A opção de Francisco: como evangelizar um mundo em mudança

A realização do XVIII Simpósio Internacional promovido pelo IHU Unisinos em Porto Alegre, A virada profética de Francisco: possibilidades e limites para o futuro da Igreja no mundo contemporâneo foi coroada pela Conferência proferida pelo Dr. Austen Ivereigh – Catholic Voices – CV – Inglaterra sobre a Opção de Francisco: como evangelizar um mundo em mudança.

Ao observarmos o mundo em que vivemos, notamos que tudo se encontra em mudança. Em relação à sociedade contemporânea, o Papa Francisco tem uma visão apocalíptica no que diz respeito a uma sociedade capitalista. Dai é importante propor recursos para este mundo. Francisco é um Papa energizado de alegria, esperança e, assim, sua opção não é a de uma retirada do mundo, um fechamento em relação ao mundo como na época do monaquismo, mas a de indicar a necessidade de sermos uma Igreja em saída, em missão e sempre de portas abertas. Não se pode lidar com esse mundo líquido construindo barcos para nos salvarmos das ondas revoltas. Sua proposta é a conversão pastoral que parte da misericórdia e nos conscientizarmos sempre de exercer o discipulado de forma missionária.

Na busca de elucidar melhor a opção de Francisco, o conferencista desenvolveu três aspectos importantes no horizonte interpretativo do Papa quanto à evangelização deste e neste mundo, a saber:

1 Transformação de época. A mudança que assistimos de forma crescente na sociedade de nossos dias exige uma verdadeira conversão da igreja e de seus membros. Esta conversão passa pelo resgate do encontro com Jesus Cristo que alimenta o coração humano desafiando-nos a estarmos ao lado dos crucificados. Aparecida parte do princípio que o Cristianismo, a fé católica enquanto mero devocionismo fragmentado não sobreviveria a esta época de fragmentação e liquidez. Dai a necessidade de certas reformas que exige um repensar da Igreja no mundo a partir do encontro com Jesus Cristo. Logo após Aparecida, no retorno a Buenos Aires, Francisco fala aos seus sacerdotes que a situação em que se encontrava o mundo, não era de se lamentar e condenar, mas era necessária e importante uma nova forma de agir e estar como Igreja no mundo. Era preciso uma transformação de atitudes, posturas e comportamentos. Para isso é preciso ser de novo evangelizados. Aqui se enfatiza o convite a um retorno à experiência dos primeiros discípulos. Considerando o mundo de hoje, diz Dr. Austem a partir de Francisco, é preciso propor uma ação pastoral com o coração de samaritano. O mundo contemporâneo pode ser caracterizado por um sentimento de angústia quando os espaços que ocupamos não são mais marcados pelos símbolos da transcendência reconectando-nos com a criação, quando os vínculos de confiança e amor são fragilizados, quando o mundo tecnocrata são espaços em que não se conta mais com a graça de Deus… Nesse mundo e a esse mundo a Igreja deve mostrar e ser sinal de um Deus concreto que se faz próximo, particular através da nossa presença , afeto, comunhão, solidariedade, fraternidade.

2 Refocalizar a Igreja ensimesmada. Segundo Austen, a Igreja tem-se enrijecido ao invés de reformar-se. A Igreja investiu numa resistência e defesa diante do mundo e ao mundo após o Vaticano II. O que o Papa Francisco tem insistido é justamente o contrário, isto é, o de ser a Igreja sempre mais uma presença, uma proximidade e não o fechamento em si mesma, uma Igreja enlameada e não protegida na sacristia. No agir da Igreja que sai de si mesma, ela possibilita propor a misericórdia de Deus a partir de suas próprias misérias e isto já seria o inicio da conversão pastoral. A conversão da Igreja se identifica à conversão pessoal. Uma Igreja que é capaz de reconhecer as suas próprias chagas é capaz de também compreender as chagas das pessoas e assim não se coloca no centro, mas o Cristo mesmo, o encontro com sua misericórdia. Quando a Igreja não põe o Cristo no centro, ela fica doente, empobrecida, sem vida, sem luz, mas, ao fazer o contrário, ela se põe numa perspectiva missionária. Nesta perspectiva, é preciso liberar a Igreja da sua auto-referencialidade. Enquanto a Igreja está ensimesmada, o povo de Deus está na busca de Deus.

3 Evangelizar através da misericórdia e das bem – aventuranças: a proposta que Francisco faz à Igreja, é a de uma evangelização não de uma forma sofisticada, pragmática, programática, complexa, mas , de forma simples oferecendo e despertando a todos para a oportunidade de um encontro com a misericórdia, com a graça de Deus. A Igreja mesma não só deve levar as pessoas ao encontro com a graça de Deus, mas ela mesma deve estar aberta à graça. Numa sociedade líquida é preciso a ajuda da graça. Existe aqui uma atenção e uma proposta a cada indivíduo a abrir-se e experimentar a graça de Deus. Ao evangelizar o mundo de hoje, não se pode deixar de oferecer a mesma experiência. Neste horizonte, Francisco sempre lembra o que Deus fez e faz em nossas vidas, em cada um de nós através de seus dons, da sua misericórdia e os efeitos da sua graça.

Concluindo, na Amoris Laetitia, Evangelli Gaudium e Gaudete Exsultate, o Papa Francisco deixa claro que falta algo e que é preciso recuperar na evangelização: a alegria. Esta brota da consciência de que o que nos salva é Deus, sua graça que busca alcançar a todos.  Dai, a Igreja mesma precisa ser a primeira a mudar sua linguagem, sua consciência. O fracasso é quando se põe a esperança em nós mesmos, nos nossos esquemas e não na graça de Deus. A Boa Nova que muda o mundo é a paciência, a alegria e o anúncio do amor de Cristo, de sua graça. Isto motiva os discípulos a não se esconderem em suas cavernas e esquemas, mas na alegria de anunciar e ser no mundo uma presença da graça de Deus. Francisco tem feito de Aparecida a referência para a Igreja universal. Assim, a opção de Francisco é a de colocar o encontro com Cristo no centro e a partir da Graça, a Igreja ser presença e sinal do amor de Deus. A opção de Francisco é pela consolação, pela alegria e não pela desolação.

Joel Maria dos Santos

Membro da Equipe Executiva

Observatório da Evangelização