían hablar y hacer oír su voz, la Iglesia, a través del Sínodo, hizo que esta voz, estos clamores, estos gritos de los pueblos indígenas, llegaran a todos . Todos escucharon las necesidades, demandas, luchas y esperanzas de los pueblos indígenas.
El desafío es grande porque hay una fuerza muy fuerte, contraria a Querida Amazonía, en el sentido político social. Veo específicamente la realidad de Brasil. El contexto político actual que estamos viviendo no es favorable. Por el contrario, hemos visto que existe una clara persecución en relación con los pueblos indígenas, sus organizaciones, los movimientos populares y los sectores de la Iglesia que están más comprometidos con esta causa. La cuestión del CIMI (Consejo Misionero Indio), la cuestión de la CPT (Comisión Pastoral de la Tierra).
El ambiente de la Iglesia universal, especialmente con la figura del Papa Francisco, con Querida Amazonía, y una buena parte del episcopado brasileño, de la iglesia en Brasil, el clima es favorable para este reconocimiento de la ciudadanía de los pueblos indígenas. Ahora, tenemos grandes desafíos, la pregunta es si estamos dispuestos, con valentía profética, de abrazar con los pueblos indígenas los desafíos y las propuestas que Querida Amazonía plantea para la Amazonía.
7. Usted es presidente de la Comisión Episcopal para el Laicado. En una Iglesia sinodal, y el Papa Francisco tiene un compromiso decisivo con esta Iglesia sinodal, convocando el próximo sínodo sobre este tema, el papel de los laicos es fundamental. ¿Qué representa esta Iglesia sinodal y cómo se puede asumir esto desde la Comisión Episcopal para el Laicado para la Iglesia de Brasil?
Tenemos espacios en Brasil donde podemos vivir y practicar esta dinámica de una Iglesia sinodal. Consejos pastorales, consejos comunitarios, experiencias de asambleas, consejos diocesanos de los laicos. Tenemos espacios en los que existe esta dimensión sinodal, de comunión, de participación, de decidir juntos. Lo que necesitamos es fortalecer estos espacios y colocar esto como un punto fundamental en la construcción de una Iglesia en camino sinodal. Necesitamos recuperar esta eclesiología de la Iglesia Pueblo de Dios, que, especialmente las generaciones más jóvenes de presbíteros, a veces no entienden, no han aceptado esta idea.
Es necesario recuperar esta eclesiología, recuperar esta dimensión de la ministerialidad, expandir esta cuestión de la ministerialidad. Necesitamos reconocer que la ministerialidad no solo se reduce al aspecto interno de la Iglesia, sino que un laico que actúa en nombre del Evangelio, en nombre de la Iglesia, en el sindicato, en el partido político, también ejerce un ministerio y compromiso de su fe en el contexto de la sociedad. Necesitamos ampliar y profundizar estas experiencias y apoyarlas con una eclesiología que tenemos, que es la eclesiología del Concilio Vaticano II, que entiende la Iglesia como Pueblo de Dios.
8. En la práctica, desde esta propuesta de una Iglesia sinodal, ¿podríamos decir que es posible que el clero comience a escuchar a los laicos y especialmente a las mujeres?
Si no escuchamos y no entendemos que la misión de la Iglesia no se hace solo con nuestro ministerio, sino que se hace con el servicio, con la presencia, con el desempeño de todos los bautizados, no cumpliremos la misión de Cristo de anunciar la buena nueva del Evangelio. Hoy, en la realidad de la Iglesia, y en particular de la Iglesia de Brasil, en la Amazonía, yo como sacerdote, como obispo, no puedo, de ninguna manera, pensar en una evangelización sin la presencia, sin la misión, sin el testimonio de los cristianos laicos. Y los cristianos deben ser sujetos, no solo ejecutores, es necesario que sacerdotes, laicos, toda la Iglesia, se sienten, hablen, y, como hermanos, encuentren caminos de evangelización. De lo contrario, no podemos cumplir la misión del Señor.
9. Alguien que nació en la Amazonía, que es obispo en el Amazonía, ¿cuál es su sueño para la Amazonía y para la Iglesia de la Amazonía?
Necesitamos creer y trabajar para que, de hecho, tengamos una Iglesia que sea ministerial, que tengamos una Iglesia en la que los cristianos laicos sientan que son sujetos en la Iglesia y en la sociedad. Para esto, la Iglesia invierta en la formación de los laicos. Así como invertimos en la formación de nuestros futuros presbíteros, de los actuales presbíteros, también necesitamos, si no tanto, invertir.
Por ejemplo, en la diócesis de Tocantinópolis, mi prioridad es la formación de los laicos, no dejo de formar a los presbíteros, pero a través de dos escuelas, tenemos una Escuela de Formación para iniciadores de la vida cristiana y tenemos una escuela que capacita a líderes laicos, para trabajar en la Iglesia y también fuera, en la sociedad. Invertir en la formación, fortalecer y expandir la ministerialidad en la Iglesia, y fortalecer estos entornos en los que podemos vivir una experiencia de la Iglesia sinodal, de la Iglesia de hermanos, que caminan juntos, que deciden juntos, que celebran juntos.