O Seminário Nacional do CEFEP (Centro Nacional de Fé e Política Dom Hélder Câmara – organismo da CNBB) aconteceu nos dias 22 a 24 de março passado, reunindo o grupo de Assessores e as escolas locais de Fé e Política que atualmente formam uma rede de mais de 70 instituições em todo o Brasil.
Levando em conta a complexa conjuntura social, econômica, política e religiosa do país, os participantes aprovaram uma carta destinada aos bispos do Brasil que se encontram reunidos em Assembleia Geral, no período entre os dias 1º e 10 de maio, em Aparecida (SP).
Assinada pelos presentes, o documento foi entregue ao Presidente da CNBB, o cardeal Dom Sergio da Rocha e enviada a todos os bispos.
Leia a íntegra do texto:
CARTA À CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL
Senhores bispos,
“Construirão casas, para nelas morar, plantarão vinhas, para comer seus frutos. Não acontecerá que um construa e outro more, tampouco um plantará e outro comerá; pois meu povo alcançará a idade das árvores e meus eleitos consumirão o produto do seu trabalho.” (Isaías 65, 22).
“A necessária mudança das estruturas sociais, políticas e econômicas injustas não será verdadeira e plena se não for acompanhada pela mudança de mentalidade pessoal e coletiva com o respeito ao ideal duma vida humana digna e feliz, que por sua vez dispõe à conversão“. (Puebla, 1155).
Nós, leigos e leigas, agentes de Pastoral, reunidos no seminário da rede de Assessores e das Escolas de Fé e Política do Centro Nacional de Fé e Política Dom Helder Câmara, engajados/as na missão de “tornar o Reino de Deus presente no mundo” (Papa Francisco – Alegria do Evangelho) queremos dialogar com os nossos Pastores e expressar algumas preocupações e propostas em vista de sermos uma Igreja cada vez mais discípula missionária.
1. A realidade nos desafia para uma resposta profética
A realidade brasileira é marcada pela desigualdade socioeconômica e regional; um país onde a maioria da população conta com muitas dificuldades de sobrevivência e serviços públicos insuficientes diante das demandas sociais. A Constituição Federal de 1988 garantiu um marco legal de direitos fundamentais e sociais que ao longo dos últimos 30 anos se desdobraram em Políticas Públicas universais que possibilitaram a diminuição das desigualdades e a melhorias de todos os indicadores sociais.
A crise econômica e política dos últimos anos representa um ataque à Constituição Brasileira e a qualquer possibilidade de termos no Brasil um Estado de Bem Estar Social que garanta uma sociedade de igualdade de oportunidades.
A Agenda Econômica do governo Bolsonaro está comprometida com uma visão de mundo onde o mercado por si só é capaz de resolver os problemas da sociedade, dado que o poder público é usado para diminuir as políticas públicas e fazer do Estado mero incentivador das forças do mercado. Uma visão ultraliberal que não se compromete com a eliminação das desigualdades.
Essa Agenda está articulada com a restrição das liberdades democráticas; os direitos civis estão ameaçados e o uso da força e da perseguição política já é uma realidade. A intolerância e o ódio se tornam políticas oficiais e presentes nas relações pessoais e até em nossas comunidades eclesiais; o futuro do Brasil pode significar um aprofundamento da pobreza e da miséria e do trabalho precarizado, com consequências imprevisíveis no campo das relações familiares e sociais. A atual proposta de “reforma da previdência” é um exemplo da restrição de direitos
2. As ameaças dos fundamentalismos
O ódio virou arma para destruir todo aquele que pensa ou tem posições diferentes; ele atua por razões políticas, econômicas e religiosas e mina a democracia; impede que os conflitos sejam resolvidos de forma pacífica no campo da política. Também no interior da Igreja, sofremos a vigilância e a perseguição de alguns grupos organizados comprometidos com uma ação contra o Concílio Vaticano II e até contra o papa Francisco. A própria CNBB tem sido acusada e difamada por estes grupos que se dizem católicos.
Afirmamos a necessidade de investirmos em uma cultura do encontro e do diálogo, como pede o papa Francisco. Não há democracia sem respeito e pluralidade, sem a vivência de uma cultura democrática que sustente o Estado Democrático de Direito.
A conjuntura que enfrentamos pede de todos nós e de modo particular a manifestação profética dos nossos bispos e comunidade eclesiais, denunciando as injustiças e tudo aquilo que fere a dignidade humana e a possibilidade da convivência democrática.
Também nos preocupa a formação dos agentes de Pastoral, dos recursos disponíveis para tais atividades em todos os níveis, bem como a formação dos seminaristas sobre as relação Igreja/sociedade, Doutrina Social da Igreja e formação sociopolítica.
3. Caminhar juntos
Com o papa Francisco, sentimos um novo vigor da eclesiologia do Povo de Deus. Com isso, a nossa intenção é que cada vez mais a CNBB seja uma Instituição que testemunhe a renovação conciliar e a conversão pastoral convocada pela Conferência de Aparecida. Esperamos uma maior presença e participação do laicato nas diversas comissões e instâncias da Conferência, bem como nos regionais e nas próprias dioceses. Uma maior colegialidade e um compromisso renovado com a Opção Preferencial dos Pobres.
Seguindo as pegadas do Evangelho e como nos recorda o papa Francisco na “Alegria do Evangelho”, não existe evangelização sem a dimensão socioambiental que a Palavra de Deus exige e, por isso, mais uma vez conclamamos que a CNBB se manifeste, como o fez em toda a sua história, a favor do povo brasileiro e, principalmente, dos mais pobres. Que tanto na Igreja como na sociedade possamos vivenciar a profecia e ensaiarmos desde já o Reino de Justiça, Fraternidade e Igualdade.
Que o próximo quadriênio esteja à altura desses grandes desafios; de uma evangelização encarnada; de uma nova inserção eclesial no contexto complexo das cidades e na defesa de uma ecologia integral, semeando e testemunhando o Amor de Deus.
Contem conosco!
Fonte:
Núcleo de Estudos Sociopolíticos PUC Minas – NESP